Mostra de Cinema Noir exibe oito filmes lendários no Belas Artes


Filmes como 'Relíquia Macabra' e 'À Beira do Abismo' estão na programação da Mostra de Cinema Noir

Por Luiz Zanin Oricchio

O Petra Belas Artes apresenta, até dia 24, uma seleta Mostra de Cinema Noir. São oito filmes representativos do gênero, incluindo obras lendárias como Relíquia Macabra e À Beira do Abismo.

Cena de 'Pacto de Sangue',com Fred MacMurray e Barbara Stanwyck Foto: Paramount

 É do escritor Dashiell Hammett o original de Relíquia Macabra (The Maltese Falcon, 1941). Temos aqui uma figura clássica do noir, o detetive Sam Spade, vivido pelo carismático Humphrey Bogart. Talvez Bogart seja o ator “noir” por excelência, com seu rosto duro, em geral fotografado entre luz e sombras, envolto na fumaça do seu cigarro. Na história, uma mulher misteriosa (no noir elas sempre são misteriosas), interpretada por Mary Astor, o procura por estar sendo ameaçada. A trama envolve a busca de uma estatueta cobiçada por todos. 

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Bogart aparecerá também na pele de Philip Marlowe, detetive criado por Raymond Chandler. Em À Beira do Abismo (1946), de Howard Hawks, ele é contratado por um general doente, Sternwood (Charles Waldron) para proteger sua filha Carmem (Martha Vickers), vítima de chantagem. Mas outra figura feminina se impõe - a irmã de Carmen, Vivien, interpretada por Lauren Bacall, a femme fatale por excelência. A trama intrincada deu origem a uma lenda em Hollywood. O produtor do filme teria oferecido mil dólares a quem conseguisse lhe explicar o enredo. Ninguém apareceu para apanhar o dinheiro. O roteiro é de William Faulkner, um dos gênios da literatura norte-americana. É labiríntico, encantador, cheio de diálogos ferinos e de duplo sentido. O fato de ser incompreensível não lhe tira o mérito.

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Os estudiosos colocam entre as fontes do noir não apenas a crise social dos Estados Unidos na época, mas a importação de talentos europeus por Hollywood. Com a ameaça da perseguição nazista, vários deles se mudaram para Los Angeles e fertilizaram a indústria cinematográfica com seu conhecimento do expressionismo alemão. Sem eles, o noir não teria existido. Ou teria sido outra coisa. 

Um deles, o grande Fritz Lang, assina o soturno Fúria, em que Joe Wilson (Spencer Tracy) é confundido com um sequestrador de crianças e uma multidão tenta linchá-lo. O filme é de 1936 e Lang lida com temas parecidos ao de sua obra-prima, feita ainda na Alemanha e prenúncio do nazismo, M: o Vampiro de Dusseldorf (1931). 

Outro desses grandes imigrantes é o austríaco Billy Wilder, presente na mostra com Pacto de Sangue (Double Indemnity, 1944), também considerado um dos títulos representativos do noir. Temos aqui um vendedor de seguros, Walter Neff (Fred MacMurray) seduzido por Phyllis Dietrichson (Barbara Stanwyck) para cometer um crime. A ideia é livrar-se do marido de Phyllis, mas de modo que o seguro de vida seja pago em dobro. 

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Também de origem austríaca (embora nascido na Ucrânia) Otto Preminger é celebrado por um título emblemático do gênero, Laura. A história é curiosa porque começa com a investigação da morte da misteriosa Laura Hunt (Gene Tierney), diretora de uma agência de propaganda cujo rosto foi desfigurado por um tiro de espingarda. Como bom noir, este também esconde a verdade sob vários véus de engano. A música-tema, de David Raksin, tornou-se um standard da canção americana. 

Diretores famosos como Raoul Walsh e Robert Aldrich também se exercitaram no noir. O primeiro com Dentro da Noite (They Drive by Night, 1940), com George Raft e Humphrey Bogart fazendo dois irmãos arrastados, por acidente, a um caminho destrutivo. O segundo, com o célebreA Morte num Beijo (Kiss me Deadly, 1955), com o detetive Mike Hammer (Ralph Meeker) deparando-se com uma loura vestida apenas com um casaco (Cloris Leachman), encontro com desdobramentos surpreendentes. 

