Todo mundo sabe que Glen Powell é a próxima grande estrela de cinema. Não sabe?


Ator que começou nas telas como “o menino de dedos longos” desponta ao estrelato hollywoodiano, agora em ‘Twisters’

Por Sonia Rao
Glen Powell em 'Twisters' Foto: Divulgação/Universal Pictures

Glen Powell aponta para o asfalto onde seus sonhos quase foram destruídos.

Ele tinha 13 anos e estava jogando basquete neste mesmo estacionamento do Austin Studios com outros atores mirins do terceiro filme Pequenos Espiões, quando derrubou sem querer um de seus colegas de elenco. Era um intervalo nas filmagens da popular franquia infantil, na qual Powell, cujo personagem aparece nos créditos simplesmente como “menino de dedos longos”, estava trabalhando apenas naquele dia. Era seu primeiro trabalho como ator. Será que algum dia ele poderia entrar num set de filmagem de novo?

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O garoto ficou bem. E Powell também.

Ao relatar essa lembrança numa tarde de maio, parece ridículo que ele tenha se preocupado com o risco de um acidente como aquele atrapalhar sua carreira de ator. Mas Powell sempre olhou adiante. Ele sabe que o que você faz no presente pode determinar seu futuro. Ao que parece, isso se manifestou como ansiedade durante sua infância. Quando adulto, virou perspicácia nos negócios.

Isso talvez ajude a explicar por que Powell, 35 anos, parece estar em toda parte este ano. Ele brilha nas capas das revistas. Ele entra sorrateiramente em todos os seus feeds de redes sociais. Ele aparece em programas de entrevistas, onde diz a Gayle King que não está atrás de amor, mas que vai aceitar se “bater à minha porta”.

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Powell não só ganhou credibilidade entre os críticos ao se tornar uma arma frequente no arsenal de Richard Linklater – mais recentemente na comédia de ação Assassino por Acaso, cujo roteiro tem a assinatura do ator – como também pode estar à beira do estrelato com um blockbuster. Depois de um papel coadjuvante que chamou a atenção no sucesso Top Gun: Maverick, Powell estrela o filme de desastre Twisters, a sequência de Lee Isaac Chung para o hit de Jan de Bont com Helen Hunt e Bill Paxton, de 1996.

Não é fácil tomar o lugar de Paxton, admirado por dar uma humanidade palpável a grandes produções. Os céticos levantam a sobrancelha para Powell, que vem sendo descrito como o novo Matthew McConaughey por causa do sorriso largo, do rosto talhado em madeira e do carisma texano. Ele já está pronto para expandir seu currículo com uma lista diversificada de projetos de cinema e televisão – além de um possível musical na Broadway – e tem um caderno cheio de conselhos de nomes como Tom Cruise. Mas será que isso se traduz em trajetória? Powell vai ser o próximo McConaughey ou Cruise? Será que ele pode se tornar um Paul Newman ou um Robert Redford, ganhando um respeito artístico equivalente ao seu queixo e à potência do seu sorriso?

Se você perguntar para os especialistas – digamos, uma ou duas ou oito pessoas que trabalharam com Powell em algum momento de seus 22 anos de carreira – eles vão dizer que isso não é fogo de palha. Segundo eles, Powell é um dos atores mais esforçados por aí. Ele faz questão de conhecer cada pessoa no set. Ele é o cara.

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Mas em Hollywood, como o próprio Powell sabe faz muito tempo, nada é garantido.

“Tem muita conversa por aí, e eu tive que responder à pergunta: Glen é um astro de cinema?”, diz Linklater. “Qualquer pessoa que tenha trabalhado com Glen nos últimos dez anos sabe que ele é um astro de cinema. Sem a menor dúvida. A questão mais importante é se tem espaço na cultura para um novo astro de cinema”.

Recentemente, o Hollywood Reporter considerou Powell um membro da “nova lista A”, graças ao “golpe duplo” do queridinho dos festivais Assassino por Acaso e da comédia romântica Todos Menos Você, que arrecadou US$ 220 milhões no mundo todo – números inéditos para o gênero.

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Mas nesta era de franquias de super-heróis e obscuros algoritmos de streaming, a definição tradicional de astro de cinema – alguém que consegue segurar um fim de semana de estreia – parece quase extinta. Embora a Netflix afirme que Assassino por Acaso teve um bom desempenho, entrando no seu top 10 global por três semanas seguidas, Powell ainda não é um protagonista comprovado nas bilheterias. A Universal está posicionando Twisters como sua grande aposta, confiando no efeito de suas estrelas e do espetáculo.

O destino do filme pode definir o destino de Powell.

No ano passado, Powell encontrou uma parceira de negócios valiosa em Sydney Sweeney, estrela de Todos Menos Você. Ele concordou com a ideia dela de alimentar rumores (falsos) de namoro como um jeito de os dois continuarem aparecendo nas manchetes durante o período que antecedeu o lançamento da comédia romântica.

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Essa parte do plano deu certo, mas o filme ainda estava devagar nas bilheterias. (Depois de faturar apenas US$ 6 milhões no fim de semana de estreia, virou um sucesso mundial). O roteirista e diretor Will Gluck atribui naturalmente o impulso ao fato de o público ter se “apaixonado por Syd e Glen”, o que exigiu que seres humanos extraordinariamente bonitos parecessem… bem, como qualquer um de nós.

“Quando se tem alguém com a beleza de Glen, é preciso que o personagem também seja mais modesto”, diz Gluck. “É difícil fazer isso. Tive longas conversas com Glen sobre como eu gostaria que ele interpretasse esse personagem. ‘Até onde você está disposto a ir para baixar um pouco o seu brilho?’ Ele estava 100% disposto”.

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Embora alguns atores possam se esquivar das comédias românticas, com receio de serem enquadrados como um tipo de específico de personagem ou de não serem levados a sério, Powell reconhece o poder de permanência do gênero. Ele foi criado no noroeste de Austin, filho do meio entre duas irmãs, Lauren e Leslie.

Os irmãos Powell assistiam e reassistiam a filmes como 10 Coisas que Eu Odeio em Você e Como Perder um Homem em 10 Dias. No Austin Studios, Powell argumenta sinceramente que as comédias românticas são “a linguagem cinematográfica mais universal”, porque “todos nós compartilhamos o desejo de amar e ser amados”.

É claro que o amor tende a ser confuso e imperfeito – e as comédias românticas só funcionam se os personagens centrais também se revelarem confusos e imperfeitos. Como protagonista no gênero, diz Powell, “você está lá para parecer meio tonto e para se divertir e para ser vulnerável. É isso”. Não tem muito espaço para orgulho ou ego. Você tem que entrar na brincadeira.

Powell estourou com outra comédia romântica: o filme da Netflix O Plano Imperfeito (2018), no qual ele e Zoey Deutch interpretam assistentes sobrecarregados que tentam aliviar sua carga de trabalho fazendo seus chefes temperamentais se apaixonarem um pelo outro. O personagem de Powell é um carinha do mercado financeiro. A roteirista Katie Silberman diz que o “calor inerente” do ator permite que ele prospere “quando interpreta um babaca – pelo menos no começo – porque você se importa tanto com ele que torce para ele conseguir o que quer”.

É como Tom Hanks em Mensagem para Você, diz ela. Só ele mesmo para fazer você torcer pelo vilão.

“Tem um ditado que diz: para fazer papel de burro, você tem que ser muito esperto e, para fazer papel de malvado, você tem que ser muito bonzinho”, continua Silberman. “Ele tem uma alegria e um calor tão profundos e inegáveis que você pode pegar isso e ir para onde quiser”.

Essa qualidade é um trunfo em qualquer gênero, até mesmo em filmes de catástrofe. Para escolher a pessoa certa para o papel de Tyler Owens em Twisters, um autodenominado “domador de tornados” cujas artimanhas de perseguição a tempestades acumularam muitos seguidores no YouTube, Chung (Minari) estava procurando um ator com um “profundo poço de empatia, seriedade e bondade” para equilibrar a arrogância. Ele não tinha certeza se Powell era esse cara. Mas aí Chung se deparou com uma das aparições de Powell em um programa matinal.

Powell trouxera o pai e a mãe, Glen pai e Cyndy, que há muito apoiam sua carreira de ator – a ponto de terem feito até aparições especiais em seus projetos. (Cyndy, dona de casa que foi empresária do filho desde o início, aparece como espiã no filme Pequenos Espiões, por exemplo; anos depois, ela e Glen pai interpretaram passageiros de avião numa cena de Todos Menos Você). Quando viu Powell fazendo palhaçada com os pais, Chung percebeu o que o ator poderia trazer para Twisters.

“De repente, vi esse lado dele que realmente revela quem ele é como pessoa – sua criação e seu relacionamento com a família”, diz Chung. “Por trás de tudo, ele tem uma humanidade profunda”.

Os pais adoram se gabar dos filhos, mas Cyndy faz questão de trazer evidências. Certa vez, a professora de Powell no jardim de infância disse que ele tinha uma presença notável e que “ou seria ator ou presidente”, diz ela. (Talvez ele venha a ser as duas coisas, do jeito que todo mundo fala desse cara. Ele tem 35 anos).

Quando Powell entregou um trabalho de poesia no ensino médio, a professora suspeitou que era plágio porque, segundo ela, “não é possível que um aluno dessa idade tenha escrito isso”. Ela chamou os pais de Powell e pediu que ele escrevesse outro poema sentado à vista deles. A professora leu-o e disse, como Cyndy lembra: “Eu realmente preciso me desculpar com você e com Glen”.

O lema da família sempre foi “avançar em todas as frentes”, diz Cyndy. Quando as crianças demonstravam interesse em algo novo, ela e o pai, coach executivo para empresas, as incentivavam a experimentar. Powell era uma criança atlética, mas também andava por aí com uma câmera de vídeo. Depois que ele conseguiu um agente e foi escalado para o filme Pequenos Espiões 3: Game Over, Cyndy o acompanhou até o Austin Studios, onde ele ficava rodeando as pessoas que trabalhavam nos bastidores, prestando atenção ao que faziam.

Glen Powell como Gary Johnson em 'Assassino por Acaso', em cartaz nos cinemas. Foto: Matt Lankes / Netflix / Divulgação

“Quando eu não o encontrava no set, ele estava com o diretor de fotografia ou atrás de algum operador de câmera”, diz ela.

Powell voltou ao estúdio para trabalhar com a Austin Film Society, fundada por Linklater. Um dia depois de me mostrar o que ele lembrava da produção de Pequenos Espiões 3: Game Over – o local do incidente de basquete é um dos pontos altos, assim como a tela verde onde ele filmou sua cena –, o ator entrou para o Hall da Fama do Texas. Seus pais se juntaram a ele no tapete vermelho, tirando sarro do filho com cartazes que diziam: “Pare de tentar fazer Glen Powell acontecer” e “Não vai dar certo nunca”.

