“Quando a lenda ultrapassa a realidade, publicamos a lenda”. Essa frase vem do clássico western O Homem que Matou o Facínora (1952) e serve para resumir o impacto de Jesse James (1847-1882) na cultura norte-americana. O fora-da-lei é lembrado até hoje por seus roubos escalafobéticos com a gangue James-Young, compartilhada com seu irmão Frank James e situada no estado do Missouri.
Jesse cresceu em uma família que apoiava os Estados Confederados (agrários e escravistas) durante a Guerra Civil Americana, o que desempenhou um papel crucial em sua trajetória para se tornar um criminoso. Após o conflito, cujo desfecho foi desfavorável aos Confederados, o rapaz se viu desiludido, sem opções de emprego e logo ganhou fama pelos assaltos a bancos, trens e diligências – atos que eram vistos por parte da população sulista como símbolos de resistência contra a opressão do governo federal.
Sua vida, acima de tudo, foi marcada por momentos trágicos. Um deles foi quando sua casa foi bombardeada por homens que trabalhavam para a agência de detetives Pinkerton, símbolo da modernização dos EUA rumo à diretriz da lei e ordem. A explosão feriu gravemente a mãe de Jesse e matou um de seus irmãos.
“A imagem transmitida pela mídia invariavelmente refletiu uma encarnação da violência acoplada a uma forma de heroísmo semelhante a Robin Hood. Sua reputação heroica advém principalmente dos inúmeros bancos e trens que ele roubou, sabendo que um jornalista da época começou a forjar sua lenda ao publicar artigos que o glorificavam ou enfatizavam suas qualidades cavalheirescas sulistas em detrimento de sua natureza assassina impiedosa e cruel”, explica ao Estadão o autor francês Olivier ‘Dobbs’ Dobremel, um dos criadores da HQ A Verdadeira História do Faroeste: Jesse James (Ed. Alta Books; 56 págs.; R$43,24), que acaba de sair no Brasil.
Ao longo do século 20, Jesse James virou mito popular, símbolo de rebeldia e liberdade no Velho Oeste, sendo retratado em diversas produções artísticas, seja em quadrinhos, livros, filmes, séries ou músicas. A comparação com Robin Hood, inclusive, está eternizada em uma tradicional canção folk gravada pela primeira vez em 1919, cuja letra biográfica compara Jesse ao mítico herói inglês, embora não haja evidências que indiquem que ele “roubava dos ricos e dava aos pobres”, segundo relata um dos versos. A música foi recuperada por artistas como Woody Guthrie, Johnny Cash, Van Morrison e Bruce Springsteen.
No cinema, o delinquente foi interpretado por atores como Robert Wagner, Robert Duvall, Kris Kristofersson e Colin Farrell. Sua representação mais conhecida, no entanto, é a de Brad Pitt no premiado O Assassinato de Jesse James pelo Covarde Robert Ford (2007), filme de Andrew Dominik responsável por detalhar, conforme o título sugere, a morte do célebre bandido, baleado nas costas por um de seus amigos.
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A fama de Jesse James é tamanha que até invadiu as telenovelas brasileiras. Em Bang Bang (2005-2006), criada por Mario Prata, o ator Kadu Moliterno encarnou uma versão cômica do fora-da-lei na produção da TV Globo, provando o impacto longevo de uma história intrínseca à popularidade do faroeste, cartão-postal de uma era que ainda captura a imaginação do público com suas jornadas de justiça e coragem, sublinhadas pela linha tênue entre o bem e o mal.
“É um gênero que resiste ao teste do tempo, evolui e conquista novos territórios. Red Dead Redemption (franquia de games), Deadwood (2004-2006), Godless (2017) ou Yellowstone são os avatares modernos de um caminho pavimentado anteriormente por Procurado Vivo ou Morto (1958-61), Rio Bravo (1959), Sete Homens e Um Destino (1960) ou Três Homens em Conflito (1966)”, compara Dobremel. “O western se intersecta com outros gêneros e, às vezes, renasce das suas próprias cinzas, imortal”.