Cultura, comportamento, noite e gente em São Paulo

‘Carnaval é a grande festa da inclusão e da democracia’, afirma Betty Milan


A folia tem poder de reinventar o Brasil e as pessoas, diz a psicanalista e autora de livro sobre o assunto

Por Paula Bonelli

Betty Milan é destacada observadora do carnaval. Para a psicanalista e escritora, a festa permite às pessoas de todas as classes sociais viverem fantasias grandiosas, deixando sofrimentos e dificuldades de lado por alguns dias. O seu livro Os Bastidores do Carnaval está completando 35 anos de publicação. Foi o resultado de uma pesquisa que realizou nas escolas de samba do Rio de Janeiro e junto ao carnavalesco Joãosinho Trinta (1933- 2011). Ele teve passagens pela Salgueiro, Beija-flor, Viradouro, Vila Isabel e foi nove vezes campeão do grupo especial do carnaval do Rio.

Na década de 70, Betty foi analisada por Jacques Lacan na França por um ano e se tornou por aqui uma difusora de sua obra e método. A seguir, a entrevista com a autora feita pela repórter Paula Bonelli por telefone. Betty tem 26 livros publicados no Brasil e seis na França – sem abrir mão de tomar uma xícara de café pela manhã e outra logo depois do almoço.

A escritora e psicanalista Betty Milan Foto: Denise Andrade/Estadão
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Como enxerga e avalia o carnaval?

É a grande festa da inclusão no Brasil, como se a desigualdade social fosse suprimida, suspensa, durante alguns dias. Profundamente democrático, no carnaval as pessoas se esquecem de uma realidade muito dura e podem realizar no imaginário os seus sonhos.

Qual imaginário é esse?

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Eu vou ler um pequeno fragmento do livro Os Bastidores do Carnaval que traz uma declaração que Joãosinho Trinta fez na imprensa, dizendo: “O povo gosta de luxo. Quem gosta de miséria é intelectual”. O carnavalesco declarou também na década de 80: As pessoas que reclamam dos carros alegóricos são as que vivem neles em edifícios de apartamentos. O povo que vive em casebre, em rua de lama, no aperto, quer coisas grandes, procura essa outra dimensão, que só encontra no carnaval. O luxo não é de quem tem muito dinheiro, não. As joias e os diamantes de uma escola de samba são falsas, mas são muito mais verdadeiras porque têm implicações mágicas. Quando uma empregada doméstica se veste de Cinderela, faz parte da nobreza medieval, está com as joias mais autênticas porque são as joias da imaginação.

O que mais a festa popular propicia?

O carnaval promove uma viagem no espaço e no tempo. A pessoa sai do casebre, mora numa alegoria e ainda é reconhecida pelos outros. É a grande tradição e um milagre brasileiro como dizia Joãosinho Trinta. As escolas de samba tem mais de 3 mil componentes, algo extraordinário. O escritor Jorge Amado afirmava que enquanto a elite requentava a cultura europeia, o povo brasileiro tinha o samba como denominador comum.

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Existe um só carnaval?

Não, existem muitos aqui no Brasil. A tradição está ligada a reinvenção de si mesmo, rememoração de carnavais antigos e da história do Brasil ou do mundo. Outra ideia do meu livro que continua atual e a me surpreender: E se o carnaval não fosse só o dia do esquecimento, mas também a nossa memória. A repetição da fantasia de um dia entrar no paraíso. A reinvenção permanente do Brasil para si e para os outros. Não há repetição. As alegorias e as fantasias desaparecem depois do desfile. No ano seguinte, são outras. Eu lamento muito porque elas bem merecem estar num museu. Se o Brasil não fosse um país desmemoriado teríamos um grande museu do carnaval.

O carnaval pode ser entendido como algum sinal de saúde mental coletiva?

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Sim, não só propicia grande alegria, como traz o mundo inteiro para cá. A única coisa que não se deixa de exportar no Brasil é o carnaval e o futebol. Eu sei que mulheres muito idosas que tinham dores de coluna saravam treinando para o desfile da escola de samba. A alegria é muito benéfica. Oswald de Andrade tinha razão ao dizer que a alegria é a prova dos nove. Existe também, no carnaval, uma tradição muito interessante de produzir a própria roupa com o que tiver no armário: transformar uma caixa de catupiry em um chapéu. Quem faz isso geralmente é a criança. É uma volta à infância. Como diz Manoel de Barros, a criança pode errar na gramática, mas ela nunca erra na poesia. E no carnaval é quando estamos autorizados a viver poeticamente.

A folia faz sentido em uma sociedade polarizada?

