Livro-relíquia de Carlos Lacerda, escrito quando ele ainda era um jovem comunista, ganha reedição


‘O Quilombo de Manuel Congo’, sobre rebelião quilombola no Vale do Paraíba, foi publicado, pela primeira vez, em 1935, sob o pseudônimo de Marcos; Lacerda, que se tornaria um dos mais amados e mais odiados políticos brasileiros, tinha então 21 anos

Por Guilherme Evelin
Atualização:

Os frequentadores da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), que homenageia este ano o escritor negro João do Rio, estão sendo brindados com a reedição de uma relíquia histórica: o primeiro livro de Carlos Lacerda (1914-1977), um dos mais amados e odiados políticos da história do Brasil. Para quem só conhece uma das facetas de Lacerda, a do líder da UDN, opositor ferrenho de Getúlio Vargas e apoiador do golpe que depôs João Goulart da Presidência em 1964, o livro também pode ser uma surpresa.

O Quilombo de Manuel Congo, uma pequena novela de pouco mais de 50 páginas, é uma denúncia sobre a exploração dos negros escravizados no Vale do Paraíba e a repressão comandada pelos grandes fazendeiros da região à rebelião liderada em 1838 por Manuel Congo, apelidado de “Zumbi Fluminense”.

O livro foi escrito por Lacerda aos 21 anos e publicado em 1935 sob o pseudônimo de Marcos. Na época, ele era ateu, comunista e seguidor entusiasmado da Aliança Libertadora Nacional (ALN), frente de esquerda liderada por Luiz Carlos Prestes. Uma advertência foi introduzida por Lacerda no início de O Quilombo de Manuel Congo. “Não é bem verdade tudo o que está neste livro. Também não é bem mentira”.

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Mentira, esclarece o autor, são as descrições detalhadas sobre a paisagem do Vale do Paraíba na primeira metade do século 19, então sede de uma pujante economia cafeeira lastreada no regime escravocrata. Verdade é a história da rebelião dos quilombolas, recontada por Lacerda, com base em pesquisas em documentos históricos em Vassouras, cidade do sul do estado do Rio de Janeiro, onde seu avô Sebastião de Lacerda, ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), tinha uma chácara, e seu pai Maurício de Lacerda, um ex-deputado de ideias socialistas, era prefeito.

Carlos Lacerda, então governador do Rio de Janeiro, durante votação na eleição de 1962 Foto: Acervo Estadão

A rebelião estourou na vila de Paty dos Alferes, próxima a Vassouras. Centenas de homens e mulheres, liderados por Manuel Congo e por Mariana Crioula, uma negra escravizada proclamada como a “rainha dos quilombolas”, se insurgiram contra os maus tratos aplicados pelos fazendeiros e seus feitores e se refugiaram em uma mata nos arredores. A repressão não tardou. A Guarda Nacional, milícia do Império comandada no Vale do Paraíba pelo coronel Francisco Peixoto de Lacerda Werneck, um dos grandes proprietários da região, foi à caça dos fugitivos. O movimento dos quilombolas, porém, tomou tal vulto que foi preciso chamar a ajuda do Exército regular.

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Na repressão ao levante, destacou-se o então tenente-coronel Luís Alves de Lima, que depois ficaria conhecido como o Duque de Caxias e o patrono do Exército. Presos os quilombolas, Manuel Congo, ferreiro de profissão, foi condenado à morte e enforcado na praça central de Vassouras. Outros sete réus homens foram sentenciados a receber 650 chibatadas e ao uso da gargalheira, uma coleira de ferro, por três anos. Mariana Crioula e outras mulheres presas foram absolvidas por serem “fêmeas”.

Lacerda foi o primeiro a registrar a saga do quilombo de Manuel Congo e Mariana Crioula, a quem chama no livro de “Maria Crioula”. Ele se interessou pela história ainda durante a infância, ao ouvir os relatos das violências sofridas pelos negros contados por Tia Claudina, uma antiga escravizada que trabalhava na chácara do avô. Escreveu o livro em duas noites. Como ressalta o jornalista Mário Magalhães, autor do prefácio da nova edição, O Quilombo de Manuel Congo é uma “obra de juventude”.

“O tom panfletário permeado por tiradas líricas dá a impressão de escriba imaturo”, escreve Magalhães, que pesquisou por nove anos a vida de Lacerda para uma biografia a ser publicada pela Companhia das Letras. O primeiro volume, que cobre os anos de 1914 a 1961, deve ser lançado no ano que vem.

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O “tom panfletário”, impregnado de marxismo, a que se refere Magalhães, aparece em trechos em que ele reverencia os quilombolas açoitados no pelourinho. “Teus gritos serão ouvidos porque a tua voz não morreu, não morrerá. Ela é a voz dos oprimidos, dos explorados de todo o mundo. É a voz das senzalas, a voz das fábricas, a voz dos torturados e dos humildes, dos tristes e dos famintos. A voz que vai crescendo e há de ensurdecer os opressores”, escreve o jovem comunista.

