Artista Bené Fonteles faz exposição em São Paulo


Guardião das tradições ancestrais, paraense de 65 anos abre mostra composta por uma seleção de obras realizadas entre os anos 1980 e 2000

Por Antonio Gonçalves Filho

Embora conhecido aqui e fora do Brasil, com obras suas em coleções internacionais (de Yoko Ono ao MoMA, entre outras), o artista paraense Bené Fonteles, 65, mantém cautelosa distância do mercado. Na 32.ª Bienal de São Paulo, em 2016, o Museu Reina Sofia, de Madri, mostrou interesse em comprar para seu acervo a xamânica oca montada por ele no pavilhão da mostra – Fonteles simplesmente respondeu não à proposta. Poeta, compositor, jornalista e escritor, Bené Fonteles inaugurou esta semana uma individual na Galeria Jacqueline Martins, Das Coisas ao Avesso, parceria com a galeria Karla Osório, de Brasília, onde reside o artista.

O artista Benê Fonteles Foto: JF DIORIO / ESTADÃO

A mostra, composta por uma seleção de obras realizadas entre os anos 1980 e 2000, tem um caráter proustiano – não só pela rememoração do contexto em que foram produzidas, mas sobretudo pelo caráter autobiográfico de algumas séries, entre as quais se destaca Sudário, integrada por 14 trabalhos. Como o próprio título sugere, trata-se de uma série que retém as marcas da experiência existencial de Bené, incansável defensor das tradições culturais e dos santuários ecológicos brasileiros. Numa de suas viagens de barco pelo Amazonas, sofreu um acidente ao cozinhar numa panela de pressão que explodiu, e por pouco não aconteceu uma tragédia. O “sudário’ traz as marcas de seu corpo, contornado pelos amigos, e funciona como uma mortalha.

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A cocuradora da 32ª. Bienal de São Paulo, Júlia Rebouças, já observara há dois anos, na época da exposição internacional, que as assemblages de Fonteles vão além do ‘objet trouvé’ de Duchamp para assumir uma espécie de síntese cultural em que texturas, formas e cheiros revelam a relação do artista com o ambiente que o cerca. Fonteles é um resumo do Brasil, um pioneiro das questões ambientais e indigenistas, amigo de compositores e cantores que têm igualmente a mesma preocupação, como Egberto Gismonti e a dupla Luli e Lucina – ele se prepara para gravar com elas.

Ao contrário de Duchamp, o ready-made de Fonteles não é um objeto que surge diante do espectador sem apelo emocional. Tudo nele vem cercado de afeto. Não é apenas um objeto achado ao acaso, mas carregado de memória, de lembranças pessoais, de experiências afetivas, como, por exemplo, uma assemblage que traz duas figuras geométricas em metal, presenteadas pelo amigo cearense Sérvulo Esmeraldo (1929-2017) e acopladas ao trabalho de Fonteles.

Em outra obra, o arco e flecha de Oxóssi é representado pelo ferro da roda de um carro de boi (o arco), reafirmando sua ligação com culturas e crenças ancestrais. Fonteles conta que começou a pesquisar os orixás quando morava na Bahia, nos anos 1970. Foi lá que conheceu o pintor Rubem Valentim, em 1977, de quem se tornou amigo e guardião de sua obra – ele prepara um novo livro sobre o artista, de quem catalogou mais de 500 peças e sobre o qual escreveu outros dois livros anteriormente (O Livro do Ser, em 1994, e O Artista da Luz, em 2001).

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Homem de fé, como Rubem Valentim, seu trabalho de resistência pela preservação das culturas africanas tem resultado positivo, a considerar a presença de Valentim em todos os importantes museus brasileiros e do Exterior. Bené Fonteles, evoque-se, montou a sala especial do amigo no Museu de Arte Moderna da Bahia. Presente em pelo menos cinco edições da Bienal de São Paulo (1973, 1975, 1977, 1981, 2016), Fonteles poderia ter feito uma carreira internacional, mas preferiu ficar por aqui – ele morou em sete estados brasileiros e nunca saiu do Brasil. Quando organizou a mostra Les Magiciens de la Terre (1989) no Pompidou, o curador Jean-Hubert Martin queria levar o artista brasileiro para figurar entre Richard Long e Louise Bourgeois, mas quem acabou participando foi Cildo Meireles.

