Instituto promove formação de pessoas pretas para liderar criações de cinema e TV; conheça


A produtora executiva Fernanda Lomba, 35, do Nicho 54, fala sobre a necessidade de qualificação para este grupo específico como reflexo da demanda do mercado; entenda o trabalho

Por Daniel Silveira

Quando Fernanda Lomba era uma menina de 13 anos, descobriu uma afeição pelo cinema, mesmo que ela ainda não soubesse do que se tratava. “Não sei o que era, acho que eu gostava de pegar metrô”, brinca. Aos 35 anos, é, atualmente, produtora executiva além de diretora e sócia do Nicho 54, instituto criado em 2019 com objetivo de promover equidade racial apoiando carreira de pessoas negras em posições de liderança criativa, intelectual e econômica na indústria audiovisual.

Entre os trabalhos desenvolvidos está o Festival Nicho Novembro, um festival cinema negro, que já está em sua quinta edição e que promoverá mostras, debates públicos, workshops, painéis, exposição, pitching show dois espaços culturais da cidade — o Centro Cultural São Paulo (CCSP) e o Instituto Moreira Salles (IMS). A programação, totalmente gratuita, acontece a partir desta quinta-feira, 9 e segue até o dia 18. A ideia é mostrar ao público o momento atual do instituto e seu trabalho de promoção de oportunidades e apoio à carreira de pessoas negras.

Fernanda Lomba, produtora executiva, uma das criadoras do NICHO 54, instituto que dá suporte à carreira de profissionais negros no audiovisual e criadora da metodologia Nicho Executiva de mentoria e intercâmbio internacional para produtoras executivas negras -  Foto: Daniel Teixeira/Estadão
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O festival é apenas uma das linhas de trabalho do instituto, que parte da ideia de formar profissionais pretos que querem trabalhar por trás das câmeras. Aliás, você já se perguntou quantas pessoas pretas trabalham em sets de filmagens? Ou ainda quais posições estas pessoas ocupam? Se são diretores, roteiristas, assistentes de direção, produtores? Camareiras, motoristas, assistentes de produção?

Pensando nisso, o instituto decidiu atuar formando pessoas para o trabalho nesse mercado, incluindo naquele que talvez seja o que tenha mais responsabilidade na equipe: o produtor executivo. “Essa é uma área estratégica, de poder, que está logo no começo dos processos, que viabiliza e organiza processos criativos de outras pessoas”, conta a produtora. Esse cargo é responsável por escolher parte da equipe e organizar as finanças - quanto sai para cada etapa do processo -, por exemplo.

Olhando para trás

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Para entender um pouco as questões que levaram Fernanda e os amigos Heitor Augusto e Raul Perez a criarem o Nicho 54, é importante contar um pouco de sua história. Filha de uma empregada doméstica e de um coletor de material reciclável, a produtora conta que sua primeira experiência com cinema foi na adolescência, por volta dos 13 anos, quando também começou a trabalhar. Foi ao entrou na faculdade que teve outras experiências culturais e artísticas.

Estudante de Letras na Universidade de São Paulo, uma das primeiras ideias que passava por sua mente era de que seria roteirista. “Fui trabalhar numa editora jurídica e tive muita facilidade com aquele universo da linguagem burocrática, e paralelamente, estava envolvida com pessoas interessadas em trabalhar com edital, em produzir um documentário”, conta.

Foram os primeiros passos para que ela se tornasse produtora executiva. “Me interessar por cultura, ter uma leitura facilitada de instrumentos burocráticos, que é uma forma de falar dos editais públicos de cinema, por exemplo, ter pessoas no meu entorno que estavam interessadas em trabalhar com cinema e precisavam de alguém que ajudasse nesse processo mais formal do texto e da proposta, tudo isso levou a me envolver com cinema”, continua. Passos que ajudaram a construir uma trajetória: “eu não tinha naquela época um ciclo social estabelecido em cinema, não venho de uma família com herança em trabalhar com audiovisual, era tudo muito distante e me fascinei pelos processos”, comenta.

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O que mais aconteceu é que o mercado queria narrativas racializadas, mas entregou narrativas embranquecidas com imagens pretas em tela

Fernanda Lomba, diretora do Nicho 54, sobre a demanda do mercado audiovisual com narrativas com pessoas negras

Uma visão integral

Fernanda lembra que seu começo no audiovisual foi já como sócia, desenvolvendo trabalhos, em vez de fazer o caminho mais comum que é aprender no set, ao longo da trajetória. “Minha forma foi muito mais livre, comecei como sócia, fui tentando levantar os meus próprios projetos autorais no meio disso, comecei a me envolver nos eventos da área e, com isso, formando um capital social”, diz.

