A aclamada artista japonesa Yayoi Kusama, conhecida por suas instalações imersivas ‘Salas de Espelhos Infinitos’ que cativam multidões em exposições ao redor do mundo, pediu desculpas por declarações racistas feitas em sua autobiografia de 2002, ‘Rede Infinita’. Esses comentários voltaram à tona com a inauguração de sua recente exposição no Museu de Arte Moderna de São Francisco.
“Lamento profundamente por usar linguagem ofensiva e prejudicial em meu livro,” disse Kusama, agora com 94 anos, em um comunicado ao San Francisco Chronicle na semana passada. “Minha mensagem sempre foi de amor, esperança, compaixão e respeito por todas as pessoas. Minha intenção ao longo da vida foi elevar a humanidade através da minha arte. Peço desculpas pela dor que causei.”
O pedido de desculpas de Kusama, feito um dia antes de sua exposição, “Yayoi Kusama: Amor Infinito”, ser inaugurada no museu, refere-se a trechos de “Rede Infinita”, na qual ela descreveu pessoas negras como “seres primitivos e hipersexualizados”.
O site Hyperallergic destacou esses comentários em junho. Na semana passada, um crítico do Chronicle condenou a decisão do museu de seguir adiante com a exposição.
Na edição original japonesa do livro, Kusama também descreveu seu bairro em Nova York como um “gueto” onde os preços dos imóveis estavam “caíndo $5 por dia” por causa de “pessoas negras atirando umas nas outras na rua e moradores de rua dormindo ali”. Essas frases foram removidas de uma tradução posterior para o inglês.
Kusama, que nasceu em 1929 em Matsumoto, Japão, começou a pintar a partir de alucinações que teve quando jovem. Ela falou abertamente sobre seus desafios com sua condição psiquiátrica, mas continua a pintar.
A controvérsia em torno dos comentários de Kusama é o exemplo mais recente de uma instituição que teve que lidar com o histórico pessoal problemático de uma figura artística proeminente. E o Museu de Arte Moderna de São Francisco foi forçado a lidar com o que os funcionários chamaram de desigualdades estruturais em relação à raça.
Seu curador mais antigo, Gary Garrels, renunciou em 2020 depois de ser citado dizendo: “Não se preocupem, nós definitivamente continuaremos a coletar artistas brancos”. E seu diretor anterior, Neal Benezra, pediu desculpas aos funcionários após remover comentários críticos de uma postagem no Instagram após o assassinato de George Floyd.
Em uma entrevista por telefone na terça-feira, o atual diretor do museu, Christopher Bedford, disse que acolhia a oportunidade de “ser muito claro sobre a relação do museu com o anti-racismo” e de “pensar sobre como podemos apresentar assuntos difíceis com nuance”.
Bedford disse que o museu estava planejando um simpósio na próxima primavera “sobre a questão da autobiografia em relação à criatividade e como nós, como cultura, conciliamos os dois quando talvez estejam em oposição.” Uma meta de longo prazo, ele disse, era desenvolver materiais interpretativos para o público “sobre essas relações difíceis entre criador e objeto”.
Sobre Kusama, Bedford disse: “Acho realmente extraordinário que uma mulher em sua décima década de vida, que tem criado uma obra impressionante e foi várias vezes marginalizada e discriminada, venha a público e peça desculpas de forma inequívoca por declarações racistas.
“O que nos cabe é coletar, exibir e interpretar artistas em toda a sua complexidade,” ele acrescentou. “Como todos os outros, eles têm falhas. E o grande esforço não é excluir, editar ou cancelar pessoas; o esforço é lidar com eles de forma completa e com verdade.”
*Este artigo foi originalmente publicado no The New York Times.