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Em O Assassino Mora no 21 (L’Assassin Habite au...21, 1942), Henri-Georges Clouzot prova como o noir atravessa bem o Atlântico e se ambienta com facilidade na França. O caso é o de um assassino em série que costuma deixar cartões de visita junto aos corpos das vítimas. Será perseguido pelo inspetor Wens (Pierre Fresnay).

O noir é, até hoje, um tipo de cinema muito a gosto do cinéfilo. Sua estética sombria, noturna, urbana, povoada por personagens ambíguos, continua a fascinar certo tipo de público. Gênero maduro, envelheceu bem e de vez em quando ressurge em filhos temporões. Polanski (Chinatown, 1974), Lawrence Kasdan (Corpos Ardentes, 1981) e Quentin Tarantino (Cães de Aluguel, 1992) são exemplos. Homens durões e mulheres fatais são seus melhores personagens. Trocam frases cortantes e impiedosas. Emoção e romance podem rolar entre eles, mas sem jamais cair na pieguice. É uma estética de gente dura, melancólica e realista. Ninguém choraminga. Fuma-se e bebe-se o tempo todo. O noir, cujo ápice se dá entre as décadas de 1930 e 1950, reflete uma América atormentada pela crise econômica iniciada em 1929, com seus problemas sociais e na qual a fronteira entre atividades legais e criminosas parece muito difusa. É um cinema adulto, para gente grande. 

O Petra Belas Artes apresenta, até dia 24, uma seleta Mostra de Cinema Noir. São oito filmes representativos do gênero, incluindo obras lendárias como Relíquia Macabra e À Beira do Abismo.

Cena de 'Pacto de Sangue',com Fred MacMurray e Barbara Stanwyck Foto: Paramount

 É do escritor Dashiell Hammett o original de Relíquia Macabra (The Maltese Falcon, 1941). Temos aqui uma figura clássica do noir, o detetive Sam Spade, vivido pelo carismático Humphrey Bogart. Talvez Bogart seja o ator “noir” por excelência, com seu rosto duro, em geral fotografado entre luz e sombras, envolto na fumaça do seu cigarro. Na história, uma mulher misteriosa (no noir elas sempre são misteriosas), interpretada por Mary Astor, o procura por estar sendo ameaçada. A trama envolve a busca de uma estatueta cobiçada por todos. 

Bogart aparecerá também na pele de Philip Marlowe, detetive criado por Raymond Chandler. Em À Beira do Abismo (1946), de Howard Hawks, ele é contratado por um general doente, Sternwood (Charles Waldron) para proteger sua filha Carmem (Martha Vickers), vítima de chantagem. Mas outra figura feminina se impõe - a irmã de Carmen, Vivien, interpretada por Lauren Bacall, a femme fatale por excelência. A trama intrincada deu origem a uma lenda em Hollywood. O produtor do filme teria oferecido mil dólares a quem conseguisse lhe explicar o enredo. Ninguém apareceu para apanhar o dinheiro. O roteiro é de William Faulkner, um dos gênios da literatura norte-americana. É labiríntico, encantador, cheio de diálogos ferinos e de duplo sentido. O fato de ser incompreensível não lhe tira o mérito.

Os estudiosos colocam entre as fontes do noir não apenas a crise social dos Estados Unidos na época, mas a importação de talentos europeus por Hollywood. Com a ameaça da perseguição nazista, vários deles se mudaram para Los Angeles e fertilizaram a indústria cinematográfica com seu conhecimento do expressionismo alemão. Sem eles, o noir não teria existido. Ou teria sido outra coisa. 

Um deles, o grande Fritz Lang, assina o soturno Fúria, em que Joe Wilson (Spencer Tracy) é confundido com um sequestrador de crianças e uma multidão tenta linchá-lo. O filme é de 1936 e Lang lida com temas parecidos ao de sua obra-prima, feita ainda na Alemanha e prenúncio do nazismo, M: o Vampiro de Dusseldorf (1931). 