“Há muito a fazer por aqui”, justifica Fonteles. “Desde que morei no Mato Grosso, nos anos 1980, acabei me envolvendo com a luta indigenista e as causas ambientais”, conta, denunciando o genocídio das tribos indígenas no Brasil. “Temo que a situação vá se agravar”, antevê. Com etnias como a dos guaranis-caiovás em perigo e a cultura de outras tribos correndo o risco de extinção, a urgência de criar obras que resgatem essas tradições faz Fonteles recorrer aos mesmos métodos de trabalho, reciclando materiais da natureza. Afinal, natural e sobrenatural, tanto para os índios como para ele, são sinônimos.

DAS COISAS AO AVESSO Galeria Jacqueline Martins. R. Dr. Cesário Mota Junior, 443, tel. 2628-1943. 3ª/6.ª, 10h/19h. Sáb., 12h/17h. Grátis. Até 1/12

Embora conhecido aqui e fora do Brasil, com obras suas em coleções internacionais (de Yoko Ono ao MoMA, entre outras), o artista paraense Bené Fonteles, 65, mantém cautelosa distância do mercado. Na 32.ª Bienal de São Paulo, em 2016, o Museu Reina Sofia, de Madri, mostrou interesse em comprar para seu acervo a xamânica oca montada por ele no pavilhão da mostra – Fonteles simplesmente respondeu não à proposta. Poeta, compositor, jornalista e escritor, Bené Fonteles inaugurou esta semana uma individual na Galeria Jacqueline Martins, Das Coisas ao Avesso, parceria com a galeria Karla Osório, de Brasília, onde reside o artista.

O artista Benê Fonteles Foto: JF DIORIO / ESTADÃO

A mostra, composta por uma seleção de obras realizadas entre os anos 1980 e 2000, tem um caráter proustiano – não só pela rememoração do contexto em que foram produzidas, mas sobretudo pelo caráter autobiográfico de algumas séries, entre as quais se destaca Sudário, integrada por 14 trabalhos. Como o próprio título sugere, trata-se de uma série que retém as marcas da experiência existencial de Bené, incansável defensor das tradições culturais e dos santuários ecológicos brasileiros. Numa de suas viagens de barco pelo Amazonas, sofreu um acidente ao cozinhar numa panela de pressão que explodiu, e por pouco não aconteceu uma tragédia. O “sudário’ traz as marcas de seu corpo, contornado pelos amigos, e funciona como uma mortalha.

A cocuradora da 32ª. Bienal de São Paulo, Júlia Rebouças, já observara há dois anos, na época da exposição internacional, que as assemblages de Fonteles vão além do ‘objet trouvé’ de Duchamp para assumir uma espécie de síntese cultural em que texturas, formas e cheiros revelam a relação do artista com o ambiente que o cerca. Fonteles é um resumo do Brasil, um pioneiro das questões ambientais e indigenistas, amigo de compositores e cantores que têm igualmente a mesma preocupação, como Egberto Gismonti e a dupla Luli e Lucina – ele se prepara para gravar com elas.

Ao contrário de Duchamp, o ready-made de Fonteles não é um objeto que surge diante do espectador sem apelo emocional. Tudo nele vem cercado de afeto. Não é apenas um objeto achado ao acaso, mas carregado de memória, de lembranças pessoais, de experiências afetivas, como, por exemplo, uma assemblage que traz duas figuras geométricas em metal, presenteadas pelo amigo cearense Sérvulo Esmeraldo (1929-2017) e acopladas ao trabalho de Fonteles.

Em outra obra, o arco e flecha de Oxóssi é representado pelo ferro da roda de um carro de boi (o arco), reafirmando sua ligação com culturas e crenças ancestrais. Fonteles conta que começou a pesquisar os orixás quando morava na Bahia, nos anos 1970. Foi lá que conheceu o pintor Rubem Valentim, em 1977, de quem se tornou amigo e guardião de sua obra – ele prepara um novo livro sobre o artista, de quem catalogou mais de 500 peças e sobre o qual escreveu outros dois livros anteriormente (O Livro do Ser, em 1994, e O Artista da Luz, em 2001).

