A 25.ª Bienal Internacional do Livro de São Paulo abriu suas portas no Pavilhão do Anhembi, na zona norte da cidade, no momento mais agudo da crise interna do setor editorial até agora. Embora ainda não existam números oficiais de público, a impressão das editoras é que há mais gente circulando nos corredores do evento, e uma coisa é certa: o ticket médio, quanto cada pessoa gasta lá dentro, subiu em relação à última edição. Em 2016, cada leitor gastou R$ 121,98. Em 2018, o número (calculado até o dia 8, quarta-feira e obtido com exclusividade pelo Estado) é R$ 160,40, um aumento de 33% sem contar a inflação do período.
A Bienal do Livro vai até o domingo, dia 12. Os ingressos custam R$ 25, com direito a meia-entrada.
Entre as editoras na Bienal, os números também eram positivos, na maioria. A Sextante, casa que mais vende livros no País, diz ter registrado um crescimento de 50% nas vendas em relação à última edição do evento. Na Record, no primeiro fim de semana, o faturamento foi cerca de 20% maior que em 2016, e domingo, 35% maior que o mesmo dia na Bienal anterior. Na Melhoramentos – casa que comemora 37 anos de Ziraldo em seu catálogo – o crescimento foi de 57% em relação a 2016 até a quarta-feira, dia 8. Nem todas as casas consultadas pela reportagem, porém, afirmaram que as vendas na Bienal do Livro estão indo tão bem: o Grupo Autêntica, por exemplo, espera “empatar” com 2016, ou ter um crescimento de no máximo um dígito – número considerado razoável pela editora no cenário atual – mesma situação das Edições Sesc.
Quem anda pelos corredores do Pavilhão do Anhembi percebe corredores mais espaçados e algumas ausências – são 197 expositores, entre editoras, distribuidoras e livrarias, contra 280 na edição de 2016. Entre os estandes que tradicionalmente ocupavam espaços importantes no evento, as faltas mais sentidas são da editora Fundamento (casa com catálogo voltado para o público infantojuvenil, maioria na Bienal) e, claro, da livraria Saraiva.
O Estado entrou em contato com a Saraiva para saber os motivos da ausência deste ano. Em nota, a rede disse apenas que “optou” por não participar da Bienal em 2018.
Se a Bienal não representa alívio financeiro imediato, especialmente para os grandes e médios grupos editoriais, a possibilidade de ter contato com leitores, mas também profissionais do setor livreiro, distribuidores e varejistas, é o principal motivo levantado pelas casas para apontar a relevância do evento.
Nos corredores da Bienal, as editoras também lamentaram a situação difícil das redes de livrarias e se mostraram dispostas a ajudar para resolver os problemas do setor.
Se algumas casas testemunharam crescimento nas vendas até superando previsões, algumas ficaram satisfeitas com os resultados que “empataram” com os da última edição, em 2016 – ainda sem os números do segundo fim de semana, comumente o melhor no sentido comercial.
A Melhoramentos, por exemplo, está com motivos para comemorar: além de um crescimento expressivo nas vendas na Bienal (até quarta-feira, o valor era 57% maior do no evento passado) e de comemorar 128 anos em 2018, a editora vai reinugurar seu prédio no bairro da Lapa, em São Paulo. A ideia é estabelecer um novo centro cultural, recebendo exposições e eventos, a partir de setembro.
O superintendente da editora, Marcus Vinicius Barili Alves, afirma que a presença institucional da casa na Bienal paga o metro quadrado investido. A exposição para consumidor, professores, livreiros e distribuidores, diz, é fundamental para o balanço da editora no evento. Sobre a crise interna do setor, ele lamenta pelo consumidor final. “Algumas publicações podem não ter sido lançadas, títulos podem não chegar ao leitor por causa da falta de crédito. Talvez o leitor tenha que pagar mais, criam-se algumas dificuldades. Isso nunca é bom.”
As previsões do Grupo Autêntica, por outro lado, apontam para um “empate” nas vendas com a edição de 2016 ou um crescimento pequeno, de um dígito. Para a gerente de venda de varejo da empresa, Judith de Almeida, a ausência da Saraiva é “lamentável”. O consumidor final, na sua opinião, também já pode sentir efeitos da crise interna do setor, com um eventual decréscimo na bibliodiversidade das livrarias. “Mas é importante lembrar que as lojas funcionam com consignação, elas estão vendendo os estoque”, diz.
O Painel da Venda de Livros no Brasil divulgado na quinta-feira, 9, mostrou que as vendas de livros no varejo teve um semestre de praticamente 10% de crescimento em relação ao ano passado, mas houve quedas nos dois últimos meses da pesquisa, pós greve dos caminhoneiros e Copa do Mundo. “A editora está fazendo tudo que pode para participar da recuperação das livrarias”, afirma Judith, citando esforços de crédito e de caixa. “O melhor lugar pra vender livro é onde vende livro.”
Depois de ter começado a Bienal do Livro com um crescimento de 20% nas vendas em relação ao primeiro fim de semana de 2016, a vice-presidente do Grupo Record, Roberta Machado, lamenta que o ritmo não tenha se mantido durante a semana. “Claro que o recebimento em caixa numa Bienal é praticamente à vista e isso é positivo, porém não chega a compensar nem mesmo aliviar a falta de recebimento de boas livrarias”, explica, por e-mail. “O alívio da Bienal ao mercado não é financeiro, mas é uma injeção de ânimo pela confirmação do interesse do jovem pela leitura. Isso dá indicações positivas ao setor.”
Para ela, a crise do mercado livreiro força a diminuição de lançamentos, reedições, aquisições e renovações de contratos de direitos autorais por parte das editoras. “O consumo que se perde não é absorvido de forma rápida ou automática por outros canais, incluindo a internet. Apenas uma parte dele. A livraria, por sua natureza, é um espaço não apenas de venda, mas de promoção do livro. O impacto dessa difusão vai muito além da venda que realiza diretamente. Com isso, menos livros conseguem ser vistos e conhecidos em uma escala mais ampla pelo leitor.”
Marcos da Veiga Pereira, sócio diretor da Sextante, diz também por e-mail que “a Bienal demonstra que o livro não está em crise, que há um problema localizado em duas redes de livrarias”. Ele não nega, porém, que a crise afeta os consumidores ao diminuir canais de distribuição e prejudicar o acesso aos livros, bem como quando as editoras precisam diminuir o número menor de lançamentos.
As Edições Sesc também têm previsão de resultado de vendas parecido ao de 2016, o que é um “bom negócio” nas circustâncias atuais, segundo o gerente da editora, Marcos Lepiscopo. Sobre a crise, ele tenta ser otimista ao sugerir que o momento pode trazer transformações necessárias para o mercado. “O modelo de negócio precisa ser repensado. Houve uma grande concentração, as livrarias de rua foram quase aniquiladas. Com o modelo de consignação, cria-se uma interdependência muito grande.”