Na década de 1940, Lacerda deu uma guinada política, converteu-se ao catolicismo e se tornou ferrenho anticomunista. Em vida, apesar de ter sido dono de editoras de livros, não voltou a reeditar Quilombo de Manuel Congo, que só seria republicado na década de 90, após a sua morte. A nova edição foi patrocinada e está sendo distribuída pelo Museu Vassouras, que será inaugurado em 2025 a partir da restauração do antigo prédio do Hospital da Santa Casa de Misericórdia da cidade, iniciativa do ex-deputado federal, investidor e colecionador de arte Ronaldo Cezar Coelho.

Os bonecos de Manuel Congo e Mariana Crioula, na área dos bambuzais da Chácara da Hera, nos jardins do Museu Casa da Hera, em Vassouras Foto: Liz Batista/Estadão
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Obra de iniciante, O Quilombo de Manuel Congo prenuncia algumas características que se tornariam marcas de Carlos Lacerda, como o estilo incandescente, empregado por ele como jornalista e político, para defender causas e combater adversários.

Caxias, por exemplo, é descrito por Lacerda, sem meias palavras, como “esse que nunca se envergonhou de ser assassino de escravos”. O neto Rodrigo, editor da Record e autor do romance histórico A República das Abelhas sobre a saga familiar dos três Lacerdas que se envolveram com a política (Sebastião, Maurício e Carlos), destaca também a permanência da preocupação social, revelada no livro, na atuação do avô como gestor público. Primeiro governador eleito do então recém-criado estado da Guanabara nos anos 60, Lacerda se notabilizou por iniciativas para universalizar o acesso ao ensino primário e que aumentaram os investimentos públicos em saneamento e abastecimento de água no Rio de Janeiro.

O Quilombo de Manuel Congo foi dedicado por Lacerda ao Rio Paraíba, tema também da peça O Rio, que ele escreveu e foi encenada, pela primeira vez, em 1937. Além de dramaturgo, ele também escreveu contos, ensaios e discursos e fez traduções e críticas literárias. O amigo Mário de Andrade disse uma vez que sua ambição era ser Shakespeare e Camões ao mesmo tempo. As “tiradas líricas” do primeiro livro foram sendo lapidadas ao longo dessa extensa produção.

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Capa do livro 'O Quilombo de Manuel Congo', escrito por Carlos Lacerda aos 21 anos Foto: Reprodução/Museu de Vassour

Cassado em 1968 pelo regime militar que ajudou a levar ao poder e proscrito da política, passou a cuidar da sua editora e a cultivar rosas, seu hobby. Escreveu então A Casa do Meu Avô, considerada uma pequena joia memorialística e sua melhor obra. Lacerda evoca, no estilo proustiano, a infância passada na chácara do avô, às margens do Rio Paraíba, a mesma onde ouviu as histórias de tia Claudina que inspiraram seu relato sobre os quilombolas liderados por Manuel Congo e Mariana Crioula.

Sobre A Casa do Meu Avô, Carlos Drummond de Andrade escreveu uma carta a Lacerda em que dizia que bastava esse livro para “garantir-lhe esse lugar que importa mais do que os lugares convencionalmente tido como os mais importantes”.

Os frequentadores da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), que homenageia este ano o escritor negro João do Rio, estão sendo brindados com a reedição de uma relíquia histórica: o primeiro livro de Carlos Lacerda (1914-1977), um dos mais amados e odiados políticos da história do Brasil. Para quem só conhece uma das facetas de Lacerda, a do líder da UDN, opositor ferrenho de Getúlio Vargas e apoiador do golpe que depôs João Goulart da Presidência em 1964, o livro também pode ser uma surpresa.

O Quilombo de Manuel Congo, uma pequena novela de pouco mais de 50 páginas, é uma denúncia sobre a exploração dos negros escravizados no Vale do Paraíba e a repressão comandada pelos grandes fazendeiros da região à rebelião liderada em 1838 por Manuel Congo, apelidado de “Zumbi Fluminense”.

O livro foi escrito por Lacerda aos 21 anos e publicado em 1935 sob o pseudônimo de Marcos. Na época, ele era ateu, comunista e seguidor entusiasmado da Aliança Libertadora Nacional (ALN), frente de esquerda liderada por Luiz Carlos Prestes. Uma advertência foi introduzida por Lacerda no início de O Quilombo de Manuel Congo. “Não é bem verdade tudo o que está neste livro. Também não é bem mentira”.

Mentira, esclarece o autor, são as descrições detalhadas sobre a paisagem do Vale do Paraíba na primeira metade do século 19, então sede de uma pujante economia cafeeira lastreada no regime escravocrata. Verdade é a história da rebelião dos quilombolas, recontada por Lacerda, com base em pesquisas em documentos históricos em Vassouras, cidade do sul do estado do Rio de Janeiro, onde seu avô Sebastião de Lacerda, ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), tinha uma chácara, e seu pai Maurício de Lacerda, um ex-deputado de ideias socialistas, era prefeito.

