Cinema mudo nas letras de Paul Auster


O Livro das Ilusões, décimo romance do autor americano, que remete ao cinema mudo, é definido por ele como uma obra ?sobre a perda de pessoas que amamos?

Por Agencia Estado

David Zimmer não passava de um personagem secundário em Palácio da Lua, um dos romances do escritor Paul Auster. Agora, acaba de ganhar um livro só para ele: O Livro das Ilusões (Companhia das Letras, 320 págs., R$ 37), o décimo romance de Paul Auster, que deve chegar às livrarias no dia 19 de novembro. Zimmer é o autor de um estudo sobre um personagem do cinema mudo, que surge e desaparece às vésperas do surgimento do cinema falado, chamado Hector Mann. Um personagem que simplesmente some, sem deixar pistas, e cujo corpo jamais é encontrado - "A impressão era a de que ele tinha dado uma saída e voltaria a qualquer momento." Assim como o corpo de uma de suas namoradas, jornalista, assassinada grávida por outra, atriz de seu mais importante filme. Mas um personagem também é esquecido porque seus filmes se perderam e porque o tipo de comédia que fazia vira história de uma hora para a outra, com as novas tecnologias que revolucionaram o cinema na virada dos anos 1920 para 1930. "Não é um livro sobre a morte, mas sobre a perda e a aflição", afirmou ontem Auster sobre sua obra, lançada nos EUA. "Todos nós perdemos muitas pessoas que amamos no decorrer da vida, pessoas que simplesmente ficam para trás." O romance de Auster começa como uma frase dura, mas que já indica, no seu passado imperfeito, o que está por vir: "Todos achavam que ele tivesse morrido." Ele é Mann, o comediante que produziu uma dezena de filmes entre 1928 e 1929. "Por volta de 1932 ou 1933, Hector Mann pertencia a um universo extinto e se algum vestígio ainda restava dele, era apenas como nota de rodapé em livros obscuros que ninguém mais se dava ao trabalho de ler", informa ainda o início do romance. Mas qual a razão de Zimmer para que se debruce sobre um comediante perdido entre os considerados grandes gênios do cinema mudo - Harold Lloyd, Buster Keaton e, claro, Charles Chaplin? Na verdade, Zimmer já sofrera uma grande perda, a morte da mulher e de dois filhos. Assistindo a um documentário sobre o cinema mudo, ele, depois de assistir a vários trechos de Lloyd, Keaton e Chaplin, volta a sorrir depois de uma breve seleção de Mann. "Tinha um grande interesse pelos atores do cinema mudo", diz Auster. A história, que surgiu há mais de dez anos, segundo o romancista, foi tomando corpo até ganhar a forma atual. "Na verdade, não tomei uma decisão de retomar Zimmer; as tramas dos meus romances surgem e eu simplesmente as sigo." Auster conta ainda que escreve seus livros da primeira à última página, embora vá fazendo isso desconstruindo e reconstruindo a história. E isso, na sua opinião, dá um caráter orgânico à narrativa - a sensação de que tudo está lá por um motivo claro e que tudo segue um curso insinuado anteriormente. A morte brusca - a perda - dos familiares não motiva apenas a busca da obra de Hector Mann. Logo depois da publicação do livro de Zimmer - The Silent World of Hector Mann ("O Mundo Silencioso de Hector Mann") - e das primeiras resenhas, o narrador recebe uma carta enigmática, do Novo México, dizendo que Mann desejava conhecê-lo. Seria verdade ou apenas brincadeira de alguém? Zimmer resiste ao convite da suposta Frieda Spelling (a também suposta senhora Hector Mann), que tem como endereço a Fazenda Pedra Azul, na Tierra del Sueño, no Novo México. Uma enorme confusão, com direito até ao risco de um suicídio involuntário - para assustar uma enviada de Frida, ele dirige um revólver à cabeça e tenta puxar o gatilho, imaginando que estivesse descarregado, quando estava apenas travado -, acaba "forçando" Zimmer a aceitar o desafio de partir em busca de seu objeto de estudo, vivo, mas com quase 90 anos e prestes a morrer, depois de cair de uma escada. Nesse momento, o intelectual Zimmer acabara de arranjar um novo trabalho: traduzir do francês o livro Mémoires d´Outre-Tombe, de Chateaubriand - obra a que ele dá o título de Memórias de um Homem Morto. E, portanto, um paralelo óbvio: Zimmer parte para descobrir a vida de um homem que morreu mas que, paradoxalmente, continuou a viver. E, o mais incrível, continuou a filmar e a se ilustrar, embora tenha deixado ordens expressas para que esses filmes fossem destruídos 24 horas depois de sua morte. Mais