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Ela destaca que, durante esse processo, teve boas experiências e muitas alegrias, mas chegou a vivenciar algumas violências, tudo do ponto de vista de quem está numa posição estratégica e de poder como a produção executiva. “Fui me incomodando com isso e entendi que essas essas violências não eram contra mim, elas eram estruturais, sistêmicas, localizavam um retrato muito maior”, aponta. , né?

O fato de ser uma mulher negra ajudou a manter os olhos abertos para as opressões claras em uma sociedade permeada por racismo estrutural. O mercado audiovisual é parte desta sociedade e não pode fugir disso, sendo atingido também por esse problema. “Elas (as violências) falavam de Brasil, de gênero, da cultura racial, entendi que era preciso fazer alguma coisa do ponto de vista institucional, portanto não personalizado”, continua, explicando as motivações para criar o Nicho 54.

'E se não houver movimento organizado, a nossa comunidade não vai estar preparada.' Foto: Daniel Teixeira/Estadão
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Frentes de trabalho

O instituto trabalha em algumas frentes: realização de mostras e festivais, como o Nicho Novembro, cursos livres de curta duração e programas de mentoria de longa duração, como o Nicho Executiva, além de pesquisa, promoção de desapagamento do trabalho e preservação do patrimônio material e imaterial de pessoas negras, por meio dos programas Cinemateca Negra e do Memória Nicho.

Fernanda defende que o trabalho baseia-se em observar quais são os vazios na formação e as tendências do mercado. “Se a gente não não se posiciona agora vai agravar um problema, não só porque falta para a comunidade preta, falta no setor audiovisual, que tem um problema de qualificação, aprimoramento e especialização”, explica.

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Um dos pontos levantados pela produtora é o fato de que, na última década, o setor passou a demandar mais produções racializadas (ou seja, com mais pessoas e histórias pretas). “O que mais aconteceu é que o mercado queria essas narrativas, mas entregou histórias embranquecidas com imagens pretas em tela”, aponta. “Em 2019, olhando para isso, a gente diz: ‘essa figura tão central (produtor executivo) vai fazer falta daqui a muito pouco tempo porque ela vai liderar aquele processo de se tornar um filme, vai ser responsável por contratar outras pessoas e garantir a contratação de diversas equipes, vai ser responsável por um aspecto muito delicado de mercado que é de garantir os direitos patrimoniais dessa criação, é uma figura muito chave”, complementa.

Por isso, o Nicho resolveu investir no aprendizado para ajudar a criar um grupo de pessoas capazes de, apontando para a ideia de racializar histórias, não apenas pensar nas obras finalizadas, mas no processo de pré e pós-produção. “E se não houver movimento organizado, a nossa comunidade não vai estar preparada”, diz. “Isso é uma necessidade, o programa em essência é isso: mentoria que acelera a carreira dessas mulheres e que tem sido formativo para elas, para a organização e para analisar como nosso setor se organiza ou não para promover a diversidade”, completa.

*Este conteúdo foi feito em parceria com o Instituto Nicho 54, entidade que promove a equidade racial na indústria audiovisual

Quando Fernanda Lomba era uma menina de 13 anos, descobriu uma afeição pelo cinema, mesmo que ela ainda não soubesse do que se tratava. “Não sei o que era, acho que eu gostava de pegar metrô”, brinca. Aos 35 anos, é, atualmente, produtora executiva além de diretora e sócia do Nicho 54, instituto criado em 2019 com objetivo de promover equidade racial apoiando carreira de pessoas negras em posições de liderança criativa, intelectual e econômica na indústria audiovisual.

Entre os trabalhos desenvolvidos está o Festival Nicho Novembro, um festival cinema negro, que já está em sua quinta edição e que promoverá mostras, debates públicos, workshops, painéis, exposição, pitching show dois espaços culturais da cidade — o Centro Cultural São Paulo (CCSP) e o Instituto Moreira Salles (IMS). A programação, totalmente gratuita, acontece a partir desta quinta-feira, 9 e segue até o dia 18. A ideia é mostrar ao público o momento atual do instituto e seu trabalho de promoção de oportunidades e apoio à carreira de pessoas negras.