Carlos Lacerda, então governador do Rio de Janeiro, durante votação na eleição de 1962 Foto: Acervo Estadão

A rebelião estourou na vila de Paty dos Alferes, próxima a Vassouras. Centenas de homens e mulheres, liderados por Manuel Congo e por Mariana Crioula, uma negra escravizada proclamada como a “rainha dos quilombolas”, se insurgiram contra os maus tratos aplicados pelos fazendeiros e seus feitores e se refugiaram em uma mata nos arredores. A repressão não tardou. A Guarda Nacional, milícia do Império comandada no Vale do Paraíba pelo coronel Francisco Peixoto de Lacerda Werneck, um dos grandes proprietários da região, foi à caça dos fugitivos. O movimento dos quilombolas, porém, tomou tal vulto que foi preciso chamar a ajuda do Exército regular.

Na repressão ao levante, destacou-se o então tenente-coronel Luís Alves de Lima, que depois ficaria conhecido como o Duque de Caxias e o patrono do Exército. Presos os quilombolas, Manuel Congo, ferreiro de profissão, foi condenado à morte e enforcado na praça central de Vassouras. Outros sete réus homens foram sentenciados a receber 650 chibatadas e ao uso da gargalheira, uma coleira de ferro, por três anos. Mariana Crioula e outras mulheres presas foram absolvidas por serem “fêmeas”.

Lacerda foi o primeiro a registrar a saga do quilombo de Manuel Congo e Mariana Crioula, a quem chama no livro de “Maria Crioula”. Ele se interessou pela história ainda durante a infância, ao ouvir os relatos das violências sofridas pelos negros contados por Tia Claudina, uma antiga escravizada que trabalhava na chácara do avô. Escreveu o livro em duas noites. Como ressalta o jornalista Mário Magalhães, autor do prefácio da nova edição, O Quilombo de Manuel Congo é uma “obra de juventude”.

“O tom panfletário permeado por tiradas líricas dá a impressão de escriba imaturo”, escreve Magalhães, que pesquisou por nove anos a vida de Lacerda para uma biografia a ser publicada pela Companhia das Letras. O primeiro volume, que cobre os anos de 1914 a 1961, deve ser lançado no ano que vem.

O “tom panfletário”, impregnado de marxismo, a que se refere Magalhães, aparece em trechos em que ele reverencia os quilombolas açoitados no pelourinho. “Teus gritos serão ouvidos porque a tua voz não morreu, não morrerá. Ela é a voz dos oprimidos, dos explorados de todo o mundo. É a voz das senzalas, a voz das fábricas, a voz dos torturados e dos humildes, dos tristes e dos famintos. A voz que vai crescendo e há de ensurdecer os opressores”, escreve o jovem comunista.

Na década de 1940, Lacerda deu uma guinada política, converteu-se ao catolicismo e se tornou ferrenho anticomunista. Em vida, apesar de ter sido dono de editoras de livros, não voltou a reeditar Quilombo de Manuel Congo, que só seria republicado na década de 90, após a sua morte. A nova edição foi patrocinada e está sendo distribuída pelo Museu Vassouras, que será inaugurado em 2025 a partir da restauração do antigo prédio do Hospital da Santa Casa de Misericórdia da cidade, iniciativa do ex-deputado federal, investidor e colecionador de arte Ronaldo Cezar Coelho.

Os bonecos de Manuel Congo e Mariana Crioula, na área dos bambuzais da Chácara da Hera, nos jardins do Museu Casa da Hera, em Vassouras Foto: Liz Batista/Estadão

Obra de iniciante, O Quilombo de Manuel Congo prenuncia algumas características que se tornariam marcas de Carlos Lacerda, como o estilo incandescente, empregado por ele como jornalista e político, para defender causas e combater adversários.

Caxias, por exemplo, é descrito por Lacerda, sem meias palavras, como “esse que nunca se envergonhou de ser assassino de escravos”. O neto Rodrigo, editor da Record e autor do romance histórico A República das Abelhas sobre a saga familiar dos três Lacerdas que se envolveram com a política (Sebastião, Maurício e Carlos), destaca também a permanência da preocupação social, revelada no livro, na atuação do avô como gestor público. Primeiro governador eleito do então recém-criado estado da Guanabara nos anos 60, Lacerda se notabilizou por iniciativas para universalizar o acesso ao ensino primário e que aumentaram os investimentos públicos em saneamento e abastecimento de água no Rio de Janeiro.

