'Marguérite et Julien' tira a paz de Cannes


Filme de Valérie Donzelli traz história de paixão incestuosa

Por Luiz Carlos Merten/CANNES

Assim como existem três italianos na competição, existem também cinco franceses. Cinco! Muitos críticos se queixam do excesso, mas está sendo uma representação interessante. E, depois de La Loi du Marché/A Lei no Mercado, de Stéphane Brizé, com Vincent Lindon –, veio Marguérite et Julien, de Valérie Donzelli. O filme baseia-se num roteiro que Jean Gruault escreveu para seu cúmplice, François Truffaut, e foi arquivado após a morte do diretor. Editado em forma de livro, foi presenteado à diretora, que se apaixonou pela história. Valérie ama as histórias de amor, principalmente as dolorosas, como a de Declaração de Guerra, sobre um casal em choque por causa da doença terminal do filho.

Marguérite et Julien baseia-se numa história real do século 17, sobre casal de irmãos consumido pela paixão. Desafiam a Igreja e a sociedade. Tornam-se amantes, são caçados e decapitados, mas permaneceram no imaginário dos franceses. Valérie retrabalhou o roteiro original com Jérémie Elkaim, que faz Julien. O filme tem cenas bem fortes de sexo. E foi concebido sem preocupação de verossimilhança, por mais forte que seja o realismo de cena. Embora o quadro seja de época, entram inesperados elementos para criar a intemporalidade – um carro, um helicóptero. Não é sempre que o cinema encara uma história de incesto, e com esse despudor. A própria Marguerite pede perdão a Deus, mas diz que não renunciará a seu amor.

A diretora Valérie Donzelli (à direita), com os atores Anais DEmoustier e Jeremie Elkaim Foto: Franck Robichon/EFE
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No outro dia, The Hollywood Reporter fez um exercício de futurologia, apostando em quem o júri presidido pelos irmãos Coen poderá votar. O voto do jurado Jake Gyllenhaal muito provavelmente vai para Sicario, do canadense Denis Villeneuve, seu cúmplice em Os Suspeitos e O Homem Duplicado. O filme com Josh Brolin, Benicio Del Toro e Emily Blunt passou terça, 19. É muito bem-feito e ultrapassa o exercício de gênero, a questão é se esse tipo de eficiência, mesmo crítica, será o tipo de filme que os Coens poderão premiar. Passa-se na fronteira mexicana, onde o FBI designa uma agente para servir de isca na caçada ao chefe de um cartel das drogas. Villeneuve mostra como, mesmo numa democracia, os métodos operacionais da polícia subvertem a legalidade. Não seria descabido um novo prêmio de interpretação para Del Toro, que já foi melhor ator na Croisette como o Che de Steven Soderbergh. Seu personagem ambivalente é tão monstruoso como o traficante, e a impunidade não representa pouco.

As seções paralelas têm oferecido belas atrações. O autor tailandês Apichatpong Weerasethakul chegou a admitir para o repórter que, inicialmente, se sentiu desrespeitado quando Cemetery of Splendour foi selecionado para a mostra Un Certain Regard. Ao contrário de outros diretores, Apichatpong vai logo dizendo que Cemetery é seu preferido, daí o desapontamento. Só que agora ele está adorando. “Sinto-me mais livre, relaxado”, diz. O filme passa-se num hospital onde estão internados pacientes que sofrem de uma estranha doença do sono. A partir daí, vão emergindo elementos que, há tempos, integram a estética de ‘Joe’, como é chamado. Sonho, desejo, e tudo se passa na fronteira das almas, entre os vivos e os mortos, e entre a vigília e o sonho, criando um efeito perturbador. O diretor, que voltou à cidade em que nasceu, Khon Kaen, espera que Cemitério seja seu último filme na Tailândia. Apesar da Palma de Ouro que recebeu – por Tio Boonmee –, ele diz que a situação do país não é boa e a do cinema, então, é precária. E acrescenta – se não fossem suas instalações e exposições, não conseguiria sobreviver como cineasta.

