O retorno de Justin Timberlake aos discos, em maio deste ano, esboçou algo do cálculo certeiro e milionário das produções hollywoodianas com as quais o cantor se envolveu durante o seu sabático. O pacote era impecável, como um filme de James Bond: sensualidade e charme sem esforço, glamour vintage em preto e branco irretocável, entretenimento - blue-eyed soul, no caso - acessível, sem perder a classe. Mas a incontestabilidade com a qual Timberlake se acostumou desde seu apogeu em Future Sex Love Sounds tanto emoldurou quanto esterilizou o seu retorno. E embora isto não tenha aflorado na bela primeira parte de 20/20 Experience fica óbvio agora, com o lançamento da segunda metade do disco. Como vimos há duas semanas, sobre o palco principal do Rock in Rio, Timberlake ainda esbanja força entre o patamar de pop stars estratosféricos no qual está acostumado a caminhar, mas ao ouvir as duas partes do disco, um total de mais de duas horas de música, fica claro que o invencível Justin de 2013 está sem o saudoso frescor contemporâneo que associamos à sua figura desde Future Sex, de 2006.É uma conclusão que não surpreende. É raro o pop star bajulado com ganas para subverter o status quo. Dinheiro, adoração e amizade com o presidente não são os melhores ingredientes para um grande disco. Fazem do artista, no caso o talentoso JT, perder o toque humano; o sangue, o suor e as lágrimas que, em geral, fazem da ascensão ao cume a melhor parte de uma carreira. Portanto, ouvir JT surfar pela primeira parte de 20/20 como um piloto de cinema em um carro de luxo que escapa de todos os arranhões com precisão milimétrica, esbanjando finesse e soul de alta definição em canções como Pusher Love Girl e Strawberry Bubblegum, foi louvável. Mas aguentá-lo tentar trazer o sexy de volta mais uma vez é entediante. Refiro-me à sensual canção de 2006, Sexy Back, no qual Timberlake se posiciona como o cara mais desejável do mundo, maldizendo os 'posers', os 'wannabes' e os mentirosos com fogo na língua. Boa parte de 20/20 Experience, O Retorno, é dedicada à recriação deste tipo de fulgor, com o craque Timbaland produzindo batidas em modo retrô anos 2000, e Timberlake mandando as p... calarem a boca, e recitando odes às habilidades e órgãos sexuais de suas amantes. Os dois Timbs, no entanto, não vão além de uma sonolenta recriação do que já foi feito anteriormente. Ouça a guitarrinha que surge no meio de True Blood, um xerox do tipo de artifício que ouvíamos em produções pop de 6 ou 7 anos atrás em um contexto mal arquitetado e sem criatividade que dá uma aura batida ao disco. A letra e refrão só pioram as coisas, com um blá blá blá sobre sensualidade vampiresca que também não convence e algumas cômicas e infelizes referências a Thriller, de Michael Jackson. Quando True Blood parece rumo a um tardio fade out, uma espiada no contador do iPhone indica que ainda há quatro minutos de música, uma esticada desnecessária, que faz da canção a faixa mais longa e menos adequada para uma pista que um cantor de pop fará em 2013 (comparando-a com as longas Pusher Love Girl e Strawberry Bubblegum, da primeira parte, True Blood parece ter sido feita por uma imitação). O r&b hiper percussivo de Cabaret não convence com seu refrão pouco inspirado. Resta ao rapper Drake salvar a música do fiasco com o melhor verso e possivelmente o melhor momento do disco. Jay-Z, a única outra participação, desfere um verso, no mínimo, bizarro, sobre a vagina de Yoko Ono em Murder. 20/20 Parte 2 esboça uma reação ao chegar na reta final, com Only When I Walk Away, mas aí já é tarde, e a sensação de que Justin Timberlake acha que o ouvinte terá paciência para ouvir suas sobras de estúdio já assassinou a audição do disco.