Inventor do termo metaverso tem livro lançado no Brasil


Neal Stephenson é autor de ‘Snow Crash’, que provocou uma revolução há 30 anos com história sobre hacker futurista

Por André Cáceres
Atualização:

Metaverso ficou entre as três palavras do ano da Oxford University Press em 2022. O termo, que sugere um ecossistema em realidade virtual no qual usuários podem interagir entre si como se estivessem no mundo físico, caiu nas graças de figuras-chave do Vale do Silício, como Mark Zuckerberg, que considera essa a próxima grande revolução tecnológica a caminho. O que nem todos os entusiastas da tecnologia de ponta sabem é que o vocábulo foi cunhado pelo escritor estadunidense de ficção científica Neal Stephenson em seu clássico Snow Crash (1992), que ganhou nova edição no Brasil pela Aleph.

O conceito de um mundo paralelo construído digitalmente e sustentado por meio de computadores e servidores permeou diversas obras do subgênero cyberpunk entre os anos 1980 e 2000. De Neuromancer, de William Gibson, a Matrix, das irmãs Wachowski, a ideia permeou diversas obras, mas encontrou no metaverso de Neal Stephenson sua representação mais bem acabada.

Cena da série "Snow Crash', da HBO, baseada no livro de Neal Stephenson  Foto: HBO
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A princípio, Snow Crash soa como uma Torre de Babel de anglicismos, aberrações e aparatos malucos em um mundo semidistópico que perturbadoramente se parece mais com a realidade hoje do que quando foi concebido. Hiro Protagonist é uma espécie de entregador de comida freelancer para uma cadeia de pizzarias que serve de empresa de fachada para a máfia italiana. Quando volta para casa e põe seus óculos de realidade virtual, porém, ele é um dos mais respeitados hackers do planeta e um dos criadores do código original do metaverso.

Nesse ambiente digital, onde as pessoas podem ser o que quiserem desde que saibam programar com destreza seus avatares, Hiro é um samurai tecnológico — revelada aos poucos ao longo do romance, sua relação com o Japão e com a figura do pai, que combateu na 2ª. Guerra Mundial, é um dos pontos altos da obra.

Símbolo de uma globalização há muito anunciada – vale lembrar que Snow Crash foi publicado no mesmo ano que O Fim da História, do filósofo e economista Francis Fukuyama –, Hiro é uma figura cultural e etnicamente indefinível, um misto de ocidental, africano e asiático.

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O escritor Francis Fukuyama, autor de 'O Fim da História', lançado no mesmo ano de 'Snowcrash' Foto: El Clarín

A despeito da proeza de ter previsto a ascensão da internet como um ambiente de interações fraudulentas, relações superficiais e escapismo, o aspecto mais instigante de Snow Crash talvez não seja o metaverso, e sim a organização social do mundo fora do ambiente digital.

Na obra, Neal Stephenson faz uma crônica futura do pesadelo anarcocapitalista, em que empresas são muito mais poderosas e influentes que governos. Praticamente todo o território americano foi privatizado e cada pedaço é controlado por uma corporação, com leis próprias. O livro mostra como a quebra do monopólio da violência pelo Estado provoca uma escalada sem fim de conflitos.

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É curioso como esse romance foi escrito antes que empresários como Elon Musk, Jeff Bezos, Mark Zuckerberg e Bill Gates acumulassem poder político e econômico suficiente para que seus conglomerados de empresas rivalizassem até mesmo com governos mundo afora.

Mark Zuckerberg, um dos criadores do Facebook, rebatizado por ele de Meta opor causa do metaverso Foto: Nick Wass/AP

Em Snow Crash é o excêntrico L. Bob Rife, um bilionário homem de negócios, quem perturba o delicado equilíbrio de forças que mantém funcionando a sociedade descrita por Stephenson, ameaçando tanto o mundo real quanto o metaverso com uma espécie de vírus linguístico que se espalha entre mentes e máquinas, incapacitando hackers que se oponham às suas ambições e convertendo massas para uma religião fundada por ele.

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Para fundamentar a noção de religiões como vírus, Stephenson encontra linguagem produzida a partir de zeros e uns (como na computação) em pontos inesperados da história da humanidade, como hieróglifos, tabuletas sumérias e no alfabeto arcangélico da Cabala, traçando paralelos surpreendentes entre antiguidade e modernidade.