Homem de fé, como Rubem Valentim, seu trabalho de resistência pela preservação das culturas africanas tem resultado positivo, a considerar a presença de Valentim em todos os importantes museus brasileiros e do Exterior. Bené Fonteles, evoque-se, montou a sala especial do amigo no Museu de Arte Moderna da Bahia. Presente em pelo menos cinco edições da Bienal de São Paulo (1973, 1975, 1977, 1981, 2016), Fonteles poderia ter feito uma carreira internacional, mas preferiu ficar por aqui – ele morou em sete estados brasileiros e nunca saiu do Brasil. Quando organizou a mostra Les Magiciens de la Terre (1989) no Pompidou, o curador Jean-Hubert Martin queria levar o artista brasileiro para figurar entre Richard Long e Louise Bourgeois, mas quem acabou participando foi Cildo Meireles.

“Há muito a fazer por aqui”, justifica Fonteles. “Desde que morei no Mato Grosso, nos anos 1980, acabei me envolvendo com a luta indigenista e as causas ambientais”, conta, denunciando o genocídio das tribos indígenas no Brasil. “Temo que a situação vá se agravar”, antevê. Com etnias como a dos guaranis-caiovás em perigo e a cultura de outras tribos correndo o risco de extinção, a urgência de criar obras que resgatem essas tradições faz Fonteles recorrer aos mesmos métodos de trabalho, reciclando materiais da natureza. Afinal, natural e sobrenatural, tanto para os índios como para ele, são sinônimos.

DAS COISAS AO AVESSO Galeria Jacqueline Martins. R. Dr. Cesário Mota Junior, 443, tel. 2628-1943. 3ª/6.ª, 10h/19h. Sáb., 12h/17h. Grátis. Até 1/12

Embora conhecido aqui e fora do Brasil, com obras suas em coleções internacionais (de Yoko Ono ao MoMA, entre outras), o artista paraense Bené Fonteles, 65, mantém cautelosa distância do mercado. Na 32.ª Bienal de São Paulo, em 2016, o Museu Reina Sofia, de Madri, mostrou interesse em comprar para seu acervo a xamânica oca montada por ele no pavilhão da mostra – Fonteles simplesmente respondeu não à proposta. Poeta, compositor, jornalista e escritor, Bené Fonteles inaugurou esta semana uma individual na Galeria Jacqueline Martins, Das Coisas ao Avesso, parceria com a galeria Karla Osório, de Brasília, onde reside o artista.

O artista Benê Fonteles Foto: JF DIORIO / ESTADÃO

A mostra, composta por uma seleção de obras realizadas entre os anos 1980 e 2000, tem um caráter proustiano – não só pela rememoração do contexto em que foram produzidas, mas sobretudo pelo caráter autobiográfico de algumas séries, entre as quais se destaca Sudário, integrada por 14 trabalhos. Como o próprio título sugere, trata-se de uma série que retém as marcas da experiência existencial de Bené, incansável defensor das tradições culturais e dos santuários ecológicos brasileiros. Numa de suas viagens de barco pelo Amazonas, sofreu um acidente ao cozinhar numa panela de pressão que explodiu, e por pouco não aconteceu uma tragédia. O “sudário’ traz as marcas de seu corpo, contornado pelos amigos, e funciona como uma mortalha.

A cocuradora da 32ª. Bienal de São Paulo, Júlia Rebouças, já observara há dois anos, na época da exposição internacional, que as assemblages de Fonteles vão além do ‘objet trouvé’ de Duchamp para assumir uma espécie de síntese cultural em que texturas, formas e cheiros revelam a relação do artista com o ambiente que o cerca. Fonteles é um resumo do Brasil, um pioneiro das questões ambientais e indigenistas, amigo de compositores e cantores que têm igualmente a mesma preocupação, como Egberto Gismonti e a dupla Luli e Lucina – ele se prepara para gravar com elas.

