Por que vemos cada vez menos estrelas no céu? Estudo dá uma explicação


Brilho artificial noturno, uma forma de poluição luminosa, aumentou em uma média de 9,6% ao ano no período entre 2011 e 2022, mostra pesquisa publicada na ‘Science’

Por Leon Ferrari
Atualização:

O céu tem cada vez menos estrelas. Isso, pelo menos, é o que nossos olhos parecem nos mostrar. Estudo publicado na revista científica Science, que analisou o período de 2011 a 2022, mostrou que nossa visão não está mentindo: a visibilidade das estrelas está se “deteriorando rapidamente”, ao passo que o brilho artificial do céu noturno, uma forma de poluição luminosa, aumentou em uma média de 9,6% ao ano.

Para se ter uma ideia do efeito prático do avanço da poluição luminosa nessa taxa, em um período de 18 anos, um local com 250 estrelas visíveis veria esse número reduzir para 100. É como se o brilho artificial do céu estivesse dobrando a cada oito anos.

Os cientistas Christopher Kyba e Yigit Oner Altinta, do Centro Alemão de Pesquisas em Geociências (GFZ-Potsdam), e Constança Walker e Mark Newhouse, do Laboratório Nacional de Pesquisa de Astronomia Óptica-Infravermelha (NOIRLab), dos Estados Unidos, recorreram a um método de ciência cidadã para chegar a esses resultados.

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Eles investigaram a mudança no brilho global usando 51.351 observações de “amadores”. Dentro do projeto Globe at Night, do NOIRLab, esses cientistas cidadãos de várias partes do planeta viram mapas do céu com diferentes níveis de poluição luminosa e foram questionados sobre qual combinava mais com a visão que tinham, o que permitiu aos cientistas observar o quanto a poluição luminosa afeta a visão a olho nu das estrelas.

No artigo, os pesquisadores destacam que a taxa que encontraram é bastante superior à estimada por observações que recorrem apenas a satélites (que mostraram, anteriormente, aumentos do brilho artificial em uma taxa de 2,2% ao ano). Eles explicaram que essa diferença se dá por causa da sensibilidades limitadas desses equipamentos, que não conseguem detectar luz com comprimentos de onda abaixo de 500 nm (nanômetros).

Assustador

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Especialistas ouvidos pelo Estadão destacam que a taxa identificada é “assustadora”, mas não é uma surpresa. “O fundo do céu está cada vez mais brilhante e as estrelas mais fracas, estão sumindo, desaparecendo. Uma pessoa que nasceu agora e que nunca saiu da cidade vai achar que o céu só poucas estrelas brilhantes, jamais vai entender a natureza, não consegue nem entender onde é que ela está”, afirma Wagner José Corradi Barbosa, diretor do Laboratório Nacional de Astrofísica (LNA), do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI).

“Hoje, infelizmente, nós estamos vendo que a poluição luminosa, como um todo, está colocando em risco a possibilidade do ser humano conhecer a si mesmo”, diz, frisando a importância da astronomia para compreensão do Universo.

Via Láctea está escondida para mais de um terço da humanidade, mostrou estudo de 2016 Foto: Amr Abdallah Dalsh/Reuters
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A preocupação com a maneira com que a poluição luminosa afeta nossa visão do céu, de fato, não é de hoje. Em 2016, o Atlas Mundial do Brilho Artificial do Céu Noturno, publicado na revista Science Advances, por Kyba e pesquisadores da Itália, Estados Unidos e Israel, com base em dados de satélite de alta resolução e medições de precisão do brilho do céu, revelou que mais de 80% do mundo e mais de 99% das populações dos EUA e da Europa vivem sob céus poluídos pela luz.

O estudo também mostrou que a Via Láctea, há pouco mais de 100 anos vista no arco do céu de qualquer cidade, estava escondida para mais de um terço da humanidade.

No estudo de 2016, os pesquisadores disseram ser possível imaginar dois cenários para o futuro. Em um deles, a poluição luminosa é controlada com sucesso e a geração atual seja última a experimentar um mundo tão poluído por luz. No outro, o mundo continua a brilhar, com quase toda a população nunca experimentando uma visão das estrelas.

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Os impactos desse último caminho, traçado pelo estudo mais recente, conforme os especialistas, são grandes e ultrapassam prejuízos à ciência e observação do céu. Há efeitos adversos à saúde humana, que tem ciclos naturais do corpo, como o circadiano (ritmo em que o organismo realiza suas funções ao longo de um dia), que são ditados pela exposição à luz; e ecossistêmicos, com alterações em padrões migratórios dos animais e relações de predação.

Corradi afirma que a pesquisa nacional já tem dificuldade de observar objetos de luz “muito fraca” que estão no limite do brilho do céu. Ele cita como exemplo um projeto internacional, com participação do LNA, que busca contrapartidas ópticas de ondas gravitacionais. “A ciência que se sente prejuízo maior é a que depende da gente olhar objetos cujo brilho está muito próximo do brilho do fundo do céu. Você está confundindo o brilho fundo do céu com o brilho do objeto, e não se consegue distinguir aquele objeto.”