O Quilombo de Manuel Congo foi dedicado por Lacerda ao Rio Paraíba, tema também da peça O Rio, que ele escreveu e foi encenada, pela primeira vez, em 1937. Além de dramaturgo, ele também escreveu contos, ensaios e discursos e fez traduções e críticas literárias. O amigo Mário de Andrade disse uma vez que sua ambição era ser Shakespeare e Camões ao mesmo tempo. As “tiradas líricas” do primeiro livro foram sendo lapidadas ao longo dessa extensa produção.

Capa do livro 'O Quilombo de Manuel Congo', escrito por Carlos Lacerda aos 21 anos Foto: Reprodução/Museu de Vassour

Cassado em 1968 pelo regime militar que ajudou a levar ao poder e proscrito da política, passou a cuidar da sua editora e a cultivar rosas, seu hobby. Escreveu então A Casa do Meu Avô, considerada uma pequena joia memorialística e sua melhor obra. Lacerda evoca, no estilo proustiano, a infância passada na chácara do avô, às margens do Rio Paraíba, a mesma onde ouviu as histórias de tia Claudina que inspiraram seu relato sobre os quilombolas liderados por Manuel Congo e Mariana Crioula.

Sobre A Casa do Meu Avô, Carlos Drummond de Andrade escreveu uma carta a Lacerda em que dizia que bastava esse livro para “garantir-lhe esse lugar que importa mais do que os lugares convencionalmente tido como os mais importantes”.

Os frequentadores da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), que homenageia este ano o escritor negro João do Rio, estão sendo brindados com a reedição de uma relíquia histórica: o primeiro livro de Carlos Lacerda (1914-1977), um dos mais amados e odiados políticos da história do Brasil. Para quem só conhece uma das facetas de Lacerda, a do líder da UDN, opositor ferrenho de Getúlio Vargas e apoiador do golpe que depôs João Goulart da Presidência em 1964, o livro também pode ser uma surpresa.

O Quilombo de Manuel Congo, uma pequena novela de pouco mais de 50 páginas, é uma denúncia sobre a exploração dos negros escravizados no Vale do Paraíba e a repressão comandada pelos grandes fazendeiros da região à rebelião liderada em 1838 por Manuel Congo, apelidado de “Zumbi Fluminense”.

O livro foi escrito por Lacerda aos 21 anos e publicado em 1935 sob o pseudônimo de Marcos. Na época, ele era ateu, comunista e seguidor entusiasmado da Aliança Libertadora Nacional (ALN), frente de esquerda liderada por Luiz Carlos Prestes. Uma advertência foi introduzida por Lacerda no início de O Quilombo de Manuel Congo. “Não é bem verdade tudo o que está neste livro. Também não é bem mentira”.

Mentira, esclarece o autor, são as descrições detalhadas sobre a paisagem do Vale do Paraíba na primeira metade do século 19, então sede de uma pujante economia cafeeira lastreada no regime escravocrata. Verdade é a história da rebelião dos quilombolas, recontada por Lacerda, com base em pesquisas em documentos históricos em Vassouras, cidade do sul do estado do Rio de Janeiro, onde seu avô Sebastião de Lacerda, ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), tinha uma chácara, e seu pai Maurício de Lacerda, um ex-deputado de ideias socialistas, era prefeito.

Carlos Lacerda, então governador do Rio de Janeiro, durante votação na eleição de 1962 Foto: Acervo Estadão

A rebelião estourou na vila de Paty dos Alferes, próxima a Vassouras. Centenas de homens e mulheres, liderados por Manuel Congo e por Mariana Crioula, uma negra escravizada proclamada como a “rainha dos quilombolas”, se insurgiram contra os maus tratos aplicados pelos fazendeiros e seus feitores e se refugiaram em uma mata nos arredores. A repressão não tardou. A Guarda Nacional, milícia do Império comandada no Vale do Paraíba pelo coronel Francisco Peixoto de Lacerda Werneck, um dos grandes proprietários da região, foi à caça dos fugitivos. O movimento dos quilombolas, porém, tomou tal vulto que foi preciso chamar a ajuda do Exército regular.

Na repressão ao levante, destacou-se o então tenente-coronel Luís Alves de Lima, que depois ficaria conhecido como o Duque de Caxias e o patrono do Exército. Presos os quilombolas, Manuel Congo, ferreiro de profissão, foi condenado à morte e enforcado na praça central de Vassouras. Outros sete réus homens foram sentenciados a receber 650 chibatadas e ao uso da gargalheira, uma coleira de ferro, por três anos. Mariana Crioula e outras mulheres presas foram absolvidas por serem “fêmeas”.

Lacerda foi o primeiro a registrar a saga do quilombo de Manuel Congo e Mariana Crioula, a quem chama no livro de “Maria Crioula”. Ele se interessou pela história ainda durante a infância, ao ouvir os relatos das violências sofridas pelos negros contados por Tia Claudina, uma antiga escravizada que trabalhava na chácara do avô. Escreveu o livro em duas noites. Como ressalta o jornalista Mário Magalhães, autor do prefácio da nova edição, O Quilombo de Manuel Congo é uma “obra de juventude”.

