Um de nossos ex-presidentes veio com essa: não leio livros porque não tenho tempo. Então como ele se informa? Pelo WhatsApp. No mesmo instante, Machado de Assis desmaiou no colo de Olavo Bilac. E Rui Barbosa chamou o Samu.
Verdade seja dita: ninguém pode acusar este ex-presidente de ser o único a promover o obscurantismo. A educação e a cultura vêm sendo negligenciadas desde que Cabral chegou trazendo espelhinhos, tênis Nike e fitas TDK pra nosso povo. Podia ser um poema de Camões ao invés - mas não.
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Que coisa mais inclusiva e moderna que é a educação por mídia social. Temos aí a salvação da nossa cultura. Podemos relaxar; o Brasil está no primeiro mundo. Pense: sujeito está deitado na rede, matando um pão com leite condensado, e recebe um áudio do Einstein contando da Teoria da Relatividade. Ou então um vídeo do faraó Queóps explicando como construíram as pirâmides de Gizé. A pessoa nem precisa ir mais na escola – um alívio porque lá, agora, celular é proibido. Melhor ficar na rede mesmo.
Podemos inclusive levar essa didática para outras mídias, promovendo a educação por todo o Brasilzão. Imaginem o bem que o antigo Twitter pode fazer pela literatura. “Crime e Castigo”, do Dostoiévski, fica fácil: Raskólnikov mata idosa usurária, e em seguida enlouquece. Pronto. Em vez de 592 páginas, 56 caracteres. “Grande Sertão: Veredas”, do Guima, que progresso: Riobaldo vive pelo deserto dando tiro, aí se apaixona por Diadorim, descobre que ele é ela – e fim. Saramago vira post: Península Ibérica se desgarra da Europa e loucas aventuras acontecem. Dá pra ler vinte livros num Uber Black até a Faria Lima. Isso sim é educação acessível.
Nesse meio tempo, a Coreia do Sul conquista o mundo com sua cultura. É política de estado - competente e que vem de longe. Basta ver como eles inventaram o próprio alfabeto, em 1446. O Hangun, criado a partir da articulação das palavras em coreano, foi um pedido do Rei Sejong para popularizar a leitura, até então baseada nos caracteres chineses. Só a elite lia e escrevia. Obras pop atuais - como Parasita, Round 6 e até o K-Pop - começaram 600 anos atrás, com o nascimento de um alfabeto nacional. Aqui, quem deveria dar o exemplo se informa em um aplicativo bom de espalhar groselha.
Já que falamos de ex-governantes e reis já postos, trago uma frase de outro deles, desta vez Barack Obama: a ignorância não é uma virtude. Que os nossos políticos se inspirem nele para finalmente sair do zapzap e correr pras livrarias.