“Se a astronomia está prejudicada, o desenvolvimento tecnológico também vai sendo prejudicado”, afirma ele, destacando que vários avanços de tecnologia, como as câmeras triplas nos smartphones mais modernas, herdaram aprendizados dessa área do conhecimento.

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Jane Gregorio-Hetem, professora do departamento de Astronomia da Universidade de São Paulo (USP), avalia que, além dos impactos à ciência, é “assustador” o efeito adverso da poluição luminosa no meio ambiente. “As tartarugas, por exemplo, depois que eclodem os ovos na praia, as tartaruguinhas usam o brilho da Lua no mar para se orientar para onde ele está. Só que se você tem cidade próxima, elas vão ficar confusas e não vão saber qual é o lado mais iluminado que elas devem ir. O impacto ambiental é chocante.”

A luminosidade excessiva também já tem afetado o acasalamento de vaga-lumes. Os machos emitem luz para indicar a sua disponibilidade e as fêmeas respondem com flashes especiais para mostrar que estão prontas. Entretanto, a luz brilhante dos luminosos, da iluminação pública e das casas interfere e bloqueia a possível conjunção.

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LEDs

De maneira geral, a poluição luminosa ocorre quando a luz noturna artificial é mal planejada (colocada na direção errada ou de forma excessiva, com desperdício de energia).

Conforme explicam os pesquisadores no artigo, a partir da década de 2010, muitas luzes externas foram amplamente substituídas por diodos emissores de luz (LEDs), com pico de emissão entre 400 e 500 nm. O impacto dessa transição para LEDs no aumento do brilho artificial no céu não é claro, afirmam, no entanto, divide cientistas, com alguns defendendo benefícios, focados na eficiência energética apresentada pela tecnologia, e outros, temendo e alertando sobre prejuízos à saúde humana e do ecossistema como um todo.

No artigo, os pesquisadores concluem que “a visibilidade das estrelas está se deteriorando rapidamente, apesar (ou talvez por causa) da introdução de LEDs em aplicações de iluminação externa”, além de apontarem que as “políticas de iluminação existentes não estão impedindo o aumento do brilho do céu, pelo menos nas escalas continental e global”.

O contraponto entre benefícios e riscos dos LEDs é bem capturado em uma orientação publicada pela American Medical Association (AMA), em 2016. A associação destacou que a conversão da luz de rua convencional em iluminação LED com eficiência energética leva a economia de custos e energia e a uma menor dependência de combustíveis fósseis. No entanto, emite uma grande quantidade de luz azul, que causa desconforto e suprime a melatonina de maneira mais adversa durante a noite, podendo causar distúrbios de sono. “Estima-se que as lâmpadas de LED brancas tenham um impacto cinco vezes maior nos ritmos circadianos do sono do que as lâmpadas de rua convencionais”, diz a orientação, que pediu a minimização e controle da iluminação ambiental rica em azul.

“Dentro do olho da gente, temos fotorreceptores visuais que são calibrados em vermelho, verde e azul, e temos o fotorreceptor não visual que é calibrado em 480 nanômetros, que ele é a luz azul basicamente. Esse fotorreceptor que é não visual, ele serve pra mandar uma informação para o cérebro da gente de que é dia”, explica Silvia Maria Carneiro de Campos, arquiteta especialista em iluminação e representante da organização internacional sem fins lucrativos Dark Sky Association no Brasil,

“Toda vez que a gente visualiza esse espectro, o cérebro da gente vai dizendo que é dia e produz os hormônios do dia”, continua. “Basicamente, a luz LED está em mais ou menos 450 nanômetros. É muito próximo a esse espectro de luz que a gente identifica como o dia. Aí quando você coloca essa luz branca à noite, todos acabam tendo um um entendimento de que é dia. Isso muda toda a vida ao redor.”

Ela, que participa do Comitê de Revisão de Norma de Iluminação Público ABNT 5101, afirma ainda que o Brasil ainda é “ignorante” quanto à poluição luminosa e que não há limite para emissão de luz no espectro azul por ora. A arquiteta conta que outros países, como a Austrália, e já avançam nesse sentido, reconhecendo os riscos à saúde humana e os danos ao ecossistema. “A política pública de outros países exige que se use comprimentos de onda que não tenham mais de 3% de espectro azul. Lá fora você está limitado o uso da luz em 2,7 mil Kelvin, que é uma luz amarelinha, mas eles recomendam que se use 1,8 mil Kelvin, que é aquela luz mais no âmbar, vermelho.”

Corradi, do LNA, diz que as lâmpadas de LED têm aspectos interessantes. “Têm uma luz mais direcional.” No entanto, reclama da potência das utilizadas atualmente e defende um limite. “Nossa defesa é que a potência luminosa seja diminuída. Eu não tenho necessidade de colocar uma lâmpada com 200 watts em uma rua que podia estar muito bem (iluminada) com uma lâmpada de 80.”

O Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro) disse ao Estadão que o “conceito de poluição luminosa pode ter definições variadas e nem sempre convergentes” e que “ainda está em fase de análise da agenda regulatória que contemplará os regulamentos que passarão por aperfeiçoamento”.

A Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) não respondeu aos pedidos de entrevista até a publicação do texto.

O céu tem cada vez menos estrelas. Isso, pelo menos, é o que nossos olhos parecem nos mostrar. Estudo publicado na revista científica Science, que analisou o período de 2011 a 2022, mostrou que nossa visão não está mentindo: a visibilidade das estrelas está se “deteriorando rapidamente”, ao passo que o brilho artificial do céu noturno, uma forma de poluição luminosa, aumentou em uma média de 9,6% ao ano.

Para se ter uma ideia do efeito prático do avanço da poluição luminosa nessa taxa, em um período de 18 anos, um local com 250 estrelas visíveis veria esse número reduzir para 100. É como se o brilho artificial do céu estivesse dobrando a cada oito anos.

Os cientistas Christopher Kyba e Yigit Oner Altinta, do Centro Alemão de Pesquisas em Geociências (GFZ-Potsdam), e Constança Walker e Mark Newhouse, do Laboratório Nacional de Pesquisa de Astronomia Óptica-Infravermelha (NOIRLab), dos Estados Unidos, recorreram a um método de ciência cidadã para chegar a esses resultados.

Eles investigaram a mudança no brilho global usando 51.351 observações de “amadores”. Dentro do projeto Globe at Night, do NOIRLab, esses cientistas cidadãos de várias partes do planeta viram mapas do céu com diferentes níveis de poluição luminosa e foram questionados sobre qual combinava mais com a visão que tinham, o que permitiu aos cientistas observar o quanto a poluição luminosa afeta a visão a olho nu das estrelas.

No artigo, os pesquisadores destacam que a taxa que encontraram é bastante superior à estimada por observações que recorrem apenas a satélites (que mostraram, anteriormente, aumentos do brilho artificial em uma taxa de 2,2% ao ano). Eles explicaram que essa diferença se dá por causa da sensibilidades limitadas desses equipamentos, que não conseguem detectar luz com comprimentos de onda abaixo de 500 nm (nanômetros).

Assustador

Especialistas ouvidos pelo Estadão destacam que a taxa identificada é “assustadora”, mas não é uma surpresa. “O fundo do céu está cada vez mais brilhante e as estrelas mais fracas, estão sumindo, desaparecendo. Uma pessoa que nasceu agora e que nunca saiu da cidade vai achar que o céu só poucas estrelas brilhantes, jamais vai entender a natureza, não consegue nem entender onde é que ela está”, afirma Wagner José Corradi Barbosa, diretor do Laboratório Nacional de Astrofísica (LNA), do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI).

“Hoje, infelizmente, nós estamos vendo que a poluição luminosa, como um todo, está colocando em risco a possibilidade do ser humano conhecer a si mesmo”, diz, frisando a importância da astronomia para compreensão do Universo.

Via Láctea está escondida para mais de um terço da humanidade, mostrou estudo de 2016 Foto: Amr Abdallah Dalsh/Reuters

A preocupação com a maneira com que a poluição luminosa afeta nossa visão do céu, de fato, não é de hoje. Em 2016, o Atlas Mundial do Brilho Artificial do Céu Noturno, publicado na revista Science Advances, por Kyba e pesquisadores da Itália, Estados Unidos e Israel, com base em dados de satélite de alta resolução e medições de precisão do brilho do céu, revelou que mais de 80% do mundo e mais de 99% das populações dos EUA e da Europa vivem sob céus poluídos pela luz.

O estudo também mostrou que a Via Láctea, há pouco mais de 100 anos vista no arco do céu de qualquer cidade, estava escondida para mais de um terço da humanidade.

No estudo de 2016, os pesquisadores disseram ser possível imaginar dois cenários para o futuro. Em um deles, a poluição luminosa é controlada com sucesso e a geração atual seja última a experimentar um mundo tão poluído por luz. No outro, o mundo continua a brilhar, com quase toda a população nunca experimentando uma visão das estrelas.

Os impactos desse último caminho, traçado pelo estudo mais recente, conforme os especialistas, são grandes e ultrapassam prejuízos à ciência e observação do céu. Há efeitos adversos à saúde humana, que tem ciclos naturais do corpo, como o circadiano (ritmo em que o organismo realiza suas funções ao longo de um dia), que são ditados pela exposição à luz; e ecossistêmicos, com alterações em padrões migratórios dos animais e relações de predação.

Corradi afirma que a pesquisa nacional já tem dificuldade de observar objetos de luz “muito fraca” que estão no limite do brilho do céu. Ele cita como exemplo um projeto internacional, com participação do LNA, que busca contrapartidas ópticas de ondas gravitacionais. “A ciência que se sente prejuízo maior é a que depende da gente olhar objetos cujo brilho está muito próximo do brilho do fundo do céu. Você está confundindo o brilho fundo do céu com o brilho do objeto, e não se consegue distinguir aquele objeto.”

