Mostra de Cinema: Naomi Kawase trata de temas familiares delicados em 'Mães de Verdade'


Filme ecoa clássicos do cinema japonês, como Hirokazu Kore-eda e Yasujiro Ozu

Por Luiz Carlos Merten

Naomi Kawase conversa com o Estadão pelo Zoom, de sua casa em Nara, no Japão. Apesar da pandemia, conseguiu realizar seu festival anual de cinema, que tem colocado a cidade japonesa no mapa da expressão autoral de todo o mundo. Diante do interesse do repórter pelo assunto, aconselha – “Fizemos um festival com todos os protocolos de segurança. São tempos difíceis, mas você pode ter uma ideia procurando no YouTube. Abrimos com uma cerimônia em homenagem aos mortos da covid-19 no Japão e no mundo. Foi emocionante.”

Cena do filme 'Mães de Verdade', de Naomi Kawase Foto: Kino Films

Também é emocionante assistir a seu longa Mães de Verdade, uma das atrações da 44.ª Mostra de Cinema, que começou na quinta, 22, à noite, com a apresentação de Nova Ordem, do mexicano Michel Franco, no Drive-in Belas Artes. A Mostra prossegue agora remota, com poucas sessões presenciais. E, diferentemente de anos anteriores, quando havia uma grade de programação, os filmes em 2020 estão disponíveis em bloco – de todos os 197, justamente o Michel Franco esteve disponível por um único dia, só na sexta. No site www.mostra.org, encontram-se todas as informações sobre como adquirir ingressos e onde ver – pela plataforma Mostra Play – os títulos selecionados.Mães de Verdade é sobre um casal impossibilitado de ter filhos. Eles arranjam uma barriga de aluguel, têm o seu bebê e tudo parece perfeito – exceto pelo fato de a mãe biológica reaparecer para reclamar a criança. Impossível não pensar em outro grande japonês, Hirokazu Kore-eda, que tem abordado temas relativos à família. Já nos anos 1950 e 60, Yasujiro Ozu construiu toda uma obra abordando as transformações da família tradicional japonesa. Por maiores que sejam certas similaridades, o inconfundível estilo de Ozu – sua câmera colocada no ponto de vista de um observador sentado na esteira de tatame – faz dos seus filmes experiências únicas. Kore-eda, de alguma forma, em Pai e Filho e Assunto de Família, aborda o mesmo tema de Naomi, o conflito entre instinto e cultura, entre família biológica e adotiva. Mas Kore-eda, até por ser homem, filma o drama de pais, no masculino. Será? “Entendo o que você quer dizer. Sou mulher, faço filmes sobre mães, ele é homem, focaliza o tema do ângulo dos pais. A verdade é que as coisas não são tão simples, nem se resumem a uma questão de gênero. Creio e espero que meus filmes reflitam isso, que todo homem pode ter uma porção feminina e toda mulher, uma masculina. É isso que faz de nós, seres humanos, criaturas tão complexas e fascinantes.” E tem mais: “Não se trata exclusivamente de um problema japonês. Na época de Ozu, as coisas já estavam mudando. Na verdade, o mundo que se desenhou após a 2.ª Guerra mudou muita coisa, no Japão inclusive”. Ela prossegue: “As mulheres tornaram-se mais independentes. Talvez isso aparentemente seja menos perceptível no Japão, mas aqui também. Muitas mulheres começaram a deixar para ter filhos mais tarde, e o relógio biológico criou uma impossibilidade de procriar para elas. Outros casais, como o do filme, não podem ter filhos. Têm tudo, mas não o que querem. Achei que seria interessante colocar os temas que encontrei no livro de Mizuki Tsujimura, mas terminei mudando muita coisa”. Segundo a própria diretora, seu tema é a (in)fertilidade e a adoção, que permanece um tabu no país. “É parte da nossa herança tradicional. Mulheres foram feitas para procriar. Cria-se um preconceito quando não conseguem.” O filme é o melhor entre as obras mais recentes da autora de A Floresta dos Lamentos. Impossível não falar em outro assunto – a Olimpíada que foi cancelada e passou para 2021. Naomi fará o filme oficial desses Jogos Olímpicos, como Kon Ichikawa fez o de 1964, quando a Olimpíada também foi em Tóquio. Ela conta que vinha filmando desde o ano passado e, agora, com a pandemia, repensa o trabalho. “Não dá para esperar que eu recomece só no ano que vem. Esse ano de espera vai repercutir na organização, nos atletas. O tempo será personagem.” A natureza? “Todos os meus filmes de alguma forma também falam de natureza. A floresta, o mar. A humanidade está maltratando a natureza. Ela se vinga. Um vírus que nem conseguimos enxergar está causando todo esse estrago. É tempo de pensar no que é importante de verdade.”

