Tarantino pinta retrato pop da violência nos EUA em 'Os Oito Odiados'


Apuro da imagem, diálogos espertos e confrontos armados são alguns trunfos do filme

Por Luiz Zanin Oricchio

Os Oito Odiados vem colhendo opiniões desencontradas. Um Tarantino menor? Autorreferente e plágio de si mesmo? Desenvolvimento lógico de sua obra? Todos têm um pouco de razão. Mas parece que existe um estigma que persegue autores com carreiras consolidadas. Se a sua “assinatura” é apreciada, queremos reconhecê-la a cada novo trabalho. Mas, junto a esse reconhecimento de um estilo que se repete, vem certa frustração, pois não sentimos mais o impacto da novidade trazida pelos primeiros filmes. Assim, nada trará de volta o frescor de Cães de Aluguel ou Pulp Fiction. É a vida.  Mas, dito isso, o que temos em Os Oito Odiados é, sem dúvida, um exemplar típico de Tarantino. Há, por exemplo, o exercício de cinefilia que o faz filmar no formato de 70 mm, infelizmente reprodutível em poucas salas - ao que parece, no Brasil, em nenhuma. De qualquer forma, mesmo no digital, as imagens de abertura, com a câmera fixada e depois se afastando levemente de uma cruz coberta de neve, são de arrepiar. “Aqui temos cinema”, não se pode deixar de pensar.  Mas além desse apuro da imagem, há os outros elementos de linguagem de Tarantino que não deixam de comparecer. O diálogo esperto e abundante entre os personagens. As situações de impasse em confrontos armados. O vaivém no tempo como forma de estruturar a narrativa não linear. Pode-se até mesmo apontar a presença de um ator fetiche, Samuel L. Jackson, e a disposição de Tarantino em “reciclar” nomes conhecidos, fazendo-os interpretar papéis fora dos clichês a que foram aprisionados, como é o caso de Jennifer Jason Leigh.

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Tudo é Tarantino e, em sendo, flui em seu ritmo próprio, fazendo o espectador não perceber que o filme tem quase três horas de duração. Esse tempo voa, mesmo porque muita coisa acontece, ainda que, para efeito de dramaturgia, o diretor use um espaço fechado a maior parte das cenas. Os personagens se encontram numa hospedaria do Wyoming, cercada de gelo por todos os lados. Nesse confinamento se reúnem dois caçadores de recompensas, John Ruth (Kurt Russel) e Marquis Warren (Samuel L. Jackson), a condenada à forca Daisy Domergue (Jennifer Jason Leigh), um xerife novato, Chris Mannix (Walton Goggins), o general Sandy Smithers (Bruce Dern), o carrasco Oswaldo Mobray (Tim Roth), um caubói, Joe Gage (Michael Madsen) e um empregado mexicano, Bob (Demián Bichir). Oito no total, que deveriam receber a denominação de “odiosos” (hateful) e não de odiados, conforme o título nacional.  Estranhas relações se estabelecem entre esses personagens e o filme volta ao início (como se rebobinasse a fita) para estabelecer as nuances intersubjetivas da história. O roteiro é complexo. A exemplo de outros, Tarantino não se preocupa em evitar situações inverossímeis. Como se o diretor confiasse numa arte capaz de criação de uma verossimilhança interna, no que está certo.  Tarantino não é um intelectual, o que não deixa de ter suas vantagens. Não fica preso a ideias nem tenta colocar a dramaturgia a serviço de teses. Em lugar delas, dispõe de intuições interessantes - no caso um certo vale-tudo pós Guerra Civil, bastante institucionalizado, que está na origem da sociedade norte-americana moderna. Para quem quiser enxergar, o filme vai muito além do mero entretenimento. E, talvez, à revelia do próprio Tarantino.

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Os Oito Odiados vem colhendo opiniões desencontradas. Um Tarantino menor? Autorreferente e plágio de si mesmo? Desenvolvimento lógico de sua obra? Todos têm um pouco de razão. Mas parece que existe um estigma que persegue autores com carreiras consolidadas. Se a sua “assinatura” é apreciada, queremos reconhecê-la a cada novo trabalho. Mas, junto a esse reconhecimento de um estilo que se repete, vem certa frustração, pois não sentimos mais o impacto da novidade trazida pelos primeiros filmes. Assim, nada trará de volta o frescor de Cães de Aluguel ou Pulp Fiction. É a vida.  Mas, dito isso, o que temos em Os Oito Odiados é, sem dúvida, um exemplar típico de Tarantino. Há, por exemplo, o exercício de cinefilia que o faz filmar no formato de 70 mm, infelizmente reprodutível em poucas salas - ao que parece, no Brasil, em nenhuma. De qualquer forma, mesmo no digital, as imagens de abertura, com a câmera fixada e depois se afastando levemente de uma cruz coberta de neve, são de arrepiar. “Aqui temos cinema”, não se pode deixar de pensar.  Mas além desse apuro da imagem, há os outros elementos de linguagem de Tarantino que não deixam de comparecer. O diálogo esperto e abundante entre os personagens. As situações de impasse em confrontos armados. O vaivém no tempo como forma de estruturar a narrativa não linear. Pode-se até mesmo apontar a presença de um ator fetiche, Samuel L. Jackson, e a disposição de Tarantino em “reciclar” nomes conhecidos, fazendo-os interpretar papéis fora dos clichês a que foram aprisionados, como é o caso de Jennifer Jason Leigh.