Outras presenças na cerimônia? O professor de Powell no ensino médio, F.J. Schaack, que diz que Powell era “o único que escrevia roteiros” na aula de redação criativa. Schaack me manda por mensagem algumas fotos dos trabalhos de Powell daquela época. São, sem dúvida, trabalhos de adolescente. Um trecho de roteiro descreve um presidiário da cadeia do condado mostrando a bunda para uma mulher de dentro de sua cela. Uma ode a Christopher Walken admira o fato de o ator ser “imperfeito ao ponto da perfeição”.

Foi Schaack quem apresentou Powell às obras de Linklater, como Jovens, Loucos e Rebeldes (1993) e Antes do Amanhecer (1995). Logo depois, Powell conseguiu um pequeno papel na adaptação de Linklater do best-seller de não ficção Nação Fast Food (2006).

Mas foi só quando fez o teste para interpretar um jogador de beisebol pomposo na comédia esportiva Jovens, Loucos e Mais Rebeldes, quase uma década depois, que ele chamou atenção de verdade. “Ele era um jovem bonito, charmoso e carismático”, diz Linklater, que se lembra de ter pensado consigo mesmo: “Puxa vida, quando foi que Glen Powell ficou tão esperto e engraçado?”

Durante a pandemia, Powell mandou um e-mail a Linklater para discutir um artigo da Texas Monthly de 2001 sobre Gary Johnson, um homem sem grandes ambições que se passava por assassino profissional quando trabalhava para a polícia de Houston. Ele usava uma escuta para coletar evidências contra as pessoas que encomendavam os assassinatos. Linklater disse algo como: “Ótimo. Estou obcecado por essa história faz tempo. Mas acho que não funciona como filme”. Os eventos eram muito repetitivos. Não tinha um arco narrativo muito claro.

Linklater credita a Powell a ideia de usar o artigo da Texas Monthly como ponto de partida. “Fiquei meio: ‘Será que você consegue fazer isso?’”, diz o diretor. O artigo termina com uma história sobre Johnson ajudando uma mulher a procurar terapia e abrigo seguro – em vez de prendê-la – depois de saber que ela tinha sido vítima de abuso. Powell se perguntou o que poderia ter acontecido a partir daí. Gary se arrependeu da decisão de ajudá-la? Como poderia ter sido o relacionamento deles?

Adria Arjona como Madison e Glen Powell como Gary Johnson em 'Assassino por Acaso'. Foto: Netflix/Divulgação

Quando Powell se mudou para Los Angeles, ele pagava as contas trabalhando com roteiros. Mas Assassino por Acaso – no qual ele e Linklater são creditados pelo roteiro e o jornalista Skip Hollandsworth pela história original – é seu primeiro longa a cruzar a linha de chegada. Ele admira atores que têm “esse verdadeiro lado escritor”, citando George Clooney e Matt Damon como exemplos.

“Você pode ser ator, é uma profissão digna”, diz ele. “Você não precisa ficar no teclado. Mas, para se dar bem no jogo, acho que você tem que ser fã da boa escrita – e entender por que as pessoas se envolvem com uma boa escrita. Caso contrário, quando você entra no set, fica dependendo só da sorte”.

Embora Jovens, Loucos e Mais Rebeldes e O Plano Imperfeito tenham colocado Powell no mapa, seu maior filme até agora é Top Gun: Maverick. Na tão esperada sequência – que foi o segundo filme de maior bilheteria de 2022, arrecadando quase US$ 1,5 bilhão em todo o mundo – ele interpreta um arrogante piloto de caça da Marinha com o codinome Hangman [algo como “carrasco”], uma referência à sua disposição de “deixar você sangrando sozinho”.

O personagem de Tom Cruise acaba com toda essa pose, ensinando os jovens a ajudar uns aos outros. O ator deu muitos conselhos a Powell, que os anotou no caderno em que guarda a sabedoria dos mais experientes da indústria cinematográfica.

Powell aprendeu desde cedo a aproveitar ao máximo a proximidade com a grandeza. Depois que Denzel Washington o escalou para o filme O Grande Debate, de 2007, o então adolescente conheceu o importante agente de Washington Ed Limato, que ajudou a descobrir estrelas como Richard Gere e Kevin Costner. Limato incentivou Powell, então calouro na Universidade do Texas, a se mudar para Los Angeles – conselho que ele seguiu à risca. (Powell observa que Limato, que o contratou, também foi quem descobriu McConaughey, com quem Powell mais tarde fez amizade por meio de Linklater).

Ele começou o caderno no set do filme Os Mercenários, de 2014, quando Sylvester Stallone, que escreveu o roteiro, deu lições sobre como adaptar elementos de gêneros mais antigos, como westerns, para o público moderno. Mas são os conselhos de Cruise que dariam vários capítulos, diz Powell, a maior parte deles recolhidos no set de Top Gun: Maverick. “Esse filme não tem nenhuma parte que pareça pequena”, acrescenta Powell sobre a produção de grande sucesso, mas Cruise lembrava ao elenco que “cada quadro deste longa é um quadro emocional. É tudo uma questão de história, e tudo tem que ser guiado por ela”.

Poucos entendem a indústria cinematográfica tão bem quanto Cruise. Ele sabe o que as pessoas querem dele e faz hora extra para entregar. Na estreia europeia de Twisters, à qual ele compareceu em apoio a Powell, Cruise até lhe mostrou como posar com pipoca.

Glen Powell e Sidney Sweeney têm boa química em 'Todos Menos Você', comédia romântica que já arrecadou mais de 100 milhões de dólares. Foto: Sony Pictures/Divulgação

Ao ouvir Powell descrever sua abordagem para selecionar projetos, fica claro qual das lições de Cruise ressoou mais. (Dica: não é a pose da pipoca, que ele não domina muito bem). “É tipo, se eu conseguir manter a confiança do público ao longo de toda a minha carreira, se eu conseguir simplesmente continuar fazendo filmes bons, então vou seguir no jogo”, diz ele, tomando um gole de uma bebida energética da geladeira do escritório.

Powell queria fazer parte de Twisters desde que soube que Joseph Kosinski, seu diretor em Top Gun: Maverick, estava desenvolvendo a história do filme-catástrofe. O ator trouxe uma energia de Cruise para o set. A primeira cena que ele filmou foi a introdução de Tyler, na qual o personagem chega a Oklahoma a bordo de uma caminhonete toda equipada. Ele berra e bota a cabeça para fora da janela, gritando: “Se você está sentindo” – ao que uma multidão de fãs grita de volta o resto do bordão do YouTuber fictício, “Então corra atrás!”. Chung diz que não deu instruções específicas aos figurantes. Eles só responderam à energia de Powell. “Ali eu entendi que ia dar certo”, acrescenta ele.

Twisters, assim como o filme original, é ambicioso no uso de efeitos especiais. A certa altura, Tyler e Kate (Daisy Edgar-Jones), a cientista que caça tempestades com ele, chegam ao centro de um tornado. E é aí que o lembrete de Cruise vem à mente.

Enquanto trabalhava no filme, Powell compartilhou uma história de infância sobre ter testemunhado um tornado destrutivo perto da casa de sua tia, no leste do Texas. “Ele tinha uma fala em que dizia que não sabia se deveria estar com medo até olhar para ela”, lembra Chung. “E eu coloquei isso no filme, porque nosso filme é muito sobre a emoção do medo e o que você faz com o medo”.

É o tipo de detalhe com que as pessoas podem se identificar, um detalhe que cativa o público mais amplo, mas também serve à história. “É aí que quero jogar”, diz Powell. “Fazer um filme desse tamanho para as pessoas vivenciarem coletivamente no cinema é a coisa mais difícil do mundo. Eu vi Cruise quase se destruir tentando dar vida a Top Gun: Maverick. Eu via isso todos os dias e pensava: ‘Vale muito a pena’”.

No início deste ano, Powell voltou para Austin depois de se cansar de Los Angeles. “Virou uma espécie de cidade de influenciadores de TikTok”, diz ele, “o que para alguém como eu, neste momento, é o meu maior pesadelo”. Morar em Austin significa ficar mais perto da família. Além disso, ele nunca concluiu a graduação em rádio, televisão e cinema na Universidade do Texas, onde quer trabalhar entre os projetos, com o objetivo de se formar na primavera.

Powell é o tipo de cara que aprende as regras para poder quebrá-las. A maioria das pessoas não sairia da cidade quando a carreira começa a decolar, mas ele parece determinado a fazer isso dar certo. E porque não, quando até os líderes da indústria estão fazendo loucuras?

À medida que nos aproximamos do fim de nosso passeio pelo Austin Studios, Powell menciona seu trabalho para encorajar os legisladores do Texas a implementar certos incentivos fiscais como forma de atrair produções para o estado. (No ano passado, ele apareceu em um vídeo promocional ao lado de outros texanos famosos, como McConaughey, Woody Harrelson e Dennis Quaid, para exortar os habitantes a apoiarem a causa). Mesmo que Powell não acabe imitando Redford como estrela famosa, talvez consiga como empresário determinado.

Mas enquanto existirem salas de cinema – e mesmo que não continuem sendo um termômetro para o estrelato em Hollywood – Powell terá como objetivo agraciá-las. Logo depois de conversarmos, ele embarca num avião para a África do Sul para filmar Huntington, um thriller de vingança da A24. Ele já foi escalado para a versão de Edgar Wright de O Sobrevivente e para o drama jurídico de John Lee Hancock, Monsanto, na Netflix. Além disso, está colaborando na criação de Chad Powers, uma série de comédia do Hulu sobre futebol universitário. E J. J. Abrams estaria “de olho” nele para estrelar seu próximo filme.

Além disso, tem aquele musical da Broadway. Powell está bolando um espetáculo ainda sem nome com Ryan Murphy, que o escalou para a série de comédia satírica Scream Queens quase uma década atrás, depois de conhecê-lo no set de Glee. (Powell não estava na série musical, mas era amigo de Chord Overstreet). Murphy diz que o ator já tinha apelo de estrela naquela época – até mesmo Jamie Lee Curtis e Niecy Nash puxaram o chefe de lado para perguntar: “Quem é esse aí? Onde você achou esse rapaz? – e continua a surpreendê-lo. Sem dar detalhes, Murphy observa que o musical foi ideia de Powell. “É interessante que alguém que fez Top Gun queira fazer um musical da Broadway”, diz Murphy.

Powell, sempre um teórico do cinema, diz que a questão é exatamente esta.

