Obra de Bakun atrai atenção no Brasil e no mundo e ganha retrospectiva em galeria paulista


Telas da exposição do pintor são vendidas para colecionadores estrangeiros em bom sinal de ascensão 

Por Antonio Gonçalves Filho

No dia 28 de maio de 1960, três anos antes de sua morte, o pintor paranaense Miguel Bakun (1909-1963) descreveu um estranho incidente que lhe pareceu uma manifestação de caráter teofânico. À noite, em suas orações, implorou ao papa que tivesse o poder de projetar a figura de Deus em suas telas. Em seguida, a luz se apagou e Bakun ouviu um grande estrondo. É verdade que nesse período predominava o caráter religioso em sua obra, mas as verdadeiras pinturas de natureza mística já existiam antes disso. São elas as suas paisagens de textura pastosa e máxima economia cromática, obras definidas como pinturas inscritas na tradição pós-impressionista – notadamente próximas de Van Gogh, como se referiam a elas críticos de sua época.

Óleo pintado por Bakun na década da 1950 Foto: Ricardo Miyada

O mais descrente dos pagãos não deve duvidar da sinceridade de Bakun diante dessas paisagens torturadas e quase monocromáticas, que provocam no espectador uma reverência religiosa. São pinturas que evocam o silêncio de um universo pacificado, advindo por contraposição dos tormentos de um homem sensível e depressivo, que acabou se matando. Nascido em Mallet, no interior do Paraná, descendente de eslavos e filho de um ferroviário, Bakun, pintor autodidata, teve uma vida difícil, embora fosse reconhecido no meio curitibano.

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Agora, com a pequena retrospectiva de sua obra que a Galeria Simões de Assis, em São Paulo, promove até dia 14 de dezembro, o interesse pela pintura de Bakun cresce não só no Brasil como no mundo. Da mostra, que reúne 40 pinturas, duas delas foram compradas por colecionadores estrangeiros, um inglês e outro português – é a primeira vez que uma obra do artista é adquirida por compradores de fora, segundo o marchand Guilherme Simões de Assis. A exposição também foi visitada por uma das diretoras do Metropolitan Museum de Nova York, o que pode sinalizar uma possibilidade de difusão internacional de uma obra já analisada por grandes nomes da crítica brasileira.

O crítico Ronaldo Brito assina o texto de apresentação da mostra. Sobre a afirmação matérica da pintura de Bakun, escreve: “Muito da força poética de Bakun deriva da sensação de presença corpórea – sentimos o artista em meio à natureza, quase indistinto, a acompanhar a sua pulsação orgânica”. Para o pintor Paulo Pasta, também autor de um texto sobre o artista no catálogo da exposição, a “materialidade precária” das telas de Bakun ajudaria a “compor a forma magistral de sua lírica”. Segundo Pasta, as melhores telas do pintor paranaense “parecem fundos de quintal, um lugar comumente caseiro, reservado, escondido, cheio de memórias”.

'Pessegueiro Florido', óleo sobre tela da década de 1940 Foto: Ricardo Miyada
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A sensação de incompletude dessas paisagens, que por vezes sugerem ruínas como nas telas do alemão Anselm Kiefer, foi analisada pelo crítico e historiador Artur Freitas como uma “fonte completa de significação” para Bakun. Não importa que o suporte seja por vezes precário – há muitas telas suas pintadas sobre sacos de aniagem – ou que elas pareçam simples esboços inacabados. As telas se completam com o olhar do observador – o que o próprio Milliet custou a entender, escrevendo aqui mesmo no Estadão que o “temperamento vangoghiano” e impulsivo” levou Bakun a “uma concepção perigosa da matéria”, a um “empastamento excessivo”. Para Milliet, Bakun estava numa encruzilhada: “Ou vai se perder ou, o que é mais difícil, irá por uma trilha que dará em projeção internacional”.