Depois do sucesso da exibição da versão restaurada em 4K de Rocco e Seus Irmãos, de Luchino Visconti, no domingo, Cannes Classics resgatou na segunda, 18, o poderoso Z, de Costa-Gavras. Clássico do cinema político dos anos 1960/70, o filme chegou a ser proibido no Brasil pela censura da ditadura. Passado todo esse tempo, continua forte na sua exposição sobre como se estabelecem e funcionam os regimes ditatoriais. Presente à sessão, o diretor foi aplaudido de pé e sua mulher e produtora anunciou que vão voltar, restaurados, todos aqueles filmes – A Confissão, Estado de Sítio, etc. Costa-Gavras é presidente da Cinemateca Francesa. Serge Toubiana, ex-Cahiers du Cinéma, é diretor artístico da instituição. Ele foi prestigiar seu patrão. Há 40 anos, ou mais, Cahiers via como coisa de segunda o cinema que considerava reformista de Costa. O aplauso de pé de Toubiana significa uma mea culpa? Apesar desses acidentes de percurso, Cahiers não perdeu sua aura de bíblia do cinema de autor. Na edição de maio, a que está circulando no festival, a revista põe nas nuvens Casa Grande, de Fellipe Barbosa, tratado no Brasil, por críticos medíocres, como sociologia barata. Por uma vez, Cahiers acertou. Casa Grande, para não repetir o adjetivo do título, é imenso. 

Assim como existem três italianos na competição, existem também cinco franceses. Cinco! Muitos críticos se queixam do excesso, mas está sendo uma representação interessante. E, depois de La Loi du Marché/A Lei no Mercado, de Stéphane Brizé, com Vincent Lindon –, veio Marguérite et Julien, de Valérie Donzelli. O filme baseia-se num roteiro que Jean Gruault escreveu para seu cúmplice, François Truffaut, e foi arquivado após a morte do diretor. Editado em forma de livro, foi presenteado à diretora, que se apaixonou pela história. Valérie ama as histórias de amor, principalmente as dolorosas, como a de Declaração de Guerra, sobre um casal em choque por causa da doença terminal do filho.

Marguérite et Julien baseia-se numa história real do século 17, sobre casal de irmãos consumido pela paixão. Desafiam a Igreja e a sociedade. Tornam-se amantes, são caçados e decapitados, mas permaneceram no imaginário dos franceses. Valérie retrabalhou o roteiro original com Jérémie Elkaim, que faz Julien. O filme tem cenas bem fortes de sexo. E foi concebido sem preocupação de verossimilhança, por mais forte que seja o realismo de cena. Embora o quadro seja de época, entram inesperados elementos para criar a intemporalidade – um carro, um helicóptero. Não é sempre que o cinema encara uma história de incesto, e com esse despudor. A própria Marguerite pede perdão a Deus, mas diz que não renunciará a seu amor.

A diretora Valérie Donzelli (à direita), com os atores Anais DEmoustier e Jeremie Elkaim Foto: Franck Robichon/EFE

No outro dia, The Hollywood Reporter fez um exercício de futurologia, apostando em quem o júri presidido pelos irmãos Coen poderá votar. O voto do jurado Jake Gyllenhaal muito provavelmente vai para Sicario, do canadense Denis Villeneuve, seu cúmplice em Os Suspeitos e O Homem Duplicado. O filme com Josh Brolin, Benicio Del Toro e Emily Blunt passou terça, 19. É muito bem-feito e ultrapassa o exercício de gênero, a questão é se esse tipo de eficiência, mesmo crítica, será o tipo de filme que os Coens poderão premiar. Passa-se na fronteira mexicana, onde o FBI designa uma agente para servir de isca na caçada ao chefe de um cartel das drogas. Villeneuve mostra como, mesmo numa democracia, os métodos operacionais da polícia subvertem a legalidade. Não seria descabido um novo prêmio de interpretação para Del Toro, que já foi melhor ator na Croisette como o Che de Steven Soderbergh. Seu personagem ambivalente é tão monstruoso como o traficante, e a impunidade não representa pouco.

As seções paralelas têm oferecido belas atrações. O autor tailandês Apichatpong Weerasethakul chegou a admitir para o repórter que, inicialmente, se sentiu desrespeitado quando Cemetery of Splendour foi selecionado para a mostra Un Certain Regard. Ao contrário de outros diretores, Apichatpong vai logo dizendo que Cemetery é seu preferido, daí o desapontamento. Só que agora ele está adorando. “Sinto-me mais livre, relaxado”, diz. O filme passa-se num hospital onde estão internados pacientes que sofrem de uma estranha doença do sono. A partir daí, vão emergindo elementos que, há tempos, integram a estética de ‘Joe’, como é chamado. Sonho, desejo, e tudo se passa na fronteira das almas, entre os vivos e os mortos, e entre a vigília e o sonho, criando um efeito perturbador. O diretor, que voltou à cidade em que nasceu, Khon Kaen, espera que Cemitério seja seu último filme na Tailândia. Apesar da Palma de Ouro que recebeu – por Tio Boonmee –, ele diz que a situação do país não é boa e a do cinema, então, é precária. E acrescenta – se não fossem suas instalações e exposições, não conseguiria sobreviver como cineasta.