“Acho que o erro dos atores é esquecer o passado”, diz ele. “Dar ao público sempre o mesmo sabor é uma coisa muito ruim. McConaughey me deu este conselho. Ele disse: ‘Quando eles pensam que você vai fazer assim, você tem que fazer assado”. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU

Glen Powell em 'Twisters' Foto: Divulgação/Universal Pictures

Glen Powell aponta para o asfalto onde seus sonhos quase foram destruídos.

Ele tinha 13 anos e estava jogando basquete neste mesmo estacionamento do Austin Studios com outros atores mirins do terceiro filme Pequenos Espiões, quando derrubou sem querer um de seus colegas de elenco. Era um intervalo nas filmagens da popular franquia infantil, na qual Powell, cujo personagem aparece nos créditos simplesmente como “menino de dedos longos”, estava trabalhando apenas naquele dia. Era seu primeiro trabalho como ator. Será que algum dia ele poderia entrar num set de filmagem de novo?

O garoto ficou bem. E Powell também.

Ao relatar essa lembrança numa tarde de maio, parece ridículo que ele tenha se preocupado com o risco de um acidente como aquele atrapalhar sua carreira de ator. Mas Powell sempre olhou adiante. Ele sabe que o que você faz no presente pode determinar seu futuro. Ao que parece, isso se manifestou como ansiedade durante sua infância. Quando adulto, virou perspicácia nos negócios.

Isso talvez ajude a explicar por que Powell, 35 anos, parece estar em toda parte este ano. Ele brilha nas capas das revistas. Ele entra sorrateiramente em todos os seus feeds de redes sociais. Ele aparece em programas de entrevistas, onde diz a Gayle King que não está atrás de amor, mas que vai aceitar se “bater à minha porta”.

Powell não só ganhou credibilidade entre os críticos ao se tornar uma arma frequente no arsenal de Richard Linklater – mais recentemente na comédia de ação Assassino por Acaso, cujo roteiro tem a assinatura do ator – como também pode estar à beira do estrelato com um blockbuster. Depois de um papel coadjuvante que chamou a atenção no sucesso Top Gun: Maverick, Powell estrela o filme de desastre Twisters, a sequência de Lee Isaac Chung para o hit de Jan de Bont com Helen Hunt e Bill Paxton, de 1996.

Não é fácil tomar o lugar de Paxton, admirado por dar uma humanidade palpável a grandes produções. Os céticos levantam a sobrancelha para Powell, que vem sendo descrito como o novo Matthew McConaughey por causa do sorriso largo, do rosto talhado em madeira e do carisma texano. Ele já está pronto para expandir seu currículo com uma lista diversificada de projetos de cinema e televisão – além de um possível musical na Broadway – e tem um caderno cheio de conselhos de nomes como Tom Cruise. Mas será que isso se traduz em trajetória? Powell vai ser o próximo McConaughey ou Cruise? Será que ele pode se tornar um Paul Newman ou um Robert Redford, ganhando um respeito artístico equivalente ao seu queixo e à potência do seu sorriso?

Se você perguntar para os especialistas – digamos, uma ou duas ou oito pessoas que trabalharam com Powell em algum momento de seus 22 anos de carreira – eles vão dizer que isso não é fogo de palha. Segundo eles, Powell é um dos atores mais esforçados por aí. Ele faz questão de conhecer cada pessoa no set. Ele é o cara.

Mas em Hollywood, como o próprio Powell sabe faz muito tempo, nada é garantido.

“Tem muita conversa por aí, e eu tive que responder à pergunta: Glen é um astro de cinema?”, diz Linklater. “Qualquer pessoa que tenha trabalhado com Glen nos últimos dez anos sabe que ele é um astro de cinema. Sem a menor dúvida. A questão mais importante é se tem espaço na cultura para um novo astro de cinema”.

Recentemente, o Hollywood Reporter considerou Powell um membro da “nova lista A”, graças ao “golpe duplo” do queridinho dos festivais Assassino por Acaso e da comédia romântica Todos Menos Você, que arrecadou US$ 220 milhões no mundo todo – números inéditos para o gênero.

Mas nesta era de franquias de super-heróis e obscuros algoritmos de streaming, a definição tradicional de astro de cinema – alguém que consegue segurar um fim de semana de estreia – parece quase extinta. Embora a Netflix afirme que Assassino por Acaso teve um bom desempenho, entrando no seu top 10 global por três semanas seguidas, Powell ainda não é um protagonista comprovado nas bilheterias. A Universal está posicionando Twisters como sua grande aposta, confiando no efeito de suas estrelas e do espetáculo.

O destino do filme pode definir o destino de Powell.

No ano passado, Powell encontrou uma parceira de negócios valiosa em Sydney Sweeney, estrela de Todos Menos Você. Ele concordou com a ideia dela de alimentar rumores (falsos) de namoro como um jeito de os dois continuarem aparecendo nas manchetes durante o período que antecedeu o lançamento da comédia romântica.

Essa parte do plano deu certo, mas o filme ainda estava devagar nas bilheterias. (Depois de faturar apenas US$ 6 milhões no fim de semana de estreia, virou um sucesso mundial). O roteirista e diretor Will Gluck atribui naturalmente o impulso ao fato de o público ter se “apaixonado por Syd e Glen”, o que exigiu que seres humanos extraordinariamente bonitos parecessem… bem, como qualquer um de nós.

“Quando se tem alguém com a beleza de Glen, é preciso que o personagem também seja mais modesto”, diz Gluck. “É difícil fazer isso. Tive longas conversas com Glen sobre como eu gostaria que ele interpretasse esse personagem. ‘Até onde você está disposto a ir para baixar um pouco o seu brilho?’ Ele estava 100% disposto”.

Embora alguns atores possam se esquivar das comédias românticas, com receio de serem enquadrados como um tipo de específico de personagem ou de não serem levados a sério, Powell reconhece o poder de permanência do gênero. Ele foi criado no noroeste de Austin, filho do meio entre duas irmãs, Lauren e Leslie.

Os irmãos Powell assistiam e reassistiam a filmes como 10 Coisas que Eu Odeio em Você e Como Perder um Homem em 10 Dias. No Austin Studios, Powell argumenta sinceramente que as comédias românticas são “a linguagem cinematográfica mais universal”, porque “todos nós compartilhamos o desejo de amar e ser amados”.

É claro que o amor tende a ser confuso e imperfeito – e as comédias românticas só funcionam se os personagens centrais também se revelarem confusos e imperfeitos. Como protagonista no gênero, diz Powell, “você está lá para parecer meio tonto e para se divertir e para ser vulnerável. É isso”. Não tem muito espaço para orgulho ou ego. Você tem que entrar na brincadeira.

Powell estourou com outra comédia romântica: o filme da Netflix O Plano Imperfeito (2018), no qual ele e Zoey Deutch interpretam assistentes sobrecarregados que tentam aliviar sua carga de trabalho fazendo seus chefes temperamentais se apaixonarem um pelo outro. O personagem de Powell é um carinha do mercado financeiro. A roteirista Katie Silberman diz que o “calor inerente” do ator permite que ele prospere “quando interpreta um babaca – pelo menos no começo – porque você se importa tanto com ele que torce para ele conseguir o que quer”.

É como Tom Hanks em Mensagem para Você, diz ela. Só ele mesmo para fazer você torcer pelo vilão.

“Tem um ditado que diz: para fazer papel de burro, você tem que ser muito esperto e, para fazer papel de malvado, você tem que ser muito bonzinho”, continua Silberman. “Ele tem uma alegria e um calor tão profundos e inegáveis que você pode pegar isso e ir para onde quiser”.

Essa qualidade é um trunfo em qualquer gênero, até mesmo em filmes de catástrofe. Para escolher a pessoa certa para o papel de Tyler Owens em Twisters, um autodenominado “domador de tornados” cujas artimanhas de perseguição a tempestades acumularam muitos seguidores no YouTube, Chung (Minari) estava procurando um ator com um “profundo poço de empatia, seriedade e bondade” para equilibrar a arrogância. Ele não tinha certeza se Powell era esse cara. Mas aí Chung se deparou com uma das aparições de Powell em um programa matinal.

Powell trouxera o pai e a mãe, Glen pai e Cyndy, que há muito apoiam sua carreira de ator – a ponto de terem feito até aparições especiais em seus projetos. (Cyndy, dona de casa que foi empresária do filho desde o início, aparece como espiã no filme Pequenos Espiões, por exemplo; anos depois, ela e Glen pai interpretaram passageiros de avião numa cena de Todos Menos Você). Quando viu Powell fazendo palhaçada com os pais, Chung percebeu o que o ator poderia trazer para Twisters.

“De repente, vi esse lado dele que realmente revela quem ele é como pessoa – sua criação e seu relacionamento com a família”, diz Chung. “Por trás de tudo, ele tem uma humanidade profunda”.

Os pais adoram se gabar dos filhos, mas Cyndy faz questão de trazer evidências. Certa vez, a professora de Powell no jardim de infância disse que ele tinha uma presença notável e que “ou seria ator ou presidente”, diz ela. (Talvez ele venha a ser as duas coisas, do jeito que todo mundo fala desse cara. Ele tem 35 anos).

Quando Powell entregou um trabalho de poesia no ensino médio, a professora suspeitou que era plágio porque, segundo ela, “não é possível que um aluno dessa idade tenha escrito isso”. Ela chamou os pais de Powell e pediu que ele escrevesse outro poema sentado à vista deles. A professora leu-o e disse, como Cyndy lembra: “Eu realmente preciso me desculpar com você e com Glen”.

O lema da família sempre foi “avançar em todas as frentes”, diz Cyndy. Quando as crianças demonstravam interesse em algo novo, ela e o pai, coach executivo para empresas, as incentivavam a experimentar. Powell era uma criança atlética, mas também andava por aí com uma câmera de vídeo. Depois que ele conseguiu um agente e foi escalado para o filme Pequenos Espiões 3: Game Over, Cyndy o acompanhou até o Austin Studios, onde ele ficava rodeando as pessoas que trabalhavam nos bastidores, prestando atenção ao que faziam.

Glen Powell como Gary Johnson em 'Assassino por Acaso', em cartaz nos cinemas. Foto: Matt Lankes / Netflix / Divulgação

“Quando eu não o encontrava no set, ele estava com o diretor de fotografia ou atrás de algum operador de câmera”, diz ela.

Powell voltou ao estúdio para trabalhar com a Austin Film Society, fundada por Linklater. Um dia depois de me mostrar o que ele lembrava da produção de Pequenos Espiões 3: Game Over – o local do incidente de basquete é um dos pontos altos, assim como a tela verde onde ele filmou sua cena –, o ator entrou para o Hall da Fama do Texas. Seus pais se juntaram a ele no tapete vermelho, tirando sarro do filho com cartazes que diziam: “Pare de tentar fazer Glen Powell acontecer” e “Não vai dar certo nunca”.