Palavras proféticas essas de Milliet. A recente aquisição de pinturas de Bakun por colecionadores estrangeiros aponta para a segunda alternativa. Mantida em coleções privadas, especialmente do Paraná, a obra do pintor alcança o mercado internacional com uma (ainda) tímida presença nos museus brasileiros para um artista de seu porte, cujo trabalho – autônomo como a de Guignard dentro da tradição moderna brasileira – foi insuficientemente estudado. Por exemplo, por que Bakun tangenciou movimentos como o pós-impressionismo, o expressionismo e o surrealismo (no fim da vida) sem pertencer a nenhum deles? Pode ser, como escreveu o amigo e crítico Nelson Luz (1917-1977), que Bakun não coubesse mesmo em nenhuma escola. Afinal, é o destino dos gigantes.

MIGUEL BAKUN: UMA GRANDEZA PRECÁRIA Simões de Assis Galeria de Arte. Rua Sarandi, 113-a, tel: 3062-8980.  2ª a 6ª, das 10h às 19h; sáb., das 10h às 15h. Entrada gratuita. até 14/12.

No dia 28 de maio de 1960, três anos antes de sua morte, o pintor paranaense Miguel Bakun (1909-1963) descreveu um estranho incidente que lhe pareceu uma manifestação de caráter teofânico. À noite, em suas orações, implorou ao papa que tivesse o poder de projetar a figura de Deus em suas telas. Em seguida, a luz se apagou e Bakun ouviu um grande estrondo. É verdade que nesse período predominava o caráter religioso em sua obra, mas as verdadeiras pinturas de natureza mística já existiam antes disso. São elas as suas paisagens de textura pastosa e máxima economia cromática, obras definidas como pinturas inscritas na tradição pós-impressionista – notadamente próximas de Van Gogh, como se referiam a elas críticos de sua época.

Óleo pintado por Bakun na década da 1950 Foto: Ricardo Miyada

O mais descrente dos pagãos não deve duvidar da sinceridade de Bakun diante dessas paisagens torturadas e quase monocromáticas, que provocam no espectador uma reverência religiosa. São pinturas que evocam o silêncio de um universo pacificado, advindo por contraposição dos tormentos de um homem sensível e depressivo, que acabou se matando. Nascido em Mallet, no interior do Paraná, descendente de eslavos e filho de um ferroviário, Bakun, pintor autodidata, teve uma vida difícil, embora fosse reconhecido no meio curitibano.

Agora, com a pequena retrospectiva de sua obra que a Galeria Simões de Assis, em São Paulo, promove até dia 14 de dezembro, o interesse pela pintura de Bakun cresce não só no Brasil como no mundo. Da mostra, que reúne 40 pinturas, duas delas foram compradas por colecionadores estrangeiros, um inglês e outro português – é a primeira vez que uma obra do artista é adquirida por compradores de fora, segundo o marchand Guilherme Simões de Assis. A exposição também foi visitada por uma das diretoras do Metropolitan Museum de Nova York, o que pode sinalizar uma possibilidade de difusão internacional de uma obra já analisada por grandes nomes da crítica brasileira.

O crítico Ronaldo Brito assina o texto de apresentação da mostra. Sobre a afirmação matérica da pintura de Bakun, escreve: “Muito da força poética de Bakun deriva da sensação de presença corpórea – sentimos o artista em meio à natureza, quase indistinto, a acompanhar a sua pulsação orgânica”. Para o pintor Paulo Pasta, também autor de um texto sobre o artista no catálogo da exposição, a “materialidade precária” das telas de Bakun ajudaria a “compor a forma magistral de sua lírica”. Segundo Pasta, as melhores telas do pintor paranaense “parecem fundos de quintal, um lugar comumente caseiro, reservado, escondido, cheio de memórias”.