Depois do sucesso da exibição da versão restaurada em 4K de Rocco e Seus Irmãos, de Luchino Visconti, no domingo, Cannes Classics resgatou na segunda, 18, o poderoso Z, de Costa-Gavras. Clássico do cinema político dos anos 1960/70, o filme chegou a ser proibido no Brasil pela censura da ditadura. Passado todo esse tempo, continua forte na sua exposição sobre como se estabelecem e funcionam os regimes ditatoriais. Presente à sessão, o diretor foi aplaudido de pé e sua mulher e produtora anunciou que vão voltar, restaurados, todos aqueles filmes – A Confissão, Estado de Sítio, etc. Costa-Gavras é presidente da Cinemateca Francesa. Serge Toubiana, ex-Cahiers du Cinéma, é diretor artístico da instituição. Ele foi prestigiar seu patrão. Há 40 anos, ou mais, Cahiers via como coisa de segunda o cinema que considerava reformista de Costa. O aplauso de pé de Toubiana significa uma mea culpa? Apesar desses acidentes de percurso, Cahiers não perdeu sua aura de bíblia do cinema de autor. Na edição de maio, a que está circulando no festival, a revista põe nas nuvens Casa Grande, de Fellipe Barbosa, tratado no Brasil, por críticos medíocres, como sociologia barata. Por uma vez, Cahiers acertou. Casa Grande, para não repetir o adjetivo do título, é imenso. 

Assim como existem três italianos na competição, existem também cinco franceses. Cinco! Muitos críticos se queixam do excesso, mas está sendo uma representação interessante. E, depois de La Loi du Marché/A Lei no Mercado, de Stéphane Brizé, com Vincent Lindon –, veio Marguérite et Julien, de Valérie Donzelli. O filme baseia-se num roteiro que Jean Gruault escreveu para seu cúmplice, François Truffaut, e foi arquivado após a morte do diretor. Editado em forma de livro, foi presenteado à diretora, que se apaixonou pela história. Valérie ama as histórias de amor, principalmente as dolorosas, como a de Declaração de Guerra, sobre um casal em choque por causa da doença terminal do filho.

Marguérite et Julien baseia-se numa história real do século 17, sobre casal de irmãos consumido pela paixão. Desafiam a Igreja e a sociedade. Tornam-se amantes, são caçados e decapitados, mas permaneceram no imaginário dos franceses. Valérie retrabalhou o roteiro original com Jérémie Elkaim, que faz Julien. O filme tem cenas bem fortes de sexo. E foi concebido sem preocupação de verossimilhança, por mais forte que seja o realismo de cena. Embora o quadro seja de época, entram inesperados elementos para criar a intemporalidade – um carro, um helicóptero. Não é sempre que o cinema encara uma história de incesto, e com esse despudor. A própria Marguerite pede perdão a Deus, mas diz que não renunciará a seu amor.

A diretora Valérie Donzelli (à direita), com os atores Anais DEmoustier e Jeremie Elkaim Foto: Franck Robichon/EFE

No outro dia, The Hollywood Reporter fez um exercício de futurologia, apostando em quem o júri presidido pelos irmãos Coen poderá votar. O voto do jurado Jake Gyllenhaal muito provavelmente vai para Sicario, do canadense Denis Villeneuve, seu cúmplice em Os Suspeitos e O Homem Duplicado. O filme com Josh Brolin, Benicio Del Toro e Emily Blunt passou terça, 19. É muito bem-feito e ultrapassa o exercício de gênero, a questão é se esse tipo de eficiência, mesmo crítica, será o tipo de filme que os Coens poderão premiar. Passa-se na fronteira mexicana, onde o FBI designa uma agente para servir de isca na caçada ao chefe de um cartel das drogas. Villeneuve mostra como, mesmo numa democracia, os métodos operacionais da polícia subvertem a legalidade. Não seria descabido um novo prêmio de interpretação para Del Toro, que já foi melhor ator na Croisette como o Che de Steven Soderbergh. Seu personagem ambivalente é tão monstruoso como o traficante, e a impunidade não representa pouco.