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Naomi Kawase conversa com o Estadão pelo Zoom, de sua casa em Nara, no Japão. Apesar da pandemia, conseguiu realizar seu festival anual de cinema, que tem colocado a cidade japonesa no mapa da expressão autoral de todo o mundo. Diante do interesse do repórter pelo assunto, aconselha – “Fizemos um festival com todos os protocolos de segurança. São tempos difíceis, mas você pode ter uma ideia procurando no YouTube. Abrimos com uma cerimônia em homenagem aos mortos da covid-19 no Japão e no mundo. Foi emocionante.”

Cena do filme 'Mães de Verdade', de Naomi Kawase Foto: Kino Films

Também é emocionante assistir a seu longa Mães de Verdade, uma das atrações da 44.ª Mostra de Cinema, que começou na quinta, 22, à noite, com a apresentação de Nova Ordem, do mexicano Michel Franco, no Drive-in Belas Artes. A Mostra prossegue agora remota, com poucas sessões presenciais. E, diferentemente de anos anteriores, quando havia uma grade de programação, os filmes em 2020 estão disponíveis em bloco – de todos os 197, justamente o Michel Franco esteve disponível por um único dia, só na sexta. No site www.mostra.org, encontram-se todas as informações sobre como adquirir ingressos e onde ver – pela plataforma Mostra Play – os títulos selecionados.Mães de Verdade é sobre um casal impossibilitado de ter filhos. Eles arranjam uma barriga de aluguel, têm o seu bebê e tudo parece perfeito – exceto pelo fato de a mãe biológica reaparecer para reclamar a criança. Impossível não pensar em outro grande japonês, Hirokazu Kore-eda, que tem abordado temas relativos à família. Já nos anos 1950 e 60, Yasujiro Ozu construiu toda uma obra abordando as transformações da família tradicional japonesa. Por maiores que sejam certas similaridades, o inconfundível estilo de Ozu – sua câmera colocada no ponto de vista de um observador sentado na esteira de tatame – faz dos seus filmes experiências únicas. Kore-eda, de alguma forma, em Pai e Filho e Assunto de Família, aborda o mesmo tema de Naomi, o conflito entre instinto e cultura, entre família biológica e adotiva. Mas Kore-eda, até por ser homem, filma o drama de pais, no masculino. Será? “Entendo o que você quer dizer. Sou mulher, faço filmes sobre mães, ele é homem, focaliza o tema do ângulo dos pais. A verdade é que as coisas não são tão simples, nem se resumem a uma questão de gênero. Creio e espero que meus filmes reflitam isso, que todo homem pode ter uma porção feminina e toda mulher, uma masculina. É isso que faz de nós, seres humanos, criaturas tão complexas e fascinantes.” E tem mais: “Não se trata exclusivamente de um problema japonês. Na época de Ozu, as coisas já estavam mudando. Na verdade, o mundo que se desenhou após a 2.ª Guerra mudou muita coisa, no Japão inclusive”. Ela prossegue: “As mulheres tornaram-se mais independentes. Talvez isso aparentemente seja menos perceptível no Japão, mas aqui também. Muitas mulheres começaram a deixar para ter filhos mais tarde, e o relógio biológico criou uma impossibilidade de procriar para elas. Outros casais, como o do filme, não podem ter filhos. Têm tudo, mas não o que querem. Achei que seria interessante colocar os temas que encontrei no livro de Mizuki Tsujimura, mas terminei mudando muita coisa”. Segundo a própria diretora, seu tema é a (in)fertilidade e a adoção, que permanece um tabu no país. “É parte da nossa herança tradicional. Mulheres foram feitas para procriar. Cria-se um preconceito quando não conseguem.” O filme é o melhor entre as obras mais recentes da autora de A Floresta dos Lamentos. Impossível não falar em outro assunto – a Olimpíada que foi cancelada e passou para 2021. Naomi fará o filme oficial desses Jogos Olímpicos, como Kon Ichikawa fez o de 1964, quando a Olimpíada também foi em Tóquio. Ela conta que vinha filmando desde o ano passado e, agora, com a pandemia, repensa o trabalho. “Não dá para esperar que eu recomece só no ano que vem. Esse ano de espera vai repercutir na organização, nos atletas. O tempo será personagem.” A natureza? “Todos os meus filmes de alguma forma também falam de natureza. A floresta, o mar. A humanidade está maltratando a natureza. Ela se vinga. Um vírus que nem conseguimos enxergar está causando todo esse estrago. É tempo de pensar no que é importante de verdade.”

