Barbara é uma garota do interior da Inglaterra dos anos 1960 que tem um sonho incomum: transformar-se em uma grande comediante de televisão. Algo raro pois, com exceção da americana Lucille Ball (por quem, aliás, Barbara tem uma enorme idolatria), as mulheres não têm mais que um espaço secundário nas séries de TV. Mesmo assim, ela insiste e se muda para Londres onde, depois de trabalhar em uma loja de departamentos, ganha a chance em uma nova série, com a qual se consagra com o pseudônimo de Sophie Straw.
A partir desse interessante ponto de partida, o escritor inglês Nick Hornby volta ao romance depois de cinco anos afastado da literatura com Funny Girl, lançado agora pela Companhia das Letras, que preparou um evento marcado para o sábado, às 16 horas, com entrada franca, na Livraria Cultura do Conjunto Nacional – lá, Márcia Scapaticio (mediadora), André Frateschi, Cadão Volpato, Daniel Benevides e Marcelo Costa vão participar de um bate-papo sobre os caminhos da obra do escritor e sua influência sobre a cultura pop.
Tudo para comemorar um retorno que se revela memorável – afinal, desde que se tornou um queridinho do público e até da crítica, o autor de Alta Fidelidade, Um Grande Garoto e Febre de Bola comprova que sua escrita não perdeu o frescor tampouco a originalidade.
Ao revelar a ascensão de Sophie Straw, Funny Girl abre a janela de um breve momento do século passado, o pós-guerra, quando o mundo (e, aqui, a Inglaterra em especial) descobria os prazeres de se assistir à TV, época em que ainda Beatles e Rolling Stones ainda lutavam para firmar sua dominância na música. Com seu humor tradicional, referências à cultura pop e uma invejável capacidade de criar empatia imediata no leitor, Hornby trata da revolução sexual que já chacoalhava o planeta de uma forma direta, mas acarinhada pela ironia. Sobre o assunto, ele respondeu por e-mail as seguintes questões.
Funny Girl é seu primeiro romance em cinco anos, especialmente por que você vem escrevendo roteiros de filmes. Quais são as vantagens (e desvantagens) de cada disciplina?
O que mais me diverte quando escrevo roteiros é fazer parte de uma equipe. Não só é muito mais divertido trabalhar com outras pessoas, depois de passar tanto tempo da minha vida trabalhando sozinho, mas você é estimulado por outras mentes a ir a lugares imprevistos. A disciplina imposta pelos outros pode gerar uma criatividade inesperada. Mas terrível é o volume de trabalho desperdiçado de roteiros que não acredito serão algum dia produzidos. O que significa que o trabalho está morto, porque não está na sua forma adequada. Quando você escreve uma história ou um romance serão sempre uma história ou um romance mesmo que ninguém a publique. Mas um roteiro necessita de atores, de um diretor, dinheiro. Você tem de saltar tantos obstáculos, lidar com tantos guardiões e isso leva muito tempo. Não preciso da permissão de ninguém para escrever um romance, de maneira que minha liberdade é maior. E, na verdade, os romances duram mais do que filmes. Os filmes morrem muito rápido.
Quando trabalhava neste romance você leu livros de David Kynaston sobre a Grã-Bretanha do meio do século. Teve alguma revelação quando leu esses livros?
Tudo o que ocorreu nos primeiros anos da minha vida hoje parece ficção científica. Dois canais de TV, poucas viagens ao exterior, os efeitos da guerra ainda visíveis por toda a parte, as gerações anteriores a mim apenas recentemente conseguindo comprar os alimentos que precisavam. E, naturalmente, quando você fica mais velho, percebe que a história antiga está muito mais próxima do que se pensa. Eu lia sobre a luta contra os nazistas em revistas em quadrinhos, em meados da década de 60 e, se você pensar, a guerra havia terminado havia apenas 20 anos – seria como 1995 para nós hoje. Bem, eu me lembro de 1995 muito claramente!
E por que Sophie idolatra tanto Lucille Ball?
Lucille Ball era o único exemplo disponível para ela. Todas as comédias muito populares nos anos 60 e 70 eram predominantemente masculinas; mesmo o Monty Python, tão ousado e original sob muitos aspectos, na verdade não incluiu papéis para mulheres. Lucille Ball influenciou enormemente várias gerações de atrizes americanas e eu quis inventar um equivalente britânico.
Você mencionou em outras entrevistas que não existe ninguém comparável a Lucile Ball na Grã-Bretanha. Alguma comediante britânica contemporânea influenciou a personagem de Sophie?
Realmente, não. O desempenho de Rosamund Pike no filme Educação foi a principal inspiração. Eu queria escrever sobre alguém que fosse ao mesmo tempo bela e divertida, mas que estivesse mais interessada no seu talento do que no seu aspecto.
Percebemos que há muita empatia e amor pelos seus personagens. Como lida com eles depois de concluir o livro?
Estou achando este livro particular muito difícil de largar. Ainda sinto falta dos personagens. Mas a melhor coisa a fazer é seguir adiante, mergulhar num mundo que você ame muito também. No momento estou adaptando o maravilhoso livro de Nina Stibbe, Love, Nina, para a BBC e os personagens que ela descreve são uma boa substituição.
Como você lida com a pressão para escrever sempre coisas novas e originais, um tema importante em Funny Girl?
Acho que é este o meu trabalho, especialmente neste estágio da minha carreira. Se não for algo novo e sem originalidade então não me interessa. Portanto não sinto isto como pressão. É uma motivação e uma fonte de inspiração.
FUNNY GIRL
Autor: Nick Hornby
Tradução: Christian Schwartz
Editora: Companhia das Letras (424 págs., R$ 44,90).
Debate na Livraria Cultura Conjunto Nacional (Av. Paulista, 2073). Sábado, 11, 16h. Grátis