Outro desses grandes imigrantes é o austríaco Billy Wilder, presente na mostra com Pacto de Sangue (Double Indemnity, 1944), também considerado um dos títulos representativos do noir. Temos aqui um vendedor de seguros, Walter Neff (Fred MacMurray) seduzido por Phyllis Dietrichson (Barbara Stanwyck) para cometer um crime. A ideia é livrar-se do marido de Phyllis, mas de modo que o seguro de vida seja pago em dobro. 

Também de origem austríaca (embora nascido na Ucrânia) Otto Preminger é celebrado por um título emblemático do gênero, Laura. A história é curiosa porque começa com a investigação da morte da misteriosa Laura Hunt (Gene Tierney), diretora de uma agência de propaganda cujo rosto foi desfigurado por um tiro de espingarda. Como bom noir, este também esconde a verdade sob vários véus de engano. A música-tema, de David Raksin, tornou-se um standard da canção americana. 

Diretores famosos como Raoul Walsh e Robert Aldrich também se exercitaram no noir. O primeiro com Dentro da Noite (They Drive by Night, 1940), com George Raft e Humphrey Bogart fazendo dois irmãos arrastados, por acidente, a um caminho destrutivo. O segundo, com o célebreA Morte num Beijo (Kiss me Deadly, 1955), com o detetive Mike Hammer (Ralph Meeker) deparando-se com uma loura vestida apenas com um casaco (Cloris Leachman), encontro com desdobramentos surpreendentes. 

Em O Assassino Mora no 21 (L’Assassin Habite au...21, 1942), Henri-Georges Clouzot prova como o noir atravessa bem o Atlântico e se ambienta com facilidade na França. O caso é o de um assassino em série que costuma deixar cartões de visita junto aos corpos das vítimas. Será perseguido pelo inspetor Wens (Pierre Fresnay).

O noir é, até hoje, um tipo de cinema muito a gosto do cinéfilo. Sua estética sombria, noturna, urbana, povoada por personagens ambíguos, continua a fascinar certo tipo de público. Gênero maduro, envelheceu bem e de vez em quando ressurge em filhos temporões. Polanski (Chinatown, 1974), Lawrence Kasdan (Corpos Ardentes, 1981) e Quentin Tarantino (Cães de Aluguel, 1992) são exemplos. Homens durões e mulheres fatais são seus melhores personagens. Trocam frases cortantes e impiedosas. Emoção e romance podem rolar entre eles, mas sem jamais cair na pieguice. É uma estética de gente dura, melancólica e realista. Ninguém choraminga. Fuma-se e bebe-se o tempo todo. O noir, cujo ápice se dá entre as décadas de 1930 e 1950, reflete uma América atormentada pela crise econômica iniciada em 1929, com seus problemas sociais e na qual a fronteira entre atividades legais e criminosas parece muito difusa. É um cinema adulto, para gente grande. 

O Petra Belas Artes apresenta, até dia 24, uma seleta Mostra de Cinema Noir. São oito filmes representativos do gênero, incluindo obras lendárias como Relíquia Macabra e À Beira do Abismo.

Cena de 'Pacto de Sangue',com Fred MacMurray e Barbara Stanwyck Foto: Paramount

 É do escritor Dashiell Hammett o original de Relíquia Macabra (The Maltese Falcon, 1941). Temos aqui uma figura clássica do noir, o detetive Sam Spade, vivido pelo carismático Humphrey Bogart. Talvez Bogart seja o ator “noir” por excelência, com seu rosto duro, em geral fotografado entre luz e sombras, envolto na fumaça do seu cigarro. Na história, uma mulher misteriosa (no noir elas sempre são misteriosas), interpretada por Mary Astor, o procura por estar sendo ameaçada. A trama envolve a busca de uma estatueta cobiçada por todos. 