Outras presenças na cerimônia? O professor de Powell no ensino médio, F.J. Schaack, que diz que Powell era “o único que escrevia roteiros” na aula de redação criativa. Schaack me manda por mensagem algumas fotos dos trabalhos de Powell daquela época. São, sem dúvida, trabalhos de adolescente. Um trecho de roteiro descreve um presidiário da cadeia do condado mostrando a bunda para uma mulher de dentro de sua cela. Uma ode a Christopher Walken admira o fato de o ator ser “imperfeito ao ponto da perfeição”.

Foi Schaack quem apresentou Powell às obras de Linklater, como Jovens, Loucos e Rebeldes (1993) e Antes do Amanhecer (1995). Logo depois, Powell conseguiu um pequeno papel na adaptação de Linklater do best-seller de não ficção Nação Fast Food (2006).

Mas foi só quando fez o teste para interpretar um jogador de beisebol pomposo na comédia esportiva Jovens, Loucos e Mais Rebeldes, quase uma década depois, que ele chamou atenção de verdade. “Ele era um jovem bonito, charmoso e carismático”, diz Linklater, que se lembra de ter pensado consigo mesmo: “Puxa vida, quando foi que Glen Powell ficou tão esperto e engraçado?”

Durante a pandemia, Powell mandou um e-mail a Linklater para discutir um artigo da Texas Monthly de 2001 sobre Gary Johnson, um homem sem grandes ambições que se passava por assassino profissional quando trabalhava para a polícia de Houston. Ele usava uma escuta para coletar evidências contra as pessoas que encomendavam os assassinatos. Linklater disse algo como: “Ótimo. Estou obcecado por essa história faz tempo. Mas acho que não funciona como filme”. Os eventos eram muito repetitivos. Não tinha um arco narrativo muito claro.

Linklater credita a Powell a ideia de usar o artigo da Texas Monthly como ponto de partida. “Fiquei meio: ‘Será que você consegue fazer isso?’”, diz o diretor. O artigo termina com uma história sobre Johnson ajudando uma mulher a procurar terapia e abrigo seguro – em vez de prendê-la – depois de saber que ela tinha sido vítima de abuso. Powell se perguntou o que poderia ter acontecido a partir daí. Gary se arrependeu da decisão de ajudá-la? Como poderia ter sido o relacionamento deles?

Adria Arjona como Madison e Glen Powell como Gary Johnson em 'Assassino por Acaso'. Foto: Netflix/Divulgação

Quando Powell se mudou para Los Angeles, ele pagava as contas trabalhando com roteiros. Mas Assassino por Acaso – no qual ele e Linklater são creditados pelo roteiro e o jornalista Skip Hollandsworth pela história original – é seu primeiro longa a cruzar a linha de chegada. Ele admira atores que têm “esse verdadeiro lado escritor”, citando George Clooney e Matt Damon como exemplos.

“Você pode ser ator, é uma profissão digna”, diz ele. “Você não precisa ficar no teclado. Mas, para se dar bem no jogo, acho que você tem que ser fã da boa escrita – e entender por que as pessoas se envolvem com uma boa escrita. Caso contrário, quando você entra no set, fica dependendo só da sorte”.

Embora Jovens, Loucos e Mais Rebeldes e O Plano Imperfeito tenham colocado Powell no mapa, seu maior filme até agora é Top Gun: Maverick. Na tão esperada sequência – que foi o segundo filme de maior bilheteria de 2022, arrecadando quase US$ 1,5 bilhão em todo o mundo – ele interpreta um arrogante piloto de caça da Marinha com o codinome Hangman [algo como “carrasco”], uma referência à sua disposição de “deixar você sangrando sozinho”.

O personagem de Tom Cruise acaba com toda essa pose, ensinando os jovens a ajudar uns aos outros. O ator deu muitos conselhos a Powell, que os anotou no caderno em que guarda a sabedoria dos mais experientes da indústria cinematográfica.

Powell aprendeu desde cedo a aproveitar ao máximo a proximidade com a grandeza. Depois que Denzel Washington o escalou para o filme O Grande Debate, de 2007, o então adolescente conheceu o importante agente de Washington Ed Limato, que ajudou a descobrir estrelas como Richard Gere e Kevin Costner. Limato incentivou Powell, então calouro na Universidade do Texas, a se mudar para Los Angeles – conselho que ele seguiu à risca. (Powell observa que Limato, que o contratou, também foi quem descobriu McConaughey, com quem Powell mais tarde fez amizade por meio de Linklater).

Ele começou o caderno no set do filme Os Mercenários, de 2014, quando Sylvester Stallone, que escreveu o roteiro, deu lições sobre como adaptar elementos de gêneros mais antigos, como westerns, para o público moderno. Mas são os conselhos de Cruise que dariam vários capítulos, diz Powell, a maior parte deles recolhidos no set de Top Gun: Maverick. “Esse filme não tem nenhuma parte que pareça pequena”, acrescenta Powell sobre a produção de grande sucesso, mas Cruise lembrava ao elenco que “cada quadro deste longa é um quadro emocional. É tudo uma questão de história, e tudo tem que ser guiado por ela”.

Poucos entendem a indústria cinematográfica tão bem quanto Cruise. Ele sabe o que as pessoas querem dele e faz hora extra para entregar. Na estreia europeia de Twisters, à qual ele compareceu em apoio a Powell, Cruise até lhe mostrou como posar com pipoca.

Glen Powell e Sidney Sweeney têm boa química em 'Todos Menos Você', comédia romântica que já arrecadou mais de 100 milhões de dólares. Foto: Sony Pictures/Divulgação

Ao ouvir Powell descrever sua abordagem para selecionar projetos, fica claro qual das lições de Cruise ressoou mais. (Dica: não é a pose da pipoca, que ele não domina muito bem). “É tipo, se eu conseguir manter a confiança do público ao longo de toda a minha carreira, se eu conseguir simplesmente continuar fazendo filmes bons, então vou seguir no jogo”, diz ele, tomando um gole de uma bebida energética da geladeira do escritório.

Powell queria fazer parte de Twisters desde que soube que Joseph Kosinski, seu diretor em Top Gun: Maverick, estava desenvolvendo a história do filme-catástrofe. O ator trouxe uma energia de Cruise para o set. A primeira cena que ele filmou foi a introdução de Tyler, na qual o personagem chega a Oklahoma a bordo de uma caminhonete toda equipada. Ele berra e bota a cabeça para fora da janela, gritando: “Se você está sentindo” – ao que uma multidão de fãs grita de volta o resto do bordão do YouTuber fictício, “Então corra atrás!”. Chung diz que não deu instruções específicas aos figurantes. Eles só responderam à energia de Powell. “Ali eu entendi que ia dar certo”, acrescenta ele.

Twisters, assim como o filme original, é ambicioso no uso de efeitos especiais. A certa altura, Tyler e Kate (Daisy Edgar-Jones), a cientista que caça tempestades com ele, chegam ao centro de um tornado. E é aí que o lembrete de Cruise vem à mente.

Enquanto trabalhava no filme, Powell compartilhou uma história de infância sobre ter testemunhado um tornado destrutivo perto da casa de sua tia, no leste do Texas. “Ele tinha uma fala em que dizia que não sabia se deveria estar com medo até olhar para ela”, lembra Chung. “E eu coloquei isso no filme, porque nosso filme é muito sobre a emoção do medo e o que você faz com o medo”.

É o tipo de detalhe com que as pessoas podem se identificar, um detalhe que cativa o público mais amplo, mas também serve à história. “É aí que quero jogar”, diz Powell. “Fazer um filme desse tamanho para as pessoas vivenciarem coletivamente no cinema é a coisa mais difícil do mundo. Eu vi Cruise quase se destruir tentando dar vida a Top Gun: Maverick. Eu via isso todos os dias e pensava: ‘Vale muito a pena’”.

No início deste ano, Powell voltou para Austin depois de se cansar de Los Angeles. “Virou uma espécie de cidade de influenciadores de TikTok”, diz ele, “o que para alguém como eu, neste momento, é o meu maior pesadelo”. Morar em Austin significa ficar mais perto da família. Além disso, ele nunca concluiu a graduação em rádio, televisão e cinema na Universidade do Texas, onde quer trabalhar entre os projetos, com o objetivo de se formar na primavera.

Powell é o tipo de cara que aprende as regras para poder quebrá-las. A maioria das pessoas não sairia da cidade quando a carreira começa a decolar, mas ele parece determinado a fazer isso dar certo. E porque não, quando até os líderes da indústria estão fazendo loucuras?

À medida que nos aproximamos do fim de nosso passeio pelo Austin Studios, Powell menciona seu trabalho para encorajar os legisladores do Texas a implementar certos incentivos fiscais como forma de atrair produções para o estado. (No ano passado, ele apareceu em um vídeo promocional ao lado de outros texanos famosos, como McConaughey, Woody Harrelson e Dennis Quaid, para exortar os habitantes a apoiarem a causa). Mesmo que Powell não acabe imitando Redford como estrela famosa, talvez consiga como empresário determinado.

Mas enquanto existirem salas de cinema – e mesmo que não continuem sendo um termômetro para o estrelato em Hollywood – Powell terá como objetivo agraciá-las. Logo depois de conversarmos, ele embarca num avião para a África do Sul para filmar Huntington, um thriller de vingança da A24. Ele já foi escalado para a versão de Edgar Wright de O Sobrevivente e para o drama jurídico de John Lee Hancock, Monsanto, na Netflix. Além disso, está colaborando na criação de Chad Powers, uma série de comédia do Hulu sobre futebol universitário. E J. J. Abrams estaria “de olho” nele para estrelar seu próximo filme.

Além disso, tem aquele musical da Broadway. Powell está bolando um espetáculo ainda sem nome com Ryan Murphy, que o escalou para a série de comédia satírica Scream Queens quase uma década atrás, depois de conhecê-lo no set de Glee. (Powell não estava na série musical, mas era amigo de Chord Overstreet). Murphy diz que o ator já tinha apelo de estrela naquela época – até mesmo Jamie Lee Curtis e Niecy Nash puxaram o chefe de lado para perguntar: “Quem é esse aí? Onde você achou esse rapaz? – e continua a surpreendê-lo. Sem dar detalhes, Murphy observa que o musical foi ideia de Powell. “É interessante que alguém que fez Top Gun queira fazer um musical da Broadway”, diz Murphy.

Powell, sempre um teórico do cinema, diz que a questão é exatamente esta.