Fernanda Lomba, produtora executiva, uma das criadoras do NICHO 54, instituto que dá suporte à carreira de profissionais negros no audiovisual e criadora da metodologia Nicho Executiva de mentoria e intercâmbio internacional para produtoras executivas negras -  Foto: Daniel Teixeira/Estadão

O festival é apenas uma das linhas de trabalho do instituto, que parte da ideia de formar profissionais pretos que querem trabalhar por trás das câmeras. Aliás, você já se perguntou quantas pessoas pretas trabalham em sets de filmagens? Ou ainda quais posições estas pessoas ocupam? Se são diretores, roteiristas, assistentes de direção, produtores? Camareiras, motoristas, assistentes de produção?

Pensando nisso, o instituto decidiu atuar formando pessoas para o trabalho nesse mercado, incluindo naquele que talvez seja o que tenha mais responsabilidade na equipe: o produtor executivo. “Essa é uma área estratégica, de poder, que está logo no começo dos processos, que viabiliza e organiza processos criativos de outras pessoas”, conta a produtora. Esse cargo é responsável por escolher parte da equipe e organizar as finanças - quanto sai para cada etapa do processo -, por exemplo.

Olhando para trás

Para entender um pouco as questões que levaram Fernanda e os amigos Heitor Augusto e Raul Perez a criarem o Nicho 54, é importante contar um pouco de sua história. Filha de uma empregada doméstica e de um coletor de material reciclável, a produtora conta que sua primeira experiência com cinema foi na adolescência, por volta dos 13 anos, quando também começou a trabalhar. Foi ao entrou na faculdade que teve outras experiências culturais e artísticas.

Estudante de Letras na Universidade de São Paulo, uma das primeiras ideias que passava por sua mente era de que seria roteirista. “Fui trabalhar numa editora jurídica e tive muita facilidade com aquele universo da linguagem burocrática, e paralelamente, estava envolvida com pessoas interessadas em trabalhar com edital, em produzir um documentário”, conta.

Foram os primeiros passos para que ela se tornasse produtora executiva. “Me interessar por cultura, ter uma leitura facilitada de instrumentos burocráticos, que é uma forma de falar dos editais públicos de cinema, por exemplo, ter pessoas no meu entorno que estavam interessadas em trabalhar com cinema e precisavam de alguém que ajudasse nesse processo mais formal do texto e da proposta, tudo isso levou a me envolver com cinema”, continua. Passos que ajudaram a construir uma trajetória: “eu não tinha naquela época um ciclo social estabelecido em cinema, não venho de uma família com herança em trabalhar com audiovisual, era tudo muito distante e me fascinei pelos processos”, comenta.

O que mais aconteceu é que o mercado queria narrativas racializadas, mas entregou narrativas embranquecidas com imagens pretas em tela

Fernanda Lomba, diretora do Nicho 54, sobre a demanda do mercado audiovisual com narrativas com pessoas negras

Uma visão integral

Fernanda lembra que seu começo no audiovisual foi já como sócia, desenvolvendo trabalhos, em vez de fazer o caminho mais comum que é aprender no set, ao longo da trajetória. “Minha forma foi muito mais livre, comecei como sócia, fui tentando levantar os meus próprios projetos autorais no meio disso, comecei a me envolver nos eventos da área e, com isso, formando um capital social”, diz.

Ela destaca que, durante esse processo, teve boas experiências e muitas alegrias, mas chegou a vivenciar algumas violências, tudo do ponto de vista de quem está numa posição estratégica e de poder como a produção executiva. “Fui me incomodando com isso e entendi que essas essas violências não eram contra mim, elas eram estruturais, sistêmicas, localizavam um retrato muito maior”, aponta. , né?

O fato de ser uma mulher negra ajudou a manter os olhos abertos para as opressões claras em uma sociedade permeada por racismo estrutural. O mercado audiovisual é parte desta sociedade e não pode fugir disso, sendo atingido também por esse problema. “Elas (as violências) falavam de Brasil, de gênero, da cultura racial, entendi que era preciso fazer alguma coisa do ponto de vista institucional, portanto não personalizado”, continua, explicando as motivações para criar o Nicho 54.

'E se não houver movimento organizado, a nossa comunidade não vai estar preparada.' Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Frentes de trabalho

O instituto trabalha em algumas frentes: realização de mostras e festivais, como o Nicho Novembro, cursos livres de curta duração e programas de mentoria de longa duração, como o Nicho Executiva, além de pesquisa, promoção de desapagamento do trabalho e preservação do patrimônio material e imaterial de pessoas negras, por meio dos programas Cinemateca Negra e do Memória Nicho.