Muito além de um thriller cyberpunk com cenas de ação desenfreada e personagens grotescos, Snow Crash se propõe a meditar sobre a alienação no mundo contemporâneo, a natureza do poder e as mazelas da tecnologia. Por meio de capítulos cronologicamente desordenados, a obra sugere a fragmentação do ambiente digital, que mais desorienta seus usuários do que organiza as informações que deveria fornecer.

Em tempos nos quais o metaverso é celebrado como uma meta a ser alcançada, grupos de discussão sobre o anarcocapitalismo vicejam em cantos recônditos da internet e a diminuição do Estado é tratada como positiva por uma ampla parcela da sociedade, as reflexões de Neal Stephenson são relevantes doses de lucidez. O mundo bizarro de Snow Crash, tomado como receita para o futuro no Vale do Silício, é na verdade uma fábula cautelar.

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Metaverso. Desde que a pandemia da covid-19 tomou de assalto o mundo contemporâneo, transformando profundamente a maneira como as pessoas se relacionam com o trabalho, com outras pessoas e com a tecnologia, uma palavra não deixa os holofotes no Vale do Silício, região da Califórnia que concentra as grandes multinacionais tecnológicas: metaverso.

A ideia, que consiste em um ambiente digital imersivo, no qual as pessoas podem interagir como se estivessem se vendo presencialmente, talvez tenha ganhado força justamente pelo distanciamento social que marcou, em especial, os anos de 2020 e 2021.

A frustração pelas relações sociais e laborais à distância, vendo amigos, colegas e familiares por meio de janelinhas em softwares de conferência virtual como o Zoom pode ter sido um dos fatores que fez figuras como Mark Zuckerberg se interessarem por essa ideia surgida em romances distópicos.

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A obsessão foi tamanha que Zuckerberg, o todo-poderoso criador do Facebook, renomeou, no fim de 2021, sua empresa para Meta. A mais recente aquisição da corporação, em setembro de 2022, foi a empresa berlinense Lofelt, que trabalha com tecnologia háptica, ou seja, feedback tátil para ambientes de realidade virtual — como luvas e acessórios que simulam as sensações de tato, tornando o mundo digital tangível ao usuário.

A Bloomberg já estimou que, mesmo sem ter sido formalizado, o metaverso deve movimentar US$ 800 milhões até 2024. A consultoria Gartner previu que as pessoas devem passar em média uma hora por dia no metaverso até 2026. Outras gigantes, como Google, Microsoft, Disney, Nvidia, Epic Games e até empresas de outros setores, como Nike e Walmart, já investiram no metaverso.

A aposta, no entanto, não demonstrou ser lucrativa. Desde que adotou o novo nome, a Meta perdeu dois terços do valor de suas ações, voltando ao patamar pré-pandemia. O próprio Neal Stephenson já se pronunciou com bastante receio a respeito: “Preste atenção: todo mundo pode usar essas ferramentas de graça, mas as empresas estão ricas. Então, estão vendendo seus dados.”

Metaverso ficou entre as três palavras do ano da Oxford University Press em 2022. O termo, que sugere um ecossistema em realidade virtual no qual usuários podem interagir entre si como se estivessem no mundo físico, caiu nas graças de figuras-chave do Vale do Silício, como Mark Zuckerberg, que considera essa a próxima grande revolução tecnológica a caminho. O que nem todos os entusiastas da tecnologia de ponta sabem é que o vocábulo foi cunhado pelo escritor estadunidense de ficção científica Neal Stephenson em seu clássico Snow Crash (1992), que ganhou nova edição no Brasil pela Aleph.

O conceito de um mundo paralelo construído digitalmente e sustentado por meio de computadores e servidores permeou diversas obras do subgênero cyberpunk entre os anos 1980 e 2000. De Neuromancer, de William Gibson, a Matrix, das irmãs Wachowski, a ideia permeou diversas obras, mas encontrou no metaverso de Neal Stephenson sua representação mais bem acabada.

