A morte do escritor e professor da USP José Teixeira Coelho Netto, aos 78 anos, às 2h30 desta madrugada de sábado, 4, em consequência de complicações de uma mielodisplasia, empobrece ainda mais o já combalido meio cultural brasileiro. Ex-diretor do Museu da Arte de São Paulo (Masp) na gestão de Júlio Neves, entre 2006 e 2014, marcada pordificuldades financeiras da instituição, e grande intelectual, autor de importantes livros sobre arte e gestão cultural, Teixeira Coelho trabalhou até a semana passada, segundo sua filha Bruna. “Ele participou de um simpósio online organizado por seu médico, Vanderson Rocha, falando sobre a relação entretransplante e cultura”.
Teixeira Coelho, cujo velório está sendo realizado na Arce (Rua Giovanni Gronchi, 1.358), até às 18h, será cremado amanhã em cerimônia familiar, segundo Bruna, que foi a doadora no transplante de medula do pai em fevereiro. “Ele reagiu bem, pois sempre teve uma boa saúde até então”, conta. Teixeira Ceolho ficou fragilizado após o transplante, mas chegou a ter alta em abril. No aniversário do neto, João, de dois anos, ele foi encontrado caído no apartamento e internado, sendo transferido para a UTI do hospital Vila Nova Star, segundo a filha Bruna.
Colaborador do Estadão, Teixeira Coelho teve uma passagem marcante pelo jornalismo cultural e pela administração de instituições acadêmicas, como o Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo (MAC/USP), onde promoveu mudanças importantes na administração e no acervo. Igualmente, no Masp, ele realizou como curador exposições com novas leituras da coleção do museu, na impossibilidade de trazer mostras de fora por causa da crise financeira pela qual passava a instituição. Ainda assim, promoveu uma exposição internacional sobre pintura alemã contemporânea que foi um marco de sua gestão.
Como autor, Teixeira Coelho, que estava escrevendo um livro quando morreu, deixou obrasrelevantes sobre de a indústria cultural e seu futuro, entre eles o recente eCultura, a Utopia Final (Iluminuras, 2019), que trata da superação do cérebro humano pela inteligência artificial. O professor defendia que um simples computador portátil poderá em algumas décadas se revelar mais poderoso que os bilhões de cérebros espalhados pelo planeta
Outro livro notável de Teixeira Coelho é A Cultura e Seu Contrário, lançado em parceria da editora Iluminuras com o Itaú Cultural. Defensor de uma cultura inclusiva, polifônica, ele analisa no livro o uso da cultura pelos regimes totalitários e defende um modelo alternativo. “O que de fato se observa hoje é um grande processo de domesticação da cultura, de certa forma ainda mais perverso que aquele movido pela transformação da cultura em arma de combate ideológico”, escreve ele no livro, alertando para o uso da cultura pelas ditaduras, como fizeram o nazismo e o fascismo.
O embate entre o mundo moderno e pós-moderno foi outra questão abordada com maestria por Teixeira Coelho num livro publicado em 1995 pela mesma editora Iluminuras que, por meio de seu fundador, Samuel Leon, sempre reconheceu o discurso original do professor como essencial para o debate público. Em Moderno Pós Moderno: Modos & Versões, ele trata dos fundamentalismos surgidos após o esfacelamento da ex-União Soviética, que obrigou a uma mudança radical no modo de pensar o moderno. Para o professor, modernismo era, antes de tudo, um estilo, uma linguagem, um código, mais uma fabricação do que uma ação. O moderno, no limite, é o novo, segundo Teixeira Coelho. E o novo, conclui, “é a consciência neurotizada da modernidade”. Ele não faz com isso a defesa da pós-modernidade, mas propõe, à maneira de Wittgenstein, um novo modo de pensar e sentir não binário. Esse é o grande legado que Teixeira deixa para o Brasil e o mundo.