mortes virão - e, portanto, novas perdas e problemas. O nome de Tierra del Sueño ajuda a dar um segundo sentido às "ilusões" do título do livro. "A ficção é sempre ilusão, não necessariamente no mau sentido; nós precisamos também de histórias para viver", afirma o autor. E as ilusões são, claro, um recurso do cinema, especialmente do cinema que Hector Mann fazia, que não podia contar com cores que sugerissem perspectivas nem com sons e falas que facilitassem a compreensão. A ilusão é também uma ferramenta da produção de humor, e não por outro motivo o filme de Mann que Zimmer descreve com maior profundidade é justamente um em que ele desaparece, depois de tomar uma poção mágica. Atentados - Auster, em Leviatã, conta a históra de um norte-americano chamado Benjamin Sachs que comete pequenos atentados pelo país, destruindo réplicas da estátua da Liberdade. São atentados simbólicos, como também o foram os atentados às torres gêmeas, em 11 de setembro do ano passado, e Sach pretende demonstrar com seus atos que os ideais dos fundadores da nação americana estavam sendo traídos. Para Auster, no entanto, não há paralelo entre o seu personagem e os terroristas que lançaram seus aviões contra as torres e também contra o Pentágono. "Benjamin Sachs não queria matar ninguém, nem mesmo se matar, morre num acidente; era um visionário e mais que um terrorista, um performer." Ele completa: "Não conheço nenhum fundamentalista, mas gostaria de saber o que eles imaginam que seria o mundo, se conseguissem acabar com o que combatem; não acredito que nada justifique a morte de uma só pessoa."

David Zimmer não passava de um personagem secundário em Palácio da Lua, um dos romances do escritor Paul Auster. Agora, acaba de ganhar um livro só para ele: O Livro das Ilusões (Companhia das Letras, 320 págs., R$ 37), o décimo romance de Paul Auster, que deve chegar às livrarias no dia 19 de novembro. Zimmer é o autor de um estudo sobre um personagem do cinema mudo, que surge e desaparece às vésperas do surgimento do cinema falado, chamado Hector Mann. Um personagem que simplesmente some, sem deixar pistas, e cujo corpo jamais é encontrado - "A impressão era a de que ele tinha dado uma saída e voltaria a qualquer momento." Assim como o corpo de uma de suas namoradas, jornalista, assassinada grávida por outra, atriz de seu mais importante filme. Mas um personagem também é esquecido porque seus filmes se perderam e porque o tipo de comédia que fazia vira história de uma hora para a outra, com as novas tecnologias que revolucionaram o cinema na virada dos anos 1920 para 1930. "Não é um livro sobre a morte, mas sobre a perda e a aflição", afirmou ontem Auster sobre sua obra, lançada nos EUA. "Todos nós perdemos muitas pessoas que amamos no decorrer da vida, pessoas que simplesmente ficam para trás." O romance de Auster começa como uma frase dura, mas que já indica, no seu passado imperfeito, o que está por vir: "Todos achavam que ele tivesse morrido." Ele é Mann, o comediante que produziu uma dezena de filmes entre 1928 e 1929. "Por volta de 1932 ou 1933, Hector Mann pertencia a um universo extinto e se algum vestígio ainda restava dele, era apenas como nota de rodapé em livros obscuros que ninguém mais se dava ao trabalho de ler", informa ainda o início do romance. Mas qual a razão de Zimmer para que se debruce sobre um comediante perdido entre os considerados grandes gênios do cinema mudo - Harold Lloyd, Buster Keaton e, claro, Charles Chaplin? Na verdade, Zimmer já sofrera uma grande perda, a morte da mulher e de dois filhos. Assistindo a um documentário sobre o cinema mudo, ele, depois de assistir a vários trechos de Lloyd, Keaton e Chaplin, volta a sorrir depois de uma breve seleção de Mann. "Tinha um grande interesse pelos atores do cinema mudo", diz Auster. A história, que surgiu há mais de dez anos, segundo o romancista, foi tomando corpo até ganhar a forma atual. "Na verdade, não tomei uma decisão de retomar Zimmer; as tramas dos meus romances surgem e eu simplesmente as sigo." Auster conta ainda que escreve seus livros da primeira à última página, embora vá fazendo isso desconstruindo e reconstruindo a história. E isso, na sua opinião, dá um caráter orgânico à narrativa - a sensação de que tudo está lá por um motivo claro e que tudo segue um curso insinuado anteriormente. A morte brusca - a perda - dos familiares não motiva apenas a busca da obra de Hector