Um dos melhores espetáculos apresentados na mostra oficial do Festival de Teatro de Curitiba estréia hoje no Sesc Pinheiros: A Descoberta das Américas, solo do ator Julio Adrião. Dirigido por Alessandra Vannucci, ambos, diretora e ator, são também responsáveis pela tradução e adaptação do original de Dario Fo, um dos raros dramaturgos a ganhar um Nobel. Sem dúvida, trata-se de uma dessas criações felizes, que alcançam aprovação da crítica especializada e de um público amplo, diversificado. Em sua temporada carioca, provocou uma intensa propaganda boca-a-boca. E a impressionante partitura física e vocal criada por Adrião lhe valeu o Prêmio Shell/2005. Por tudo isso, esse solo estreou em Curitiba cercado de expectativas. E não decepcionou. Mais uma vez conquistou a empatia do espectador, o que deve se repetir na temporada paulistana. Técnica apurada, inteligência, humor e ironia são os principais recursos usados por Adrião para contar/viver a história de seu personagem, um pobretão metido a esperto chamado Johan, que embarca num navio rumo à América numa correria desenfreada para fugir da Inquisição. Começa aí uma trajetória plena de aventuras - desde um naufrágio até sua captura por uma tribo de antropófagos - que vai terminar, muito ironicamente, numa ´aculturação´ às avessas. Johan passa a viver como um índio e, numa reversão da História, expulsa os espanhóis do continente. Não por coincidência, justamente o conhecimento que provocou o seu banimento da Europa - adquirido com uma ´bruxa´ queimada na fogueira - salva sua pele nos momentos de perigo. Adrião cria cenas brilhantes, entre elas a da ´operação´ de índios feridos depois de uma guerra ou a da tentativa de catequizá-los. Mas durante todo o espetáculo chama atenção a qualidade da partitura física, a um só tempo sofisticada e invisível, que faz tudo parecer muito espontâneo, quase ´sujo´ no palco. Em conversa com esse ator, fica claro que tal resultado é fruto de um longo processo e sólida formação. "Costumo dizer que ensaiei 10 dias e 20 anos", diz. Como se sabe, Dario Fo interpreta seus próprios textos e sua linguagem é muito oral. "Após a tradução, o texto ficou literário e aí começou o exercício de torná-lo oral novamente. Os textos de Fo são feitos para serem adaptados à cultura inerente aos locais onde são apresentados." Foram poucos os dias de ensaios solitários. Adrião - que em 1987, após se formar na Casa das Artes de Laranjeiras partiu para a Europa em busca de aprimoramento em linguagens como circo, commedia dell´arte e teatro de rua - preferiu criar em apresentações abertas ao público. "Aos poucos fui criando os ´lazzi´, traduzindo texto em partitura física. Por exemplo, aquela cena da costura dos índios tem apenas duas linhas no original." Vale avisar, a temporada é curta. A Descoberta das Américas. 80 min. 12 anos. Sesc Pinheiros/Auditório (100 lug.). R. Paes Leme, 195, Pinheiros, 3095-9400. 6.ª, 20 h; dom.,19 h. R$ 10. Estréia hoje
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