As seções paralelas têm oferecido belas atrações. O autor tailandês Apichatpong Weerasethakul chegou a admitir para o repórter que, inicialmente, se sentiu desrespeitado quando Cemetery of Splendour foi selecionado para a mostra Un Certain Regard. Ao contrário de outros diretores, Apichatpong vai logo dizendo que Cemetery é seu preferido, daí o desapontamento. Só que agora ele está adorando. “Sinto-me mais livre, relaxado”, diz. O filme passa-se num hospital onde estão internados pacientes que sofrem de uma estranha doença do sono. A partir daí, vão emergindo elementos que, há tempos, integram a estética de ‘Joe’, como é chamado. Sonho, desejo, e tudo se passa na fronteira das almas, entre os vivos e os mortos, e entre a vigília e o sonho, criando um efeito perturbador. O diretor, que voltou à cidade em que nasceu, Khon Kaen, espera que Cemitério seja seu último filme na Tailândia. Apesar da Palma de Ouro que recebeu – por Tio Boonmee –, ele diz que a situação do país não é boa e a do cinema, então, é precária. E acrescenta – se não fossem suas instalações e exposições, não conseguiria sobreviver como cineasta.

Depois do sucesso da exibição da versão restaurada em 4K de Rocco e Seus Irmãos, de Luchino Visconti, no domingo, Cannes Classics resgatou na segunda, 18, o poderoso Z, de Costa-Gavras. Clássico do cinema político dos anos 1960/70, o filme chegou a ser proibido no Brasil pela censura da ditadura. Passado todo esse tempo, continua forte na sua exposição sobre como se estabelecem e funcionam os regimes ditatoriais. Presente à sessão, o diretor foi aplaudido de pé e sua mulher e produtora anunciou que vão voltar, restaurados, todos aqueles filmes – A Confissão, Estado de Sítio, etc. Costa-Gavras é presidente da Cinemateca Francesa. Serge Toubiana, ex-Cahiers du Cinéma, é diretor artístico da instituição. Ele foi prestigiar seu patrão. Há 40 anos, ou mais, Cahiers via como coisa de segunda o cinema que considerava reformista de Costa. O aplauso de pé de Toubiana significa uma mea culpa? Apesar desses acidentes de percurso, Cahiers não perdeu sua aura de bíblia do cinema de autor. Na edição de maio, a que está circulando no festival, a revista põe nas nuvens Casa Grande, de Fellipe Barbosa, tratado no Brasil, por críticos medíocres, como sociologia barata. Por uma vez, Cahiers acertou. Casa Grande, para não repetir o adjetivo do título, é imenso. 

Assim como existem três italianos na competição, existem também cinco franceses. Cinco! Muitos críticos se queixam do excesso, mas está sendo uma representação interessante. E, depois de La Loi du Marché/A Lei no Mercado, de Stéphane Brizé, com Vincent Lindon –, veio Marguérite et Julien, de Valérie Donzelli. O filme baseia-se num roteiro que Jean Gruault escreveu para seu cúmplice, François Truffaut, e foi arquivado após a morte do diretor. Editado em forma de livro, foi presenteado à diretora, que se apaixonou pela história. Valérie ama as histórias de amor, principalmente as dolorosas, como a de Declaração de Guerra, sobre um casal em choque por causa da doença terminal do filho.

Marguérite et Julien baseia-se numa história real do século 17, sobre casal de irmãos consumido pela paixão. Desafiam a Igreja e a sociedade. Tornam-se amantes, são caçados e decapitados, mas permaneceram no imaginário dos franceses. Valérie retrabalhou o roteiro original com Jérémie Elkaim, que faz Julien. O filme tem cenas bem fortes de sexo. E foi concebido sem preocupação de verossimilhança, por mais forte que seja o realismo de cena. Embora o quadro seja de época, entram inesperados elementos para criar a intemporalidade – um carro, um helicóptero. Não é sempre que o cinema encara uma história de incesto, e com esse despudor. A própria Marguerite pede perdão a Deus, mas diz que não renunciará a seu amor.