“Se a astronomia está prejudicada, o desenvolvimento tecnológico também vai sendo prejudicado”, afirma ele, destacando que vários avanços de tecnologia, como as câmeras triplas nos smartphones mais modernas, herdaram aprendizados dessa área do conhecimento.

Jane Gregorio-Hetem, professora do departamento de Astronomia da Universidade de São Paulo (USP), avalia que, além dos impactos à ciência, é “assustador” o efeito adverso da poluição luminosa no meio ambiente. “As tartarugas, por exemplo, depois que eclodem os ovos na praia, as tartaruguinhas usam o brilho da Lua no mar para se orientar para onde ele está. Só que se você tem cidade próxima, elas vão ficar confusas e não vão saber qual é o lado mais iluminado que elas devem ir. O impacto ambiental é chocante.”

A luminosidade excessiva também já tem afetado o acasalamento de vaga-lumes. Os machos emitem luz para indicar a sua disponibilidade e as fêmeas respondem com flashes especiais para mostrar que estão prontas. Entretanto, a luz brilhante dos luminosos, da iluminação pública e das casas interfere e bloqueia a possível conjunção.

LEDs

De maneira geral, a poluição luminosa ocorre quando a luz noturna artificial é mal planejada (colocada na direção errada ou de forma excessiva, com desperdício de energia).

Conforme explicam os pesquisadores no artigo, a partir da década de 2010, muitas luzes externas foram amplamente substituídas por diodos emissores de luz (LEDs), com pico de emissão entre 400 e 500 nm. O impacto dessa transição para LEDs no aumento do brilho artificial no céu não é claro, afirmam, no entanto, divide cientistas, com alguns defendendo benefícios, focados na eficiência energética apresentada pela tecnologia, e outros, temendo e alertando sobre prejuízos à saúde humana e do ecossistema como um todo.

No artigo, os pesquisadores concluem que “a visibilidade das estrelas está se deteriorando rapidamente, apesar (ou talvez por causa) da introdução de LEDs em aplicações de iluminação externa”, além de apontarem que as “políticas de iluminação existentes não estão impedindo o aumento do brilho do céu, pelo menos nas escalas continental e global”.

O contraponto entre benefícios e riscos dos LEDs é bem capturado em uma orientação publicada pela American Medical Association (AMA), em 2016. A associação destacou que a conversão da luz de rua convencional em iluminação LED com eficiência energética leva a economia de custos e energia e a uma menor dependência de combustíveis fósseis. No entanto, emite uma grande quantidade de luz azul, que causa desconforto e suprime a melatonina de maneira mais adversa durante a noite, podendo causar distúrbios de sono. “Estima-se que as lâmpadas de LED brancas tenham um impacto cinco vezes maior nos ritmos circadianos do sono do que as lâmpadas de rua convencionais”, diz a orientação, que pediu a minimização e controle da iluminação ambiental rica em azul.

“Dentro do olho da gente, temos fotorreceptores visuais que são calibrados em vermelho, verde e azul, e temos o fotorreceptor não visual que é calibrado em 480 nanômetros, que ele é a luz azul basicamente. Esse fotorreceptor que é não visual, ele serve pra mandar uma informação para o cérebro da gente de que é dia”, explica Silvia Maria Carneiro de Campos, arquiteta especialista em iluminação e representante da organização internacional sem fins lucrativos Dark Sky Association no Brasil,

“Toda vez que a gente visualiza esse espectro, o cérebro da gente vai dizendo que é dia e produz os hormônios do dia”, continua. “Basicamente, a luz LED está em mais ou menos 450 nanômetros. É muito próximo a esse espectro de luz que a gente identifica como o dia. Aí quando você coloca essa luz branca à noite, todos acabam tendo um um entendimento de que é dia. Isso muda toda a vida ao redor.”

Ela, que participa do Comitê de Revisão de Norma de Iluminação Público ABNT 5101, afirma ainda que o Brasil ainda é “ignorante” quanto à poluição luminosa e que não há limite para emissão de luz no espectro azul por ora. A arquiteta conta que outros países, como a Austrália, e já avançam nesse sentido, reconhecendo os riscos à saúde humana e os danos ao ecossistema. “A política pública de outros países exige que se use comprimentos de onda que não tenham mais de 3% de espectro azul. Lá fora você está limitado o uso da luz em 2,7 mil Kelvin, que é uma luz amarelinha, mas eles recomendam que se use 1,8 mil Kelvin, que é aquela luz mais no âmbar, vermelho.”

Corradi, do LNA, diz que as lâmpadas de LED têm aspectos interessantes. “Têm uma luz mais direcional.” No entanto, reclama da potência das utilizadas atualmente e defende um limite. “Nossa defesa é que a potência luminosa seja diminuída. Eu não tenho necessidade de colocar uma lâmpada com 200 watts em uma rua que podia estar muito bem (iluminada) com uma lâmpada de 80.”

O Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro) disse ao Estadão que o “conceito de poluição luminosa pode ter definições variadas e nem sempre convergentes” e que “ainda está em fase de análise da agenda regulatória que contemplará os regulamentos que passarão por aperfeiçoamento”.

A Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) não respondeu aos pedidos de entrevista até a publicação do texto.

O céu tem cada vez menos estrelas. Isso, pelo menos, é o que nossos olhos parecem nos mostrar. Estudo publicado na revista científica Science, que analisou o período de 2011 a 2022, mostrou que nossa visão não está mentindo: a visibilidade das estrelas está se “deteriorando rapidamente”, ao passo que o brilho artificial do céu noturno, uma forma de poluição luminosa, aumentou em uma média de 9,6% ao ano.

Para se ter uma ideia do efeito prático do avanço da poluição luminosa nessa taxa, em um período de 18 anos, um local com 250 estrelas visíveis veria esse número reduzir para 100. É como se o brilho artificial do céu estivesse dobrando a cada oito anos.

Os cientistas Christopher Kyba e Yigit Oner Altinta, do Centro Alemão de Pesquisas em Geociências (GFZ-Potsdam), e Constança Walker e Mark Newhouse, do Laboratório Nacional de Pesquisa de Astronomia Óptica-Infravermelha (NOIRLab), dos Estados Unidos, recorreram a um método de ciência cidadã para chegar a esses resultados.

Eles investigaram a mudança no brilho global usando 51.351 observações de “amadores”. Dentro do projeto Globe at Night, do NOIRLab, esses cientistas cidadãos de várias partes do planeta viram mapas do céu com diferentes níveis de poluição luminosa e foram questionados sobre qual combinava mais com a visão que tinham, o que permitiu aos cientistas observar o quanto a poluição luminosa afeta a visão a olho nu das estrelas.

No artigo, os pesquisadores destacam que a taxa que encontraram é bastante superior à estimada por observações que recorrem apenas a satélites (que mostraram, anteriormente, aumentos do brilho artificial em uma taxa de 2,2% ao ano). Eles explicaram que essa diferença se dá por causa da sensibilidades limitadas desses equipamentos, que não conseguem detectar luz com comprimentos de onda abaixo de 500 nm (nanômetros).

Assustador

Especialistas ouvidos pelo Estadão destacam que a taxa identificada é “assustadora”, mas não é uma surpresa. “O fundo do céu está cada vez mais brilhante e as estrelas mais fracas, estão sumindo, desaparecendo. Uma pessoa que nasceu agora e que nunca saiu da cidade vai achar que o céu só poucas estrelas brilhantes, jamais vai entender a natureza, não consegue nem entender onde é que ela está”, afirma Wagner José Corradi Barbosa, diretor do Laboratório Nacional de Astrofísica (LNA), do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI).

“Hoje, infelizmente, nós estamos vendo que a poluição luminosa, como um todo, está colocando em risco a possibilidade do ser humano conhecer a si mesmo”, diz, frisando a importância da astronomia para compreensão do Universo.

Via Láctea está escondida para mais de um terço da humanidade, mostrou estudo de 2016 Foto: Amr Abdallah Dalsh/Reuters

A preocupação com a maneira com que a poluição luminosa afeta nossa visão do céu, de fato, não é de hoje. Em 2016, o Atlas Mundial do Brilho Artificial do Céu Noturno, publicado na revista Science Advances, por Kyba e pesquisadores da Itália, Estados Unidos e Israel, com base em dados de satélite de alta resolução e medições de precisão do brilho do céu, revelou que mais de 80% do mundo e mais de 99% das populações dos EUA e da Europa vivem sob céus poluídos pela luz.

O estudo também mostrou que a Via Láctea, há pouco mais de 100 anos vista no arco do céu de qualquer cidade, estava escondida para mais de um terço da humanidade.

No estudo de 2016, os pesquisadores disseram ser possível imaginar dois cenários para o futuro. Em um deles, a poluição luminosa é controlada com sucesso e a geração atual seja última a experimentar um mundo tão poluído por luz. No outro, o mundo continua a brilhar, com quase toda a população nunca experimentando uma visão das estrelas.

Os impactos desse último caminho, traçado pelo estudo mais recente, conforme os especialistas, são grandes e ultrapassam prejuízos à ciência e observação do céu. Há efeitos adversos à saúde humana, que tem ciclos naturais do corpo, como o circadiano (ritmo em que o organismo realiza suas funções ao longo de um dia), que são ditados pela exposição à luz; e ecossistêmicos, com alterações em padrões migratórios dos animais e relações de predação.

Corradi afirma que a pesquisa nacional já tem dificuldade de observar objetos de luz “muito fraca” que estão no limite do brilho do céu. Ele cita como exemplo um projeto internacional, com participação do LNA, que busca contrapartidas ópticas de ondas gravitacionais. “A ciência que se sente prejuízo maior é a que depende da gente olhar objetos cujo brilho está muito próximo do brilho do fundo do céu. Você está confundindo o brilho fundo do céu com o brilho do objeto, e não se consegue distinguir aquele objeto.”

