A Festa Literária Internacional de Paraty (Flip 2023) escolheu Patrícia Galvão (1910-1962), a Pagu, como autora homenageada desta edição, que será realizada de 22 a 26 de novembro. A programação do evento deve ser anunciada entre o final de setembro e o começo de outubro.
Como ocorreu nos anos anteriores com os outros autores homenageados, Pagu deve ser lembrada mais profundamente em um ciclo de conversas, possivelmente, segundo Mauro Munhoz, diretor artístico da Flip, no Centro de Pesquisa e Formação do Sesc, em São Paulo. Isso, antes do festival. Lá, serão realizadas mesas mais gerais, acompanhando o interesse de um público diverso e menos especializado.
Fernanda Bastos, uma das curadoras da Flip, disse que Pagu, esta personalidade múltipla, com um importante legado a ser conhecido, lembrado e discutido, “vai nos levar para diferentes lugares”. Ou seja, há muitas abordagens e leituras a serem feitas.
A ideia, no fim das contas, é uma maior divulgação da obra de Pagu, inspiração para o movimento feminista e até para Rita Lee, que escreveu a música Pagu (relembre aqui). “Queremos que ela seja mais lida”, disse.
“Pagu foi uma pessoa que olhou para os problemas do País e criou uma estética para enfrentar a misoginia, o racismo e a miséria”, completou a curadora.
Milena Britto, também curadora da programação, comentou que Pagu ficou “um pouco à sombra” do movimento modernista. “Precisamos trazer uma Pagu que não é a Pagu musa. Atravessamos essa Pagu pelo que ela escreveu”, afirmou. Uma mulher, em suas palavras, que “não teve medo de se meter nos embates”, “apaixonada pela liberdade”, “decidida a recusar as regras”. “O que está por trás dessa Pagu?”, se questiona a curadora.
Por muitos anos, a obra de Pagu andou distante das livrarias. Isso, no entanto, começou a mudar recentemente.
Autobiografia precoce, que se chamava Paixão Pagu em edições anteriores, foi publicada pela Companhia das Letras em 2020. Dois anos depois, a editora lançou Parque Industrial. Ela também tem em catálogo Pagu: Vida e Obra, de Augusto de Campos, de 2014. Pagu no Metrô (Nós, 2022) segue as pistas de sua passagem por Paris. E Croquis de Pagu, de Lúcia Teixeira, está disponível em e-book. Outros livros devem ser lançados para aproveitar a homenagem na Flip.
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Quem foi Pagu
Pagu nasceu em 9 de junho de 1910, em São João da Boa Vista, filha de Adélia e Thiers Galvão da França, e cresceu nos fundos de uma tecelagem no Brás, presenciando greves e manifestações. Ainda não fazia ideia de que dedicaria sua vida à causa operária, que por sua luta seria presa mais de 20 vezes, que quase morreria, que viveria na miséria.
Pagu, que não participou da Semana de Arte Moderna, é um nome importante do modernismo brasileiro. Ela, porém, trocou as “enfadonhas” reuniões de intelectuais com suas “polemicazinhas chochas” e suas “comédias sexuais”, como ela dizia, pelo chão de fábrica, pela vontade de agir e de fazer a revolução. Enfrentou o machismo e muitas provações, mas também dizia que lutar por um mundo de verdade e de justiça valia uma vida.
Militante da esquerda, ela lutou contra todos os tipos de autoritarismo, no Brasil e fora. Usou diversos pseudônimos ao longo da vida. Escreveu livros engajados e literatura, peças de teatro, poemas. Foi jornalista, tradutora, ilustradora.
Publicou Parque Industrial, considerado o primeiro romance proletário e no qual ela expôs a vida das trabalhadoras paulistanas submetidas a condições precárias de trabalho, em 1933, e A Famosa Revista, em 1945, em colaboração com Geraldo Ferraz, seu segundo marido e pai de seu filho Geraldo Galvão Ferraz. Usou o pseudônimo King Shelter para escrever contos policiais, reunidos depois em Safra Macabra. E traduziu, para o teatro, autores até então inéditos no Brasil, como James Joyce, Eugène Ionesco, Fernando Arrabal e Octavio Paz.
Ganhou o apelido de Raul Bopp, que dedicou um poema a ela, mas errou seu nome. Vem, então, da junção das primeiras sílabas de Patrícia Goulart. Nessa época já convivia com Oswald de Andrade e Tarsila do Amaral. Acabou se casando com ele, e nasceu Rudá.
Pagu filiou-se ao Partido Comunista. Foi presa pela primeira vez em Santos, aos 21 anos, em 23 de agosto de 1931, num comício de estivadores no Porto de Santos e tornou-se a primeira mulher presa por motivos políticos no Brasil.
Ela lançou, com Oswald, o jornal O Homem do Povo e viajou pelo mundo (EUA, Japão, China, União Soviética, França - sua passagem por Paris é tema de um interessante romance baseado em fatos reais, Pagu no Metrô, de Adriana Armony).
Na França, participou do Partido Comunista Francês. Fez amizade com André Breton e Paul Éluard. Acabou sendo detida como comunista estrangeira e deportada para o Brasil. Em 1935 separou-se de Oswald de Andrade. Acabou presa devido às perseguições que se originaram após a Intentona Comunista e passou dois anos encarcerada sofrendo torturas. Saindo da prisão em 1940, desvinculou-se do Partido Comunista brasileiro e passou a critica-lo.
Passou a colaborar com alguns jornais de esquerda e entrou também para a escola de Arte Dramática. Em 1950 filiou-se ao PSB e concorreu ao cargo de deputada estadual, não conseguindo se eleger. Na década seguinte dedica-se ao teatro, traduzindo e dirigindo algumas peças e alcançando a presidência da União do Teatro Amador de Santos. Acabou morrendo vítima de câncer, em 1962.
Em 1987 sua vida foi retratada no filme Eternamente Pagu, dirigido por Norma Benguell, com Carla Camurati no papel-título. / Com informações biográficas do Acervo Estadão.
21ª Flip - Festa Literária Internacional de Paraty
- Data: 22 a 26 de novembro de 2023
- Programação a ser anunciada