Jornalista Rui Cardoso Martins escreve com graça sobre histórias de tribunais portugueses


"Levante-se o Réu", reunião de textos que ele publica em jornais desde 1990, foi lançado agora pela Tinta da China no Brasil

Por Guilherme Sobota

Se a crônica é o gênero tipicamente brasileiro, ninguém avisou o escritor português Rui Cardoso Martins – Levante-se o Réu, reunião de textos que ele publica em jornais desde 1990, foi lançado agora pela Tinta da China no Brasil, e no ano passado levou o Grande Prêmio da Crônica da Associação Portuguesa de Escritores. O livro é um compilado de situações reais de tribunais portugueses que o jornalista descreve com humor e sensibilidade – e elas vão de casos corriqueiros a atrocidades violentas.

Rui Cardoso Martins Foto: Editora Tinta da China

“Não leve a mal”, disse um dia um advogado a Cardoso Martins sobre o livro, “mas tenho a minha casa de banho forrada com as suas crônicas de tribunal. Leio-as na sanita. É para me lembrar de que o Direito não tem de ser aborrecido”, escreve no prefácio. “Quem pode levar a mal um elogio desse?”, se pergunta o escritor.

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São 100 crônicas. Em uma delas, o jovem H. senta no banco dos réus após bater a moto embriagado, depois de encontrar, sete meses depois do término, a amada “com quem tinha andado há quatro anos”. Em outra, uma testemunha num caso de difamação se recusa a dizer as palavras usadas para ofender: “A minha educação não me permite” (depois de ele finalmente ser convencido a proferir o elaborado xingamento no tribunal, Martins narra: “Como é inteiramente compreensível, fez-se silêncio sob as arcadas da casa de Justiça. Fraca concordância dos tempos verbais, mas não há dúvidas de que é português”). Há várias situações mais sérias, de assassinatos, homicídios, violência doméstica, que acabam equilibrando o ambiente cômico com histórias emocionantes. “Tenham pena da humanidade!”, pede no livro um “bêbedo que caiu da bicicleta”.

Martins publicou suas crônicas entre 1990 e 2007 no Público (onde começou como estagiário), e em 2017 voltou à ativa em outro diário português, o Jornal de Notícias. “Estou a apanhar as sobras da grande crise que atravessamos”, diz ele por telefone ao Estado, de Lisboa. “Intervenção dos organismos internacionais, imigração. Estou a ver os julgamentos das pessoas que perderam casa e emprego, agora essas crises estão voltando aos tribunais, com os efeitos da brutal contração econômica.”

A ideia de escrever sobre os casos pitorescos do Palácio da Justiça de Lisboa lhe foi entregue por um chefe de redação do Público, jornal que surgiu naquele mesmo 1990 e hoje consolidado como um dos mais importantes do país europeu. Ele então começou a perambular pelo ambiente que lhe remete a Franz Kafka e assistir às sessões públicas, abertas. Os textos resultam da audiência, da leitura de autos e de conversas com juízes, advogados, acusados, polícias e outros elementos do tribunal. “Vi e ouvi muita coisa. Muito caso bem e mal resolvido. Justiça e injustiça, milhares e milhares de horas.”

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Num momento que a desconfiança em relação às instituições brasileiras anda alta, é curioso notar a tranquilidade com que o escritor e os demais indivíduos que aparecem nos textos tratam o seu sistema judiciário (no Brasil, apenas 29% da população confia na Justiça, segundo relatório da Fundação Getúlio Vargas de outubro de 2016).

“Há aqui uma perplexidade com as notícias que chegam do Brasil. Como é possível sentirmos que toda a sociedade brasileira parece completamente corrompida? É muito angustiante sentir isso”, lamenta o escritor. “Não encontrei na minha experiência um sinal de que as coisas estão todas pervertidas, de que estejamos todos permeados de corrupção.” Mas ele ressalva: “Há sim corrupção, casos que nunca se resolvem, claro”.