Ao contrário de Duchamp, o ready-made de Fonteles não é um objeto que surge diante do espectador sem apelo emocional. Tudo nele vem cercado de afeto. Não é apenas um objeto achado ao acaso, mas carregado de memória, de lembranças pessoais, de experiências afetivas, como, por exemplo, uma assemblage que traz duas figuras geométricas em metal, presenteadas pelo amigo cearense Sérvulo Esmeraldo (1929-2017) e acopladas ao trabalho de Fonteles.

Em outra obra, o arco e flecha de Oxóssi é representado pelo ferro da roda de um carro de boi (o arco), reafirmando sua ligação com culturas e crenças ancestrais. Fonteles conta que começou a pesquisar os orixás quando morava na Bahia, nos anos 1970. Foi lá que conheceu o pintor Rubem Valentim, em 1977, de quem se tornou amigo e guardião de sua obra – ele prepara um novo livro sobre o artista, de quem catalogou mais de 500 peças e sobre o qual escreveu outros dois livros anteriormente (O Livro do Ser, em 1994, e O Artista da Luz, em 2001).

Homem de fé, como Rubem Valentim, seu trabalho de resistência pela preservação das culturas africanas tem resultado positivo, a considerar a presença de Valentim em todos os importantes museus brasileiros e do Exterior. Bené Fonteles, evoque-se, montou a sala especial do amigo no Museu de Arte Moderna da Bahia. Presente em pelo menos cinco edições da Bienal de São Paulo (1973, 1975, 1977, 1981, 2016), Fonteles poderia ter feito uma carreira internacional, mas preferiu ficar por aqui – ele morou em sete estados brasileiros e nunca saiu do Brasil. Quando organizou a mostra Les Magiciens de la Terre (1989) no Pompidou, o curador Jean-Hubert Martin queria levar o artista brasileiro para figurar entre Richard Long e Louise Bourgeois, mas quem acabou participando foi Cildo Meireles.

“Há muito a fazer por aqui”, justifica Fonteles. “Desde que morei no Mato Grosso, nos anos 1980, acabei me envolvendo com a luta indigenista e as causas ambientais”, conta, denunciando o genocídio das tribos indígenas no Brasil. “Temo que a situação vá se agravar”, antevê. Com etnias como a dos guaranis-caiovás em perigo e a cultura de outras tribos correndo o risco de extinção, a urgência de criar obras que resgatem essas tradições faz Fonteles recorrer aos mesmos métodos de trabalho, reciclando materiais da natureza. Afinal, natural e sobrenatural, tanto para os índios como para ele, são sinônimos.

DAS COISAS AO AVESSO Galeria Jacqueline Martins. R. Dr. Cesário Mota Junior, 443, tel. 2628-1943. 3ª/6.ª, 10h/19h. Sáb., 12h/17h. Grátis. Até 1/12

Embora conhecido aqui e fora do Brasil, com obras suas em coleções internacionais (de Yoko Ono ao MoMA, entre outras), o artista paraense Bené Fonteles, 65, mantém cautelosa distância do mercado. Na 32.ª Bienal de São Paulo, em 2016, o Museu Reina Sofia, de Madri, mostrou interesse em comprar para seu acervo a xamânica oca montada por ele no pavilhão da mostra – Fonteles simplesmente respondeu não à proposta. Poeta, compositor, jornalista e escritor, Bené Fonteles inaugurou esta semana uma individual na Galeria Jacqueline Martins, Das Coisas ao Avesso, parceria com a galeria Karla Osório, de Brasília, onde reside o artista.

O artista Benê Fonteles Foto: JF DIORIO / ESTADÃO

A mostra, composta por uma seleção de obras realizadas entre os anos 1980 e 2000, tem um caráter proustiano – não só pela rememoração do contexto em que foram produzidas, mas sobretudo pelo caráter autobiográfico de algumas séries, entre as quais se destaca Sudário, integrada por 14 trabalhos. Como o próprio título sugere, trata-se de uma série que retém as marcas da experiência existencial de Bené, incansável defensor das tradições culturais e dos santuários ecológicos brasileiros. Numa de suas viagens de barco pelo Amazonas, sofreu um acidente ao cozinhar numa panela de pressão que explodiu, e por pouco não aconteceu uma tragédia. O “sudário’ traz as marcas de seu corpo, contornado pelos amigos, e funciona como uma mortalha.