“O tom panfletário permeado por tiradas líricas dá a impressão de escriba imaturo”, escreve Magalhães, que pesquisou por nove anos a vida de Lacerda para uma biografia a ser publicada pela Companhia das Letras. O primeiro volume, que cobre os anos de 1914 a 1961, deve ser lançado no ano que vem.

O “tom panfletário”, impregnado de marxismo, a que se refere Magalhães, aparece em trechos em que ele reverencia os quilombolas açoitados no pelourinho. “Teus gritos serão ouvidos porque a tua voz não morreu, não morrerá. Ela é a voz dos oprimidos, dos explorados de todo o mundo. É a voz das senzalas, a voz das fábricas, a voz dos torturados e dos humildes, dos tristes e dos famintos. A voz que vai crescendo e há de ensurdecer os opressores”, escreve o jovem comunista.

Na década de 1940, Lacerda deu uma guinada política, converteu-se ao catolicismo e se tornou ferrenho anticomunista. Em vida, apesar de ter sido dono de editoras de livros, não voltou a reeditar Quilombo de Manuel Congo, que só seria republicado na década de 90, após a sua morte. A nova edição foi patrocinada e está sendo distribuída pelo Museu Vassouras, que será inaugurado em 2025 a partir da restauração do antigo prédio do Hospital da Santa Casa de Misericórdia da cidade, iniciativa do ex-deputado federal, investidor e colecionador de arte Ronaldo Cezar Coelho.

Os bonecos de Manuel Congo e Mariana Crioula, na área dos bambuzais da Chácara da Hera, nos jardins do Museu Casa da Hera, em Vassouras Foto: Liz Batista/Estadão

Obra de iniciante, O Quilombo de Manuel Congo prenuncia algumas características que se tornariam marcas de Carlos Lacerda, como o estilo incandescente, empregado por ele como jornalista e político, para defender causas e combater adversários.

Caxias, por exemplo, é descrito por Lacerda, sem meias palavras, como “esse que nunca se envergonhou de ser assassino de escravos”. O neto Rodrigo, editor da Record e autor do romance histórico A República das Abelhas sobre a saga familiar dos três Lacerdas que se envolveram com a política (Sebastião, Maurício e Carlos), destaca também a permanência da preocupação social, revelada no livro, na atuação do avô como gestor público. Primeiro governador eleito do então recém-criado estado da Guanabara nos anos 60, Lacerda se notabilizou por iniciativas para universalizar o acesso ao ensino primário e que aumentaram os investimentos públicos em saneamento e abastecimento de água no Rio de Janeiro.

O Quilombo de Manuel Congo foi dedicado por Lacerda ao Rio Paraíba, tema também da peça O Rio, que ele escreveu e foi encenada, pela primeira vez, em 1937. Além de dramaturgo, ele também escreveu contos, ensaios e discursos e fez traduções e críticas literárias. O amigo Mário de Andrade disse uma vez que sua ambição era ser Shakespeare e Camões ao mesmo tempo. As “tiradas líricas” do primeiro livro foram sendo lapidadas ao longo dessa extensa produção.

Capa do livro 'O Quilombo de Manuel Congo', escrito por Carlos Lacerda aos 21 anos Foto: Reprodução/Museu de Vassour

Cassado em 1968 pelo regime militar que ajudou a levar ao poder e proscrito da política, passou a cuidar da sua editora e a cultivar rosas, seu hobby. Escreveu então A Casa do Meu Avô, considerada uma pequena joia memorialística e sua melhor obra. Lacerda evoca, no estilo proustiano, a infância passada na chácara do avô, às margens do Rio Paraíba, a mesma onde ouviu as histórias de tia Claudina que inspiraram seu relato sobre os quilombolas liderados por Manuel Congo e Mariana Crioula.

Sobre A Casa do Meu Avô, Carlos Drummond de Andrade escreveu uma carta a Lacerda em que dizia que bastava esse livro para “garantir-lhe esse lugar que importa mais do que os lugares convencionalmente tido como os mais importantes”.

Os frequentadores da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), que homenageia este ano o escritor negro João do Rio, estão sendo brindados com a reedição de uma relíquia histórica: o primeiro livro de Carlos Lacerda (1914-1977), um dos mais amados e odiados políticos da história do Brasil. Para quem só conhece uma das facetas de Lacerda, a do líder da UDN, opositor ferrenho de Getúlio Vargas e apoiador do golpe que depôs João Goulart da Presidência em 1964, o livro também pode ser uma surpresa.

O Quilombo de Manuel Congo, uma pequena novela de pouco mais de 50 páginas, é uma denúncia sobre a exploração dos negros escravizados no Vale do Paraíba e a repressão comandada pelos grandes fazendeiros da região à rebelião liderada em 1838 por Manuel Congo, apelidado de “Zumbi Fluminense”.