Quem escreve o prefácio da edição é António Lobo Antunes, não lá muito conhecido pelo bom humor em público: aqui, porém, ele não poupa elogios. Ele descreve uma conversa com José Cardoso Pires, e quando este lhe pergunta se leu as crônicas de Martins, Lobo Antunes responde: “Eu, que não bebo, quase tive vontade de pedir um uísque para mim, no intuito de lhe responder, lá de baixo, ‘é tão cabrão como a gente’”.

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O livro lembra um pouco o Febeapá de Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto, 1923-1968), mas Martins cita como influências brasileiras outros grandes: Paulo Mendes Campos, Vinicius, Nelson Rodrigues, Drummond. “Fui me habituando ao longo do tempo a ler com muito gosto e aprender com esses mestres.”

TRECHO:

“Abrimos numa esquadra de polícia às 2h35 de um dos últimos dias de Agosto. Está um calor de alcatrão, as plaquetas das feridas abertas de António nem conseguem colar-se umas às outras. É importante focar este pormenor: todos os polícias dizem que ele já sangrava quando chegou à esquadra, que andou a pingar sangue nos cenários de Lisboa. (...) António aproximou-se dela com uma queixa banal: – A polícia, em vez de estar aí parada, devia andar na rua a apanhar os bandidos!, exclamou(...) Mas nada está tão mal que não possa piorar.”

Se a crônica é o gênero tipicamente brasileiro, ninguém avisou o escritor português Rui Cardoso Martins – Levante-se o Réu, reunião de textos que ele publica em jornais desde 1990, foi lançado agora pela Tinta da China no Brasil, e no ano passado levou o Grande Prêmio da Crônica da Associação Portuguesa de Escritores. O livro é um compilado de situações reais de tribunais portugueses que o jornalista descreve com humor e sensibilidade – e elas vão de casos corriqueiros a atrocidades violentas.

Rui Cardoso Martins Foto: Editora Tinta da China

“Não leve a mal”, disse um dia um advogado a Cardoso Martins sobre o livro, “mas tenho a minha casa de banho forrada com as suas crônicas de tribunal. Leio-as na sanita. É para me lembrar de que o Direito não tem de ser aborrecido”, escreve no prefácio. “Quem pode levar a mal um elogio desse?”, se pergunta o escritor.

São 100 crônicas. Em uma delas, o jovem H. senta no banco dos réus após bater a moto embriagado, depois de encontrar, sete meses depois do término, a amada “com quem tinha andado há quatro anos”. Em outra, uma testemunha num caso de difamação se recusa a dizer as palavras usadas para ofender: “A minha educação não me permite” (depois de ele finalmente ser convencido a proferir o elaborado xingamento no tribunal, Martins narra: “Como é inteiramente compreensível, fez-se silêncio sob as arcadas da casa de Justiça. Fraca concordância dos tempos verbais, mas não há dúvidas de que é português”). Há várias situações mais sérias, de assassinatos, homicídios, violência doméstica, que acabam equilibrando o ambiente cômico com histórias emocionantes. “Tenham pena da humanidade!”, pede no livro um “bêbedo que caiu da bicicleta”.

Martins publicou suas crônicas entre 1990 e 2007 no Público (onde começou como estagiário), e em 2017 voltou à ativa em outro diário português, o Jornal de Notícias. “Estou a apanhar as sobras da grande crise que atravessamos”, diz ele por telefone ao Estado, de Lisboa. “Intervenção dos organismos internacionais, imigração. Estou a ver os julgamentos das pessoas que perderam casa e emprego, agora essas crises estão voltando aos tribunais, com os efeitos da brutal contração econômica.”

A ideia de escrever sobre os casos pitorescos do Palácio da Justiça de Lisboa lhe foi entregue por um chefe de redação do Público, jornal que surgiu naquele mesmo 1990 e hoje consolidado como um dos mais importantes do país europeu. Ele então começou a perambular pelo ambiente que lhe remete a Franz Kafka e assistir às sessões públicas, abertas. Os textos resultam da audiência, da leitura de autos e de conversas com juízes, advogados, acusados, polícias e outros elementos do tribunal. “Vi e ouvi muita coisa. Muito caso bem e mal resolvido. Justiça e injustiça, milhares e milhares de horas.”