'Pessegueiro Florido', óleo sobre tela da década de 1940 Foto: Ricardo Miyada

A sensação de incompletude dessas paisagens, que por vezes sugerem ruínas como nas telas do alemão Anselm Kiefer, foi analisada pelo crítico e historiador Artur Freitas como uma “fonte completa de significação” para Bakun. Não importa que o suporte seja por vezes precário – há muitas telas suas pintadas sobre sacos de aniagem – ou que elas pareçam simples esboços inacabados. As telas se completam com o olhar do observador – o que o próprio Milliet custou a entender, escrevendo aqui mesmo no Estadão que o “temperamento vangoghiano” e impulsivo” levou Bakun a “uma concepção perigosa da matéria”, a um “empastamento excessivo”. Para Milliet, Bakun estava numa encruzilhada: “Ou vai se perder ou, o que é mais difícil, irá por uma trilha que dará em projeção internacional”.

Palavras proféticas essas de Milliet. A recente aquisição de pinturas de Bakun por colecionadores estrangeiros aponta para a segunda alternativa. Mantida em coleções privadas, especialmente do Paraná, a obra do pintor alcança o mercado internacional com uma (ainda) tímida presença nos museus brasileiros para um artista de seu porte, cujo trabalho – autônomo como a de Guignard dentro da tradição moderna brasileira – foi insuficientemente estudado. Por exemplo, por que Bakun tangenciou movimentos como o pós-impressionismo, o expressionismo e o surrealismo (no fim da vida) sem pertencer a nenhum deles? Pode ser, como escreveu o amigo e crítico Nelson Luz (1917-1977), que Bakun não coubesse mesmo em nenhuma escola. Afinal, é o destino dos gigantes.

MIGUEL BAKUN: UMA GRANDEZA PRECÁRIA Simões de Assis Galeria de Arte. Rua Sarandi, 113-a, tel: 3062-8980.  2ª a 6ª, das 10h às 19h; sáb., das 10h às 15h. Entrada gratuita. até 14/12.

No dia 28 de maio de 1960, três anos antes de sua morte, o pintor paranaense Miguel Bakun (1909-1963) descreveu um estranho incidente que lhe pareceu uma manifestação de caráter teofânico. À noite, em suas orações, implorou ao papa que tivesse o poder de projetar a figura de Deus em suas telas. Em seguida, a luz se apagou e Bakun ouviu um grande estrondo. É verdade que nesse período predominava o caráter religioso em sua obra, mas as verdadeiras pinturas de natureza mística já existiam antes disso. São elas as suas paisagens de textura pastosa e máxima economia cromática, obras definidas como pinturas inscritas na tradição pós-impressionista – notadamente próximas de Van Gogh, como se referiam a elas críticos de sua época.

Óleo pintado por Bakun na década da 1950 Foto: Ricardo Miyada

O mais descrente dos pagãos não deve duvidar da sinceridade de Bakun diante dessas paisagens torturadas e quase monocromáticas, que provocam no espectador uma reverência religiosa. São pinturas que evocam o silêncio de um universo pacificado, advindo por contraposição dos tormentos de um homem sensível e depressivo, que acabou se matando. Nascido em Mallet, no interior do Paraná, descendente de eslavos e filho de um ferroviário, Bakun, pintor autodidata, teve uma vida difícil, embora fosse reconhecido no meio curitibano.

Agora, com a pequena retrospectiva de sua obra que a Galeria Simões de Assis, em São Paulo, promove até dia 14 de dezembro, o interesse pela pintura de Bakun cresce não só no Brasil como no mundo. Da mostra, que reúne 40 pinturas, duas delas foram compradas por colecionadores estrangeiros, um inglês e outro português – é a primeira vez que uma obra do artista é adquirida por compradores de fora, segundo o marchand Guilherme Simões de Assis. A exposição também foi visitada por uma das diretoras do Metropolitan Museum de Nova York, o que pode sinalizar uma possibilidade de difusão internacional de uma obra já analisada por grandes nomes da crítica brasileira.