“Acho que o erro dos atores é esquecer o passado”, diz ele. “Dar ao público sempre o mesmo sabor é uma coisa muito ruim. McConaughey me deu este conselho. Ele disse: ‘Quando eles pensam que você vai fazer assim, você tem que fazer assado”. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU

Glen Powell em 'Twisters' Foto: Divulgação/Universal Pictures

Glen Powell aponta para o asfalto onde seus sonhos quase foram destruídos.

Ele tinha 13 anos e estava jogando basquete neste mesmo estacionamento do Austin Studios com outros atores mirins do terceiro filme Pequenos Espiões, quando derrubou sem querer um de seus colegas de elenco. Era um intervalo nas filmagens da popular franquia infantil, na qual Powell, cujo personagem aparece nos créditos simplesmente como “menino de dedos longos”, estava trabalhando apenas naquele dia. Era seu primeiro trabalho como ator. Será que algum dia ele poderia entrar num set de filmagem de novo?

O garoto ficou bem. E Powell também.

Ao relatar essa lembrança numa tarde de maio, parece ridículo que ele tenha se preocupado com o risco de um acidente como aquele atrapalhar sua carreira de ator. Mas Powell sempre olhou adiante. Ele sabe que o que você faz no presente pode determinar seu futuro. Ao que parece, isso se manifestou como ansiedade durante sua infância. Quando adulto, virou perspicácia nos negócios.

Isso talvez ajude a explicar por que Powell, 35 anos, parece estar em toda parte este ano. Ele brilha nas capas das revistas. Ele entra sorrateiramente em todos os seus feeds de redes sociais. Ele aparece em programas de entrevistas, onde diz a Gayle King que não está atrás de amor, mas que vai aceitar se “bater à minha porta”.

Powell não só ganhou credibilidade entre os críticos ao se tornar uma arma frequente no arsenal de Richard Linklater – mais recentemente na comédia de ação Assassino por Acaso, cujo roteiro tem a assinatura do ator – como também pode estar à beira do estrelato com um blockbuster. Depois de um papel coadjuvante que chamou a atenção no sucesso Top Gun: Maverick, Powell estrela o filme de desastre Twisters, a sequência de Lee Isaac Chung para o hit de Jan de Bont com Helen Hunt e Bill Paxton, de 1996.

Não é fácil tomar o lugar de Paxton, admirado por dar uma humanidade palpável a grandes produções. Os céticos levantam a sobrancelha para Powell, que vem sendo descrito como o novo Matthew McConaughey por causa do sorriso largo, do rosto talhado em madeira e do carisma texano. Ele já está pronto para expandir seu currículo com uma lista diversificada de projetos de cinema e televisão – além de um possível musical na Broadway – e tem um caderno cheio de conselhos de nomes como Tom Cruise. Mas será que isso se traduz em trajetória? Powell vai ser o próximo McConaughey ou Cruise? Será que ele pode se tornar um Paul Newman ou um Robert Redford, ganhando um respeito artístico equivalente ao seu queixo e à potência do seu sorriso?

Se você perguntar para os especialistas – digamos, uma ou duas ou oito pessoas que trabalharam com Powell em algum momento de seus 22 anos de carreira – eles vão dizer que isso não é fogo de palha. Segundo eles, Powell é um dos atores mais esforçados por aí. Ele faz questão de conhecer cada pessoa no set. Ele é o cara.

Mas em Hollywood, como o próprio Powell sabe faz muito tempo, nada é garantido.

“Tem muita conversa por aí, e eu tive que responder à pergunta: Glen é um astro de cinema?”, diz Linklater. “Qualquer pessoa que tenha trabalhado com Glen nos últimos dez anos sabe que ele é um astro de cinema. Sem a menor dúvida. A questão mais importante é se tem espaço na cultura para um novo astro de cinema”.

Recentemente, o Hollywood Reporter considerou Powell um membro da “nova lista A”, graças ao “golpe duplo” do queridinho dos festivais Assassino por Acaso e da comédia romântica Todos Menos Você, que arrecadou US$ 220 milhões no mundo todo – números inéditos para o gênero.

Mas nesta era de franquias de super-heróis e obscuros algoritmos de streaming, a definição tradicional de astro de cinema – alguém que consegue segurar um fim de semana de estreia – parece quase extinta. Embora a Netflix afirme que Assassino por Acaso teve um bom desempenho, entrando no seu top 10 global por três semanas seguidas, Powell ainda não é um protagonista comprovado nas bilheterias. A Universal está posicionando Twisters como sua grande aposta, confiando no efeito de suas estrelas e do espetáculo.

O destino do filme pode definir o destino de Powell.

No ano passado, Powell encontrou uma parceira de negócios valiosa em Sydney Sweeney, estrela de Todos Menos Você. Ele concordou com a ideia dela de alimentar rumores (falsos) de namoro como um jeito de os dois continuarem aparecendo nas manchetes durante o período que antecedeu o lançamento da comédia romântica.

Essa parte do plano deu certo, mas o filme ainda estava devagar nas bilheterias. (Depois de faturar apenas US$ 6 milhões no fim de semana de estreia, virou um sucesso mundial). O roteirista e diretor Will Gluck atribui naturalmente o impulso ao fato de o público ter se “apaixonado por Syd e Glen”, o que exigiu que seres humanos extraordinariamente bonitos parecessem… bem, como qualquer um de nós.

“Quando se tem alguém com a beleza de Glen, é preciso que o personagem também seja mais modesto”, diz Gluck. “É difícil fazer isso. Tive longas conversas com Glen sobre como eu gostaria que ele interpretasse esse personagem. ‘Até onde você está disposto a ir para baixar um pouco o seu brilho?’ Ele estava 100% disposto”.

Embora alguns atores possam se esquivar das comédias românticas, com receio de serem enquadrados como um tipo de específico de personagem ou de não serem levados a sério, Powell reconhece o poder de permanência do gênero. Ele foi criado no noroeste de Austin, filho do meio entre duas irmãs, Lauren e Leslie.

Os irmãos Powell assistiam e reassistiam a filmes como 10 Coisas que Eu Odeio em Você e Como Perder um Homem em 10 Dias. No Austin Studios, Powell argumenta sinceramente que as comédias românticas são “a linguagem cinematográfica mais universal”, porque “todos nós compartilhamos o desejo de amar e ser amados”.

É claro que o amor tende a ser confuso e imperfeito – e as comédias românticas só funcionam se os personagens centrais também se revelarem confusos e imperfeitos. Como protagonista no gênero, diz Powell, “você está lá para parecer meio tonto e para se divertir e para ser vulnerável. É isso”. Não tem muito espaço para orgulho ou ego. Você tem que entrar na brincadeira.

Powell estourou com outra comédia romântica: o filme da Netflix O Plano Imperfeito (2018), no qual ele e Zoey Deutch interpretam assistentes sobrecarregados que tentam aliviar sua carga de trabalho fazendo seus chefes temperamentais se apaixonarem um pelo outro. O personagem de Powell é um carinha do mercado financeiro. A roteirista Katie Silberman diz que o “calor inerente” do ator permite que ele prospere “quando interpreta um babaca – pelo menos no começo – porque você se importa tanto com ele que torce para ele conseguir o que quer”.

É como Tom Hanks em Mensagem para Você, diz ela. Só ele mesmo para fazer você torcer pelo vilão.

“Tem um ditado que diz: para fazer papel de burro, você tem que ser muito esperto e, para fazer papel de malvado, você tem que ser muito bonzinho”, continua Silberman. “Ele tem uma alegria e um calor tão profundos e inegáveis que você pode pegar isso e ir para onde quiser”.

Essa qualidade é um trunfo em qualquer gênero, até mesmo em filmes de catástrofe. Para escolher a pessoa certa para o papel de Tyler Owens em Twisters, um autodenominado “domador de tornados” cujas artimanhas de perseguição a tempestades acumularam muitos seguidores no YouTube, Chung (Minari) estava procurando um ator com um “profundo poço de empatia, seriedade e bondade” para equilibrar a arrogância. Ele não tinha certeza se Powell era esse cara. Mas aí Chung se deparou com uma das aparições de Powell em um programa matinal.

Powell trouxera o pai e a mãe, Glen pai e Cyndy, que há muito apoiam sua carreira de ator – a ponto de terem feito até aparições especiais em seus projetos. (Cyndy, dona de casa que foi empresária do filho desde o início, aparece como espiã no filme Pequenos Espiões, por exemplo; anos depois, ela e Glen pai interpretaram passageiros de avião numa cena de Todos Menos Você). Quando viu Powell fazendo palhaçada com os pais, Chung percebeu o que o ator poderia trazer para Twisters.

“De repente, vi esse lado dele que realmente revela quem ele é como pessoa – sua criação e seu relacionamento com a família”, diz Chung. “Por trás de tudo, ele tem uma humanidade profunda”.

Os pais adoram se gabar dos filhos, mas Cyndy faz questão de trazer evidências. Certa vez, a professora de Powell no jardim de infância disse que ele tinha uma presença notável e que “ou seria ator ou presidente”, diz ela. (Talvez ele venha a ser as duas coisas, do jeito que todo mundo fala desse cara. Ele tem 35 anos).

Quando Powell entregou um trabalho de poesia no ensino médio, a professora suspeitou que era plágio porque, segundo ela, “não é possível que um aluno dessa idade tenha escrito isso”. Ela chamou os pais de Powell e pediu que ele escrevesse outro poema sentado à vista deles. A professora leu-o e disse, como Cyndy lembra: “Eu realmente preciso me desculpar com você e com Glen”.

O lema da família sempre foi “avançar em todas as frentes”, diz Cyndy. Quando as crianças demonstravam interesse em algo novo, ela e o pai, coach executivo para empresas, as incentivavam a experimentar. Powell era uma criança atlética, mas também andava por aí com uma câmera de vídeo. Depois que ele conseguiu um agente e foi escalado para o filme Pequenos Espiões 3: Game Over, Cyndy o acompanhou até o Austin Studios, onde ele ficava rodeando as pessoas que trabalhavam nos bastidores, prestando atenção ao que faziam.

Glen Powell como Gary Johnson em 'Assassino por Acaso', em cartaz nos cinemas. Foto: Matt Lankes / Netflix / Divulgação

“Quando eu não o encontrava no set, ele estava com o diretor de fotografia ou atrás de algum operador de câmera”, diz ela.

Powell voltou ao estúdio para trabalhar com a Austin Film Society, fundada por Linklater. Um dia depois de me mostrar o que ele lembrava da produção de Pequenos Espiões 3: Game Over – o local do incidente de basquete é um dos pontos altos, assim como a tela verde onde ele filmou sua cena –, o ator entrou para o Hall da Fama do Texas. Seus pais se juntaram a ele no tapete vermelho, tirando sarro do filho com cartazes que diziam: “Pare de tentar fazer Glen Powell acontecer” e “Não vai dar certo nunca”.

