Coluna quinzenal do roteirista Lusa Silvestre com crônicas sobre a vida vista com ironia dramática

Opinião|Paulistano gosta tanto da sua cidade que, quando viaja, leva o trânsito na mala


No próximo réveillon, vou ficar em São Paulo. Aqui tem tudo o que eu preciso - peru, cerveja IPA, cinema, gente joia e internet

Por Lusa Silvestre

O Waze autorizou: pode sair que vai ser três horas. Catei as coisas, juntei família e liguei o carro. A perspectiva era chegar em São Paulo tipo uma da tarde. Perfeito.

Acontece que o Waze possui milhões de usuários. Mas não tem coração. Em vez de privilegiar os mais afetivos (eu), em vez de mocozar a informação, saiu contando pra todo mundo. O Hugo Gloss dos aplicativos. Aí, esses milhões de usuários caíram na estrada na mesma hora que eu.

O começo até que foi promissor. Durante a primeira hora, na via local, a viagem foi boa. Porém, já neste trecho, apareceu um problema: junto com a bagagem veio também uma mutuca - inseto com a envergadura, a camuflagem e o poder de fogo de um caça da Guerra do Golfo. A bicha atacou a aba da minha orelha num mergulho assassino. Doeu, coçou, latejou, esquentou e inchou - fiquei igual ao Doutor Spock (sem a mesma paciência).

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Cheguei na Dutra junto com a chuva. Um toró. Pra vocês terem noção, Noé achou melhor encostar a arca no Iate Clube de Ilhabela. A previsão foi pra cinco horas. Quando passamos por Aparecida, justo a terra da Mãinha, subiu pra sete. Metade dos carros boiava e metade embicava na basílica pra pedir pra parar de chover.

A previsão de três foi pra cinco horas... mas só depois de oito horas, chegamos. Caos na ida e na volta. Foto: Kadmy/Adobe Stock

Quando veio o milagre e estiou, o trânsito fluiu. Claro que, depois de horas na Dutra, debaixo de aguaceiro, agora batia inspiração e desespero pra ir ao banheiro. No WC do posto, outro engarrafamento - também com o asfalto escorregadio (se me entendem).

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Conseguimos engrenar 80 por hora. O trânsito só encrespava quando os carros tinham que passar pela polícia rodoviária. Acho absurdo diminuir porque a pessoa está na frente da PFR: ninguém cometeu nenhum crime. Né? Mesmo assim, tirei o pé - por precaução. Antes, os policiais rodoviários usavam bigode; pareciam mais simpáticos. Agora, dão medo.

Depois de oito horas, chegamos. São Paulo deserta. Dava pra jogar truco sentado no meio da 23. Paulistano gosta tanto da sua cidade que, quando viaja, leva o trânsito na mala. Fomos na Liberdade comer um japa e purificar o subaé, depois de tanto excesso. Terminei a viagem alimentado - mas com dor na lombar, na orelha e água dentro da porta do carro. A cada curva, escutava um chuá.

Caos na ida e na volta. Nem sei se vale mais a pena. No próximo réveillon, vou ficar em São Paulo. Aqui tem tudo o que eu preciso - peru, cerveja IPA, cinema, gente joia e internet. O que não encontrar na capital, eu mando trazer do interior. A mutuca inclusive já guardei numa gaiola. Capaz até dela engordar.

O Waze autorizou: pode sair que vai ser três horas. Catei as coisas, juntei família e liguei o carro. A perspectiva era chegar em São Paulo tipo uma da tarde. Perfeito.

Acontece que o Waze possui milhões de usuários. Mas não tem coração. Em vez de privilegiar os mais afetivos (eu), em vez de mocozar a informação, saiu contando pra todo mundo. O Hugo Gloss dos aplicativos. Aí, esses milhões de usuários caíram na estrada na mesma hora que eu.

O começo até que foi promissor. Durante a primeira hora, na via local, a viagem foi boa. Porém, já neste trecho, apareceu um problema: junto com a bagagem veio também uma mutuca - inseto com a envergadura, a camuflagem e o poder de fogo de um caça da Guerra do Golfo. A bicha atacou a aba da minha orelha num mergulho assassino. Doeu, coçou, latejou, esquentou e inchou - fiquei igual ao Doutor Spock (sem a mesma paciência).

Cheguei na Dutra junto com a chuva. Um toró. Pra vocês terem noção, Noé achou melhor encostar a arca no Iate Clube de Ilhabela. A previsão foi pra cinco horas. Quando passamos por Aparecida, justo a terra da Mãinha, subiu pra sete. Metade dos carros boiava e metade embicava na basílica pra pedir pra parar de chover.