Fernanda defende que o trabalho baseia-se em observar quais são os vazios na formação e as tendências do mercado. “Se a gente não não se posiciona agora vai agravar um problema, não só porque falta para a comunidade preta, falta no setor audiovisual, que tem um problema de qualificação, aprimoramento e especialização”, explica.

Um dos pontos levantados pela produtora é o fato de que, na última década, o setor passou a demandar mais produções racializadas (ou seja, com mais pessoas e histórias pretas). “O que mais aconteceu é que o mercado queria essas narrativas, mas entregou histórias embranquecidas com imagens pretas em tela”, aponta. “Em 2019, olhando para isso, a gente diz: ‘essa figura tão central (produtor executivo) vai fazer falta daqui a muito pouco tempo porque ela vai liderar aquele processo de se tornar um filme, vai ser responsável por contratar outras pessoas e garantir a contratação de diversas equipes, vai ser responsável por um aspecto muito delicado de mercado que é de garantir os direitos patrimoniais dessa criação, é uma figura muito chave”, complementa.

Por isso, o Nicho resolveu investir no aprendizado para ajudar a criar um grupo de pessoas capazes de, apontando para a ideia de racializar histórias, não apenas pensar nas obras finalizadas, mas no processo de pré e pós-produção. “E se não houver movimento organizado, a nossa comunidade não vai estar preparada”, diz. “Isso é uma necessidade, o programa em essência é isso: mentoria que acelera a carreira dessas mulheres e que tem sido formativo para elas, para a organização e para analisar como nosso setor se organiza ou não para promover a diversidade”, completa.

*Este conteúdo foi feito em parceria com o Instituto Nicho 54, entidade que promove a equidade racial na indústria audiovisual

Quando Fernanda Lomba era uma menina de 13 anos, descobriu uma afeição pelo cinema, mesmo que ela ainda não soubesse do que se tratava. “Não sei o que era, acho que eu gostava de pegar metrô”, brinca. Aos 35 anos, é, atualmente, produtora executiva além de diretora e sócia do Nicho 54, instituto criado em 2019 com objetivo de promover equidade racial apoiando carreira de pessoas negras em posições de liderança criativa, intelectual e econômica na indústria audiovisual.

Entre os trabalhos desenvolvidos está o Festival Nicho Novembro, um festival cinema negro, que já está em sua quinta edição e que promoverá mostras, debates públicos, workshops, painéis, exposição, pitching show dois espaços culturais da cidade — o Centro Cultural São Paulo (CCSP) e o Instituto Moreira Salles (IMS). A programação, totalmente gratuita, acontece a partir desta quinta-feira, 9 e segue até o dia 18. A ideia é mostrar ao público o momento atual do instituto e seu trabalho de promoção de oportunidades e apoio à carreira de pessoas negras.

Fernanda Lomba, produtora executiva, uma das criadoras do NICHO 54, instituto que dá suporte à carreira de profissionais negros no audiovisual e criadora da metodologia Nicho Executiva de mentoria e intercâmbio internacional para produtoras executivas negras -  Foto: Daniel Teixeira/Estadão

O festival é apenas uma das linhas de trabalho do instituto, que parte da ideia de formar profissionais pretos que querem trabalhar por trás das câmeras. Aliás, você já se perguntou quantas pessoas pretas trabalham em sets de filmagens? Ou ainda quais posições estas pessoas ocupam? Se são diretores, roteiristas, assistentes de direção, produtores? Camareiras, motoristas, assistentes de produção?

Pensando nisso, o instituto decidiu atuar formando pessoas para o trabalho nesse mercado, incluindo naquele que talvez seja o que tenha mais responsabilidade na equipe: o produtor executivo. “Essa é uma área estratégica, de poder, que está logo no começo dos processos, que viabiliza e organiza processos criativos de outras pessoas”, conta a produtora. Esse cargo é responsável por escolher parte da equipe e organizar as finanças - quanto sai para cada etapa do processo -, por exemplo.

Olhando para trás

Para entender um pouco as questões que levaram Fernanda e os amigos Heitor Augusto e Raul Perez a criarem o Nicho 54, é importante contar um pouco de sua história. Filha de uma empregada doméstica e de um coletor de material reciclável, a produtora conta que sua primeira experiência com cinema foi na adolescência, por volta dos 13 anos, quando também começou a trabalhar. Foi ao entrou na faculdade que teve outras experiências culturais e artísticas.

Estudante de Letras na Universidade de São Paulo, uma das primeiras ideias que passava por sua mente era de que seria roteirista. “Fui trabalhar numa editora jurídica e tive muita facilidade com aquele universo da linguagem burocrática, e paralelamente, estava envolvida com pessoas interessadas em trabalhar com edital, em produzir um documentário”, conta.