O crítico Ronaldo Brito assina o texto de apresentação da mostra. Sobre a afirmação matérica da pintura de Bakun, escreve: “Muito da força poética de Bakun deriva da sensação de presença corpórea – sentimos o artista em meio à natureza, quase indistinto, a acompanhar a sua pulsação orgânica”. Para o pintor Paulo Pasta, também autor de um texto sobre o artista no catálogo da exposição, a “materialidade precária” das telas de Bakun ajudaria a “compor a forma magistral de sua lírica”. Segundo Pasta, as melhores telas do pintor paranaense “parecem fundos de quintal, um lugar comumente caseiro, reservado, escondido, cheio de memórias”.

'Pessegueiro Florido', óleo sobre tela da década de 1940 Foto: Ricardo Miyada

A sensação de incompletude dessas paisagens, que por vezes sugerem ruínas como nas telas do alemão Anselm Kiefer, foi analisada pelo crítico e historiador Artur Freitas como uma “fonte completa de significação” para Bakun. Não importa que o suporte seja por vezes precário – há muitas telas suas pintadas sobre sacos de aniagem – ou que elas pareçam simples esboços inacabados. As telas se completam com o olhar do observador – o que o próprio Milliet custou a entender, escrevendo aqui mesmo no Estadão que o “temperamento vangoghiano” e impulsivo” levou Bakun a “uma concepção perigosa da matéria”, a um “empastamento excessivo”. Para Milliet, Bakun estava numa encruzilhada: “Ou vai se perder ou, o que é mais difícil, irá por uma trilha que dará em projeção internacional”.

Palavras proféticas essas de Milliet. A recente aquisição de pinturas de Bakun por colecionadores estrangeiros aponta para a segunda alternativa. Mantida em coleções privadas, especialmente do Paraná, a obra do pintor alcança o mercado internacional com uma (ainda) tímida presença nos museus brasileiros para um artista de seu porte, cujo trabalho – autônomo como a de Guignard dentro da tradição moderna brasileira – foi insuficientemente estudado. Por exemplo, por que Bakun tangenciou movimentos como o pós-impressionismo, o expressionismo e o surrealismo (no fim da vida) sem pertencer a nenhum deles? Pode ser, como escreveu o amigo e crítico Nelson Luz (1917-1977), que Bakun não coubesse mesmo em nenhuma escola. Afinal, é o destino dos gigantes.

MIGUEL BAKUN: UMA GRANDEZA PRECÁRIA Simões de Assis Galeria de Arte. Rua Sarandi, 113-a, tel: 3062-8980.  2ª a 6ª, das 10h às 19h; sáb., das 10h às 15h. Entrada gratuita. até 14/12.

No dia 28 de maio de 1960, três anos antes de sua morte, o pintor paranaense Miguel Bakun (1909-1963) descreveu um estranho incidente que lhe pareceu uma manifestação de caráter teofânico. À noite, em suas orações, implorou ao papa que tivesse o poder de projetar a figura de Deus em suas telas. Em seguida, a luz se apagou e Bakun ouviu um grande estrondo. É verdade que nesse período predominava o caráter religioso em sua obra, mas as verdadeiras pinturas de natureza mística já existiam antes disso. São elas as suas paisagens de textura pastosa e máxima economia cromática, obras definidas como pinturas inscritas na tradição pós-impressionista – notadamente próximas de Van Gogh, como se referiam a elas críticos de sua época.

Óleo pintado por Bakun na década da 1950 Foto: Ricardo Miyada

O mais descrente dos pagãos não deve duvidar da sinceridade de Bakun diante dessas paisagens torturadas e quase monocromáticas, que provocam no espectador uma reverência religiosa. São pinturas que evocam o silêncio de um universo pacificado, advindo por contraposição dos tormentos de um homem sensível e depressivo, que acabou se matando. Nascido em Mallet, no interior do Paraná, descendente de eslavos e filho de um ferroviário, Bakun, pintor autodidata, teve uma vida difícil, embora fosse reconhecido no meio curitibano.