Mann. Logo depois da publicação do livro de Zimmer - The Silent World of Hector Mann ("O Mundo Silencioso de Hector Mann") - e das primeiras resenhas, o narrador recebe uma carta enigmática, do Novo México, dizendo que Mann desejava conhecê-lo. Seria verdade ou apenas brincadeira de alguém? Zimmer resiste ao convite da suposta Frieda Spelling (a também suposta senhora Hector Mann), que tem como endereço a Fazenda Pedra Azul, na Tierra del Sueño, no Novo México. Uma enorme confusão, com direito até ao risco de um suicídio involuntário - para assustar uma enviada de Frida, ele dirige um revólver à cabeça e tenta puxar o gatilho, imaginando que estivesse descarregado, quando estava apenas travado -, acaba "forçando" Zimmer a aceitar o desafio de partir em busca de seu objeto de estudo, vivo, mas com quase 90 anos e prestes a morrer, depois de cair de uma escada. Nesse momento, o intelectual Zimmer acabara de arranjar um novo trabalho: traduzir do francês o livro Mémoires d´Outre-Tombe, de Chateaubriand - obra a que ele dá o título de Memórias de um Homem Morto. E, portanto, um paralelo óbvio: Zimmer parte para descobrir a vida de um homem que morreu mas que, paradoxalmente, continuou a viver. E, o mais incrível, continuou a filmar e a se ilustrar, embora tenha deixado ordens expressas para que esses filmes fossem destruídos 24 horas depois de sua morte. Mais mortes virão - e, portanto, novas perdas e problemas. O nome de Tierra del Sueño ajuda a dar um segundo sentido às "ilusões" do título do livro. "A ficção é sempre ilusão, não necessariamente no mau sentido; nós precisamos também de histórias para viver", afirma o autor. E as ilusões são, claro, um recurso do cinema, especialmente do cinema que Hector Mann fazia, que não podia contar com cores que sugerissem perspectivas nem com sons e falas que facilitassem a compreensão. A ilusão é também uma ferramenta da produção de humor, e não por outro motivo o filme de Mann que Zimmer descreve com maior profundidade é justamente um em que ele desaparece, depois de tomar uma poção mágica. Atentados - Auster, em Leviatã, conta a históra de um norte-americano chamado Benjamin Sachs que comete pequenos atentados pelo país, destruindo réplicas da estátua da Liberdade. São atentados simbólicos, como também o foram os atentados às torres gêmeas, em 11 de setembro do ano passado, e Sach pretende demonstrar com seus atos que os ideais dos fundadores da nação americana estavam sendo traídos. Para Auster, no entanto, não há paralelo entre o seu personagem e os terroristas que lançaram seus aviões contra as torres e também contra o Pentágono. "Benjamin Sachs não queria matar ninguém, nem mesmo se matar, morre num acidente; era um visionário e mais que um terrorista, um performer." Ele completa: "Não conheço nenhum fundamentalista, mas gostaria de saber o que eles imaginam que seria o mundo, se conseguissem acabar com o que combatem; não acredito que nada justifique a morte de uma só pessoa."

David Zimmer não passava de um personagem secundário em Palácio da Lua, um dos romances do escritor Paul Auster. Agora, acaba de ganhar um livro só para ele: O Livro das Ilusões (Companhia das Letras, 320 págs., R$ 37), o décimo romance de Paul Auster, que deve chegar às livrarias no dia 19 de novembro. Zimmer é o autor de um estudo sobre um personagem do cinema mudo, que surge e desaparece às vésperas do surgimento do cinema falado, chamado Hector Mann. Um personagem que simplesmente some, sem deixar pistas, e cujo corpo jamais é encontrado - "A impressão era a de que ele tinha dado uma saída e voltaria a qualquer momento." Assim como o corpo de uma de suas namoradas, jornalista, assassinada grávida por outra, atriz de seu mais importante filme. Mas um personagem também é esquecido porque seus filmes se perderam e porque o tipo de comédia que fazia vira história de uma hora para a outra, com as novas tecnologias que revolucionaram o cinema na virada dos anos 1920 para 1930. "Não é um livro sobre a morte, mas sobre a perda e a aflição", afirmou ontem Auster sobre sua obra, lançada nos EUA. "Todos nós perdemos muitas pessoas que amamos no decorrer da vida, pessoas que simplesmente ficam para trás." O romance de Auster começa como uma frase dura, mas que já indica, no seu passado imperfeito, o que está por vir: "Todos achavam que ele tivesse morrido." Ele é Mann, o comediante que produziu uma dezena de filmes