Claro que sim, ela inclui todo mundo. Isso não quer dizer que o carnaval vai despolarizar a sociedade. Mas a pessoa não deixa de festejar pelo Lula ou pelo Bolsonaro. Agora o carnaval faz a sátira da polarização, dos políticos. É só prestar atenção a uma letra de samba e verificar quão crítica e pertinente muitas vezes ela é.

Betty Milan é destacada observadora do carnaval. Para a psicanalista e escritora, a festa permite às pessoas de todas as classes sociais viverem fantasias grandiosas, deixando sofrimentos e dificuldades de lado por alguns dias. O seu livro Os Bastidores do Carnaval está completando 35 anos de publicação. Foi o resultado de uma pesquisa que realizou nas escolas de samba do Rio de Janeiro e junto ao carnavalesco Joãosinho Trinta (1933- 2011). Ele teve passagens pela Salgueiro, Beija-flor, Viradouro, Vila Isabel e foi nove vezes campeão do grupo especial do carnaval do Rio.

Na década de 70, Betty foi analisada por Jacques Lacan na França por um ano e se tornou por aqui uma difusora de sua obra e método. A seguir, a entrevista com a autora feita pela repórter Paula Bonelli por telefone. Betty tem 26 livros publicados no Brasil e seis na França – sem abrir mão de tomar uma xícara de café pela manhã e outra logo depois do almoço.

A escritora e psicanalista Betty Milan Foto: Denise Andrade/Estadão

Como enxerga e avalia o carnaval?

É a grande festa da inclusão no Brasil, como se a desigualdade social fosse suprimida, suspensa, durante alguns dias. Profundamente democrático, no carnaval as pessoas se esquecem de uma realidade muito dura e podem realizar no imaginário os seus sonhos.

Qual imaginário é esse?

Eu vou ler um pequeno fragmento do livro Os Bastidores do Carnaval que traz uma declaração que Joãosinho Trinta fez na imprensa, dizendo: “O povo gosta de luxo. Quem gosta de miséria é intelectual”. O carnavalesco declarou também na década de 80: As pessoas que reclamam dos carros alegóricos são as que vivem neles em edifícios de apartamentos. O povo que vive em casebre, em rua de lama, no aperto, quer coisas grandes, procura essa outra dimensão, que só encontra no carnaval. O luxo não é de quem tem muito dinheiro, não. As joias e os diamantes de uma escola de samba são falsas, mas são muito mais verdadeiras porque têm implicações mágicas. Quando uma empregada doméstica se veste de Cinderela, faz parte da nobreza medieval, está com as joias mais autênticas porque são as joias da imaginação.

O que mais a festa popular propicia?

O carnaval promove uma viagem no espaço e no tempo. A pessoa sai do casebre, mora numa alegoria e ainda é reconhecida pelos outros. É a grande tradição e um milagre brasileiro como dizia Joãosinho Trinta. As escolas de samba tem mais de 3 mil componentes, algo extraordinário. O escritor Jorge Amado afirmava que enquanto a elite requentava a cultura europeia, o povo brasileiro tinha o samba como denominador comum.

Existe um só carnaval?

Não, existem muitos aqui no Brasil. A tradição está ligada a reinvenção de si mesmo, rememoração de carnavais antigos e da história do Brasil ou do mundo. Outra ideia do meu livro que continua atual e a me surpreender: E se o carnaval não fosse só o dia do esquecimento, mas também a nossa memória. A repetição da fantasia de um dia entrar no paraíso. A reinvenção permanente do Brasil para si e para os outros. Não há repetição. As alegorias e as fantasias desaparecem depois do desfile. No ano seguinte, são outras. Eu lamento muito porque elas bem merecem estar num museu. Se o Brasil não fosse um país desmemoriado teríamos um grande museu do carnaval.

O carnaval pode ser entendido como algum sinal de saúde mental coletiva?

Sim, não só propicia grande alegria, como traz o mundo inteiro para cá. A única coisa que não se deixa de exportar no Brasil é o carnaval e o futebol. Eu sei que mulheres muito idosas que tinham dores de coluna saravam treinando para o desfile da escola de samba. A alegria é muito benéfica. Oswald de Andrade tinha razão ao dizer que a alegria é a prova dos nove. Existe também, no carnaval, uma tradição muito interessante de produzir a própria roupa com o que tiver no armário: transformar uma caixa de catupiry em um chapéu. Quem faz isso geralmente é a criança. É uma volta à infância. Como diz Manoel de Barros, a criança pode errar na gramática, mas ela nunca erra na poesia. E no carnaval é quando estamos autorizados a viver poeticamente.

A folia faz sentido em uma sociedade polarizada?

Claro que sim, ela inclui todo mundo. Isso não quer dizer que o carnaval vai despolarizar a sociedade. Mas a pessoa não deixa de festejar pelo Lula ou pelo Bolsonaro. Agora o carnaval faz a sátira da polarização, dos políticos. É só prestar atenção a uma letra de samba e verificar quão crítica e pertinente muitas vezes ela é.