Naomi Kawase conversa com o Estadão pelo Zoom, de sua casa em Nara, no Japão. Apesar da pandemia, conseguiu realizar seu festival anual de cinema, que tem colocado a cidade japonesa no mapa da expressão autoral de todo o mundo. Diante do interesse do repórter pelo assunto, aconselha – “Fizemos um festival com todos os protocolos de segurança. São tempos difíceis, mas você pode ter uma ideia procurando no YouTube. Abrimos com uma cerimônia em homenagem aos mortos da covid-19 no Japão e no mundo. Foi emocionante.”

Cena do filme 'Mães de Verdade', de Naomi Kawase Foto: Kino Films

Também é emocionante assistir a seu longa Mães de Verdade, uma das atrações da 44.ª Mostra de Cinema, que começou na quinta, 22, à noite, com a apresentação de Nova Ordem, do mexicano Michel Franco, no Drive-in Belas Artes. A Mostra prossegue agora remota, com poucas sessões presenciais. E, diferentemente de anos anteriores, quando havia uma grade de programação, os filmes em 2020 estão disponíveis em bloco – de todos os 197, justamente o Michel Franco esteve disponível por um único dia, só na sexta. No site www.mostra.org, encontram-se todas as informações sobre como adquirir ingressos e onde ver – pela plataforma Mostra Play – os títulos selecionados.Mães de Verdade é sobre um casal impossibilitado de ter filhos. Eles arranjam uma barriga de aluguel, têm o seu bebê e tudo parece perfeito – exceto pelo fato de a mãe biológica reaparecer para reclamar a criança. Impossível não pensar em outro grande japonês, Hirokazu Kore-eda, que tem abordado temas relativos à família. Já nos anos 1950 e 60, Yasujiro Ozu construiu toda uma obra abordando as transformações da família tradicional japonesa. Por maiores que sejam certas similaridades, o inconfundível estilo de Ozu – sua câmera colocada no ponto de vista de um observador sentado na esteira de tatame – faz dos seus filmes experiências únicas. Kore-eda, de alguma forma, em Pai e Filho e Assunto de Família, aborda o mesmo tema de Naomi, o conflito entre instinto e cultura, entre família biológica e adotiva. Mas Kore-eda, até por ser homem, filma o drama de pais, no masculino. Será? “Entendo o que você quer dizer. Sou mulher, faço filmes sobre mães, ele é homem, focaliza o tema do ângulo dos pais. A verdade é que as coisas não são tão simples, nem se resumem a uma questão de gênero. Creio e espero que meus filmes reflitam isso, que todo homem pode ter uma porção feminina e toda mulher, uma masculina. É isso que faz de nós, seres humanos, criaturas tão complexas e fascinantes.” E tem mais: “Não se trata exclusivamente de um problema japonês. Na época de Ozu, as coisas já estavam mudando. Na verdade, o mundo que se desenhou após a 2.ª Guerra mudou muita coisa, no Japão inclusive”. Ela prossegue: “As mulheres tornaram-se mais independentes. Talvez isso aparentemente seja menos perceptível no Japão, mas aqui também. Muitas mulheres começaram a deixar para ter filhos mais tarde, e o relógio biológico criou uma impossibilidade de procriar para elas. Outros casais, como o do filme, não podem ter filhos. Têm tudo, mas não o que querem. Achei que seria interessante colocar os temas que encontrei no livro de Mizuki Tsujimura, mas terminei mudando muita coisa”. Segundo a própria diretora, seu tema é a (in)fertilidade e a adoção, que permanece um tabu no país. “É parte da nossa herança tradicional. Mulheres foram feitas para procriar. Cria-se um preconceito quando não conseguem.” O filme é o melhor entre as obras mais recentes da autora de A Floresta dos Lamentos. Impossível não falar em outro assunto – a Olimpíada que foi cancelada e passou para 2021. Naomi fará o filme oficial desses Jogos Olímpicos, como Kon Ichikawa fez o de 1964, quando a Olimpíada também foi em Tóquio. Ela conta que vinha filmando desde o ano passado e, agora, com a pandemia, repensa o trabalho. “Não dá para esperar que eu recomece só no ano que vem. Esse ano de espera vai repercutir na organização, nos atletas. O tempo será personagem.” A natureza? “Todos os meus filmes de alguma forma também falam de natureza. A floresta, o mar. A humanidade está maltratando a natureza. Ela se vinga. Um vírus que nem conseguimos enxergar está causando todo esse estrago. É tempo de pensar no que é importante de verdade.”

