Influenciadores estão dando livro de graça pelas cidades. Quem são eles? E por que fazem isso?


Para Digão Roque, Lucas Barros e Tiago Valente, ação democratiza acesso a livros e chama a atenção do público não leitor. Saiba como tudo começou e os quais são os livros que eles dariam para qualquer pessoa

Por Julia Queiroz e Sabrina Legramandi
Atualização:

“Oi, tudo bem? Quero saber quanto você trouxe para gastar aqui na Bienal”, pergunta Digão Roque. “Cinquenta reais que o governo deu”, responde uma adolescente com um uniforme de uma escola estadual da Bahia. “Você aceita trocar esses R$ 50 por R$ 1 mil?”. O diálogo parece cena de filme – ou, melhor, de livro –, mas a possibilidade de ganhar exemplares enquanto se passeia em livrarias, bienais e eventos se tornou real por causa de influenciadores literários.

Rodrigo, o Digão, tem 23 anos e é um dos muitos booktokers (nome dado àqueles que criam conteúdos literários para o TikTok) que agora dedicam parte de seus vídeos para mostrar reações de pessoas ao receberem livros de surpresa. Foi ele quem lançou a moda por aqui.

Observando a tendência do “dois reais ou um presente misterioso?”, que tomou conta da rede de vídeos no Brasil e no exterior, Digão resolveu adaptar a brincadeira para o meio literário. No vídeo citado no início da reportagem, o influenciador foi até a Bienal da Bahia, em abril, e se gravou distribuindo exemplares para desconhecidos. Mas ele já faz publicações desse tipo há três anos.

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“Eu sou a pessoa que ajuda a minha família, mas eu pego uma parte do que eu ganho para investir no meu trabalho e comprar livros para as pessoas”, comenta ele. “Eu sinto que preciso retribuir. Se eu estou ganhando dinheiro, é porque elas estão me apoiando.”

Carioca, mas morando em São Paulo, Digão começou a falar sobre livros no TikTok “no calor do momento”. “Eu li É Assim Que Acaba, da Colleen Hoover, e estava com muita ‘raiva’ porque era um livro muito bom e eu fiquei com medo de nunca mais ler um livro tão bom”, brinca.

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O influenciador, então, criou o costume de gravar vídeos no estilo “apertar o play e começar a falar”. Hoje, os temas das postagens são mais variados e ele tem mais de 700 mil seguidores. O boom da conta, porém, veio após a Bienal do Livro em São Paulo de 2021 – a primeira vez em que ele se gravou distribuindo livros. “Eu ganhei 70 mil seguidores com esse vídeo e eu ainda não tinha nem 100 mil”, diz.

O conteúdo acabou inspirando outros influenciadores do meio literário a fazerem o mesmo. Tiago Valente, de 26 anos, é um deles. Natural de São Paulo, ele produz conteúdo para o TikTok desde 2017 e acumula 523 mil seguidores, mas, neste ano, resolveu fazer um vídeo diferente: ele se gravou “perdendo” livros pela capital paulista.

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No Dia do Livro, 23 de abril, Tiago fez uma seleção de títulos que tinha repetidos em sua casa e escreveu um bilhete explicando a ação e encorajando quem encontrasse o exemplar que o passasse para frente depois. Em seguida, ele foi deixando os livros por onde passava: no cinema, no shopping, em uma cafeteria e no metrô. O vídeo foi bem e, alguns dias depois, ele repetiu a ação na Bienal da Bahia - desta vez, esperou para registrar a reação de quem achava os objetos “perdidos”.

O influenciador literário Tiago Valente. Foto: Felipe Rau/Estadão

“A própria dinâmica do vídeo já é interessante e desperta essa curiosidade. É um tipo de conteúdo diferente do que costumamos produzir no BookTok. Geralmente, sou eu no meu quarto falando sobre livros. Esse tem mais interesse entre pessoas [fora do nicho]. É muito legal de acompanhar as reações”, explica ele.

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Quem também investiu na distribuição de livros foi o estudante de comunicação social Lucas Barros, de 22 anos. De Caruaru, Pernambuco, ele começou a postar vídeos sobre livros no YouTube em 2020 e, no ano seguinte, resolveu se arriscar no TikTok. Hoje, são mais de 182 mil seguidores e 9,8 milhões de curtidas.

Ele já havia consumido vídeos semelhantes de criadores de conteúdo estrangeiros e, neste mesmo período, Rodrigo Roque, o Digão, havia feito suas primeiras publicações distribuindo livros. “Fui conversar com ele sobre isso na época e concordamos que há muitas pessoas que querem ler, mas não têm condição de comprar livros. Entramos nessa conclusão de que, agora, temos condições de fazer isso pelas pessoas”, diz.