Agora, com a pequena retrospectiva de sua obra que a Galeria Simões de Assis, em São Paulo, promove até dia 14 de dezembro, o interesse pela pintura de Bakun cresce não só no Brasil como no mundo. Da mostra, que reúne 40 pinturas, duas delas foram compradas por colecionadores estrangeiros, um inglês e outro português – é a primeira vez que uma obra do artista é adquirida por compradores de fora, segundo o marchand Guilherme Simões de Assis. A exposição também foi visitada por uma das diretoras do Metropolitan Museum de Nova York, o que pode sinalizar uma possibilidade de difusão internacional de uma obra já analisada por grandes nomes da crítica brasileira.

O crítico Ronaldo Brito assina o texto de apresentação da mostra. Sobre a afirmação matérica da pintura de Bakun, escreve: “Muito da força poética de Bakun deriva da sensação de presença corpórea – sentimos o artista em meio à natureza, quase indistinto, a acompanhar a sua pulsação orgânica”. Para o pintor Paulo Pasta, também autor de um texto sobre o artista no catálogo da exposição, a “materialidade precária” das telas de Bakun ajudaria a “compor a forma magistral de sua lírica”. Segundo Pasta, as melhores telas do pintor paranaense “parecem fundos de quintal, um lugar comumente caseiro, reservado, escondido, cheio de memórias”.

'Pessegueiro Florido', óleo sobre tela da década de 1940 Foto: Ricardo Miyada

A sensação de incompletude dessas paisagens, que por vezes sugerem ruínas como nas telas do alemão Anselm Kiefer, foi analisada pelo crítico e historiador Artur Freitas como uma “fonte completa de significação” para Bakun. Não importa que o suporte seja por vezes precário – há muitas telas suas pintadas sobre sacos de aniagem – ou que elas pareçam simples esboços inacabados. As telas se completam com o olhar do observador – o que o próprio Milliet custou a entender, escrevendo aqui mesmo no Estadão que o “temperamento vangoghiano” e impulsivo” levou Bakun a “uma concepção perigosa da matéria”, a um “empastamento excessivo”. Para Milliet, Bakun estava numa encruzilhada: “Ou vai se perder ou, o que é mais difícil, irá por uma trilha que dará em projeção internacional”.

Palavras proféticas essas de Milliet. A recente aquisição de pinturas de Bakun por colecionadores estrangeiros aponta para a segunda alternativa. Mantida em coleções privadas, especialmente do Paraná, a obra do pintor alcança o mercado internacional com uma (ainda) tímida presença nos museus brasileiros para um artista de seu porte, cujo trabalho – autônomo como a de Guignard dentro da tradição moderna brasileira – foi insuficientemente estudado. Por exemplo, por que Bakun tangenciou movimentos como o pós-impressionismo, o expressionismo e o surrealismo (no fim da vida) sem pertencer a nenhum deles? Pode ser, como escreveu o amigo e crítico Nelson Luz (1917-1977), que Bakun não coubesse mesmo em nenhuma escola. Afinal, é o destino dos gigantes.

MIGUEL BAKUN: UMA GRANDEZA PRECÁRIA Simões de Assis Galeria de Arte. Rua Sarandi, 113-a, tel: 3062-8980.  2ª a 6ª, das 10h às 19h; sáb., das 10h às 15h. Entrada gratuita. até 14/12.

No dia 28 de maio de 1960, três anos antes de sua morte, o pintor paranaense Miguel Bakun (1909-1963) descreveu um estranho incidente que lhe pareceu uma manifestação de caráter teofânico. À noite, em suas orações, implorou ao papa que tivesse o poder de projetar a figura de Deus em suas telas. Em seguida, a luz se apagou e Bakun ouviu um grande estrondo. É verdade que nesse período predominava o caráter religioso em sua obra, mas as verdadeiras pinturas de natureza mística já existiam antes disso. São elas as suas paisagens de textura pastosa e máxima economia cromática, obras definidas como pinturas inscritas na tradição pós-impressionista – notadamente próximas de Van Gogh, como se referiam a elas críticos de sua época.

