Forças de revolução e opressão colidem e se enredam no escaldante Judas e o Messias Negro, de Shaka King, um drama potente e vivamente interpretado sobre a subversão do FBI e o assassinato do líder do Pantera Negra de Chicago Fred Hampton. O filme tem previsão de estreia no Brasil para o dia 25 de fevereiro.
O filme de King, que ele escreveu com Will Berson, mergulha no capítulo sombrio da história americana quando o FBI de J. Edgar Hoover usou vigilância, infiltração e artifícios piores para verificar a ascensão de movimentos negros tanto pacíficos (como no caso de Martin Luther King Jr., relatado recentemente no documentário MLK / FBI, de Sam Pollard) como os mais militantes. Hampton, interpretado por Daniel Kaluuya, tinha apenas 21 anos quando foi baleado e morto em uma ofensiva do FBI, em 1969. O ataque foi realizado, em parte, devido a detalhes passados pelo informante William O’Neal (LaKeith Stanfield), um ladrão de carros que se tornou auxiliar do FBI incitado, quatro anos antes, pelo agente Roy Mitchell (Jesse Plemons). Nas primeiras cenas do filme, O’Neal invade um bar vestindo um sobretudo, chapéu de feltro e exibindo um distintivo falso – um ardil que quase permite roubar um carro. Quando ele é pego, a polícia pergunta por que ele não usa uma faca ou uma arma. “Um distintivo é mais assustador que uma arma”, ele responde. Entre encarar uma longa pena de prisão ou se infiltrar disfarçado entre os Panteras Negras, O’Neal opta por trabalhar para Mitchell. Isso nos leva à órbita inebriante de Hampton. Na interpretação de Kaluuya, ele é um orador poderoso e magnético que, através do trabalho e do carisma, está construindo uma “coalizão do arco-íris” dos oprimidos em Chicago. Kaluuya é tão convincente e carismático que Judas e o Messias Negro perde um pouco de sua força quando ele não está por perto. (Por um tempo, Hampton permanece preso.) Não que o resto do elenco não seja superlativo – Dominique Fishback é também excelente como a revolucionária Deborah Johnson, por quem Hampton se apaixona – ela já teve uma presença memorável em The Deuce, por isso, suspeito que se trata de uma futura estrela. Mas Judas e o Messias Negro é melhor quando o Hampton de Kaluuya hipnotiza quando emprega sua voz de fogo para que o filme de King mantenha o foco diretamente no movimento do poder negro da época. Se Kaluuya dá força a Judas e o Messias Negro, Stanfield provoca uma inquietação. King não se preocupa com o estresse psicológico sofrido por O’Neal como informante da mesma forma com que Sidney Lumet trabalhou com a corrupção policial em O Príncipe da Cidade (1981). King conta com as justaposições do tempo de O’Neal entre os Panteras e os encontros com Mitchell. O agente do FBI acredita que está do lado da Justiça. Comparando os Panteras Negras com os supremacistas brancos, ele diz: “Você não pode se enganar no seu caminho para a igualdade e certamente não pode atirar para chegar a ela”. Mas Mitchell é um agente do FBI de Hoover. Quando Hoover (Martin Sheen) faz uma aparição, Judas e o Messias Negro sugere uma guerra mais ampla de opressão – uma guerra, diz Hoover, sobre o “nosso modo de vida”. Isso torna o filme de King um contraponto claro a Infiltrado na Klan, de Spike Lee, que mostrou o Programa de Contrainteligência do FBI (Cointelpro) ajudando, e não sabotando, os radicais negros. O’Neal está preso entre os Panteras e os federais. Para Stanfield, o papel é uma corda bamba escorregadia que pede uma performance convincente, equilibrada entre a empatia e o julgamento para atos lamentáveis. Por mais contundente que seja o título do filme, o O’Neal de Stanfield nunca está completamente ciente da seriedade do jogo que está jogando, até seu final horrível e apavorante.