Jerry Seinfeld é um dos mestres do humor observacional, um gênero de comédia que encontra na vida cotidiana a matéria-prima para suas piadas. Naturalmente, não é de surpreender que a primeira incursão do criador de Seinfeld (”a série sobre nada”) como diretor fosse em um filme sobre a invenção de um biscoito.
Além de diretor, A Batalha dos Pop-Tart, que chegou à Netflix nesta sexta-feira, 3, também traz o comediante como produtor, roteirista e protagonista – dividindo o papel com o produto que também foi alçado ao papel de astro comestível.
A Batalha do Biscoito Pop-Tart reconta, com uma série de elementos fictícios, a história por trás do próprio biscoito – um tipo de waffle pré-cozido com recheio e cobertura granulada, que se tornou uma das refeições de café da manhã favoritas entre os norte-americanos que apreciam alimentos ultraprocessados.
No filme, Seinfeld interpreta um executivo fictício chamado Bob Cabana, um dos grandes figurões da Kellogg’s, marca real e responsável por trás de alguns dos maiores sucessos de cereais do mercado. Enfrentando uma crise criativa, Cabana convoca sua antiga parceira, a cientista da NASA Donna Stankowski (Melissa McCarthy), para ajudá-lo a aperfeiçoar o Pop-Tart, um que pode ser o grande pulo do gato da companhia na batalha contra a concorrente, a Post.
A partir desse ponto, a trama monta uma espécie de corrida maluca pelo posto de campeão dos cafés da manhã, inserida no contexto dos anos 1960 – década marcada pela invasão britânica na cultura pop, espionagem e um clima de paranoia impulsionado pelo governo norte-americano. Todos esses elementos poderiam ter sido utilizados para criar uma sátira mordaz sobre a cultura do consumismo.
Ou, para se alinhar com o humor observacional do comediante, poderiam ironizar o recente interesse da indústria de Hollywood em filmes sobre produtos, impulsionado pelo sucesso de Barbie e outras produções, como os filmes sobre os tênis da Nike (AIR: A História Por Trás do Logo), os ursinhos de pelúcia (The Beanie Bubble - O Fenômeno das Pelúcias) e até mesmo um Cheetos apimentado (Flamin’ Hot: A História dos Cheetos Extra Picantes) – todos lançados em 2023, aliás.
O grande problema é que A Batalha do Biscoito Pop-Tart não se encaixa nem em uma categoria, nem na outra. Pelo contrário, desperdiça seus esforços e um elenco de peso, que inclui Hugh Grant, Christian Slater, Amy Schumer e outros, ao tentar extrair de um produto sem graça em uma narrativa atraente.
Há até uma tentativa de Seinfeld, enquanto roteirista, em trazer outras figuras históricas e relevantes da época para contextualizar melhor o momento em que o biscoito foi criado e extrair uma piada ou outra. Para isso, surgem em cena o empresário de fitness Jack LaLanne, o primeiro-ministro soviético Nikita Khrushchev e o presidente John F. Kennedy.
No entanto, a inclusão desses nomes e outros parece apenas um desfile de referências vazio, já que não acrescentam de forma significativa à trama principal.
Os momentos em que A Batalha do Biscoito Pop-Tart quase acerta o tom são aqueles em que Seinfeld empresta uma ou duas lições da comédia vaudeville, um gênero de humor popularizado durante a Grande Depressão dos anos 1930, para exagerar a trama por trás do biscoito.
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Por exemplo, há uma cena em que um dos executivos decide colocar uma câmera de espionagem em meio a um espanador de chão para investigar o trabalho da concorrência. Mas mesmo nesses pequenos fragmentos, o título não consegue cumprir sua missão.
O conceito de A Batalha do Biscoito Pop-Tart funciona melhor como uma piada isolada dentro de um stand-up, algo rápido e passageiro – a motivação por trás do filme surgiu de um comentário feito por Seinfeld no especial de comédia 23 Hours to Kill, da Netflix. Mas não como uma narrativa de uma hora e meia.
É interessante notar que Seinfeld conquistou fama ao criar uma comédia sobre “nada”. Mais que interessante – e até irônico – é perceber que seu primeiro esforço como diretor resultou em um filme que também poderia ser descrito como simplesmente “nada”.