Num momento que a desconfiança em relação às instituições brasileiras anda alta, é curioso notar a tranquilidade com que o escritor e os demais indivíduos que aparecem nos textos tratam o seu sistema judiciário (no Brasil, apenas 29% da população confia na Justiça, segundo relatório da Fundação Getúlio Vargas de outubro de 2016).

“Há aqui uma perplexidade com as notícias que chegam do Brasil. Como é possível sentirmos que toda a sociedade brasileira parece completamente corrompida? É muito angustiante sentir isso”, lamenta o escritor. “Não encontrei na minha experiência um sinal de que as coisas estão todas pervertidas, de que estejamos todos permeados de corrupção.” Mas ele ressalva: “Há sim corrupção, casos que nunca se resolvem, claro”.

Quem escreve o prefácio da edição é António Lobo Antunes, não lá muito conhecido pelo bom humor em público: aqui, porém, ele não poupa elogios. Ele descreve uma conversa com José Cardoso Pires, e quando este lhe pergunta se leu as crônicas de Martins, Lobo Antunes responde: “Eu, que não bebo, quase tive vontade de pedir um uísque para mim, no intuito de lhe responder, lá de baixo, ‘é tão cabrão como a gente’”.

O livro lembra um pouco o Febeapá de Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto, 1923-1968), mas Martins cita como influências brasileiras outros grandes: Paulo Mendes Campos, Vinicius, Nelson Rodrigues, Drummond. “Fui me habituando ao longo do tempo a ler com muito gosto e aprender com esses mestres.”

TRECHO:

“Abrimos numa esquadra de polícia às 2h35 de um dos últimos dias de Agosto. Está um calor de alcatrão, as plaquetas das feridas abertas de António nem conseguem colar-se umas às outras. É importante focar este pormenor: todos os polícias dizem que ele já sangrava quando chegou à esquadra, que andou a pingar sangue nos cenários de Lisboa. (...) António aproximou-se dela com uma queixa banal: – A polícia, em vez de estar aí parada, devia andar na rua a apanhar os bandidos!, exclamou(...) Mas nada está tão mal que não possa piorar.”

Se a crônica é o gênero tipicamente brasileiro, ninguém avisou o escritor português Rui Cardoso Martins – Levante-se o Réu, reunião de textos que ele publica em jornais desde 1990, foi lançado agora pela Tinta da China no Brasil, e no ano passado levou o Grande Prêmio da Crônica da Associação Portuguesa de Escritores. O livro é um compilado de situações reais de tribunais portugueses que o jornalista descreve com humor e sensibilidade – e elas vão de casos corriqueiros a atrocidades violentas.

Rui Cardoso Martins Foto: Editora Tinta da China

“Não leve a mal”, disse um dia um advogado a Cardoso Martins sobre o livro, “mas tenho a minha casa de banho forrada com as suas crônicas de tribunal. Leio-as na sanita. É para me lembrar de que o Direito não tem de ser aborrecido”, escreve no prefácio. “Quem pode levar a mal um elogio desse?”, se pergunta o escritor.

São 100 crônicas. Em uma delas, o jovem H. senta no banco dos réus após bater a moto embriagado, depois de encontrar, sete meses depois do término, a amada “com quem tinha andado há quatro anos”. Em outra, uma testemunha num caso de difamação se recusa a dizer as palavras usadas para ofender: “A minha educação não me permite” (depois de ele finalmente ser convencido a proferir o elaborado xingamento no tribunal, Martins narra: “Como é inteiramente compreensível, fez-se silêncio sob as arcadas da casa de Justiça. Fraca concordância dos tempos verbais, mas não há dúvidas de que é português”). Há várias situações mais sérias, de assassinatos, homicídios, violência doméstica, que acabam equilibrando o ambiente cômico com histórias emocionantes. “Tenham pena da humanidade!”, pede no livro um “bêbedo que caiu da bicicleta”.