Betty Milan é destacada observadora do carnaval. Para a psicanalista e escritora, a festa permite às pessoas de todas as classes sociais viverem fantasias grandiosas, deixando sofrimentos e dificuldades de lado por alguns dias. O seu livro Os Bastidores do Carnaval está completando 35 anos de publicação. Foi o resultado de uma pesquisa que realizou nas escolas de samba do Rio de Janeiro e junto ao carnavalesco Joãosinho Trinta (1933- 2011). Ele teve passagens pela Salgueiro, Beija-flor, Viradouro, Vila Isabel e foi nove vezes campeão do grupo especial do carnaval do Rio.

Na década de 70, Betty foi analisada por Jacques Lacan na França por um ano e se tornou por aqui uma difusora de sua obra e método. A seguir, a entrevista com a autora feita pela repórter Paula Bonelli por telefone. Betty tem 26 livros publicados no Brasil e seis na França – sem abrir mão de tomar uma xícara de café pela manhã e outra logo depois do almoço.

A escritora e psicanalista Betty Milan Foto: Denise Andrade/Estadão

Como enxerga e avalia o carnaval?

É a grande festa da inclusão no Brasil, como se a desigualdade social fosse suprimida, suspensa, durante alguns dias. Profundamente democrático, no carnaval as pessoas se esquecem de uma realidade muito dura e podem realizar no imaginário os seus sonhos.

Qual imaginário é esse?

Eu vou ler um pequeno fragmento do livro Os Bastidores do Carnaval que traz uma declaração que Joãosinho Trinta fez na imprensa, dizendo: “O povo gosta de luxo. Quem gosta de miséria é intelectual”. O carnavalesco declarou também na década de 80: As pessoas que reclamam dos carros alegóricos são as que vivem neles em edifícios de apartamentos. O povo que vive em casebre, em rua de lama, no aperto, quer coisas grandes, procura essa outra dimensão, que só encontra no carnaval. O luxo não é de quem tem muito dinheiro, não. As joias e os diamantes de uma escola de samba são falsas, mas são muito mais verdadeiras porque têm implicações mágicas. Quando uma empregada doméstica se veste de Cinderela, faz parte da nobreza medieval, está com as joias mais autênticas porque são as joias da imaginação.

O que mais a festa popular propicia?

O carnaval promove uma viagem no espaço e no tempo. A pessoa sai do casebre, mora numa alegoria e ainda é reconhecida pelos outros. É a grande tradição e um milagre brasileiro como dizia Joãosinho Trinta. As escolas de samba tem mais de 3 mil componentes, algo extraordinário. O escritor Jorge Amado afirmava que enquanto a elite requentava a cultura europeia, o povo brasileiro tinha o samba como denominador comum.

Existe um só carnaval?

Não, existem muitos aqui no Brasil. A tradição está ligada a reinvenção de si mesmo, rememoração de carnavais antigos e da história do Brasil ou do mundo. Outra ideia do meu livro que continua atual e a me surpreender: E se o carnaval não fosse só o dia do esquecimento, mas também a nossa memória. A repetição da fantasia de um dia entrar no paraíso. A reinvenção permanente do Brasil para si e para os outros. Não há repetição. As alegorias e as fantasias desaparecem depois do desfile. No ano seguinte, são outras. Eu lamento muito porque elas bem merecem estar num museu. Se o Brasil não fosse um país desmemoriado teríamos um grande museu do carnaval.

O carnaval pode ser entendido como algum sinal de saúde mental coletiva?

Sim, não só propicia grande alegria, como traz o mundo inteiro para cá. A única coisa que não se deixa de exportar no Brasil é o carnaval e o futebol. Eu sei que mulheres muito idosas que tinham dores de coluna saravam treinando para o desfile da escola de samba. A alegria é muito benéfica. Oswald de Andrade tinha razão ao dizer que a alegria é a prova dos nove. Existe também, no carnaval, uma tradição muito interessante de produzir a própria roupa com o que tiver no armário: transformar uma caixa de catupiry em um chapéu. Quem faz isso geralmente é a criança. É uma volta à infância. Como diz Manoel de Barros, a criança pode errar na gramática, mas ela nunca erra na poesia. E no carnaval é quando estamos autorizados a viver poeticamente.

A folia faz sentido em uma sociedade polarizada?

Claro que sim, ela inclui todo mundo. Isso não quer dizer que o carnaval vai despolarizar a sociedade. Mas a pessoa não deixa de festejar pelo Lula ou pelo Bolsonaro. Agora o carnaval faz a sátira da polarização, dos políticos. É só prestar atenção a uma letra de samba e verificar quão crítica e pertinente muitas vezes ela é.