“Comecei com aquele ‘trocando livros por qualquer coisa’. Resolvi fazer a ideia do nada. Fui na livraria e gravei o vídeo. Deu muito certo, o público achou legal e continuei fazendo. Depois, eu fui buscando outras ideias”, explica. Uma delas foi um vídeo “vendendo lixo”, também gravado na Bienal do Livro da Bahia. Na gravação, Lucas oferece um pedaço de papel amassado por R$ 2. Quem aceita comprá-lo abre a folha e recebe uma surpresa: “Você ganhou 10 livros!”.

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Quem paga e como funciona?

Digão explica que “já aconteceu” de firmar parcerias para distribuir os livros, mas garante: “90% sou eu que pago”. Em um de seus vídeos, o influenciador pediu para que uma desconhecida usasse seu cartão para comprar quantos livros quisesse, desde que não passasse o limite disponível - mas ele não disse qual era. Ao final, ele revela que o cartão era ilimitado.

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Com relação a este vídeo, por exemplo, o booktoker disse ter arcado com todos os exemplares escolhidos. Nas publicações em que pede para que as pessoas escolham entre “10 reais ou uma caixa de livros misteriosa”, ele diz que varia entre as obras compradas por ele e as que ele mesmo ganha.

O influenciador diz que costuma escolher uma livraria próxima à sua casa para fazer a surpresa para desconhecidos – geralmente, ele grava os vídeos semanalmente. Para filmar, ele conta com a ajuda de amigos ou, até mesmo, pede auxílio para os próprios funcionários do estabelecimento.

Lucas conta que seleciona livros que recebe - prática comum na divulgação das editoras. Em alguns casos, ele escolhe aqueles que estão parados em sua estante ou que já leu e quer passar para frente. Às vezes, como Digão, ele tira dinheiro do próprio bolso para presentear os escolhidos. É o caso de vídeos em ele permite que a pessoa escolha quais (e, às vezes, quantos) livros ela quer levar para casa.

Em uma gravação recente, o influenciador ofereceu a uma jovem: “Vou comprar todos os livros que você quiser, mas tem uma regra secreta”. E a regra era, no fim das contas, que ela só poderia escolher livros de autores brasileiros.

Lucas também já fez parceiras, mas afirma que esses vídeos são menos comuns. Ele explica que gosta de gravar este tipo de conteúdo em eventos literários, como Bienais, ou em livrarias (na cidade dele, são apenas duas, mas só uma permite a gravação). Ele explica a preferência: “Quero que quem ganhe esses livros sejam pessoas que realmente vão ler”.

Já Tiago Valente diz que optou por selecionar livros que já tinha em casa ou foram enviados por editoras. Ele pretende ter um diferencial a partir de curadoria das obras: “Na Bienal da Bahia, distribui só livros com representatividade, com protagonismo LGBT+. Foi uma escolha consciente, com a intenção de levar essas histórias para frente”.

O que eles ‘ganham’ em troca?

Digão conta que sabe que os vídeos em que aparece presenteando desconhecidos com livros recebem mais visualizações. Para além de números, porém, o influenciador se diz grato por perceber que o conteúdo – por “flertar” com o humor e o inesperado – atingiu pessoas não leitoras.

“O meu maior objetivo sempre foi alcançar pessoas que não leem”, afirma. “Muita gente já me contou que via meus vídeos e achava engraçado, mas, como não entendia 100% da piada, começava a ler o livro para entender.”

Em relação ao retorno financeiro, o influenciador diz não monetizar nenhum de seus vídeos em nenhuma de suas redes sociais, já que produz vídeos muito curtos. No TikTok, criadores só ganham dinheiro por postagens com mais de um minuto de duração. Por esse motivo, ele não ganha diretamente com as publicações em que presenteia as pessoas com livros, mas sim com parcerias de publicidade e outras formas de apoio.

Tiago Valente diz monetizar seus vídeos, mas conta que grande parte da renda vem de conteúdos patrocinados. Foto: Felipe Rau/Estadão

Já Tiago e Lucas monetizam as publicações, mas explicam que, da mesma forma, a maior parte da renda vem dos conteúdos patrocinados. Ambos afirmam que o retorno dos vídeos presentando pessoas vem apenas pelo engajamento, que costuma ser maior do que o de outras postagens.