Outras presenças na cerimônia? O professor de Powell no ensino médio, F.J. Schaack, que diz que Powell era “o único que escrevia roteiros” na aula de redação criativa. Schaack me manda por mensagem algumas fotos dos trabalhos de Powell daquela época. São, sem dúvida, trabalhos de adolescente. Um trecho de roteiro descreve um presidiário da cadeia do condado mostrando a bunda para uma mulher de dentro de sua cela. Uma ode a Christopher Walken admira o fato de o ator ser “imperfeito ao ponto da perfeição”.

Foi Schaack quem apresentou Powell às obras de Linklater, como Jovens, Loucos e Rebeldes (1993) e Antes do Amanhecer (1995). Logo depois, Powell conseguiu um pequeno papel na adaptação de Linklater do best-seller de não ficção Nação Fast Food (2006).

Mas foi só quando fez o teste para interpretar um jogador de beisebol pomposo na comédia esportiva Jovens, Loucos e Mais Rebeldes, quase uma década depois, que ele chamou atenção de verdade. “Ele era um jovem bonito, charmoso e carismático”, diz Linklater, que se lembra de ter pensado consigo mesmo: “Puxa vida, quando foi que Glen Powell ficou tão esperto e engraçado?”

Durante a pandemia, Powell mandou um e-mail a Linklater para discutir um artigo da Texas Monthly de 2001 sobre Gary Johnson, um homem sem grandes ambições que se passava por assassino profissional quando trabalhava para a polícia de Houston. Ele usava uma escuta para coletar evidências contra as pessoas que encomendavam os assassinatos. Linklater disse algo como: “Ótimo. Estou obcecado por essa história faz tempo. Mas acho que não funciona como filme”. Os eventos eram muito repetitivos. Não tinha um arco narrativo muito claro.

Linklater credita a Powell a ideia de usar o artigo da Texas Monthly como ponto de partida. “Fiquei meio: ‘Será que você consegue fazer isso?’”, diz o diretor. O artigo termina com uma história sobre Johnson ajudando uma mulher a procurar terapia e abrigo seguro – em vez de prendê-la – depois de saber que ela tinha sido vítima de abuso. Powell se perguntou o que poderia ter acontecido a partir daí. Gary se arrependeu da decisão de ajudá-la? Como poderia ter sido o relacionamento deles?

Adria Arjona como Madison e Glen Powell como Gary Johnson em 'Assassino por Acaso'. Foto: Netflix/Divulgação

Quando Powell se mudou para Los Angeles, ele pagava as contas trabalhando com roteiros. Mas Assassino por Acaso – no qual ele e Linklater são creditados pelo roteiro e o jornalista Skip Hollandsworth pela história original – é seu primeiro longa a cruzar a linha de chegada. Ele admira atores que têm “esse verdadeiro lado escritor”, citando George Clooney e Matt Damon como exemplos.

“Você pode ser ator, é uma profissão digna”, diz ele. “Você não precisa ficar no teclado. Mas, para se dar bem no jogo, acho que você tem que ser fã da boa escrita – e entender por que as pessoas se envolvem com uma boa escrita. Caso contrário, quando você entra no set, fica dependendo só da sorte”.

Embora Jovens, Loucos e Mais Rebeldes e O Plano Imperfeito tenham colocado Powell no mapa, seu maior filme até agora é Top Gun: Maverick. Na tão esperada sequência – que foi o segundo filme de maior bilheteria de 2022, arrecadando quase US$ 1,5 bilhão em todo o mundo – ele interpreta um arrogante piloto de caça da Marinha com o codinome Hangman [algo como “carrasco”], uma referência à sua disposição de “deixar você sangrando sozinho”.

O personagem de Tom Cruise acaba com toda essa pose, ensinando os jovens a ajudar uns aos outros. O ator deu muitos conselhos a Powell, que os anotou no caderno em que guarda a sabedoria dos mais experientes da indústria cinematográfica.

Powell aprendeu desde cedo a aproveitar ao máximo a proximidade com a grandeza. Depois que Denzel Washington o escalou para o filme O Grande Debate, de 2007, o então adolescente conheceu o importante agente de Washington Ed Limato, que ajudou a descobrir estrelas como Richard Gere e Kevin Costner. Limato incentivou Powell, então calouro na Universidade do Texas, a se mudar para Los Angeles – conselho que ele seguiu à risca. (Powell observa que Limato, que o contratou, também foi quem descobriu McConaughey, com quem Powell mais tarde fez amizade por meio de Linklater).

Ele começou o caderno no set do filme Os Mercenários, de 2014, quando Sylvester Stallone, que escreveu o roteiro, deu lições sobre como adaptar elementos de gêneros mais antigos, como westerns, para o público moderno. Mas são os conselhos de Cruise que dariam vários capítulos, diz Powell, a maior parte deles recolhidos no set de Top Gun: Maverick. “Esse filme não tem nenhuma parte que pareça pequena”, acrescenta Powell sobre a produção de grande sucesso, mas Cruise lembrava ao elenco que “cada quadro deste longa é um quadro emocional. É tudo uma questão de história, e tudo tem que ser guiado por ela”.

Poucos entendem a indústria cinematográfica tão bem quanto Cruise. Ele sabe o que as pessoas querem dele e faz hora extra para entregar. Na estreia europeia de Twisters, à qual ele compareceu em apoio a Powell, Cruise até lhe mostrou como posar com pipoca.

Glen Powell e Sidney Sweeney têm boa química em 'Todos Menos Você', comédia romântica que já arrecadou mais de 100 milhões de dólares. Foto: Sony Pictures/Divulgação

Ao ouvir Powell descrever sua abordagem para selecionar projetos, fica claro qual das lições de Cruise ressoou mais. (Dica: não é a pose da pipoca, que ele não domina muito bem). “É tipo, se eu conseguir manter a confiança do público ao longo de toda a minha carreira, se eu conseguir simplesmente continuar fazendo filmes bons, então vou seguir no jogo”, diz ele, tomando um gole de uma bebida energética da geladeira do escritório.

Powell queria fazer parte de Twisters desde que soube que Joseph Kosinski, seu diretor em Top Gun: Maverick, estava desenvolvendo a história do filme-catástrofe. O ator trouxe uma energia de Cruise para o set. A primeira cena que ele filmou foi a introdução de Tyler, na qual o personagem chega a Oklahoma a bordo de uma caminhonete toda equipada. Ele berra e bota a cabeça para fora da janela, gritando: “Se você está sentindo” – ao que uma multidão de fãs grita de volta o resto do bordão do YouTuber fictício, “Então corra atrás!”. Chung diz que não deu instruções específicas aos figurantes. Eles só responderam à energia de Powell. “Ali eu entendi que ia dar certo”, acrescenta ele.

Twisters, assim como o filme original, é ambicioso no uso de efeitos especiais. A certa altura, Tyler e Kate (Daisy Edgar-Jones), a cientista que caça tempestades com ele, chegam ao centro de um tornado. E é aí que o lembrete de Cruise vem à mente.

Enquanto trabalhava no filme, Powell compartilhou uma história de infância sobre ter testemunhado um tornado destrutivo perto da casa de sua tia, no leste do Texas. “Ele tinha uma fala em que dizia que não sabia se deveria estar com medo até olhar para ela”, lembra Chung. “E eu coloquei isso no filme, porque nosso filme é muito sobre a emoção do medo e o que você faz com o medo”.

É o tipo de detalhe com que as pessoas podem se identificar, um detalhe que cativa o público mais amplo, mas também serve à história. “É aí que quero jogar”, diz Powell. “Fazer um filme desse tamanho para as pessoas vivenciarem coletivamente no cinema é a coisa mais difícil do mundo. Eu vi Cruise quase se destruir tentando dar vida a Top Gun: Maverick. Eu via isso todos os dias e pensava: ‘Vale muito a pena’”.

No início deste ano, Powell voltou para Austin depois de se cansar de Los Angeles. “Virou uma espécie de cidade de influenciadores de TikTok”, diz ele, “o que para alguém como eu, neste momento, é o meu maior pesadelo”. Morar em Austin significa ficar mais perto da família. Além disso, ele nunca concluiu a graduação em rádio, televisão e cinema na Universidade do Texas, onde quer trabalhar entre os projetos, com o objetivo de se formar na primavera.

Powell é o tipo de cara que aprende as regras para poder quebrá-las. A maioria das pessoas não sairia da cidade quando a carreira começa a decolar, mas ele parece determinado a fazer isso dar certo. E porque não, quando até os líderes da indústria estão fazendo loucuras?

À medida que nos aproximamos do fim de nosso passeio pelo Austin Studios, Powell menciona seu trabalho para encorajar os legisladores do Texas a implementar certos incentivos fiscais como forma de atrair produções para o estado. (No ano passado, ele apareceu em um vídeo promocional ao lado de outros texanos famosos, como McConaughey, Woody Harrelson e Dennis Quaid, para exortar os habitantes a apoiarem a causa). Mesmo que Powell não acabe imitando Redford como estrela famosa, talvez consiga como empresário determinado.

Mas enquanto existirem salas de cinema – e mesmo que não continuem sendo um termômetro para o estrelato em Hollywood – Powell terá como objetivo agraciá-las. Logo depois de conversarmos, ele embarca num avião para a África do Sul para filmar Huntington, um thriller de vingança da A24. Ele já foi escalado para a versão de Edgar Wright de O Sobrevivente e para o drama jurídico de John Lee Hancock, Monsanto, na Netflix. Além disso, está colaborando na criação de Chad Powers, uma série de comédia do Hulu sobre futebol universitário. E J. J. Abrams estaria “de olho” nele para estrelar seu próximo filme.

Além disso, tem aquele musical da Broadway. Powell está bolando um espetáculo ainda sem nome com Ryan Murphy, que o escalou para a série de comédia satírica Scream Queens quase uma década atrás, depois de conhecê-lo no set de Glee. (Powell não estava na série musical, mas era amigo de Chord Overstreet). Murphy diz que o ator já tinha apelo de estrela naquela época – até mesmo Jamie Lee Curtis e Niecy Nash puxaram o chefe de lado para perguntar: “Quem é esse aí? Onde você achou esse rapaz? – e continua a surpreendê-lo. Sem dar detalhes, Murphy observa que o musical foi ideia de Powell. “É interessante que alguém que fez Top Gun queira fazer um musical da Broadway”, diz Murphy.

Powell, sempre um teórico do cinema, diz que a questão é exatamente esta.