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Tudo é Tarantino e, em sendo, flui em seu ritmo próprio, fazendo o espectador não perceber que o filme tem quase três horas de duração. Esse tempo voa, mesmo porque muita coisa acontece, ainda que, para efeito de dramaturgia, o diretor use um espaço fechado a maior parte das cenas. Os personagens se encontram numa hospedaria do Wyoming, cercada de gelo por todos os lados. Nesse confinamento se reúnem dois caçadores de recompensas, John Ruth (Kurt Russel) e Marquis Warren (Samuel L. Jackson), a condenada à forca Daisy Domergue (Jennifer Jason Leigh), um xerife novato, Chris Mannix (Walton Goggins), o general Sandy Smithers (Bruce Dern), o carrasco Oswaldo Mobray (Tim Roth), um caubói, Joe Gage (Michael Madsen) e um empregado mexicano, Bob (Demián Bichir). Oito no total, que deveriam receber a denominação de “odiosos” (hateful) e não de odiados, conforme o título nacional.  Estranhas relações se estabelecem entre esses personagens e o filme volta ao início (como se rebobinasse a fita) para estabelecer as nuances intersubjetivas da história. O roteiro é complexo. A exemplo de outros, Tarantino não se preocupa em evitar situações inverossímeis. Como se o diretor confiasse numa arte capaz de criação de uma verossimilhança interna, no que está certo.  Tarantino não é um intelectual, o que não deixa de ter suas vantagens. Não fica preso a ideias nem tenta colocar a dramaturgia a serviço de teses. Em lugar delas, dispõe de intuições interessantes - no caso um certo vale-tudo pós Guerra Civil, bastante institucionalizado, que está na origem da sociedade norte-americana moderna. Para quem quiser enxergar, o filme vai muito além do mero entretenimento. E, talvez, à revelia do próprio Tarantino.

Os Oito Odiados vem colhendo opiniões desencontradas. Um Tarantino menor? Autorreferente e plágio de si mesmo? Desenvolvimento lógico de sua obra? Todos têm um pouco de razão. Mas parece que existe um estigma que persegue autores com carreiras consolidadas. Se a sua “assinatura” é apreciada, queremos reconhecê-la a cada novo trabalho. Mas, junto a esse reconhecimento de um estilo que se repete, vem certa frustração, pois não sentimos mais o impacto da novidade trazida pelos primeiros filmes. Assim, nada trará de volta o frescor de Cães de Aluguel ou Pulp Fiction. É a vida.  Mas, dito isso, o que temos em Os Oito Odiados é, sem dúvida, um exemplar típico de Tarantino. Há, por exemplo, o exercício de cinefilia que o faz filmar no formato de 70 mm, infelizmente reprodutível em poucas salas - ao que parece, no Brasil, em nenhuma. De qualquer forma, mesmo no digital, as imagens de abertura, com a câmera fixada e depois se afastando levemente de uma cruz coberta de neve, são de arrepiar. “Aqui temos cinema”, não se pode deixar de pensar.  Mas além desse apuro da imagem, há os outros elementos de linguagem de Tarantino que não deixam de comparecer. O diálogo esperto e abundante entre os personagens. As situações de impasse em confrontos armados. O vaivém no tempo como forma de estruturar a narrativa não linear. Pode-se até mesmo apontar a presença de um ator fetiche, Samuel L. Jackson, e a disposição de Tarantino em “reciclar” nomes conhecidos, fazendo-os interpretar papéis fora dos clichês a que foram aprisionados, como é o caso de Jennifer Jason Leigh.

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Tudo é Tarantino e, em sendo, flui em seu ritmo próprio, fazendo o espectador não perceber que o filme tem quase três horas de duração. Esse tempo voa, mesmo porque muita coisa acontece, ainda que, para efeito de dramaturgia, o diretor use um espaço fechado a maior parte das cenas. Os personagens se encontram numa hospedaria do Wyoming, cercada de gelo por todos os lados. Nesse confinamento se reúnem dois caçadores de recompensas, John Ruth (Kurt Russel) e Marquis Warren (Samuel L. Jackson), a condenada à forca Daisy Domergue (Jennifer Jason Leigh), um xerife novato, Chris Mannix (Walton Goggins), o general Sandy Smithers (Bruce Dern), o carrasco Oswaldo Mobray (Tim Roth), um caubói, Joe Gage (Michael Madsen) e um empregado mexicano, Bob (Demián Bichir). Oito no total, que deveriam receber a denominação de “odiosos” (hateful) e não de odiados, conforme o título nacional.  Estranhas relações se estabelecem entre esses personagens e o filme volta ao início (como se rebobinasse a fita) para estabelecer as nuances intersubjetivas da história. O roteiro é complexo. A exemplo de outros, Tarantino não se preocupa em evitar situações inverossímeis. Como se o diretor confiasse numa arte capaz de criação de uma verossimilhança interna, no que está certo.  Tarantino não é um intelectual, o que não deixa de ter suas vantagens. Não fica preso a ideias nem tenta colocar a dramaturgia a serviço de teses. Em lugar delas, dispõe de intuições interessantes - no caso um certo vale-tudo pós Guerra Civil, bastante institucionalizado, que está na origem da sociedade norte-americana moderna. Para quem quiser enxergar, o filme vai muito além do mero entretenimento. E, talvez, à revelia do próprio Tarantino.

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