Cena da série "Snow Crash', da HBO, baseada no livro de Neal Stephenson  Foto: HBO

A princípio, Snow Crash soa como uma Torre de Babel de anglicismos, aberrações e aparatos malucos em um mundo semidistópico que perturbadoramente se parece mais com a realidade hoje do que quando foi concebido. Hiro Protagonist é uma espécie de entregador de comida freelancer para uma cadeia de pizzarias que serve de empresa de fachada para a máfia italiana. Quando volta para casa e põe seus óculos de realidade virtual, porém, ele é um dos mais respeitados hackers do planeta e um dos criadores do código original do metaverso.

Nesse ambiente digital, onde as pessoas podem ser o que quiserem desde que saibam programar com destreza seus avatares, Hiro é um samurai tecnológico — revelada aos poucos ao longo do romance, sua relação com o Japão e com a figura do pai, que combateu na 2ª. Guerra Mundial, é um dos pontos altos da obra.

Símbolo de uma globalização há muito anunciada – vale lembrar que Snow Crash foi publicado no mesmo ano que O Fim da História, do filósofo e economista Francis Fukuyama –, Hiro é uma figura cultural e etnicamente indefinível, um misto de ocidental, africano e asiático.

O escritor Francis Fukuyama, autor de 'O Fim da História', lançado no mesmo ano de 'Snowcrash' Foto: El Clarín

A despeito da proeza de ter previsto a ascensão da internet como um ambiente de interações fraudulentas, relações superficiais e escapismo, o aspecto mais instigante de Snow Crash talvez não seja o metaverso, e sim a organização social do mundo fora do ambiente digital.

Na obra, Neal Stephenson faz uma crônica futura do pesadelo anarcocapitalista, em que empresas são muito mais poderosas e influentes que governos. Praticamente todo o território americano foi privatizado e cada pedaço é controlado por uma corporação, com leis próprias. O livro mostra como a quebra do monopólio da violência pelo Estado provoca uma escalada sem fim de conflitos.

É curioso como esse romance foi escrito antes que empresários como Elon Musk, Jeff Bezos, Mark Zuckerberg e Bill Gates acumulassem poder político e econômico suficiente para que seus conglomerados de empresas rivalizassem até mesmo com governos mundo afora.

Mark Zuckerberg, um dos criadores do Facebook, rebatizado por ele de Meta opor causa do metaverso Foto: Nick Wass/AP

Em Snow Crash é o excêntrico L. Bob Rife, um bilionário homem de negócios, quem perturba o delicado equilíbrio de forças que mantém funcionando a sociedade descrita por Stephenson, ameaçando tanto o mundo real quanto o metaverso com uma espécie de vírus linguístico que se espalha entre mentes e máquinas, incapacitando hackers que se oponham às suas ambições e convertendo massas para uma religião fundada por ele.

Para fundamentar a noção de religiões como vírus, Stephenson encontra linguagem produzida a partir de zeros e uns (como na computação) em pontos inesperados da história da humanidade, como hieróglifos, tabuletas sumérias e no alfabeto arcangélico da Cabala, traçando paralelos surpreendentes entre antiguidade e modernidade.

Muito além de um thriller cyberpunk com cenas de ação desenfreada e personagens grotescos, Snow Crash se propõe a meditar sobre a alienação no mundo contemporâneo, a natureza do poder e as mazelas da tecnologia. Por meio de capítulos cronologicamente desordenados, a obra sugere a fragmentação do ambiente digital, que mais desorienta seus usuários do que organiza as informações que deveria fornecer.

Em tempos nos quais o metaverso é celebrado como uma meta a ser alcançada, grupos de discussão sobre o anarcocapitalismo vicejam em cantos recônditos da internet e a diminuição do Estado é tratada como positiva por uma ampla parcela da sociedade, as reflexões de Neal Stephenson são relevantes doses de lucidez. O mundo bizarro de Snow Crash, tomado como receita para o futuro no Vale do Silício, é na verdade uma fábula cautelar.

Metaverso. Desde que a pandemia da covid-19 tomou de assalto o mundo contemporâneo, transformando profundamente a maneira como as pessoas se relacionam com o trabalho, com outras pessoas e com a tecnologia, uma palavra não deixa os holofotes no Vale do Silício, região da Califórnia que concentra as grandes multinacionais tecnológicas: metaverso.

A ideia, que consiste em um ambiente digital imersivo, no qual as pessoas podem interagir como se estivessem se vendo presencialmente, talvez tenha ganhado força justamente pelo distanciamento social que marcou, em especial, os anos de 2020 e 2021.