“Acho que o erro dos atores é esquecer o passado”, diz ele. “Dar ao público sempre o mesmo sabor é uma coisa muito ruim. McConaughey me deu este conselho. Ele disse: ‘Quando eles pensam que você vai fazer assim, você tem que fazer assado”. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU

Glen Powell em 'Twisters' Foto: Divulgação/Universal Pictures

Glen Powell aponta para o asfalto onde seus sonhos quase foram destruídos.

Ele tinha 13 anos e estava jogando basquete neste mesmo estacionamento do Austin Studios com outros atores mirins do terceiro filme Pequenos Espiões, quando derrubou sem querer um de seus colegas de elenco. Era um intervalo nas filmagens da popular franquia infantil, na qual Powell, cujo personagem aparece nos créditos simplesmente como “menino de dedos longos”, estava trabalhando apenas naquele dia. Era seu primeiro trabalho como ator. Será que algum dia ele poderia entrar num set de filmagem de novo?

O garoto ficou bem. E Powell também.

Ao relatar essa lembrança numa tarde de maio, parece ridículo que ele tenha se preocupado com o risco de um acidente como aquele atrapalhar sua carreira de ator. Mas Powell sempre olhou adiante. Ele sabe que o que você faz no presente pode determinar seu futuro. Ao que parece, isso se manifestou como ansiedade durante sua infância. Quando adulto, virou perspicácia nos negócios.

Isso talvez ajude a explicar por que Powell, 35 anos, parece estar em toda parte este ano. Ele brilha nas capas das revistas. Ele entra sorrateiramente em todos os seus feeds de redes sociais. Ele aparece em programas de entrevistas, onde diz a Gayle King que não está atrás de amor, mas que vai aceitar se “bater à minha porta”.

Powell não só ganhou credibilidade entre os críticos ao se tornar uma arma frequente no arsenal de Richard Linklater – mais recentemente na comédia de ação Assassino por Acaso, cujo roteiro tem a assinatura do ator – como também pode estar à beira do estrelato com um blockbuster. Depois de um papel coadjuvante que chamou a atenção no sucesso Top Gun: Maverick, Powell estrela o filme de desastre Twisters, a sequência de Lee Isaac Chung para o hit de Jan de Bont com Helen Hunt e Bill Paxton, de 1996.

Não é fácil tomar o lugar de Paxton, admirado por dar uma humanidade palpável a grandes produções. Os céticos levantam a sobrancelha para Powell, que vem sendo descrito como o novo Matthew McConaughey por causa do sorriso largo, do rosto talhado em madeira e do carisma texano. Ele já está pronto para expandir seu currículo com uma lista diversificada de projetos de cinema e televisão – além de um possível musical na Broadway – e tem um caderno cheio de conselhos de nomes como Tom Cruise. Mas será que isso se traduz em trajetória? Powell vai ser o próximo McConaughey ou Cruise? Será que ele pode se tornar um Paul Newman ou um Robert Redford, ganhando um respeito artístico equivalente ao seu queixo e à potência do seu sorriso?

Se você perguntar para os especialistas – digamos, uma ou duas ou oito pessoas que trabalharam com Powell em algum momento de seus 22 anos de carreira – eles vão dizer que isso não é fogo de palha. Segundo eles, Powell é um dos atores mais esforçados por aí. Ele faz questão de conhecer cada pessoa no set. Ele é o cara.

Mas em Hollywood, como o próprio Powell sabe faz muito tempo, nada é garantido.

“Tem muita conversa por aí, e eu tive que responder à pergunta: Glen é um astro de cinema?”, diz Linklater. “Qualquer pessoa que tenha trabalhado com Glen nos últimos dez anos sabe que ele é um astro de cinema. Sem a menor dúvida. A questão mais importante é se tem espaço na cultura para um novo astro de cinema”.

Recentemente, o Hollywood Reporter considerou Powell um membro da “nova lista A”, graças ao “golpe duplo” do queridinho dos festivais Assassino por Acaso e da comédia romântica Todos Menos Você, que arrecadou US$ 220 milhões no mundo todo – números inéditos para o gênero.

Mas nesta era de franquias de super-heróis e obscuros algoritmos de streaming, a definição tradicional de astro de cinema – alguém que consegue segurar um fim de semana de estreia – parece quase extinta. Embora a Netflix afirme que Assassino por Acaso teve um bom desempenho, entrando no seu top 10 global por três semanas seguidas, Powell ainda não é um protagonista comprovado nas bilheterias. A Universal está posicionando Twisters como sua grande aposta, confiando no efeito de suas estrelas e do espetáculo.

O destino do filme pode definir o destino de Powell.

No ano passado, Powell encontrou uma parceira de negócios valiosa em Sydney Sweeney, estrela de Todos Menos Você. Ele concordou com a ideia dela de alimentar rumores (falsos) de namoro como um jeito de os dois continuarem aparecendo nas manchetes durante o período que antecedeu o lançamento da comédia romântica.

Essa parte do plano deu certo, mas o filme ainda estava devagar nas bilheterias. (Depois de faturar apenas US$ 6 milhões no fim de semana de estreia, virou um sucesso mundial). O roteirista e diretor Will Gluck atribui naturalmente o impulso ao fato de o público ter se “apaixonado por Syd e Glen”, o que exigiu que seres humanos extraordinariamente bonitos parecessem… bem, como qualquer um de nós.

“Quando se tem alguém com a beleza de Glen, é preciso que o personagem também seja mais modesto”, diz Gluck. “É difícil fazer isso. Tive longas conversas com Glen sobre como eu gostaria que ele interpretasse esse personagem. ‘Até onde você está disposto a ir para baixar um pouco o seu brilho?’ Ele estava 100% disposto”.

Embora alguns atores possam se esquivar das comédias românticas, com receio de serem enquadrados como um tipo de específico de personagem ou de não serem levados a sério, Powell reconhece o poder de permanência do gênero. Ele foi criado no noroeste de Austin, filho do meio entre duas irmãs, Lauren e Leslie.

Os irmãos Powell assistiam e reassistiam a filmes como 10 Coisas que Eu Odeio em Você e Como Perder um Homem em 10 Dias. No Austin Studios, Powell argumenta sinceramente que as comédias românticas são “a linguagem cinematográfica mais universal”, porque “todos nós compartilhamos o desejo de amar e ser amados”.

É claro que o amor tende a ser confuso e imperfeito – e as comédias românticas só funcionam se os personagens centrais também se revelarem confusos e imperfeitos. Como protagonista no gênero, diz Powell, “você está lá para parecer meio tonto e para se divertir e para ser vulnerável. É isso”. Não tem muito espaço para orgulho ou ego. Você tem que entrar na brincadeira.

Powell estourou com outra comédia romântica: o filme da Netflix O Plano Imperfeito (2018), no qual ele e Zoey Deutch interpretam assistentes sobrecarregados que tentam aliviar sua carga de trabalho fazendo seus chefes temperamentais se apaixonarem um pelo outro. O personagem de Powell é um carinha do mercado financeiro. A roteirista Katie Silberman diz que o “calor inerente” do ator permite que ele prospere “quando interpreta um babaca – pelo menos no começo – porque você se importa tanto com ele que torce para ele conseguir o que quer”.

É como Tom Hanks em Mensagem para Você, diz ela. Só ele mesmo para fazer você torcer pelo vilão.

“Tem um ditado que diz: para fazer papel de burro, você tem que ser muito esperto e, para fazer papel de malvado, você tem que ser muito bonzinho”, continua Silberman. “Ele tem uma alegria e um calor tão profundos e inegáveis que você pode pegar isso e ir para onde quiser”.

Essa qualidade é um trunfo em qualquer gênero, até mesmo em filmes de catástrofe. Para escolher a pessoa certa para o papel de Tyler Owens em Twisters, um autodenominado “domador de tornados” cujas artimanhas de perseguição a tempestades acumularam muitos seguidores no YouTube, Chung (Minari) estava procurando um ator com um “profundo poço de empatia, seriedade e bondade” para equilibrar a arrogância. Ele não tinha certeza se Powell era esse cara. Mas aí Chung se deparou com uma das aparições de Powell em um programa matinal.

Powell trouxera o pai e a mãe, Glen pai e Cyndy, que há muito apoiam sua carreira de ator – a ponto de terem feito até aparições especiais em seus projetos. (Cyndy, dona de casa que foi empresária do filho desde o início, aparece como espiã no filme Pequenos Espiões, por exemplo; anos depois, ela e Glen pai interpretaram passageiros de avião numa cena de Todos Menos Você). Quando viu Powell fazendo palhaçada com os pais, Chung percebeu o que o ator poderia trazer para Twisters.

“De repente, vi esse lado dele que realmente revela quem ele é como pessoa – sua criação e seu relacionamento com a família”, diz Chung. “Por trás de tudo, ele tem uma humanidade profunda”.

Os pais adoram se gabar dos filhos, mas Cyndy faz questão de trazer evidências. Certa vez, a professora de Powell no jardim de infância disse que ele tinha uma presença notável e que “ou seria ator ou presidente”, diz ela. (Talvez ele venha a ser as duas coisas, do jeito que todo mundo fala desse cara. Ele tem 35 anos).

Quando Powell entregou um trabalho de poesia no ensino médio, a professora suspeitou que era plágio porque, segundo ela, “não é possível que um aluno dessa idade tenha escrito isso”. Ela chamou os pais de Powell e pediu que ele escrevesse outro poema sentado à vista deles. A professora leu-o e disse, como Cyndy lembra: “Eu realmente preciso me desculpar com você e com Glen”.

O lema da família sempre foi “avançar em todas as frentes”, diz Cyndy. Quando as crianças demonstravam interesse em algo novo, ela e o pai, coach executivo para empresas, as incentivavam a experimentar. Powell era uma criança atlética, mas também andava por aí com uma câmera de vídeo. Depois que ele conseguiu um agente e foi escalado para o filme Pequenos Espiões 3: Game Over, Cyndy o acompanhou até o Austin Studios, onde ele ficava rodeando as pessoas que trabalhavam nos bastidores, prestando atenção ao que faziam.

Glen Powell como Gary Johnson em 'Assassino por Acaso', em cartaz nos cinemas. Foto: Matt Lankes / Netflix / Divulgação

“Quando eu não o encontrava no set, ele estava com o diretor de fotografia ou atrás de algum operador de câmera”, diz ela.

Powell voltou ao estúdio para trabalhar com a Austin Film Society, fundada por Linklater. Um dia depois de me mostrar o que ele lembrava da produção de Pequenos Espiões 3: Game Over – o local do incidente de basquete é um dos pontos altos, assim como a tela verde onde ele filmou sua cena –, o ator entrou para o Hall da Fama do Texas. Seus pais se juntaram a ele no tapete vermelho, tirando sarro do filho com cartazes que diziam: “Pare de tentar fazer Glen Powell acontecer” e “Não vai dar certo nunca”.