“Ganhei muitos seguidores por esses vídeos”, conta Lucas. “Na Bienal da Bahia, postei um vídeo dizendo que eu ia me livrar de uma mala de livros. Esse vídeo acabou furando um pouco e minha bolha, e comecei a ganhar muitos seguidores por causa disso. É muito legal, porque ajuda do lado de cá, e eu ajudo a galera também, dando livros pra eles.”

Afinal, por que eles distribuem livros?

Para os influenciadores literários, distribuir livros é uma forma de criar um conteúdo inusitado e que pode atrair um público ainda maior. Mas também pode ser mais que isso: “O livro é uma coisa muito cara, então acaba sendo pouco acessível para algumas pessoas terem. Chegar em pessoas que eu sei que não têm condições e que querem muito ler é uma forma de democratizar”, diz Lucas.

“Sei que é um jeito diferente e complexo, porque não vai chegar em todo mundo, mas acho que é uma iniciativa bacana e é muito legal ver também que isso se espalhou muito”, diz Lucas. Para o influenciador, também é uma forma de retribuir.

Obviamente, eu não tenho tanto dinheiro ainda para fazer muito, mas faço sempre que percebo que dá pra separar um pouquinho do que eu estou recebendo com a internet. Na minha cabeça, também é uma forma de devolver, porque, querendo ou não, só tenho esse dinheiro porque a galera me assiste.

Lucas Barros

Tiago Valente diz fazer uma 'curadoria' dos livros que distribui. Foto: Felipe Rau/Estadão

Para Tiago, é uma maneira de apoiar causas em que acredita. “Eu já fui a pessoa que não tinha dinheiro para comprar livros”, diz. “Para além da parte material, penso muito também na questão de histórias, e como elas me transformaram, me ajudaram a construir a empatia, entender pessoas e realidades diferentes das minhas. É justamente por isso que eu gosto de fazer essa curadoria.”

Digão também cita os valores cada vez mais altos dos livros e diz que seu trabalho é uma forma de democratizar o acesso à leitura. “O meu foco é ajudar com as condições que eu tenho hoje. [...] O objetivo é incentivar não só as pessoas a doarem livros, mas também influenciadores literários a doarem livros”, diz.

Graças à visibilidade que ganhou com o TikTok, o booktoker pôde se envolver ativamente em prol das vítimas das enchentes do Rio Grande do Sul. Recentemente, ele fez uma ação na Livraria da Vila, em São Paulo, em que trocava livros por doações.

Para o evento, ele doou todos os livros que tinha na estante - ao todo, foram mais de 600 exemplares. “Eu fiquei pensando de que maneira faria mais sentido eu ajudar. [...] Concluí que seria difícil se eu me desapegasse de todos os meus livros. E foi o que eu fiz”, afirma. A ação também contou com obras doadas pela livraria e por editoras e, agora, o influenciador está promovendo eventos de “livros por doações” em diversos pontos do País.

Três livros que os três dariam para qualquer pessoa

Se o objetivo dos influenciadores é fazer com que histórias em que acreditam sejam lidas, quais livros eles dariam para qualquer pessoa? O Estadão fez essa pergunta para os três. Confira as indicações de cada um abaixo.

Digão Roque

  • Os Sete Maridos de Evelyn Hugo, de Taylor Jenkins Reid
  • Pessoas Normais, de Sally Rooney
  • Amanhã, Amanhã, E Ainda Outro Amanhã, de Gabrielle Zevin

Lucas Barros

  • Tudo é Rio, de Carla Madeira
  • O Quarto de Despejo, de Carolina Maria de Jesus
  • A Insustentável Leveza do Ser, de Milan Kundera

Tiago Valente

  • Felix Para Sempre, de Kacen Callender
  • Foi Assim Que Tudo Explodiu, de Arvin Ahmadi
  • Heartstopper, de Alice Oseman

“Oi, tudo bem? Quero saber quanto você trouxe para gastar aqui na Bienal”, pergunta Digão Roque. “Cinquenta reais que o governo deu”, responde uma adolescente com um uniforme de uma escola estadual da Bahia. “Você aceita trocar esses R$ 50 por R$ 1 mil?”. O diálogo parece cena de filme – ou, melhor, de livro –, mas a possibilidade de ganhar exemplares enquanto se passeia em livrarias, bienais e eventos se tornou real por causa de influenciadores literários.

Rodrigo, o Digão, tem 23 anos e é um dos muitos booktokers (nome dado àqueles que criam conteúdos literários para o TikTok) que agora dedicam parte de seus vídeos para mostrar reações de pessoas ao receberem livros de surpresa. Foi ele quem lançou a moda por aqui.