“Se a astronomia está prejudicada, o desenvolvimento tecnológico também vai sendo prejudicado”, afirma ele, destacando que vários avanços de tecnologia, como as câmeras triplas nos smartphones mais modernas, herdaram aprendizados dessa área do conhecimento.

Jane Gregorio-Hetem, professora do departamento de Astronomia da Universidade de São Paulo (USP), avalia que, além dos impactos à ciência, é “assustador” o efeito adverso da poluição luminosa no meio ambiente. “As tartarugas, por exemplo, depois que eclodem os ovos na praia, as tartaruguinhas usam o brilho da Lua no mar para se orientar para onde ele está. Só que se você tem cidade próxima, elas vão ficar confusas e não vão saber qual é o lado mais iluminado que elas devem ir. O impacto ambiental é chocante.”

A luminosidade excessiva também já tem afetado o acasalamento de vaga-lumes. Os machos emitem luz para indicar a sua disponibilidade e as fêmeas respondem com flashes especiais para mostrar que estão prontas. Entretanto, a luz brilhante dos luminosos, da iluminação pública e das casas interfere e bloqueia a possível conjunção.

LEDs

De maneira geral, a poluição luminosa ocorre quando a luz noturna artificial é mal planejada (colocada na direção errada ou de forma excessiva, com desperdício de energia).

Conforme explicam os pesquisadores no artigo, a partir da década de 2010, muitas luzes externas foram amplamente substituídas por diodos emissores de luz (LEDs), com pico de emissão entre 400 e 500 nm. O impacto dessa transição para LEDs no aumento do brilho artificial no céu não é claro, afirmam, no entanto, divide cientistas, com alguns defendendo benefícios, focados na eficiência energética apresentada pela tecnologia, e outros, temendo e alertando sobre prejuízos à saúde humana e do ecossistema como um todo.

No artigo, os pesquisadores concluem que “a visibilidade das estrelas está se deteriorando rapidamente, apesar (ou talvez por causa) da introdução de LEDs em aplicações de iluminação externa”, além de apontarem que as “políticas de iluminação existentes não estão impedindo o aumento do brilho do céu, pelo menos nas escalas continental e global”.

O contraponto entre benefícios e riscos dos LEDs é bem capturado em uma orientação publicada pela American Medical Association (AMA), em 2016. A associação destacou que a conversão da luz de rua convencional em iluminação LED com eficiência energética leva a economia de custos e energia e a uma menor dependência de combustíveis fósseis. No entanto, emite uma grande quantidade de luz azul, que causa desconforto e suprime a melatonina de maneira mais adversa durante a noite, podendo causar distúrbios de sono. “Estima-se que as lâmpadas de LED brancas tenham um impacto cinco vezes maior nos ritmos circadianos do sono do que as lâmpadas de rua convencionais”, diz a orientação, que pediu a minimização e controle da iluminação ambiental rica em azul.

“Dentro do olho da gente, temos fotorreceptores visuais que são calibrados em vermelho, verde e azul, e temos o fotorreceptor não visual que é calibrado em 480 nanômetros, que ele é a luz azul basicamente. Esse fotorreceptor que é não visual, ele serve pra mandar uma informação para o cérebro da gente de que é dia”, explica Silvia Maria Carneiro de Campos, arquiteta especialista em iluminação e representante da organização internacional sem fins lucrativos Dark Sky Association no Brasil,

“Toda vez que a gente visualiza esse espectro, o cérebro da gente vai dizendo que é dia e produz os hormônios do dia”, continua. “Basicamente, a luz LED está em mais ou menos 450 nanômetros. É muito próximo a esse espectro de luz que a gente identifica como o dia. Aí quando você coloca essa luz branca à noite, todos acabam tendo um um entendimento de que é dia. Isso muda toda a vida ao redor.”

Ela, que participa do Comitê de Revisão de Norma de Iluminação Público ABNT 5101, afirma ainda que o Brasil ainda é “ignorante” quanto à poluição luminosa e que não há limite para emissão de luz no espectro azul por ora. A arquiteta conta que outros países, como a Austrália, e já avançam nesse sentido, reconhecendo os riscos à saúde humana e os danos ao ecossistema. “A política pública de outros países exige que se use comprimentos de onda que não tenham mais de 3% de espectro azul. Lá fora você está limitado o uso da luz em 2,7 mil Kelvin, que é uma luz amarelinha, mas eles recomendam que se use 1,8 mil Kelvin, que é aquela luz mais no âmbar, vermelho.”

Corradi, do LNA, diz que as lâmpadas de LED têm aspectos interessantes. “Têm uma luz mais direcional.” No entanto, reclama da potência das utilizadas atualmente e defende um limite. “Nossa defesa é que a potência luminosa seja diminuída. Eu não tenho necessidade de colocar uma lâmpada com 200 watts em uma rua que podia estar muito bem (iluminada) com uma lâmpada de 80.”

O Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro) disse ao Estadão que o “conceito de poluição luminosa pode ter definições variadas e nem sempre convergentes” e que “ainda está em fase de análise da agenda regulatória que contemplará os regulamentos que passarão por aperfeiçoamento”.

A Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) não respondeu aos pedidos de entrevista até a publicação do texto.

O céu tem cada vez menos estrelas. Isso, pelo menos, é o que nossos olhos parecem nos mostrar. Estudo publicado na revista científica Science, que analisou o período de 2011 a 2022, mostrou que nossa visão não está mentindo: a visibilidade das estrelas está se “deteriorando rapidamente”, ao passo que o brilho artificial do céu noturno, uma forma de poluição luminosa, aumentou em uma média de 9,6% ao ano.

Para se ter uma ideia do efeito prático do avanço da poluição luminosa nessa taxa, em um período de 18 anos, um local com 250 estrelas visíveis veria esse número reduzir para 100. É como se o brilho artificial do céu estivesse dobrando a cada oito anos.

Os cientistas Christopher Kyba e Yigit Oner Altinta, do Centro Alemão de Pesquisas em Geociências (GFZ-Potsdam), e Constança Walker e Mark Newhouse, do Laboratório Nacional de Pesquisa de Astronomia Óptica-Infravermelha (NOIRLab), dos Estados Unidos, recorreram a um método de ciência cidadã para chegar a esses resultados.

Eles investigaram a mudança no brilho global usando 51.351 observações de “amadores”. Dentro do projeto Globe at Night, do NOIRLab, esses cientistas cidadãos de várias partes do planeta viram mapas do céu com diferentes níveis de poluição luminosa e foram questionados sobre qual combinava mais com a visão que tinham, o que permitiu aos cientistas observar o quanto a poluição luminosa afeta a visão a olho nu das estrelas.

No artigo, os pesquisadores destacam que a taxa que encontraram é bastante superior à estimada por observações que recorrem apenas a satélites (que mostraram, anteriormente, aumentos do brilho artificial em uma taxa de 2,2% ao ano). Eles explicaram que essa diferença se dá por causa da sensibilidades limitadas desses equipamentos, que não conseguem detectar luz com comprimentos de onda abaixo de 500 nm (nanômetros).

Assustador

Especialistas ouvidos pelo Estadão destacam que a taxa identificada é “assustadora”, mas não é uma surpresa. “O fundo do céu está cada vez mais brilhante e as estrelas mais fracas, estão sumindo, desaparecendo. Uma pessoa que nasceu agora e que nunca saiu da cidade vai achar que o céu só poucas estrelas brilhantes, jamais vai entender a natureza, não consegue nem entender onde é que ela está”, afirma Wagner José Corradi Barbosa, diretor do Laboratório Nacional de Astrofísica (LNA), do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI).

“Hoje, infelizmente, nós estamos vendo que a poluição luminosa, como um todo, está colocando em risco a possibilidade do ser humano conhecer a si mesmo”, diz, frisando a importância da astronomia para compreensão do Universo.

Via Láctea está escondida para mais de um terço da humanidade, mostrou estudo de 2016 Foto: Amr Abdallah Dalsh/Reuters

A preocupação com a maneira com que a poluição luminosa afeta nossa visão do céu, de fato, não é de hoje. Em 2016, o Atlas Mundial do Brilho Artificial do Céu Noturno, publicado na revista Science Advances, por Kyba e pesquisadores da Itália, Estados Unidos e Israel, com base em dados de satélite de alta resolução e medições de precisão do brilho do céu, revelou que mais de 80% do mundo e mais de 99% das populações dos EUA e da Europa vivem sob céus poluídos pela luz.

O estudo também mostrou que a Via Láctea, há pouco mais de 100 anos vista no arco do céu de qualquer cidade, estava escondida para mais de um terço da humanidade.

No estudo de 2016, os pesquisadores disseram ser possível imaginar dois cenários para o futuro. Em um deles, a poluição luminosa é controlada com sucesso e a geração atual seja última a experimentar um mundo tão poluído por luz. No outro, o mundo continua a brilhar, com quase toda a população nunca experimentando uma visão das estrelas.

Os impactos desse último caminho, traçado pelo estudo mais recente, conforme os especialistas, são grandes e ultrapassam prejuízos à ciência e observação do céu. Há efeitos adversos à saúde humana, que tem ciclos naturais do corpo, como o circadiano (ritmo em que o organismo realiza suas funções ao longo de um dia), que são ditados pela exposição à luz; e ecossistêmicos, com alterações em padrões migratórios dos animais e relações de predação.

Corradi afirma que a pesquisa nacional já tem dificuldade de observar objetos de luz “muito fraca” que estão no limite do brilho do céu. Ele cita como exemplo um projeto internacional, com participação do LNA, que busca contrapartidas ópticas de ondas gravitacionais. “A ciência que se sente prejuízo maior é a que depende da gente olhar objetos cujo brilho está muito próximo do brilho do fundo do céu. Você está confundindo o brilho fundo do céu com o brilho do objeto, e não se consegue distinguir aquele objeto.”

“Se a astronomia está prejudicada, o desenvolvimento tecnológico também vai sendo prejudicado”, afirma ele, destacando que vários avanços de tecnologia, como as câmeras triplas nos smartphones mais modernas, herdaram aprendizados dessa área do conhecimento.