Outras presenças na cerimônia? O professor de Powell no ensino médio, F.J. Schaack, que diz que Powell era “o único que escrevia roteiros” na aula de redação criativa. Schaack me manda por mensagem algumas fotos dos trabalhos de Powell daquela época. São, sem dúvida, trabalhos de adolescente. Um trecho de roteiro descreve um presidiário da cadeia do condado mostrando a bunda para uma mulher de dentro de sua cela. Uma ode a Christopher Walken admira o fato de o ator ser “imperfeito ao ponto da perfeição”.

Foi Schaack quem apresentou Powell às obras de Linklater, como Jovens, Loucos e Rebeldes (1993) e Antes do Amanhecer (1995). Logo depois, Powell conseguiu um pequeno papel na adaptação de Linklater do best-seller de não ficção Nação Fast Food (2006).

Mas foi só quando fez o teste para interpretar um jogador de beisebol pomposo na comédia esportiva Jovens, Loucos e Mais Rebeldes, quase uma década depois, que ele chamou atenção de verdade. “Ele era um jovem bonito, charmoso e carismático”, diz Linklater, que se lembra de ter pensado consigo mesmo: “Puxa vida, quando foi que Glen Powell ficou tão esperto e engraçado?”

Durante a pandemia, Powell mandou um e-mail a Linklater para discutir um artigo da Texas Monthly de 2001 sobre Gary Johnson, um homem sem grandes ambições que se passava por assassino profissional quando trabalhava para a polícia de Houston. Ele usava uma escuta para coletar evidências contra as pessoas que encomendavam os assassinatos. Linklater disse algo como: “Ótimo. Estou obcecado por essa história faz tempo. Mas acho que não funciona como filme”. Os eventos eram muito repetitivos. Não tinha um arco narrativo muito claro.

Linklater credita a Powell a ideia de usar o artigo da Texas Monthly como ponto de partida. “Fiquei meio: ‘Será que você consegue fazer isso?’”, diz o diretor. O artigo termina com uma história sobre Johnson ajudando uma mulher a procurar terapia e abrigo seguro – em vez de prendê-la – depois de saber que ela tinha sido vítima de abuso. Powell se perguntou o que poderia ter acontecido a partir daí. Gary se arrependeu da decisão de ajudá-la? Como poderia ter sido o relacionamento deles?

Adria Arjona como Madison e Glen Powell como Gary Johnson em 'Assassino por Acaso'. Foto: Netflix/Divulgação

Quando Powell se mudou para Los Angeles, ele pagava as contas trabalhando com roteiros. Mas Assassino por Acaso – no qual ele e Linklater são creditados pelo roteiro e o jornalista Skip Hollandsworth pela história original – é seu primeiro longa a cruzar a linha de chegada. Ele admira atores que têm “esse verdadeiro lado escritor”, citando George Clooney e Matt Damon como exemplos.

“Você pode ser ator, é uma profissão digna”, diz ele. “Você não precisa ficar no teclado. Mas, para se dar bem no jogo, acho que você tem que ser fã da boa escrita – e entender por que as pessoas se envolvem com uma boa escrita. Caso contrário, quando você entra no set, fica dependendo só da sorte”.

Embora Jovens, Loucos e Mais Rebeldes e O Plano Imperfeito tenham colocado Powell no mapa, seu maior filme até agora é Top Gun: Maverick. Na tão esperada sequência – que foi o segundo filme de maior bilheteria de 2022, arrecadando quase US$ 1,5 bilhão em todo o mundo – ele interpreta um arrogante piloto de caça da Marinha com o codinome Hangman [algo como “carrasco”], uma referência à sua disposição de “deixar você sangrando sozinho”.

O personagem de Tom Cruise acaba com toda essa pose, ensinando os jovens a ajudar uns aos outros. O ator deu muitos conselhos a Powell, que os anotou no caderno em que guarda a sabedoria dos mais experientes da indústria cinematográfica.

Powell aprendeu desde cedo a aproveitar ao máximo a proximidade com a grandeza. Depois que Denzel Washington o escalou para o filme O Grande Debate, de 2007, o então adolescente conheceu o importante agente de Washington Ed Limato, que ajudou a descobrir estrelas como Richard Gere e Kevin Costner. Limato incentivou Powell, então calouro na Universidade do Texas, a se mudar para Los Angeles – conselho que ele seguiu à risca. (Powell observa que Limato, que o contratou, também foi quem descobriu McConaughey, com quem Powell mais tarde fez amizade por meio de Linklater).

Ele começou o caderno no set do filme Os Mercenários, de 2014, quando Sylvester Stallone, que escreveu o roteiro, deu lições sobre como adaptar elementos de gêneros mais antigos, como westerns, para o público moderno. Mas são os conselhos de Cruise que dariam vários capítulos, diz Powell, a maior parte deles recolhidos no set de Top Gun: Maverick. “Esse filme não tem nenhuma parte que pareça pequena”, acrescenta Powell sobre a produção de grande sucesso, mas Cruise lembrava ao elenco que “cada quadro deste longa é um quadro emocional. É tudo uma questão de história, e tudo tem que ser guiado por ela”.

Poucos entendem a indústria cinematográfica tão bem quanto Cruise. Ele sabe o que as pessoas querem dele e faz hora extra para entregar. Na estreia europeia de Twisters, à qual ele compareceu em apoio a Powell, Cruise até lhe mostrou como posar com pipoca.

Glen Powell e Sidney Sweeney têm boa química em 'Todos Menos Você', comédia romântica que já arrecadou mais de 100 milhões de dólares. Foto: Sony Pictures/Divulgação

Ao ouvir Powell descrever sua abordagem para selecionar projetos, fica claro qual das lições de Cruise ressoou mais. (Dica: não é a pose da pipoca, que ele não domina muito bem). “É tipo, se eu conseguir manter a confiança do público ao longo de toda a minha carreira, se eu conseguir simplesmente continuar fazendo filmes bons, então vou seguir no jogo”, diz ele, tomando um gole de uma bebida energética da geladeira do escritório.

Powell queria fazer parte de Twisters desde que soube que Joseph Kosinski, seu diretor em Top Gun: Maverick, estava desenvolvendo a história do filme-catástrofe. O ator trouxe uma energia de Cruise para o set. A primeira cena que ele filmou foi a introdução de Tyler, na qual o personagem chega a Oklahoma a bordo de uma caminhonete toda equipada. Ele berra e bota a cabeça para fora da janela, gritando: “Se você está sentindo” – ao que uma multidão de fãs grita de volta o resto do bordão do YouTuber fictício, “Então corra atrás!”. Chung diz que não deu instruções específicas aos figurantes. Eles só responderam à energia de Powell. “Ali eu entendi que ia dar certo”, acrescenta ele.

Twisters, assim como o filme original, é ambicioso no uso de efeitos especiais. A certa altura, Tyler e Kate (Daisy Edgar-Jones), a cientista que caça tempestades com ele, chegam ao centro de um tornado. E é aí que o lembrete de Cruise vem à mente.

Enquanto trabalhava no filme, Powell compartilhou uma história de infância sobre ter testemunhado um tornado destrutivo perto da casa de sua tia, no leste do Texas. “Ele tinha uma fala em que dizia que não sabia se deveria estar com medo até olhar para ela”, lembra Chung. “E eu coloquei isso no filme, porque nosso filme é muito sobre a emoção do medo e o que você faz com o medo”.

É o tipo de detalhe com que as pessoas podem se identificar, um detalhe que cativa o público mais amplo, mas também serve à história. “É aí que quero jogar”, diz Powell. “Fazer um filme desse tamanho para as pessoas vivenciarem coletivamente no cinema é a coisa mais difícil do mundo. Eu vi Cruise quase se destruir tentando dar vida a Top Gun: Maverick. Eu via isso todos os dias e pensava: ‘Vale muito a pena’”.

No início deste ano, Powell voltou para Austin depois de se cansar de Los Angeles. “Virou uma espécie de cidade de influenciadores de TikTok”, diz ele, “o que para alguém como eu, neste momento, é o meu maior pesadelo”. Morar em Austin significa ficar mais perto da família. Além disso, ele nunca concluiu a graduação em rádio, televisão e cinema na Universidade do Texas, onde quer trabalhar entre os projetos, com o objetivo de se formar na primavera.

Powell é o tipo de cara que aprende as regras para poder quebrá-las. A maioria das pessoas não sairia da cidade quando a carreira começa a decolar, mas ele parece determinado a fazer isso dar certo. E porque não, quando até os líderes da indústria estão fazendo loucuras?

À medida que nos aproximamos do fim de nosso passeio pelo Austin Studios, Powell menciona seu trabalho para encorajar os legisladores do Texas a implementar certos incentivos fiscais como forma de atrair produções para o estado. (No ano passado, ele apareceu em um vídeo promocional ao lado de outros texanos famosos, como McConaughey, Woody Harrelson e Dennis Quaid, para exortar os habitantes a apoiarem a causa). Mesmo que Powell não acabe imitando Redford como estrela famosa, talvez consiga como empresário determinado.

Mas enquanto existirem salas de cinema – e mesmo que não continuem sendo um termômetro para o estrelato em Hollywood – Powell terá como objetivo agraciá-las. Logo depois de conversarmos, ele embarca num avião para a África do Sul para filmar Huntington, um thriller de vingança da A24. Ele já foi escalado para a versão de Edgar Wright de O Sobrevivente e para o drama jurídico de John Lee Hancock, Monsanto, na Netflix. Além disso, está colaborando na criação de Chad Powers, uma série de comédia do Hulu sobre futebol universitário. E J. J. Abrams estaria “de olho” nele para estrelar seu próximo filme.

Além disso, tem aquele musical da Broadway. Powell está bolando um espetáculo ainda sem nome com Ryan Murphy, que o escalou para a série de comédia satírica Scream Queens quase uma década atrás, depois de conhecê-lo no set de Glee. (Powell não estava na série musical, mas era amigo de Chord Overstreet). Murphy diz que o ator já tinha apelo de estrela naquela época – até mesmo Jamie Lee Curtis e Niecy Nash puxaram o chefe de lado para perguntar: “Quem é esse aí? Onde você achou esse rapaz? – e continua a surpreendê-lo. Sem dar detalhes, Murphy observa que o musical foi ideia de Powell. “É interessante que alguém que fez Top Gun queira fazer um musical da Broadway”, diz Murphy.

Powell, sempre um teórico do cinema, diz que a questão é exatamente esta.

“Acho que o erro dos atores é esquecer o passado”, diz ele. “Dar ao público sempre o mesmo sabor é uma coisa muito ruim. McConaughey me deu este conselho. Ele disse: ‘Quando eles pensam que você vai fazer assim, você tem que fazer assado”. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU

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