entre 1928 e 1929. "Por volta de 1932 ou 1933, Hector Mann pertencia a um universo extinto e se algum vestígio ainda restava dele, era apenas como nota de rodapé em livros obscuros que ninguém mais se dava ao trabalho de ler", informa ainda o início do romance. Mas qual a razão de Zimmer para que se debruce sobre um comediante perdido entre os considerados grandes gênios do cinema mudo - Harold Lloyd, Buster Keaton e, claro, Charles Chaplin? Na verdade, Zimmer já sofrera uma grande perda, a morte da mulher e de dois filhos. Assistindo a um documentário sobre o cinema mudo, ele, depois de assistir a vários trechos de Lloyd, Keaton e Chaplin, volta a sorrir depois de uma breve seleção de Mann. "Tinha um grande interesse pelos atores do cinema mudo", diz Auster. A história, que surgiu há mais de dez anos, segundo o romancista, foi tomando corpo até ganhar a forma atual. "Na verdade, não tomei uma decisão de retomar Zimmer; as tramas dos meus romances surgem e eu simplesmente as sigo." Auster conta ainda que escreve seus livros da primeira à última página, embora vá fazendo isso desconstruindo e reconstruindo a história. E isso, na sua opinião, dá um caráter orgânico à narrativa - a sensação de que tudo está lá por um motivo claro e que tudo segue um curso insinuado anteriormente. A morte brusca - a perda - dos familiares não motiva apenas a busca da obra de Hector Mann. Logo depois da publicação do livro de Zimmer - The Silent World of Hector Mann ("O Mundo Silencioso de Hector Mann") - e das primeiras resenhas, o narrador recebe uma carta enigmática, do Novo México, dizendo que Mann desejava conhecê-lo. Seria verdade ou apenas brincadeira de alguém? Zimmer resiste ao convite da suposta Frieda Spelling (a também suposta senhora Hector Mann), que tem como endereço a Fazenda Pedra Azul, na Tierra del Sueño, no Novo México. Uma enorme confusão, com direito até ao risco de um suicídio involuntário - para assustar uma enviada de Frida, ele dirige um revólver à cabeça e tenta puxar o gatilho, imaginando que estivesse descarregado, quando estava apenas travado -, acaba "forçando" Zimmer a aceitar o desafio de partir em busca de seu objeto de estudo, vivo, mas com quase 90 anos e prestes a morrer, depois de cair de uma escada. Nesse momento, o intelectual Zimmer acabara de arranjar um novo trabalho: traduzir do francês o livro Mémoires d´Outre-Tombe, de Chateaubriand - obra a que ele dá o título de Memórias de um Homem Morto. E, portanto, um paralelo óbvio: Zimmer parte para descobrir a vida de um homem que morreu mas que, paradoxalmente, continuou a viver. E, o mais incrível, continuou a filmar e a se ilustrar, embora tenha deixado ordens expressas para que esses filmes fossem destruídos 24 horas depois de sua morte. Mais mortes virão - e, portanto, novas perdas e problemas. O nome de Tierra del Sueño ajuda a dar um segundo sentido às "ilusões" do título do livro. "A ficção é sempre ilusão, não necessariamente no mau sentido; nós precisamos também de histórias para viver", afirma o autor. E as ilusões são, claro, um recurso do cinema, especialmente do cinema que Hector Mann fazia, que não podia contar com cores que sugerissem perspectivas nem com sons e falas que facilitassem a compreensão. A ilusão é também uma ferramenta da produção de humor, e não por outro motivo o filme de Mann que Zimmer descreve com maior profundidade é justamente um em que ele desaparece, depois de tomar uma poção mágica. Atentados - Auster, em Leviatã, conta a históra de um norte-americano chamado Benjamin Sachs que comete pequenos atentados pelo país, destruindo réplicas da estátua da Liberdade. São atentados simbólicos, como também o foram os atentados às torres gêmeas, em 11 de setembro do ano passado, e Sach pretende demonstrar com seus atos que os ideais dos fundadores da nação americana estavam sendo traídos. Para Auster, no entanto, não há paralelo entre o seu personagem e os terroristas que lançaram seus aviões contra as torres e também contra o Pentágono. "Benjamin Sachs não queria matar ninguém, nem mesmo se matar, morre num acidente; era um visionário e mais que um terrorista, um performer." Ele completa: "Não conheço nenhum fundamentalista, mas gostaria de saber o que eles imaginam que seria o mundo, se conseguissem acabar com o que combatem; não acredito que nada justifique a morte de uma só pessoa."

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