Óleo pintado por Bakun na década da 1950 Foto: Ricardo Miyada

O mais descrente dos pagãos não deve duvidar da sinceridade de Bakun diante dessas paisagens torturadas e quase monocromáticas, que provocam no espectador uma reverência religiosa. São pinturas que evocam o silêncio de um universo pacificado, advindo por contraposição dos tormentos de um homem sensível e depressivo, que acabou se matando. Nascido em Mallet, no interior do Paraná, descendente de eslavos e filho de um ferroviário, Bakun, pintor autodidata, teve uma vida difícil, embora fosse reconhecido no meio curitibano.

Agora, com a pequena retrospectiva de sua obra que a Galeria Simões de Assis, em São Paulo, promove até dia 14 de dezembro, o interesse pela pintura de Bakun cresce não só no Brasil como no mundo. Da mostra, que reúne 40 pinturas, duas delas foram compradas por colecionadores estrangeiros, um inglês e outro português – é a primeira vez que uma obra do artista é adquirida por compradores de fora, segundo o marchand Guilherme Simões de Assis. A exposição também foi visitada por uma das diretoras do Metropolitan Museum de Nova York, o que pode sinalizar uma possibilidade de difusão internacional de uma obra já analisada por grandes nomes da crítica brasileira.

O crítico Ronaldo Brito assina o texto de apresentação da mostra. Sobre a afirmação matérica da pintura de Bakun, escreve: “Muito da força poética de Bakun deriva da sensação de presença corpórea – sentimos o artista em meio à natureza, quase indistinto, a acompanhar a sua pulsação orgânica”. Para o pintor Paulo Pasta, também autor de um texto sobre o artista no catálogo da exposição, a “materialidade precária” das telas de Bakun ajudaria a “compor a forma magistral de sua lírica”. Segundo Pasta, as melhores telas do pintor paranaense “parecem fundos de quintal, um lugar comumente caseiro, reservado, escondido, cheio de memórias”.

'Pessegueiro Florido', óleo sobre tela da década de 1940 Foto: Ricardo Miyada

A sensação de incompletude dessas paisagens, que por vezes sugerem ruínas como nas telas do alemão Anselm Kiefer, foi analisada pelo crítico e historiador Artur Freitas como uma “fonte completa de significação” para Bakun. Não importa que o suporte seja por vezes precário – há muitas telas suas pintadas sobre sacos de aniagem – ou que elas pareçam simples esboços inacabados. As telas se completam com o olhar do observador – o que o próprio Milliet custou a entender, escrevendo aqui mesmo no Estadão que o “temperamento vangoghiano” e impulsivo” levou Bakun a “uma concepção perigosa da matéria”, a um “empastamento excessivo”. Para Milliet, Bakun estava numa encruzilhada: “Ou vai se perder ou, o que é mais difícil, irá por uma trilha que dará em projeção internacional”.

Palavras proféticas essas de Milliet. A recente aquisição de pinturas de Bakun por colecionadores estrangeiros aponta para a segunda alternativa. Mantida em coleções privadas, especialmente do Paraná, a obra do pintor alcança o mercado internacional com uma (ainda) tímida presença nos museus brasileiros para um artista de seu porte, cujo trabalho – autônomo como a de Guignard dentro da tradição moderna brasileira – foi insuficientemente estudado. Por exemplo, por que Bakun tangenciou movimentos como o pós-impressionismo, o expressionismo e o surrealismo (no fim da vida) sem pertencer a nenhum deles? Pode ser, como escreveu o amigo e crítico Nelson Luz (1917-1977), que Bakun não coubesse mesmo em nenhuma escola. Afinal, é o destino dos gigantes.

MIGUEL BAKUN: UMA GRANDEZA PRECÁRIA Simões de Assis Galeria de Arte. Rua Sarandi, 113-a, tel: 3062-8980.  2ª a 6ª, das 10h às 19h; sáb., das 10h às 15h. Entrada gratuita. até 14/12.

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