A diretora Valérie Donzelli (à direita), com os atores Anais DEmoustier e Jeremie Elkaim Foto: Franck Robichon/EFE

No outro dia, The Hollywood Reporter fez um exercício de futurologia, apostando em quem o júri presidido pelos irmãos Coen poderá votar. O voto do jurado Jake Gyllenhaal muito provavelmente vai para Sicario, do canadense Denis Villeneuve, seu cúmplice em Os Suspeitos e O Homem Duplicado. O filme com Josh Brolin, Benicio Del Toro e Emily Blunt passou terça, 19. É muito bem-feito e ultrapassa o exercício de gênero, a questão é se esse tipo de eficiência, mesmo crítica, será o tipo de filme que os Coens poderão premiar. Passa-se na fronteira mexicana, onde o FBI designa uma agente para servir de isca na caçada ao chefe de um cartel das drogas. Villeneuve mostra como, mesmo numa democracia, os métodos operacionais da polícia subvertem a legalidade. Não seria descabido um novo prêmio de interpretação para Del Toro, que já foi melhor ator na Croisette como o Che de Steven Soderbergh. Seu personagem ambivalente é tão monstruoso como o traficante, e a impunidade não representa pouco.

As seções paralelas têm oferecido belas atrações. O autor tailandês Apichatpong Weerasethakul chegou a admitir para o repórter que, inicialmente, se sentiu desrespeitado quando Cemetery of Splendour foi selecionado para a mostra Un Certain Regard. Ao contrário de outros diretores, Apichatpong vai logo dizendo que Cemetery é seu preferido, daí o desapontamento. Só que agora ele está adorando. “Sinto-me mais livre, relaxado”, diz. O filme passa-se num hospital onde estão internados pacientes que sofrem de uma estranha doença do sono. A partir daí, vão emergindo elementos que, há tempos, integram a estética de ‘Joe’, como é chamado. Sonho, desejo, e tudo se passa na fronteira das almas, entre os vivos e os mortos, e entre a vigília e o sonho, criando um efeito perturbador. O diretor, que voltou à cidade em que nasceu, Khon Kaen, espera que Cemitério seja seu último filme na Tailândia. Apesar da Palma de Ouro que recebeu – por Tio Boonmee –, ele diz que a situação do país não é boa e a do cinema, então, é precária. E acrescenta – se não fossem suas instalações e exposições, não conseguiria sobreviver como cineasta.

Depois do sucesso da exibição da versão restaurada em 4K de Rocco e Seus Irmãos, de Luchino Visconti, no domingo, Cannes Classics resgatou na segunda, 18, o poderoso Z, de Costa-Gavras. Clássico do cinema político dos anos 1960/70, o filme chegou a ser proibido no Brasil pela censura da ditadura. Passado todo esse tempo, continua forte na sua exposição sobre como se estabelecem e funcionam os regimes ditatoriais. Presente à sessão, o diretor foi aplaudido de pé e sua mulher e produtora anunciou que vão voltar, restaurados, todos aqueles filmes – A Confissão, Estado de Sítio, etc. Costa-Gavras é presidente da Cinemateca Francesa. Serge Toubiana, ex-Cahiers du Cinéma, é diretor artístico da instituição. Ele foi prestigiar seu patrão. Há 40 anos, ou mais, Cahiers via como coisa de segunda o cinema que considerava reformista de Costa. O aplauso de pé de Toubiana significa uma mea culpa? Apesar desses acidentes de percurso, Cahiers não perdeu sua aura de bíblia do cinema de autor. Na edição de maio, a que está circulando no festival, a revista põe nas nuvens Casa Grande, de Fellipe Barbosa, tratado no Brasil, por críticos medíocres, como sociologia barata. Por uma vez, Cahiers acertou. Casa Grande, para não repetir o adjetivo do título, é imenso. 

Assim como existem três italianos na competição, existem também cinco franceses. Cinco! Muitos críticos se queixam do excesso, mas está sendo uma representação interessante. E, depois de La Loi du Marché/A Lei no Mercado, de Stéphane Brizé, com Vincent Lindon –, veio Marguérite et Julien, de Valérie Donzelli. O filme baseia-se num roteiro que Jean Gruault escreveu para seu cúmplice, François Truffaut, e foi arquivado após a morte do diretor. Editado em forma de livro, foi presenteado à diretora, que se apaixonou pela história. Valérie ama as histórias de amor, principalmente as dolorosas, como a de Declaração de Guerra, sobre um casal em choque por causa da doença terminal do filho.