Jane Gregorio-Hetem, professora do departamento de Astronomia da Universidade de São Paulo (USP), avalia que, além dos impactos à ciência, é “assustador” o efeito adverso da poluição luminosa no meio ambiente. “As tartarugas, por exemplo, depois que eclodem os ovos na praia, as tartaruguinhas usam o brilho da Lua no mar para se orientar para onde ele está. Só que se você tem cidade próxima, elas vão ficar confusas e não vão saber qual é o lado mais iluminado que elas devem ir. O impacto ambiental é chocante.”

A luminosidade excessiva também já tem afetado o acasalamento de vaga-lumes. Os machos emitem luz para indicar a sua disponibilidade e as fêmeas respondem com flashes especiais para mostrar que estão prontas. Entretanto, a luz brilhante dos luminosos, da iluminação pública e das casas interfere e bloqueia a possível conjunção.

LEDs

De maneira geral, a poluição luminosa ocorre quando a luz noturna artificial é mal planejada (colocada na direção errada ou de forma excessiva, com desperdício de energia).

Conforme explicam os pesquisadores no artigo, a partir da década de 2010, muitas luzes externas foram amplamente substituídas por diodos emissores de luz (LEDs), com pico de emissão entre 400 e 500 nm. O impacto dessa transição para LEDs no aumento do brilho artificial no céu não é claro, afirmam, no entanto, divide cientistas, com alguns defendendo benefícios, focados na eficiência energética apresentada pela tecnologia, e outros, temendo e alertando sobre prejuízos à saúde humana e do ecossistema como um todo.

No artigo, os pesquisadores concluem que “a visibilidade das estrelas está se deteriorando rapidamente, apesar (ou talvez por causa) da introdução de LEDs em aplicações de iluminação externa”, além de apontarem que as “políticas de iluminação existentes não estão impedindo o aumento do brilho do céu, pelo menos nas escalas continental e global”.

O contraponto entre benefícios e riscos dos LEDs é bem capturado em uma orientação publicada pela American Medical Association (AMA), em 2016. A associação destacou que a conversão da luz de rua convencional em iluminação LED com eficiência energética leva a economia de custos e energia e a uma menor dependência de combustíveis fósseis. No entanto, emite uma grande quantidade de luz azul, que causa desconforto e suprime a melatonina de maneira mais adversa durante a noite, podendo causar distúrbios de sono. “Estima-se que as lâmpadas de LED brancas tenham um impacto cinco vezes maior nos ritmos circadianos do sono do que as lâmpadas de rua convencionais”, diz a orientação, que pediu a minimização e controle da iluminação ambiental rica em azul.

“Dentro do olho da gente, temos fotorreceptores visuais que são calibrados em vermelho, verde e azul, e temos o fotorreceptor não visual que é calibrado em 480 nanômetros, que ele é a luz azul basicamente. Esse fotorreceptor que é não visual, ele serve pra mandar uma informação para o cérebro da gente de que é dia”, explica Silvia Maria Carneiro de Campos, arquiteta especialista em iluminação e representante da organização internacional sem fins lucrativos Dark Sky Association no Brasil,

“Toda vez que a gente visualiza esse espectro, o cérebro da gente vai dizendo que é dia e produz os hormônios do dia”, continua. “Basicamente, a luz LED está em mais ou menos 450 nanômetros. É muito próximo a esse espectro de luz que a gente identifica como o dia. Aí quando você coloca essa luz branca à noite, todos acabam tendo um um entendimento de que é dia. Isso muda toda a vida ao redor.”

Ela, que participa do Comitê de Revisão de Norma de Iluminação Público ABNT 5101, afirma ainda que o Brasil ainda é “ignorante” quanto à poluição luminosa e que não há limite para emissão de luz no espectro azul por ora. A arquiteta conta que outros países, como a Austrália, e já avançam nesse sentido, reconhecendo os riscos à saúde humana e os danos ao ecossistema. “A política pública de outros países exige que se use comprimentos de onda que não tenham mais de 3% de espectro azul. Lá fora você está limitado o uso da luz em 2,7 mil Kelvin, que é uma luz amarelinha, mas eles recomendam que se use 1,8 mil Kelvin, que é aquela luz mais no âmbar, vermelho.”

Corradi, do LNA, diz que as lâmpadas de LED têm aspectos interessantes. “Têm uma luz mais direcional.” No entanto, reclama da potência das utilizadas atualmente e defende um limite. “Nossa defesa é que a potência luminosa seja diminuída. Eu não tenho necessidade de colocar uma lâmpada com 200 watts em uma rua que podia estar muito bem (iluminada) com uma lâmpada de 80.”

O Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro) disse ao Estadão que o “conceito de poluição luminosa pode ter definições variadas e nem sempre convergentes” e que “ainda está em fase de análise da agenda regulatória que contemplará os regulamentos que passarão por aperfeiçoamento”.

A Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) não respondeu aos pedidos de entrevista até a publicação do texto.

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