Quem passou pela Flip em 2012 se lembra da comoção que foi a leitura integral que o escritor português José Luis Peixoto fez de Morreste-me num evento paralelo do festival literário. Ele nunca tinha feito isso, nem pensado em fazê-lo. O livro, o primeiro que escreveu na vida, é a sua tentativa de elaborar o luto após a morte de seu pai. Escrito aos 21 anos, em 1996, e publicado anos depois, em 2000, o breve, profundo e poético relato só chegou às livrarias brasileiras em 2015, quando ele já era considerado um dos principais autores de sua geração.
No livro, o filho conversa com o pai "impossivelmente morto" enquanto relembra os últimos momentos vividos em casa ou no hospital e fala sobre o presente, ou seja, o regresso a uma "terra cruel" - "A nossa terra, pai. E tudo como se continuasse".
Peixoto não teve medo de mergulhar nesse luto, de se apresentar menino diante de sua dor e de se mostrar homem diante da situação do pai: "Pai, que nunca te vi tão vulnerável, olhar de menino assustado perdido a pedir ajuda. Pai, meu pequeno filho".
Ao escrever, pensar e falar sobre a morte, o autor faz uma reflexão sobre a vida, o amor, o tempo. O livro representa, também, a passagem para a vida adulta e o começo de uma nova história - a de um jovem que diante da dor extrema se descobre escritor, algo que esse pai jamais imaginou.
Em entrevista à época do lançamento, José Luis Peixoto classificou a literatura como uma cartografia invisível. "Por meio dela, tentamos encontrar sentido, referências para não nos perdermos do essencial. Ela dá proporção, equilibra a memória, limpa o pensamento." Para escritores e para leitores.
Morreste-me condensa temas que o autor vem tratando em sua obra. É triste e é bonito. Uma leitura delicada em tempos de lutos sem fim.
MORRESTE-ME Autor: José Luis Peixoto Editora: Dublinense (64 págs.; R$ 36,90; R$ 24,90 o e-book)