Marguérite et Julien baseia-se numa história real do século 17, sobre casal de irmãos consumido pela paixão. Desafiam a Igreja e a sociedade. Tornam-se amantes, são caçados e decapitados, mas permaneceram no imaginário dos franceses. Valérie retrabalhou o roteiro original com Jérémie Elkaim, que faz Julien. O filme tem cenas bem fortes de sexo. E foi concebido sem preocupação de verossimilhança, por mais forte que seja o realismo de cena. Embora o quadro seja de época, entram inesperados elementos para criar a intemporalidade – um carro, um helicóptero. Não é sempre que o cinema encara uma história de incesto, e com esse despudor. A própria Marguerite pede perdão a Deus, mas diz que não renunciará a seu amor.

A diretora Valérie Donzelli (à direita), com os atores Anais DEmoustier e Jeremie Elkaim Foto: Franck Robichon/EFE

No outro dia, The Hollywood Reporter fez um exercício de futurologia, apostando em quem o júri presidido pelos irmãos Coen poderá votar. O voto do jurado Jake Gyllenhaal muito provavelmente vai para Sicario, do canadense Denis Villeneuve, seu cúmplice em Os Suspeitos e O Homem Duplicado. O filme com Josh Brolin, Benicio Del Toro e Emily Blunt passou terça, 19. É muito bem-feito e ultrapassa o exercício de gênero, a questão é se esse tipo de eficiência, mesmo crítica, será o tipo de filme que os Coens poderão premiar. Passa-se na fronteira mexicana, onde o FBI designa uma agente para servir de isca na caçada ao chefe de um cartel das drogas. Villeneuve mostra como, mesmo numa democracia, os métodos operacionais da polícia subvertem a legalidade. Não seria descabido um novo prêmio de interpretação para Del Toro, que já foi melhor ator na Croisette como o Che de Steven Soderbergh. Seu personagem ambivalente é tão monstruoso como o traficante, e a impunidade não representa pouco.

As seções paralelas têm oferecido belas atrações. O autor tailandês Apichatpong Weerasethakul chegou a admitir para o repórter que, inicialmente, se sentiu desrespeitado quando Cemetery of Splendour foi selecionado para a mostra Un Certain Regard. Ao contrário de outros diretores, Apichatpong vai logo dizendo que Cemetery é seu preferido, daí o desapontamento. Só que agora ele está adorando. “Sinto-me mais livre, relaxado”, diz. O filme passa-se num hospital onde estão internados pacientes que sofrem de uma estranha doença do sono. A partir daí, vão emergindo elementos que, há tempos, integram a estética de ‘Joe’, como é chamado. Sonho, desejo, e tudo se passa na fronteira das almas, entre os vivos e os mortos, e entre a vigília e o sonho, criando um efeito perturbador. O diretor, que voltou à cidade em que nasceu, Khon Kaen, espera que Cemitério seja seu último filme na Tailândia. Apesar da Palma de Ouro que recebeu – por Tio Boonmee –, ele diz que a situação do país não é boa e a do cinema, então, é precária. E acrescenta – se não fossem suas instalações e exposições, não conseguiria sobreviver como cineasta.

Depois do sucesso da exibição da versão restaurada em 4K de Rocco e Seus Irmãos, de Luchino Visconti, no domingo, Cannes Classics resgatou na segunda, 18, o poderoso Z, de Costa-Gavras. Clássico do cinema político dos anos 1960/70, o filme chegou a ser proibido no Brasil pela censura da ditadura. Passado todo esse tempo, continua forte na sua exposição sobre como se estabelecem e funcionam os regimes ditatoriais. Presente à sessão, o diretor foi aplaudido de pé e sua mulher e produtora anunciou que vão voltar, restaurados, todos aqueles filmes – A Confissão, Estado de Sítio, etc. Costa-Gavras é presidente da Cinemateca Francesa. Serge Toubiana, ex-Cahiers du Cinéma, é diretor artístico da instituição. Ele foi prestigiar seu patrão. Há 40 anos, ou mais, Cahiers via como coisa de segunda o cinema que considerava reformista de Costa. O aplauso de pé de Toubiana significa uma mea culpa? Apesar desses acidentes de percurso, Cahiers não perdeu sua aura de bíblia do cinema de autor. Na edição de maio, a que está circulando no festival, a revista põe nas nuvens Casa Grande, de Fellipe Barbosa, tratado no Brasil, por críticos medíocres, como sociologia barata. Por uma vez, Cahiers acertou. Casa Grande, para não repetir o adjetivo do título, é imenso. 

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