A cocuradora da 32ª. Bienal de São Paulo, Júlia Rebouças, já observara há dois anos, na época da exposição internacional, que as assemblages de Fonteles vão além do ‘objet trouvé’ de Duchamp para assumir uma espécie de síntese cultural em que texturas, formas e cheiros revelam a relação do artista com o ambiente que o cerca. Fonteles é um resumo do Brasil, um pioneiro das questões ambientais e indigenistas, amigo de compositores e cantores que têm igualmente a mesma preocupação, como Egberto Gismonti e a dupla Luli e Lucina – ele se prepara para gravar com elas.

Ao contrário de Duchamp, o ready-made de Fonteles não é um objeto que surge diante do espectador sem apelo emocional. Tudo nele vem cercado de afeto. Não é apenas um objeto achado ao acaso, mas carregado de memória, de lembranças pessoais, de experiências afetivas, como, por exemplo, uma assemblage que traz duas figuras geométricas em metal, presenteadas pelo amigo cearense Sérvulo Esmeraldo (1929-2017) e acopladas ao trabalho de Fonteles.

Em outra obra, o arco e flecha de Oxóssi é representado pelo ferro da roda de um carro de boi (o arco), reafirmando sua ligação com culturas e crenças ancestrais. Fonteles conta que começou a pesquisar os orixás quando morava na Bahia, nos anos 1970. Foi lá que conheceu o pintor Rubem Valentim, em 1977, de quem se tornou amigo e guardião de sua obra – ele prepara um novo livro sobre o artista, de quem catalogou mais de 500 peças e sobre o qual escreveu outros dois livros anteriormente (O Livro do Ser, em 1994, e O Artista da Luz, em 2001).

Homem de fé, como Rubem Valentim, seu trabalho de resistência pela preservação das culturas africanas tem resultado positivo, a considerar a presença de Valentim em todos os importantes museus brasileiros e do Exterior. Bené Fonteles, evoque-se, montou a sala especial do amigo no Museu de Arte Moderna da Bahia. Presente em pelo menos cinco edições da Bienal de São Paulo (1973, 1975, 1977, 1981, 2016), Fonteles poderia ter feito uma carreira internacional, mas preferiu ficar por aqui – ele morou em sete estados brasileiros e nunca saiu do Brasil. Quando organizou a mostra Les Magiciens de la Terre (1989) no Pompidou, o curador Jean-Hubert Martin queria levar o artista brasileiro para figurar entre Richard Long e Louise Bourgeois, mas quem acabou participando foi Cildo Meireles.

“Há muito a fazer por aqui”, justifica Fonteles. “Desde que morei no Mato Grosso, nos anos 1980, acabei me envolvendo com a luta indigenista e as causas ambientais”, conta, denunciando o genocídio das tribos indígenas no Brasil. “Temo que a situação vá se agravar”, antevê. Com etnias como a dos guaranis-caiovás em perigo e a cultura de outras tribos correndo o risco de extinção, a urgência de criar obras que resgatem essas tradições faz Fonteles recorrer aos mesmos métodos de trabalho, reciclando materiais da natureza. Afinal, natural e sobrenatural, tanto para os índios como para ele, são sinônimos.

DAS COISAS AO AVESSO Galeria Jacqueline Martins. R. Dr. Cesário Mota Junior, 443, tel. 2628-1943. 3ª/6.ª, 10h/19h. Sáb., 12h/17h. Grátis. Até 1/12

Embora conhecido aqui e fora do Brasil, com obras suas em coleções internacionais (de Yoko Ono ao MoMA, entre outras), o artista paraense Bené Fonteles, 65, mantém cautelosa distância do mercado. Na 32.ª Bienal de São Paulo, em 2016, o Museu Reina Sofia, de Madri, mostrou interesse em comprar para seu acervo a xamânica oca montada por ele no pavilhão da mostra – Fonteles simplesmente respondeu não à proposta. Poeta, compositor, jornalista e escritor, Bené Fonteles inaugurou esta semana uma individual na Galeria Jacqueline Martins, Das Coisas ao Avesso, parceria com a galeria Karla Osório, de Brasília, onde reside o artista.

