James Marsh adora personagens a cavalo, fora de esquadro, verdadeiros equilibristas da vida. Antes de A Teoria de Tudo, ele fez O Equilibrista, e o título já entrega a história, e também Agente C, com Clive Owen como um integrante do IRA que se torna informante do governo britânico e vive na corda bamba. São filmes interessantes, eventualmente bons – Agente C tem o sugestivo título original de Shadow Dancer, o Dançarino da Sombra –, mas que não preparam o espectador para a força, a excelência de A Teoria de Tudo. O filme, que estreia na quinta, 29, conta a história do astrofísico Stephen Hawking.
Você sabe – Hawking é aquele gênio aprisionado num corpo que lhe vai sendo progressivamente negado. No filme, ele começa como um jovem com limitações, descobre a doença rara que inibe cada vez mais seus movimentos. Os médicos não lhe dão muito tempo, mas Hawking não apenas sobrevive. Tem filhos, produz pensamentos notáveis e até revoluciona a ciência (e o mercado editorial) com sua Breve História do Tempo, que, a propósito, está sendo reeditada para pegar carona no lançamento do filme. A própria gratidão à mulher que o acompanhou a vida toda não o impede de abandoná-la – de trocá-la por outra, em bom português – e quando o filme termina o letreiro dá conta de uma terceira união.
referenceEsse Stephen Hawking realmente não é fraco como homem, muito menos como cientista. O filme tenta dar conta de tudo. Da teoria – do teórico – como do humano. Não é tarefa fácil, mas Marsh conseguiu. Ele filma bem, narra bem, mas o que realmente faz a diferença em seu filme são os atores. Não é por acaso que Eddie Redmayne e Felicity Jones estão indicados para os Oscars de melhor ator e atriz. Ele já ganhou o Globo de Ouro de melhor ator de drama. É o melhor dos concorrentes da categoria, mas há um movimento de simpatia que pode favorecer Michael Keaton, que faz Birdman no filme homônimo do mexicano Alejandro González Iñárritu. Pode-se dizer que o Birdman de Keaton e Iñárritu é um personagem complexo, que dá ao ator a chance de uma criação rara em sua carreira, mas no filme ele é quase sempre referido através dos outros, e do olhar da filha, e assim seria muito mais justo premiar a ótima Emma Stone como atriz coadjuvante.
Tradicionalmente, Hollywood prestigia os atores – astros e estrelas – que interpretam personagens reais, e com algum tipo de condicionamento físico. Um gado, um paralítico. Pode até ser que Redmayne, no limite – na hora H –, não ganhe o prêmio, mas vai ser difícil. E injusto. Porque o seu Stephen Hawking não é só um tour de force físico. Por mais angustiante que seja a prisão física, é a alma que fascina. O voo da imaginação, a vontade de superar barreiras. Buscando respostas para questões básicas – relativas ao tempo, à origem do universo e à existência de Deus –, Hawking, no filme como na vida, em seus escritos, é um homem em busca da transcendência. Quer superar limites que afligem a humanidade em geral, mas há o particular, que tem de ser levado em consideração.
Você talvez não se lembre, mas Eddie Redmayne foi o filho incestuoso de Julianne Moore em Savage Grace/Pecados Inocentes, de Tom Kalin. Ela também concorre ao Oscar – por Para Sempre Alice. Poderão se encontrar no palco, até ganhar. Pecados Inocentes tinha aquela cena forte em que a mãe masturba o filho. E em Os Miseráveis, o musical de Tom Hooper, Redmayne tinha uma participação visceral, liderando a multidão na Comuna de Paris, agitando aquela bandeira vermelha. Pequeno, aparentemente frágil, ele é um grande, imenso ator. Igualmente grande é Felicity Jones, que faz Jane Hawking.
Entre outras coisas, A Teoria de Tudo é a história de um triângulo amoroso. Por um momento, Jane renuncia ao seu amor, mas, após a separação, ele vem. Existe a questão da ciência em A Teoria de Tudo. Existe a força e a fragilidade do humano. Se você embarcar no clima, vai ver o filme eletrizado. Emocionado.