Foram os primeiros passos para que ela se tornasse produtora executiva. “Me interessar por cultura, ter uma leitura facilitada de instrumentos burocráticos, que é uma forma de falar dos editais públicos de cinema, por exemplo, ter pessoas no meu entorno que estavam interessadas em trabalhar com cinema e precisavam de alguém que ajudasse nesse processo mais formal do texto e da proposta, tudo isso levou a me envolver com cinema”, continua. Passos que ajudaram a construir uma trajetória: “eu não tinha naquela época um ciclo social estabelecido em cinema, não venho de uma família com herança em trabalhar com audiovisual, era tudo muito distante e me fascinei pelos processos”, comenta.

O que mais aconteceu é que o mercado queria narrativas racializadas, mas entregou narrativas embranquecidas com imagens pretas em tela

Fernanda Lomba, diretora do Nicho 54, sobre a demanda do mercado audiovisual com narrativas com pessoas negras

Uma visão integral

Fernanda lembra que seu começo no audiovisual foi já como sócia, desenvolvendo trabalhos, em vez de fazer o caminho mais comum que é aprender no set, ao longo da trajetória. “Minha forma foi muito mais livre, comecei como sócia, fui tentando levantar os meus próprios projetos autorais no meio disso, comecei a me envolver nos eventos da área e, com isso, formando um capital social”, diz.

Ela destaca que, durante esse processo, teve boas experiências e muitas alegrias, mas chegou a vivenciar algumas violências, tudo do ponto de vista de quem está numa posição estratégica e de poder como a produção executiva. “Fui me incomodando com isso e entendi que essas essas violências não eram contra mim, elas eram estruturais, sistêmicas, localizavam um retrato muito maior”, aponta. , né?

O fato de ser uma mulher negra ajudou a manter os olhos abertos para as opressões claras em uma sociedade permeada por racismo estrutural. O mercado audiovisual é parte desta sociedade e não pode fugir disso, sendo atingido também por esse problema. “Elas (as violências) falavam de Brasil, de gênero, da cultura racial, entendi que era preciso fazer alguma coisa do ponto de vista institucional, portanto não personalizado”, continua, explicando as motivações para criar o Nicho 54.

'E se não houver movimento organizado, a nossa comunidade não vai estar preparada.' Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Frentes de trabalho

O instituto trabalha em algumas frentes: realização de mostras e festivais, como o Nicho Novembro, cursos livres de curta duração e programas de mentoria de longa duração, como o Nicho Executiva, além de pesquisa, promoção de desapagamento do trabalho e preservação do patrimônio material e imaterial de pessoas negras, por meio dos programas Cinemateca Negra e do Memória Nicho.

Fernanda defende que o trabalho baseia-se em observar quais são os vazios na formação e as tendências do mercado. “Se a gente não não se posiciona agora vai agravar um problema, não só porque falta para a comunidade preta, falta no setor audiovisual, que tem um problema de qualificação, aprimoramento e especialização”, explica.

Um dos pontos levantados pela produtora é o fato de que, na última década, o setor passou a demandar mais produções racializadas (ou seja, com mais pessoas e histórias pretas). “O que mais aconteceu é que o mercado queria essas narrativas, mas entregou histórias embranquecidas com imagens pretas em tela”, aponta. “Em 2019, olhando para isso, a gente diz: ‘essa figura tão central (produtor executivo) vai fazer falta daqui a muito pouco tempo porque ela vai liderar aquele processo de se tornar um filme, vai ser responsável por contratar outras pessoas e garantir a contratação de diversas equipes, vai ser responsável por um aspecto muito delicado de mercado que é de garantir os direitos patrimoniais dessa criação, é uma figura muito chave”, complementa.

Por isso, o Nicho resolveu investir no aprendizado para ajudar a criar um grupo de pessoas capazes de, apontando para a ideia de racializar histórias, não apenas pensar nas obras finalizadas, mas no processo de pré e pós-produção. “E se não houver movimento organizado, a nossa comunidade não vai estar preparada”, diz. “Isso é uma necessidade, o programa em essência é isso: mentoria que acelera a carreira dessas mulheres e que tem sido formativo para elas, para a organização e para analisar como nosso setor se organiza ou não para promover a diversidade”, completa.

*Este conteúdo foi feito em parceria com o Instituto Nicho 54, entidade que promove a equidade racial na indústria audiovisual

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