O livro foi escrito por Lacerda aos 21 anos e publicado em 1935 sob o pseudônimo de Marcos. Na época, ele era ateu, comunista e seguidor entusiasmado da Aliança Libertadora Nacional (ALN), frente de esquerda liderada por Luiz Carlos Prestes. Uma advertência foi introduzida por Lacerda no início de O Quilombo de Manuel Congo. “Não é bem verdade tudo o que está neste livro. Também não é bem mentira”.

Mentira, esclarece o autor, são as descrições detalhadas sobre a paisagem do Vale do Paraíba na primeira metade do século 19, então sede de uma pujante economia cafeeira lastreada no regime escravocrata. Verdade é a história da rebelião dos quilombolas, recontada por Lacerda, com base em pesquisas em documentos históricos em Vassouras, cidade do sul do estado do Rio de Janeiro, onde seu avô Sebastião de Lacerda, ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), tinha uma chácara, e seu pai Maurício de Lacerda, um ex-deputado de ideias socialistas, era prefeito.

Carlos Lacerda, então governador do Rio de Janeiro, durante votação na eleição de 1962 Foto: Acervo Estadão

A rebelião estourou na vila de Paty dos Alferes, próxima a Vassouras. Centenas de homens e mulheres, liderados por Manuel Congo e por Mariana Crioula, uma negra escravizada proclamada como a “rainha dos quilombolas”, se insurgiram contra os maus tratos aplicados pelos fazendeiros e seus feitores e se refugiaram em uma mata nos arredores. A repressão não tardou. A Guarda Nacional, milícia do Império comandada no Vale do Paraíba pelo coronel Francisco Peixoto de Lacerda Werneck, um dos grandes proprietários da região, foi à caça dos fugitivos. O movimento dos quilombolas, porém, tomou tal vulto que foi preciso chamar a ajuda do Exército regular.

Na repressão ao levante, destacou-se o então tenente-coronel Luís Alves de Lima, que depois ficaria conhecido como o Duque de Caxias e o patrono do Exército. Presos os quilombolas, Manuel Congo, ferreiro de profissão, foi condenado à morte e enforcado na praça central de Vassouras. Outros sete réus homens foram sentenciados a receber 650 chibatadas e ao uso da gargalheira, uma coleira de ferro, por três anos. Mariana Crioula e outras mulheres presas foram absolvidas por serem “fêmeas”.

Lacerda foi o primeiro a registrar a saga do quilombo de Manuel Congo e Mariana Crioula, a quem chama no livro de “Maria Crioula”. Ele se interessou pela história ainda durante a infância, ao ouvir os relatos das violências sofridas pelos negros contados por Tia Claudina, uma antiga escravizada que trabalhava na chácara do avô. Escreveu o livro em duas noites. Como ressalta o jornalista Mário Magalhães, autor do prefácio da nova edição, O Quilombo de Manuel Congo é uma “obra de juventude”.

“O tom panfletário permeado por tiradas líricas dá a impressão de escriba imaturo”, escreve Magalhães, que pesquisou por nove anos a vida de Lacerda para uma biografia a ser publicada pela Companhia das Letras. O primeiro volume, que cobre os anos de 1914 a 1961, deve ser lançado no ano que vem.

O “tom panfletário”, impregnado de marxismo, a que se refere Magalhães, aparece em trechos em que ele reverencia os quilombolas açoitados no pelourinho. “Teus gritos serão ouvidos porque a tua voz não morreu, não morrerá. Ela é a voz dos oprimidos, dos explorados de todo o mundo. É a voz das senzalas, a voz das fábricas, a voz dos torturados e dos humildes, dos tristes e dos famintos. A voz que vai crescendo e há de ensurdecer os opressores”, escreve o jovem comunista.

Na década de 1940, Lacerda deu uma guinada política, converteu-se ao catolicismo e se tornou ferrenho anticomunista. Em vida, apesar de ter sido dono de editoras de livros, não voltou a reeditar Quilombo de Manuel Congo, que só seria republicado na década de 90, após a sua morte. A nova edição foi patrocinada e está sendo distribuída pelo Museu Vassouras, que será inaugurado em 2025 a partir da restauração do antigo prédio do Hospital da Santa Casa de Misericórdia da cidade, iniciativa do ex-deputado federal, investidor e colecionador de arte Ronaldo Cezar Coelho.

Os bonecos de Manuel Congo e Mariana Crioula, na área dos bambuzais da Chácara da Hera, nos jardins do Museu Casa da Hera, em Vassouras Foto: Liz Batista/Estadão

Obra de iniciante, O Quilombo de Manuel Congo prenuncia algumas características que se tornariam marcas de Carlos Lacerda, como o estilo incandescente, empregado por ele como jornalista e político, para defender causas e combater adversários.