A frustração pelas relações sociais e laborais à distância, vendo amigos, colegas e familiares por meio de janelinhas em softwares de conferência virtual como o Zoom pode ter sido um dos fatores que fez figuras como Mark Zuckerberg se interessarem por essa ideia surgida em romances distópicos.

A obsessão foi tamanha que Zuckerberg, o todo-poderoso criador do Facebook, renomeou, no fim de 2021, sua empresa para Meta. A mais recente aquisição da corporação, em setembro de 2022, foi a empresa berlinense Lofelt, que trabalha com tecnologia háptica, ou seja, feedback tátil para ambientes de realidade virtual — como luvas e acessórios que simulam as sensações de tato, tornando o mundo digital tangível ao usuário.

A Bloomberg já estimou que, mesmo sem ter sido formalizado, o metaverso deve movimentar US$ 800 milhões até 2024. A consultoria Gartner previu que as pessoas devem passar em média uma hora por dia no metaverso até 2026. Outras gigantes, como Google, Microsoft, Disney, Nvidia, Epic Games e até empresas de outros setores, como Nike e Walmart, já investiram no metaverso.

A aposta, no entanto, não demonstrou ser lucrativa. Desde que adotou o novo nome, a Meta perdeu dois terços do valor de suas ações, voltando ao patamar pré-pandemia. O próprio Neal Stephenson já se pronunciou com bastante receio a respeito: “Preste atenção: todo mundo pode usar essas ferramentas de graça, mas as empresas estão ricas. Então, estão vendendo seus dados.”

Metaverso ficou entre as três palavras do ano da Oxford University Press em 2022. O termo, que sugere um ecossistema em realidade virtual no qual usuários podem interagir entre si como se estivessem no mundo físico, caiu nas graças de figuras-chave do Vale do Silício, como Mark Zuckerberg, que considera essa a próxima grande revolução tecnológica a caminho. O que nem todos os entusiastas da tecnologia de ponta sabem é que o vocábulo foi cunhado pelo escritor estadunidense de ficção científica Neal Stephenson em seu clássico Snow Crash (1992), que ganhou nova edição no Brasil pela Aleph.

O conceito de um mundo paralelo construído digitalmente e sustentado por meio de computadores e servidores permeou diversas obras do subgênero cyberpunk entre os anos 1980 e 2000. De Neuromancer, de William Gibson, a Matrix, das irmãs Wachowski, a ideia permeou diversas obras, mas encontrou no metaverso de Neal Stephenson sua representação mais bem acabada.

Cena da série "Snow Crash', da HBO, baseada no livro de Neal Stephenson  Foto: HBO

A princípio, Snow Crash soa como uma Torre de Babel de anglicismos, aberrações e aparatos malucos em um mundo semidistópico que perturbadoramente se parece mais com a realidade hoje do que quando foi concebido. Hiro Protagonist é uma espécie de entregador de comida freelancer para uma cadeia de pizzarias que serve de empresa de fachada para a máfia italiana. Quando volta para casa e põe seus óculos de realidade virtual, porém, ele é um dos mais respeitados hackers do planeta e um dos criadores do código original do metaverso.

Nesse ambiente digital, onde as pessoas podem ser o que quiserem desde que saibam programar com destreza seus avatares, Hiro é um samurai tecnológico — revelada aos poucos ao longo do romance, sua relação com o Japão e com a figura do pai, que combateu na 2ª. Guerra Mundial, é um dos pontos altos da obra.

Símbolo de uma globalização há muito anunciada – vale lembrar que Snow Crash foi publicado no mesmo ano que O Fim da História, do filósofo e economista Francis Fukuyama –, Hiro é uma figura cultural e etnicamente indefinível, um misto de ocidental, africano e asiático.

O escritor Francis Fukuyama, autor de 'O Fim da História', lançado no mesmo ano de 'Snowcrash' Foto: El Clarín

A despeito da proeza de ter previsto a ascensão da internet como um ambiente de interações fraudulentas, relações superficiais e escapismo, o aspecto mais instigante de Snow Crash talvez não seja o metaverso, e sim a organização social do mundo fora do ambiente digital.

Na obra, Neal Stephenson faz uma crônica futura do pesadelo anarcocapitalista, em que empresas são muito mais poderosas e influentes que governos. Praticamente todo o território americano foi privatizado e cada pedaço é controlado por uma corporação, com leis próprias. O livro mostra como a quebra do monopólio da violência pelo Estado provoca uma escalada sem fim de conflitos.

