Vencedor do Prêmio Nobel de Física do ano passado, o pesquisador norte-americano John Clauser chocou a comunidade científica recentemente ao se posicionar como um “negacionista climático”. Durante um evento organizado pelo grupo Coalizão Depósito da Fé, que reúne organizações católicas, o laureado declarou em tom que “as mudanças climáticas não existem”, e que o aquecimento global não coloca o “mundo em risco”.
“Apesar de poder irritar muita gente, minha mensagem é que o planeta não está em risco”, disse Clauser, de 80 anos. “Eu chamo a mim mesmo de negacionista climático”, acrescentou o físico, cuja linha de pesquisa e produção acadêmica não estão voltados para o estudo do clima e dos efeitos do aquecimento global na Terra. O experiente cientista venceu o Nobel de Física de 2022 em reconhecimento aos trabalhos pioneiros realizados com partículas de luz nos anos 1970.
A postura negacionista de Clauser sobre as mudanças climáticas, algo amplamente defendido pelos climatologistas, coloca o físico ao lado de outros vencedores do Nobel que também já foram na contramão de teses sustentadas pela ciência.
Entre eles, estão profissionais que contestam a importância da vacinação como proteção ao coronavírus, outros colegas que também duvidam que a Terra esteja aquecendo por influência humana e até laureados que entendem que a inteligência de pessoas brancas e negras é determinada pela genética.
Embora incomum, o movimento já agrega tantos cientistas ao longo da história que essa postura anticiência de alguns laureados foi ironicamente cunhada de “Síndrome do Nobel”. Conheça alguns desses cientistas:
Luc Montaigner (Nobel de Medicina, 2008)
O francês Luc Montagnier, virologista que ganhou o Prêmio Nobel de Medicina em 2008 por descobrir o vírus do HIV (vírus da imunodeficiência humana), patógeno da Aids, voltou a ganhar notoriedade durante a crise da pandemia do covid-19 por alegações falsas e distorcidas sobre a doença e sobre a vacinação.
Com um discurso negacionista sobre os imunizantes, o pesquisador defendeu em 2021 a tese de que a vacinação contra o novo coronavírus seria responsável pela criação de novas variantes e que, por essa razão, deveria ser evitada para não provocar o agravamento da pandemia.
Ivar Giaever (Nobel de Física, 1973)
O físico Ivan Giaver, de origem norueguesa, recebeu o Prêmio Nobel de Física em 1973 pelas descobertas experimentais sobre fenômenos de tunelamento em semicondutores e supercondutores. Porém, o pesquisador, atualmente com 94 anos, já demonstrou de forma contundente não concordar com a tese do aquecimento global. Em 2011, ele chegou a renunciar o seu posto da Sociedade Americana de Física (APS) por discordar dos colegas em relação à constatação das mudanças climáticas no mundo.
James Watson (Nobel de Medicina, 1962)
Em 1962, o norte-americano James Watson recebeu o Nobel de Medicina pela descoberta da dupla hélice do DNA, considerada uma das mais importantes da ciência moderna. O prestígio, porém, ficou manchado por declarações racistas de Watson.
Em 2007, ele declarou à imprensa que pessoas africanas não teriam a mesma capacidade e inteligência que os europeus em função da diferença genética entre negros e brancos. Na época, ele chegou a se desculpar e disse ter sido mal interpretado, mas acabou sendo suspenso do laboratório onde pesquisava, em Nova York.
Em 2019, Watson voltou a polemizar ao reafirmar as suas crenças sobre a superioridade de brancos sobre negros em um documentário feito sobre sua carreira. Ele foi novamente punido com perdas de títulos, como o de reitor emérito e professor emérito do laboratório onde trabalhava, Cold Spring Harbor.
Na época, o laboratório afirmou que as declaração de James Watson não tinha respaldo científico.
‘Síndrome do Nobel’
Especialistas acreditam que a sensação de poder que vem junto com a premiação pode levar alguns pesquisadores a se sentirem acima das evidências dos experimentos e das descobertas de estudos realizados por outros colegas. Por isso, foi cunhado o termo “Síndrome de Nobel” - ou “doença do Nobel”, “efeito Nobel”, e até de “nobelite”.