Bogart aparecerá também na pele de Philip Marlowe, detetive criado por Raymond Chandler. Em À Beira do Abismo (1946), de Howard Hawks, ele é contratado por um general doente, Sternwood (Charles Waldron) para proteger sua filha Carmem (Martha Vickers), vítima de chantagem. Mas outra figura feminina se impõe - a irmã de Carmen, Vivien, interpretada por Lauren Bacall, a femme fatale por excelência. A trama intrincada deu origem a uma lenda em Hollywood. O produtor do filme teria oferecido mil dólares a quem conseguisse lhe explicar o enredo. Ninguém apareceu para apanhar o dinheiro. O roteiro é de William Faulkner, um dos gênios da literatura norte-americana. É labiríntico, encantador, cheio de diálogos ferinos e de duplo sentido. O fato de ser incompreensível não lhe tira o mérito.

Os estudiosos colocam entre as fontes do noir não apenas a crise social dos Estados Unidos na época, mas a importação de talentos europeus por Hollywood. Com a ameaça da perseguição nazista, vários deles se mudaram para Los Angeles e fertilizaram a indústria cinematográfica com seu conhecimento do expressionismo alemão. Sem eles, o noir não teria existido. Ou teria sido outra coisa. 

Um deles, o grande Fritz Lang, assina o soturno Fúria, em que Joe Wilson (Spencer Tracy) é confundido com um sequestrador de crianças e uma multidão tenta linchá-lo. O filme é de 1936 e Lang lida com temas parecidos ao de sua obra-prima, feita ainda na Alemanha e prenúncio do nazismo, M: o Vampiro de Dusseldorf (1931). 

Outro desses grandes imigrantes é o austríaco Billy Wilder, presente na mostra com Pacto de Sangue (Double Indemnity, 1944), também considerado um dos títulos representativos do noir. Temos aqui um vendedor de seguros, Walter Neff (Fred MacMurray) seduzido por Phyllis Dietrichson (Barbara Stanwyck) para cometer um crime. A ideia é livrar-se do marido de Phyllis, mas de modo que o seguro de vida seja pago em dobro. 

Também de origem austríaca (embora nascido na Ucrânia) Otto Preminger é celebrado por um título emblemático do gênero, Laura. A história é curiosa porque começa com a investigação da morte da misteriosa Laura Hunt (Gene Tierney), diretora de uma agência de propaganda cujo rosto foi desfigurado por um tiro de espingarda. Como bom noir, este também esconde a verdade sob vários véus de engano. A música-tema, de David Raksin, tornou-se um standard da canção americana. 

Diretores famosos como Raoul Walsh e Robert Aldrich também se exercitaram no noir. O primeiro com Dentro da Noite (They Drive by Night, 1940), com George Raft e Humphrey Bogart fazendo dois irmãos arrastados, por acidente, a um caminho destrutivo. O segundo, com o célebreA Morte num Beijo (Kiss me Deadly, 1955), com o detetive Mike Hammer (Ralph Meeker) deparando-se com uma loura vestida apenas com um casaco (Cloris Leachman), encontro com desdobramentos surpreendentes. 

Em O Assassino Mora no 21 (L’Assassin Habite au...21, 1942), Henri-Georges Clouzot prova como o noir atravessa bem o Atlântico e se ambienta com facilidade na França. O caso é o de um assassino em série que costuma deixar cartões de visita junto aos corpos das vítimas. Será perseguido pelo inspetor Wens (Pierre Fresnay).

O noir é, até hoje, um tipo de cinema muito a gosto do cinéfilo. Sua estética sombria, noturna, urbana, povoada por personagens ambíguos, continua a fascinar certo tipo de público. Gênero maduro, envelheceu bem e de vez em quando ressurge em filhos temporões. Polanski (Chinatown, 1974), Lawrence Kasdan (Corpos Ardentes, 1981) e Quentin Tarantino (Cães de Aluguel, 1992) são exemplos. Homens durões e mulheres fatais são seus melhores personagens. Trocam frases cortantes e impiedosas. Emoção e romance podem rolar entre eles, mas sem jamais cair na pieguice. É uma estética de gente dura, melancólica e realista. Ninguém choraminga. Fuma-se e bebe-se o tempo todo. O noir, cujo ápice se dá entre as décadas de 1930 e 1950, reflete uma América atormentada pela crise econômica iniciada em 1929, com seus problemas sociais e na qual a fronteira entre atividades legais e criminosas parece muito difusa. É um cinema adulto, para gente grande. 

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