É curioso como esse romance foi escrito antes que empresários como Elon Musk, Jeff Bezos, Mark Zuckerberg e Bill Gates acumulassem poder político e econômico suficiente para que seus conglomerados de empresas rivalizassem até mesmo com governos mundo afora.

Mark Zuckerberg, um dos criadores do Facebook, rebatizado por ele de Meta opor causa do metaverso Foto: Nick Wass/AP

Em Snow Crash é o excêntrico L. Bob Rife, um bilionário homem de negócios, quem perturba o delicado equilíbrio de forças que mantém funcionando a sociedade descrita por Stephenson, ameaçando tanto o mundo real quanto o metaverso com uma espécie de vírus linguístico que se espalha entre mentes e máquinas, incapacitando hackers que se oponham às suas ambições e convertendo massas para uma religião fundada por ele.

Para fundamentar a noção de religiões como vírus, Stephenson encontra linguagem produzida a partir de zeros e uns (como na computação) em pontos inesperados da história da humanidade, como hieróglifos, tabuletas sumérias e no alfabeto arcangélico da Cabala, traçando paralelos surpreendentes entre antiguidade e modernidade.

Muito além de um thriller cyberpunk com cenas de ação desenfreada e personagens grotescos, Snow Crash se propõe a meditar sobre a alienação no mundo contemporâneo, a natureza do poder e as mazelas da tecnologia. Por meio de capítulos cronologicamente desordenados, a obra sugere a fragmentação do ambiente digital, que mais desorienta seus usuários do que organiza as informações que deveria fornecer.

Em tempos nos quais o metaverso é celebrado como uma meta a ser alcançada, grupos de discussão sobre o anarcocapitalismo vicejam em cantos recônditos da internet e a diminuição do Estado é tratada como positiva por uma ampla parcela da sociedade, as reflexões de Neal Stephenson são relevantes doses de lucidez. O mundo bizarro de Snow Crash, tomado como receita para o futuro no Vale do Silício, é na verdade uma fábula cautelar.

Metaverso. Desde que a pandemia da covid-19 tomou de assalto o mundo contemporâneo, transformando profundamente a maneira como as pessoas se relacionam com o trabalho, com outras pessoas e com a tecnologia, uma palavra não deixa os holofotes no Vale do Silício, região da Califórnia que concentra as grandes multinacionais tecnológicas: metaverso.

A ideia, que consiste em um ambiente digital imersivo, no qual as pessoas podem interagir como se estivessem se vendo presencialmente, talvez tenha ganhado força justamente pelo distanciamento social que marcou, em especial, os anos de 2020 e 2021.

A frustração pelas relações sociais e laborais à distância, vendo amigos, colegas e familiares por meio de janelinhas em softwares de conferência virtual como o Zoom pode ter sido um dos fatores que fez figuras como Mark Zuckerberg se interessarem por essa ideia surgida em romances distópicos.

A obsessão foi tamanha que Zuckerberg, o todo-poderoso criador do Facebook, renomeou, no fim de 2021, sua empresa para Meta. A mais recente aquisição da corporação, em setembro de 2022, foi a empresa berlinense Lofelt, que trabalha com tecnologia háptica, ou seja, feedback tátil para ambientes de realidade virtual — como luvas e acessórios que simulam as sensações de tato, tornando o mundo digital tangível ao usuário.

A Bloomberg já estimou que, mesmo sem ter sido formalizado, o metaverso deve movimentar US$ 800 milhões até 2024. A consultoria Gartner previu que as pessoas devem passar em média uma hora por dia no metaverso até 2026. Outras gigantes, como Google, Microsoft, Disney, Nvidia, Epic Games e até empresas de outros setores, como Nike e Walmart, já investiram no metaverso.

A aposta, no entanto, não demonstrou ser lucrativa. Desde que adotou o novo nome, a Meta perdeu dois terços do valor de suas ações, voltando ao patamar pré-pandemia. O próprio Neal Stephenson já se pronunciou com bastante receio a respeito: “Preste atenção: todo mundo pode usar essas ferramentas de graça, mas as empresas estão ricas. Então, estão vendendo seus dados.”

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