Caxias, por exemplo, é descrito por Lacerda, sem meias palavras, como “esse que nunca se envergonhou de ser assassino de escravos”. O neto Rodrigo, editor da Record e autor do romance histórico A República das Abelhas sobre a saga familiar dos três Lacerdas que se envolveram com a política (Sebastião, Maurício e Carlos), destaca também a permanência da preocupação social, revelada no livro, na atuação do avô como gestor público. Primeiro governador eleito do então recém-criado estado da Guanabara nos anos 60, Lacerda se notabilizou por iniciativas para universalizar o acesso ao ensino primário e que aumentaram os investimentos públicos em saneamento e abastecimento de água no Rio de Janeiro.

O Quilombo de Manuel Congo foi dedicado por Lacerda ao Rio Paraíba, tema também da peça O Rio, que ele escreveu e foi encenada, pela primeira vez, em 1937. Além de dramaturgo, ele também escreveu contos, ensaios e discursos e fez traduções e críticas literárias. O amigo Mário de Andrade disse uma vez que sua ambição era ser Shakespeare e Camões ao mesmo tempo. As “tiradas líricas” do primeiro livro foram sendo lapidadas ao longo dessa extensa produção.

Capa do livro 'O Quilombo de Manuel Congo', escrito por Carlos Lacerda aos 21 anos Foto: Reprodução/Museu de Vassour

Cassado em 1968 pelo regime militar que ajudou a levar ao poder e proscrito da política, passou a cuidar da sua editora e a cultivar rosas, seu hobby. Escreveu então A Casa do Meu Avô, considerada uma pequena joia memorialística e sua melhor obra. Lacerda evoca, no estilo proustiano, a infância passada na chácara do avô, às margens do Rio Paraíba, a mesma onde ouviu as histórias de tia Claudina que inspiraram seu relato sobre os quilombolas liderados por Manuel Congo e Mariana Crioula.

Sobre A Casa do Meu Avô, Carlos Drummond de Andrade escreveu uma carta a Lacerda em que dizia que bastava esse livro para “garantir-lhe esse lugar que importa mais do que os lugares convencionalmente tido como os mais importantes”.

Os frequentadores da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), que homenageia este ano o escritor negro João do Rio, estão sendo brindados com a reedição de uma relíquia histórica: o primeiro livro de Carlos Lacerda (1914-1977), um dos mais amados e odiados políticos da história do Brasil. Para quem só conhece uma das facetas de Lacerda, a do líder da UDN, opositor ferrenho de Getúlio Vargas e apoiador do golpe que depôs João Goulart da Presidência em 1964, o livro também pode ser uma surpresa.

O Quilombo de Manuel Congo, uma pequena novela de pouco mais de 50 páginas, é uma denúncia sobre a exploração dos negros escravizados no Vale do Paraíba e a repressão comandada pelos grandes fazendeiros da região à rebelião liderada em 1838 por Manuel Congo, apelidado de “Zumbi Fluminense”.

O livro foi escrito por Lacerda aos 21 anos e publicado em 1935 sob o pseudônimo de Marcos. Na época, ele era ateu, comunista e seguidor entusiasmado da Aliança Libertadora Nacional (ALN), frente de esquerda liderada por Luiz Carlos Prestes. Uma advertência foi introduzida por Lacerda no início de O Quilombo de Manuel Congo. “Não é bem verdade tudo o que está neste livro. Também não é bem mentira”.

Mentira, esclarece o autor, são as descrições detalhadas sobre a paisagem do Vale do Paraíba na primeira metade do século 19, então sede de uma pujante economia cafeeira lastreada no regime escravocrata. Verdade é a história da rebelião dos quilombolas, recontada por Lacerda, com base em pesquisas em documentos históricos em Vassouras, cidade do sul do estado do Rio de Janeiro, onde seu avô Sebastião de Lacerda, ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), tinha uma chácara, e seu pai Maurício de Lacerda, um ex-deputado de ideias socialistas, era prefeito.

Carlos Lacerda, então governador do Rio de Janeiro, durante votação na eleição de 1962 Foto: Acervo Estadão

A rebelião estourou na vila de Paty dos Alferes, próxima a Vassouras. Centenas de homens e mulheres, liderados por Manuel Congo e por Mariana Crioula, uma negra escravizada proclamada como a “rainha dos quilombolas”, se insurgiram contra os maus tratos aplicados pelos fazendeiros e seus feitores e se refugiaram em uma mata nos arredores. A repressão não tardou. A Guarda Nacional, milícia do Império comandada no Vale do Paraíba pelo coronel Francisco Peixoto de Lacerda Werneck, um dos grandes proprietários da região, foi à caça dos fugitivos. O movimento dos quilombolas, porém, tomou tal vulto que foi preciso chamar a ajuda do Exército regular.