Martins publicou suas crônicas entre 1990 e 2007 no Público (onde começou como estagiário), e em 2017 voltou à ativa em outro diário português, o Jornal de Notícias. “Estou a apanhar as sobras da grande crise que atravessamos”, diz ele por telefone ao Estado, de Lisboa. “Intervenção dos organismos internacionais, imigração. Estou a ver os julgamentos das pessoas que perderam casa e emprego, agora essas crises estão voltando aos tribunais, com os efeitos da brutal contração econômica.”

A ideia de escrever sobre os casos pitorescos do Palácio da Justiça de Lisboa lhe foi entregue por um chefe de redação do Público, jornal que surgiu naquele mesmo 1990 e hoje consolidado como um dos mais importantes do país europeu. Ele então começou a perambular pelo ambiente que lhe remete a Franz Kafka e assistir às sessões públicas, abertas. Os textos resultam da audiência, da leitura de autos e de conversas com juízes, advogados, acusados, polícias e outros elementos do tribunal. “Vi e ouvi muita coisa. Muito caso bem e mal resolvido. Justiça e injustiça, milhares e milhares de horas.”

Num momento que a desconfiança em relação às instituições brasileiras anda alta, é curioso notar a tranquilidade com que o escritor e os demais indivíduos que aparecem nos textos tratam o seu sistema judiciário (no Brasil, apenas 29% da população confia na Justiça, segundo relatório da Fundação Getúlio Vargas de outubro de 2016).

“Há aqui uma perplexidade com as notícias que chegam do Brasil. Como é possível sentirmos que toda a sociedade brasileira parece completamente corrompida? É muito angustiante sentir isso”, lamenta o escritor. “Não encontrei na minha experiência um sinal de que as coisas estão todas pervertidas, de que estejamos todos permeados de corrupção.” Mas ele ressalva: “Há sim corrupção, casos que nunca se resolvem, claro”.

Quem escreve o prefácio da edição é António Lobo Antunes, não lá muito conhecido pelo bom humor em público: aqui, porém, ele não poupa elogios. Ele descreve uma conversa com José Cardoso Pires, e quando este lhe pergunta se leu as crônicas de Martins, Lobo Antunes responde: “Eu, que não bebo, quase tive vontade de pedir um uísque para mim, no intuito de lhe responder, lá de baixo, ‘é tão cabrão como a gente’”.

O livro lembra um pouco o Febeapá de Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto, 1923-1968), mas Martins cita como influências brasileiras outros grandes: Paulo Mendes Campos, Vinicius, Nelson Rodrigues, Drummond. “Fui me habituando ao longo do tempo a ler com muito gosto e aprender com esses mestres.”

TRECHO:

“Abrimos numa esquadra de polícia às 2h35 de um dos últimos dias de Agosto. Está um calor de alcatrão, as plaquetas das feridas abertas de António nem conseguem colar-se umas às outras. É importante focar este pormenor: todos os polícias dizem que ele já sangrava quando chegou à esquadra, que andou a pingar sangue nos cenários de Lisboa. (...) António aproximou-se dela com uma queixa banal: – A polícia, em vez de estar aí parada, devia andar na rua a apanhar os bandidos!, exclamou(...) Mas nada está tão mal que não possa piorar.”

Se a crônica é o gênero tipicamente brasileiro, ninguém avisou o escritor português Rui Cardoso Martins – Levante-se o Réu, reunião de textos que ele publica em jornais desde 1990, foi lançado agora pela Tinta da China no Brasil, e no ano passado levou o Grande Prêmio da Crônica da Associação Portuguesa de Escritores. O livro é um compilado de situações reais de tribunais portugueses que o jornalista descreve com humor e sensibilidade – e elas vão de casos corriqueiros a atrocidades violentas.

Rui Cardoso Martins Foto: Editora Tinta da China

“Não leve a mal”, disse um dia um advogado a Cardoso Martins sobre o livro, “mas tenho a minha casa de banho forrada com as suas crônicas de tribunal. Leio-as na sanita. É para me lembrar de que o Direito não tem de ser aborrecido”, escreve no prefácio. “Quem pode levar a mal um elogio desse?”, se pergunta o escritor.