O artista Benê Fonteles Foto: JF DIORIO / ESTADÃO

A mostra, composta por uma seleção de obras realizadas entre os anos 1980 e 2000, tem um caráter proustiano – não só pela rememoração do contexto em que foram produzidas, mas sobretudo pelo caráter autobiográfico de algumas séries, entre as quais se destaca Sudário, integrada por 14 trabalhos. Como o próprio título sugere, trata-se de uma série que retém as marcas da experiência existencial de Bené, incansável defensor das tradições culturais e dos santuários ecológicos brasileiros. Numa de suas viagens de barco pelo Amazonas, sofreu um acidente ao cozinhar numa panela de pressão que explodiu, e por pouco não aconteceu uma tragédia. O “sudário’ traz as marcas de seu corpo, contornado pelos amigos, e funciona como uma mortalha.

A cocuradora da 32ª. Bienal de São Paulo, Júlia Rebouças, já observara há dois anos, na época da exposição internacional, que as assemblages de Fonteles vão além do ‘objet trouvé’ de Duchamp para assumir uma espécie de síntese cultural em que texturas, formas e cheiros revelam a relação do artista com o ambiente que o cerca. Fonteles é um resumo do Brasil, um pioneiro das questões ambientais e indigenistas, amigo de compositores e cantores que têm igualmente a mesma preocupação, como Egberto Gismonti e a dupla Luli e Lucina – ele se prepara para gravar com elas.

Ao contrário de Duchamp, o ready-made de Fonteles não é um objeto que surge diante do espectador sem apelo emocional. Tudo nele vem cercado de afeto. Não é apenas um objeto achado ao acaso, mas carregado de memória, de lembranças pessoais, de experiências afetivas, como, por exemplo, uma assemblage que traz duas figuras geométricas em metal, presenteadas pelo amigo cearense Sérvulo Esmeraldo (1929-2017) e acopladas ao trabalho de Fonteles.

Em outra obra, o arco e flecha de Oxóssi é representado pelo ferro da roda de um carro de boi (o arco), reafirmando sua ligação com culturas e crenças ancestrais. Fonteles conta que começou a pesquisar os orixás quando morava na Bahia, nos anos 1970. Foi lá que conheceu o pintor Rubem Valentim, em 1977, de quem se tornou amigo e guardião de sua obra – ele prepara um novo livro sobre o artista, de quem catalogou mais de 500 peças e sobre o qual escreveu outros dois livros anteriormente (O Livro do Ser, em 1994, e O Artista da Luz, em 2001).

Homem de fé, como Rubem Valentim, seu trabalho de resistência pela preservação das culturas africanas tem resultado positivo, a considerar a presença de Valentim em todos os importantes museus brasileiros e do Exterior. Bené Fonteles, evoque-se, montou a sala especial do amigo no Museu de Arte Moderna da Bahia. Presente em pelo menos cinco edições da Bienal de São Paulo (1973, 1975, 1977, 1981, 2016), Fonteles poderia ter feito uma carreira internacional, mas preferiu ficar por aqui – ele morou em sete estados brasileiros e nunca saiu do Brasil. Quando organizou a mostra Les Magiciens de la Terre (1989) no Pompidou, o curador Jean-Hubert Martin queria levar o artista brasileiro para figurar entre Richard Long e Louise Bourgeois, mas quem acabou participando foi Cildo Meireles.

“Há muito a fazer por aqui”, justifica Fonteles. “Desde que morei no Mato Grosso, nos anos 1980, acabei me envolvendo com a luta indigenista e as causas ambientais”, conta, denunciando o genocídio das tribos indígenas no Brasil. “Temo que a situação vá se agravar”, antevê. Com etnias como a dos guaranis-caiovás em perigo e a cultura de outras tribos correndo o risco de extinção, a urgência de criar obras que resgatem essas tradições faz Fonteles recorrer aos mesmos métodos de trabalho, reciclando materiais da natureza. Afinal, natural e sobrenatural, tanto para os índios como para ele, são sinônimos.

DAS COISAS AO AVESSO Galeria Jacqueline Martins. R. Dr. Cesário Mota Junior, 443, tel. 2628-1943. 3ª/6.ª, 10h/19h. Sáb., 12h/17h. Grátis. Até 1/12

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