A previsão de três foi pra cinco horas... mas só depois de oito horas, chegamos. Caos na ida e na volta. Foto: Kadmy/Adobe Stock

Quando veio o milagre e estiou, o trânsito fluiu. Claro que, depois de horas na Dutra, debaixo de aguaceiro, agora batia inspiração e desespero pra ir ao banheiro. No WC do posto, outro engarrafamento - também com o asfalto escorregadio (se me entendem).

Conseguimos engrenar 80 por hora. O trânsito só encrespava quando os carros tinham que passar pela polícia rodoviária. Acho absurdo diminuir porque a pessoa está na frente da PFR: ninguém cometeu nenhum crime. Né? Mesmo assim, tirei o pé - por precaução. Antes, os policiais rodoviários usavam bigode; pareciam mais simpáticos. Agora, dão medo.

Depois de oito horas, chegamos. São Paulo deserta. Dava pra jogar truco sentado no meio da 23. Paulistano gosta tanto da sua cidade que, quando viaja, leva o trânsito na mala. Fomos na Liberdade comer um japa e purificar o subaé, depois de tanto excesso. Terminei a viagem alimentado - mas com dor na lombar, na orelha e água dentro da porta do carro. A cada curva, escutava um chuá.

Caos na ida e na volta. Nem sei se vale mais a pena. No próximo réveillon, vou ficar em São Paulo. Aqui tem tudo o que eu preciso - peru, cerveja IPA, cinema, gente joia e internet. O que não encontrar na capital, eu mando trazer do interior. A mutuca inclusive já guardei numa gaiola. Capaz até dela engordar.

O Waze autorizou: pode sair que vai ser três horas. Catei as coisas, juntei família e liguei o carro. A perspectiva era chegar em São Paulo tipo uma da tarde. Perfeito.

Acontece que o Waze possui milhões de usuários. Mas não tem coração. Em vez de privilegiar os mais afetivos (eu), em vez de mocozar a informação, saiu contando pra todo mundo. O Hugo Gloss dos aplicativos. Aí, esses milhões de usuários caíram na estrada na mesma hora que eu.

O começo até que foi promissor. Durante a primeira hora, na via local, a viagem foi boa. Porém, já neste trecho, apareceu um problema: junto com a bagagem veio também uma mutuca - inseto com a envergadura, a camuflagem e o poder de fogo de um caça da Guerra do Golfo. A bicha atacou a aba da minha orelha num mergulho assassino. Doeu, coçou, latejou, esquentou e inchou - fiquei igual ao Doutor Spock (sem a mesma paciência).

Cheguei na Dutra junto com a chuva. Um toró. Pra vocês terem noção, Noé achou melhor encostar a arca no Iate Clube de Ilhabela. A previsão foi pra cinco horas. Quando passamos por Aparecida, justo a terra da Mãinha, subiu pra sete. Metade dos carros boiava e metade embicava na basílica pra pedir pra parar de chover.

A previsão de três foi pra cinco horas... mas só depois de oito horas, chegamos. Caos na ida e na volta. Foto: Kadmy/Adobe Stock

Quando veio o milagre e estiou, o trânsito fluiu. Claro que, depois de horas na Dutra, debaixo de aguaceiro, agora batia inspiração e desespero pra ir ao banheiro. No WC do posto, outro engarrafamento - também com o asfalto escorregadio (se me entendem).

Conseguimos engrenar 80 por hora. O trânsito só encrespava quando os carros tinham que passar pela polícia rodoviária. Acho absurdo diminuir porque a pessoa está na frente da PFR: ninguém cometeu nenhum crime. Né? Mesmo assim, tirei o pé - por precaução. Antes, os policiais rodoviários usavam bigode; pareciam mais simpáticos. Agora, dão medo.

Depois de oito horas, chegamos. São Paulo deserta. Dava pra jogar truco sentado no meio da 23. Paulistano gosta tanto da sua cidade que, quando viaja, leva o trânsito na mala. Fomos na Liberdade comer um japa e purificar o subaé, depois de tanto excesso. Terminei a viagem alimentado - mas com dor na lombar, na orelha e água dentro da porta do carro. A cada curva, escutava um chuá.

Caos na ida e na volta. Nem sei se vale mais a pena. No próximo réveillon, vou ficar em São Paulo. Aqui tem tudo o que eu preciso - peru, cerveja IPA, cinema, gente joia e internet. O que não encontrar na capital, eu mando trazer do interior. A mutuca inclusive já guardei numa gaiola. Capaz até dela engordar.

Opinião por Lusa Silvestre

Roteirista dos filmes 'Estômago', 'O Roubo da Taça', 'Medida Provisória' e 'Sequestro do Voo 375'.

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