São raros os nomes ligados ao teatro vencedores do Prêmio Nobel de Literatura. Desde 1901, quando a honraria da academia escandinava começou a ser distribuída, figuram entre os laureados o americano Eugene O’Neill (1888-1953), o francês Jean-Paul Sartre (1905-1980), o irlandês Samuel Beckett (1906-1989), o italiano Dario Fo (1926-2016) e o inglês Harold Pinter (1930-2008). Junta-se, agora, a esse seleto time o norueguês Jon Fosse, de 64 anos, que também é romancista, poeta e ensaísta, mas ganhou relevância internacional pela sua produção de dramaturgia para os palcos.
Como justificativa para o Nobel, a Academia Sueca definiu Fosse como um autor de “peças e prosas inovadoras que dão voz ao indizível”. E é isso que se vê na maior parte de sua obra dramaturgia, que apresenta características intimistas para abordar as angústias da existência, ligadas à morte, à espera e às frustrações acumuladas no decorrer da vida. Em um trânsito entre o realismo e o absurdo, seu texto é marcado por poucas palavras e constantes repetições, as frases não têm pontuação e são entrecortadas, causando surpresa em que as ouve dramatizadas.
Jon Olav Fosse nasceu em 1959 na cidade de Haugesund, na Noruega, e estreou na literatura em 1983 com o romance Vermelho, Preto. A primeira de suas mais de trinta peças teatrais foi Alguém Vai Chegar, escrita entre 1992 e 1993.
O seu estilo começou a chamar a atenção na cena internacional com a estreia de O Nome, escrita em 1995. Nesta peça, a harmonia de uma família burguesa é quebrada quando a filha retorna para casa grávida e detona conflitos que pareciam escondidos debaixo do tapete.
Em Sonho de Outono, lançada em 1999, a ação é ambientada em um cemitério e, numa trama não linear que confunde passado e presente, Fosse enfoca um homem que reencontra seus pais e duas mulheres.
Já Um Dia, no Verão, também de 1999, traz à tona uma mulher que aguarda obsessivamente a volta do marido que saiu para velejar há 25 anos e nunca mais voltou. Perdida em sua imaginação, a personagem reconstitui o passado junto ao homem que amou e o que poderia ter acontecido depois do provável acidente ocasionado por uma tempestade.
Essas três peças escritas ganharam montagens brasileiras, dirigidas respectivamente por Denise Weinberg, Emílio de Mello e Monique Gardenberg na década de 2000. Na mesma época, Fernanda D’Umbra comandou a encenação de Roxo, que trata dos conflitos de um adolescente enfrentando a morte da avó e a iniciação sexual.
A incomunicabilidade humana atravessa os personagens criados pelo autor. Em comum, eles paralisam diante de traumas e situações inesperadas do cotidiano. Suas peças já foram traduzidas para mais de trinta idiomas e produzidas em países tão distintos quanto Estados Unidos, China, Turquia, Suécia e Croácia. Ele é considerado o dramaturgo mais importante da Noruega desde Henrik Ibsen (1828-1906), um dos fundadores do realismo e responsável pelos clássicos Casa de Bonecas e Um Inimigo do Povo.
Essa mesma essência da incomunicabilidade ronda a literatura de prosa, o veículo de maior expressão de Fosse na última década. A profícua veia de dramaturgo comprovada nos anos de 1990 e 2000 cedeu espaço ao romancista nos últimos tempos. Um exemplo dessa safra é o romance É a Ales, publicado no Brasil pela Companhia das Letras há menos de um mês.
A história, que dialoga e amplia a narrativa iniciada na peça Um Dia, no Verão, apresenta uma mulher que também espera o marido que saiu para um passeio de barco e jamais retornou. Em suas memórias, a personagem volta no tempo para revisitar cinco gerações da família e reflete sobre como os fantasmas do passado ainda assombram no presente.