Na repressão ao levante, destacou-se o então tenente-coronel Luís Alves de Lima, que depois ficaria conhecido como o Duque de Caxias e o patrono do Exército. Presos os quilombolas, Manuel Congo, ferreiro de profissão, foi condenado à morte e enforcado na praça central de Vassouras. Outros sete réus homens foram sentenciados a receber 650 chibatadas e ao uso da gargalheira, uma coleira de ferro, por três anos. Mariana Crioula e outras mulheres presas foram absolvidas por serem “fêmeas”.

Lacerda foi o primeiro a registrar a saga do quilombo de Manuel Congo e Mariana Crioula, a quem chama no livro de “Maria Crioula”. Ele se interessou pela história ainda durante a infância, ao ouvir os relatos das violências sofridas pelos negros contados por Tia Claudina, uma antiga escravizada que trabalhava na chácara do avô. Escreveu o livro em duas noites. Como ressalta o jornalista Mário Magalhães, autor do prefácio da nova edição, O Quilombo de Manuel Congo é uma “obra de juventude”.

“O tom panfletário permeado por tiradas líricas dá a impressão de escriba imaturo”, escreve Magalhães, que pesquisou por nove anos a vida de Lacerda para uma biografia a ser publicada pela Companhia das Letras. O primeiro volume, que cobre os anos de 1914 a 1961, deve ser lançado no ano que vem.

O “tom panfletário”, impregnado de marxismo, a que se refere Magalhães, aparece em trechos em que ele reverencia os quilombolas açoitados no pelourinho. “Teus gritos serão ouvidos porque a tua voz não morreu, não morrerá. Ela é a voz dos oprimidos, dos explorados de todo o mundo. É a voz das senzalas, a voz das fábricas, a voz dos torturados e dos humildes, dos tristes e dos famintos. A voz que vai crescendo e há de ensurdecer os opressores”, escreve o jovem comunista.

Na década de 1940, Lacerda deu uma guinada política, converteu-se ao catolicismo e se tornou ferrenho anticomunista. Em vida, apesar de ter sido dono de editoras de livros, não voltou a reeditar Quilombo de Manuel Congo, que só seria republicado na década de 90, após a sua morte. A nova edição foi patrocinada e está sendo distribuída pelo Museu Vassouras, que será inaugurado em 2025 a partir da restauração do antigo prédio do Hospital da Santa Casa de Misericórdia da cidade, iniciativa do ex-deputado federal, investidor e colecionador de arte Ronaldo Cezar Coelho.

Os bonecos de Manuel Congo e Mariana Crioula, na área dos bambuzais da Chácara da Hera, nos jardins do Museu Casa da Hera, em Vassouras Foto: Liz Batista/Estadão

Obra de iniciante, O Quilombo de Manuel Congo prenuncia algumas características que se tornariam marcas de Carlos Lacerda, como o estilo incandescente, empregado por ele como jornalista e político, para defender causas e combater adversários.

Caxias, por exemplo, é descrito por Lacerda, sem meias palavras, como “esse que nunca se envergonhou de ser assassino de escravos”. O neto Rodrigo, editor da Record e autor do romance histórico A República das Abelhas sobre a saga familiar dos três Lacerdas que se envolveram com a política (Sebastião, Maurício e Carlos), destaca também a permanência da preocupação social, revelada no livro, na atuação do avô como gestor público. Primeiro governador eleito do então recém-criado estado da Guanabara nos anos 60, Lacerda se notabilizou por iniciativas para universalizar o acesso ao ensino primário e que aumentaram os investimentos públicos em saneamento e abastecimento de água no Rio de Janeiro.

O Quilombo de Manuel Congo foi dedicado por Lacerda ao Rio Paraíba, tema também da peça O Rio, que ele escreveu e foi encenada, pela primeira vez, em 1937. Além de dramaturgo, ele também escreveu contos, ensaios e discursos e fez traduções e críticas literárias. O amigo Mário de Andrade disse uma vez que sua ambição era ser Shakespeare e Camões ao mesmo tempo. As “tiradas líricas” do primeiro livro foram sendo lapidadas ao longo dessa extensa produção.

Capa do livro 'O Quilombo de Manuel Congo', escrito por Carlos Lacerda aos 21 anos Foto: Reprodução/Museu de Vassour

Cassado em 1968 pelo regime militar que ajudou a levar ao poder e proscrito da política, passou a cuidar da sua editora e a cultivar rosas, seu hobby. Escreveu então A Casa do Meu Avô, considerada uma pequena joia memorialística e sua melhor obra. Lacerda evoca, no estilo proustiano, a infância passada na chácara do avô, às margens do Rio Paraíba, a mesma onde ouviu as histórias de tia Claudina que inspiraram seu relato sobre os quilombolas liderados por Manuel Congo e Mariana Crioula.

Sobre A Casa do Meu Avô, Carlos Drummond de Andrade escreveu uma carta a Lacerda em que dizia que bastava esse livro para “garantir-lhe esse lugar que importa mais do que os lugares convencionalmente tido como os mais importantes”.

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