Betty Milan é destacada observadora do carnaval. Para a psicanalista e escritora, a festa permite às pessoas de todas as classes sociais viverem fantasias grandiosas, deixando sofrimentos e dificuldades de lado por alguns dias. O seu livro Os Bastidores do Carnaval está completando 35 anos de publicação. Foi o resultado de uma pesquisa que realizou nas escolas de samba do Rio de Janeiro e junto ao carnavalesco Joãosinho Trinta (1933- 2011). Ele teve passagens pela Salgueiro, Beija-flor, Viradouro, Vila Isabel e foi nove vezes campeão do grupo especial do carnaval do Rio.

Na década de 70, Betty foi analisada por Jacques Lacan na França por um ano e se tornou por aqui uma difusora de sua obra e método. A seguir, a entrevista com a autora feita pela repórter Paula Bonelli por telefone. Betty tem 26 livros publicados no Brasil e seis na França – sem abrir mão de tomar uma xícara de café pela manhã e outra logo depois do almoço.

A escritora e psicanalista Betty Milan Foto: Denise Andrade/Estadão

Como enxerga e avalia o carnaval?

É a grande festa da inclusão no Brasil, como se a desigualdade social fosse suprimida, suspensa, durante alguns dias. Profundamente democrático, no carnaval as pessoas se esquecem de uma realidade muito dura e podem realizar no imaginário os seus sonhos.

Qual imaginário é esse?

Eu vou ler um pequeno fragmento do livro Os Bastidores do Carnaval que traz uma declaração que Joãosinho Trinta fez na imprensa, dizendo: “O povo gosta de luxo. Quem gosta de miséria é intelectual”. O carnavalesco declarou também na década de 80: As pessoas que reclamam dos carros alegóricos são as que vivem neles em edifícios de apartamentos. O povo que vive em casebre, em rua de lama, no aperto, quer coisas grandes, procura essa outra dimensão, que só encontra no carnaval. O luxo não é de quem tem muito dinheiro, não. As joias e os diamantes de uma escola de samba são falsas, mas são muito mais verdadeiras porque têm implicações mágicas. Quando uma empregada doméstica se veste de Cinderela, faz parte da nobreza medieval, está com as joias mais autênticas porque são as joias da imaginação.

O que mais a festa popular propicia?

O carnaval promove uma viagem no espaço e no tempo. A pessoa sai do casebre, mora numa alegoria e ainda é reconhecida pelos outros. É a grande tradição e um milagre brasileiro como dizia Joãosinho Trinta. As escolas de samba tem mais de 3 mil componentes, algo extraordinário. O escritor Jorge Amado afirmava que enquanto a elite requentava a cultura europeia, o povo brasileiro tinha o samba como denominador comum.

Existe um só carnaval?

Não, existem muitos aqui no Brasil. A tradição está ligada a reinvenção de si mesmo, rememoração de carnavais antigos e da história do Brasil ou do mundo. Outra ideia do meu livro que continua atual e a me surpreender: E se o carnaval não fosse só o dia do esquecimento, mas também a nossa memória. A repetição da fantasia de um dia entrar no paraíso. A reinvenção permanente do Brasil para si e para os outros. Não há repetição. As alegorias e as fantasias desaparecem depois do desfile. No ano seguinte, são outras. Eu lamento muito porque elas bem merecem estar num museu. Se o Brasil não fosse um país desmemoriado teríamos um grande museu do carnaval.

O carnaval pode ser entendido como algum sinal de saúde mental coletiva?

Sim, não só propicia grande alegria, como traz o mundo inteiro para cá. A única coisa que não se deixa de exportar no Brasil é o carnaval e o futebol. Eu sei que mulheres muito idosas que tinham dores de coluna saravam treinando para o desfile da escola de samba. A alegria é muito benéfica. Oswald de Andrade tinha razão ao dizer que a alegria é a prova dos nove. Existe também, no carnaval, uma tradição muito interessante de produzir a própria roupa com o que tiver no armário: transformar uma caixa de catupiry em um chapéu. Quem faz isso geralmente é a criança. É uma volta à infância. Como diz Manoel de Barros, a criança pode errar na gramática, mas ela nunca erra na poesia. E no carnaval é quando estamos autorizados a viver poeticamente.

A folia faz sentido em uma sociedade polarizada?

Claro que sim, ela inclui todo mundo. Isso não quer dizer que o carnaval vai despolarizar a sociedade. Mas a pessoa não deixa de festejar pelo Lula ou pelo Bolsonaro. Agora o carnaval faz a sátira da polarização, dos políticos. É só prestar atenção a uma letra de samba e verificar quão crítica e pertinente muitas vezes ela é.

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