São 100 crônicas. Em uma delas, o jovem H. senta no banco dos réus após bater a moto embriagado, depois de encontrar, sete meses depois do término, a amada “com quem tinha andado há quatro anos”. Em outra, uma testemunha num caso de difamação se recusa a dizer as palavras usadas para ofender: “A minha educação não me permite” (depois de ele finalmente ser convencido a proferir o elaborado xingamento no tribunal, Martins narra: “Como é inteiramente compreensível, fez-se silêncio sob as arcadas da casa de Justiça. Fraca concordância dos tempos verbais, mas não há dúvidas de que é português”). Há várias situações mais sérias, de assassinatos, homicídios, violência doméstica, que acabam equilibrando o ambiente cômico com histórias emocionantes. “Tenham pena da humanidade!”, pede no livro um “bêbedo que caiu da bicicleta”.

Martins publicou suas crônicas entre 1990 e 2007 no Público (onde começou como estagiário), e em 2017 voltou à ativa em outro diário português, o Jornal de Notícias. “Estou a apanhar as sobras da grande crise que atravessamos”, diz ele por telefone ao Estado, de Lisboa. “Intervenção dos organismos internacionais, imigração. Estou a ver os julgamentos das pessoas que perderam casa e emprego, agora essas crises estão voltando aos tribunais, com os efeitos da brutal contração econômica.”

A ideia de escrever sobre os casos pitorescos do Palácio da Justiça de Lisboa lhe foi entregue por um chefe de redação do Público, jornal que surgiu naquele mesmo 1990 e hoje consolidado como um dos mais importantes do país europeu. Ele então começou a perambular pelo ambiente que lhe remete a Franz Kafka e assistir às sessões públicas, abertas. Os textos resultam da audiência, da leitura de autos e de conversas com juízes, advogados, acusados, polícias e outros elementos do tribunal. “Vi e ouvi muita coisa. Muito caso bem e mal resolvido. Justiça e injustiça, milhares e milhares de horas.”

Num momento que a desconfiança em relação às instituições brasileiras anda alta, é curioso notar a tranquilidade com que o escritor e os demais indivíduos que aparecem nos textos tratam o seu sistema judiciário (no Brasil, apenas 29% da população confia na Justiça, segundo relatório da Fundação Getúlio Vargas de outubro de 2016).

“Há aqui uma perplexidade com as notícias que chegam do Brasil. Como é possível sentirmos que toda a sociedade brasileira parece completamente corrompida? É muito angustiante sentir isso”, lamenta o escritor. “Não encontrei na minha experiência um sinal de que as coisas estão todas pervertidas, de que estejamos todos permeados de corrupção.” Mas ele ressalva: “Há sim corrupção, casos que nunca se resolvem, claro”.

Quem escreve o prefácio da edição é António Lobo Antunes, não lá muito conhecido pelo bom humor em público: aqui, porém, ele não poupa elogios. Ele descreve uma conversa com José Cardoso Pires, e quando este lhe pergunta se leu as crônicas de Martins, Lobo Antunes responde: “Eu, que não bebo, quase tive vontade de pedir um uísque para mim, no intuito de lhe responder, lá de baixo, ‘é tão cabrão como a gente’”.

O livro lembra um pouco o Febeapá de Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto, 1923-1968), mas Martins cita como influências brasileiras outros grandes: Paulo Mendes Campos, Vinicius, Nelson Rodrigues, Drummond. “Fui me habituando ao longo do tempo a ler com muito gosto e aprender com esses mestres.”

TRECHO:

“Abrimos numa esquadra de polícia às 2h35 de um dos últimos dias de Agosto. Está um calor de alcatrão, as plaquetas das feridas abertas de António nem conseguem colar-se umas às outras. É importante focar este pormenor: todos os polícias dizem que ele já sangrava quando chegou à esquadra, que andou a pingar sangue nos cenários de Lisboa. (...) António aproximou-se dela com uma queixa banal: – A polícia, em vez de estar aí parada, devia andar na rua a apanhar os bandidos!, exclamou(...) Mas nada está tão mal que não possa piorar.”

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