Naomi Kawase conversa com o Estadão pelo Zoom, de sua casa em Nara, no Japão. Apesar da pandemia, conseguiu realizar seu festival anual de cinema, que tem colocado a cidade japonesa no mapa da expressão autoral de todo o mundo. Diante do interesse do repórter pelo assunto, aconselha – “Fizemos um festival com todos os protocolos de segurança. São tempos difíceis, mas você pode ter uma ideia procurando no YouTube. Abrimos com uma cerimônia em homenagem aos mortos da covid-19 no Japão e no mundo. Foi emocionante.”

Cena do filme 'Mães de Verdade', de Naomi Kawase Foto: Kino Films

Também é emocionante assistir a seu longa Mães de Verdade, uma das atrações da 44.ª Mostra de Cinema, que começou na quinta, 22, à noite, com a apresentação de Nova Ordem, do mexicano Michel Franco, no Drive-in Belas Artes. A Mostra prossegue agora remota, com poucas sessões presenciais. E, diferentemente de anos anteriores, quando havia uma grade de programação, os filmes em 2020 estão disponíveis em bloco – de todos os 197, justamente o Michel Franco esteve disponível por um único dia, só na sexta. No site www.mostra.org, encontram-se todas as informações sobre como adquirir ingressos e onde ver – pela plataforma Mostra Play – os títulos selecionados.Mães de Verdade é sobre um casal impossibilitado de ter filhos. Eles arranjam uma barriga de aluguel, têm o seu bebê e tudo parece perfeito – exceto pelo fato de a mãe biológica reaparecer para reclamar a criança. Impossível não pensar em outro grande japonês, Hirokazu Kore-eda, que tem abordado temas relativos à família. Já nos anos 1950 e 60, Yasujiro Ozu construiu toda uma obra abordando as transformações da família tradicional japonesa. Por maiores que sejam certas similaridades, o inconfundível estilo de Ozu – sua câmera colocada no ponto de vista de um observador sentado na esteira de tatame – faz dos seus filmes experiências únicas. Kore-eda, de alguma forma, em Pai e Filho e Assunto de Família, aborda o mesmo tema de Naomi, o conflito entre instinto e cultura, entre família biológica e adotiva. Mas Kore-eda, até por ser homem, filma o drama de pais, no masculino. Será? “Entendo o que você quer dizer. Sou mulher, faço filmes sobre mães, ele é homem, focaliza o tema do ângulo dos pais. A verdade é que as coisas não são tão simples, nem se resumem a uma questão de gênero. Creio e espero que meus filmes reflitam isso, que todo homem pode ter uma porção feminina e toda mulher, uma masculina. É isso que faz de nós, seres humanos, criaturas tão complexas e fascinantes.” E tem mais: “Não se trata exclusivamente de um problema japonês. Na época de Ozu, as coisas já estavam mudando. Na verdade, o mundo que se desenhou após a 2.ª Guerra mudou muita coisa, no Japão inclusive”. Ela prossegue: “As mulheres tornaram-se mais independentes. Talvez isso aparentemente seja menos perceptível no Japão, mas aqui também. Muitas mulheres começaram a deixar para ter filhos mais tarde, e o relógio biológico criou uma impossibilidade de procriar para elas. Outros casais, como o do filme, não podem ter filhos. Têm tudo, mas não o que querem. Achei que seria interessante colocar os temas que encontrei no livro de Mizuki Tsujimura, mas terminei mudando muita coisa”. Segundo a própria diretora, seu tema é a (in)fertilidade e a adoção, que permanece um tabu no país. “É parte da nossa herança tradicional. Mulheres foram feitas para procriar. Cria-se um preconceito quando não conseguem.” O filme é o melhor entre as obras mais recentes da autora de A Floresta dos Lamentos. Impossível não falar em outro assunto – a Olimpíada que foi cancelada e passou para 2021. Naomi fará o filme oficial desses Jogos Olímpicos, como Kon Ichikawa fez o de 1964, quando a Olimpíada também foi em Tóquio. Ela conta que vinha filmando desde o ano passado e, agora, com a pandemia, repensa o trabalho. “Não dá para esperar que eu recomece só no ano que vem. Esse ano de espera vai repercutir na organização, nos atletas. O tempo será personagem.” A natureza? “Todos os meus filmes de alguma forma também falam de natureza. A floresta, o mar. A humanidade está maltratando a natureza. Ela se vinga. Um vírus que nem conseguimos enxergar está causando todo esse estrago. É tempo de pensar no que é importante de verdade.”

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