Observando a tendência do “dois reais ou um presente misterioso?”, que tomou conta da rede de vídeos no Brasil e no exterior, Digão resolveu adaptar a brincadeira para o meio literário. No vídeo citado no início da reportagem, o influenciador foi até a Bienal da Bahia, em abril, e se gravou distribuindo exemplares para desconhecidos. Mas ele já faz publicações desse tipo há três anos.

“Eu sou a pessoa que ajuda a minha família, mas eu pego uma parte do que eu ganho para investir no meu trabalho e comprar livros para as pessoas”, comenta ele. “Eu sinto que preciso retribuir. Se eu estou ganhando dinheiro, é porque elas estão me apoiando.”

Carioca, mas morando em São Paulo, Digão começou a falar sobre livros no TikTok “no calor do momento”. “Eu li É Assim Que Acaba, da Colleen Hoover, e estava com muita ‘raiva’ porque era um livro muito bom e eu fiquei com medo de nunca mais ler um livro tão bom”, brinca.

O influenciador, então, criou o costume de gravar vídeos no estilo “apertar o play e começar a falar”. Hoje, os temas das postagens são mais variados e ele tem mais de 700 mil seguidores. O boom da conta, porém, veio após a Bienal do Livro em São Paulo de 2021 – a primeira vez em que ele se gravou distribuindo livros. “Eu ganhei 70 mil seguidores com esse vídeo e eu ainda não tinha nem 100 mil”, diz.

O conteúdo acabou inspirando outros influenciadores do meio literário a fazerem o mesmo. Tiago Valente, de 26 anos, é um deles. Natural de São Paulo, ele produz conteúdo para o TikTok desde 2017 e acumula 523 mil seguidores, mas, neste ano, resolveu fazer um vídeo diferente: ele se gravou “perdendo” livros pela capital paulista.

No Dia do Livro, 23 de abril, Tiago fez uma seleção de títulos que tinha repetidos em sua casa e escreveu um bilhete explicando a ação e encorajando quem encontrasse o exemplar que o passasse para frente depois. Em seguida, ele foi deixando os livros por onde passava: no cinema, no shopping, em uma cafeteria e no metrô. O vídeo foi bem e, alguns dias depois, ele repetiu a ação na Bienal da Bahia - desta vez, esperou para registrar a reação de quem achava os objetos “perdidos”.

O influenciador literário Tiago Valente. Foto: Felipe Rau/Estadão

“A própria dinâmica do vídeo já é interessante e desperta essa curiosidade. É um tipo de conteúdo diferente do que costumamos produzir no BookTok. Geralmente, sou eu no meu quarto falando sobre livros. Esse tem mais interesse entre pessoas [fora do nicho]. É muito legal de acompanhar as reações”, explica ele.

Quem também investiu na distribuição de livros foi o estudante de comunicação social Lucas Barros, de 22 anos. De Caruaru, Pernambuco, ele começou a postar vídeos sobre livros no YouTube em 2020 e, no ano seguinte, resolveu se arriscar no TikTok. Hoje, são mais de 182 mil seguidores e 9,8 milhões de curtidas.

Ele já havia consumido vídeos semelhantes de criadores de conteúdo estrangeiros e, neste mesmo período, Rodrigo Roque, o Digão, havia feito suas primeiras publicações distribuindo livros. “Fui conversar com ele sobre isso na época e concordamos que há muitas pessoas que querem ler, mas não têm condição de comprar livros. Entramos nessa conclusão de que, agora, temos condições de fazer isso pelas pessoas”, diz.

“Comecei com aquele ‘trocando livros por qualquer coisa’. Resolvi fazer a ideia do nada. Fui na livraria e gravei o vídeo. Deu muito certo, o público achou legal e continuei fazendo. Depois, eu fui buscando outras ideias”, explica. Uma delas foi um vídeo “vendendo lixo”, também gravado na Bienal do Livro da Bahia. Na gravação, Lucas oferece um pedaço de papel amassado por R$ 2. Quem aceita comprá-lo abre a folha e recebe uma surpresa: “Você ganhou 10 livros!”.

Quem paga e como funciona?

Digão explica que “já aconteceu” de firmar parcerias para distribuir os livros, mas garante: “90% sou eu que pago”. Em um de seus vídeos, o influenciador pediu para que uma desconhecida usasse seu cartão para comprar quantos livros quisesse, desde que não passasse o limite disponível - mas ele não disse qual era. Ao final, ele revela que o cartão era ilimitado.

Com relação a este vídeo, por exemplo, o booktoker disse ter arcado com todos os exemplares escolhidos. Nas publicações em que pede para que as pessoas escolham entre “10 reais ou uma caixa de livros misteriosa”, ele diz que varia entre as obras compradas por ele e as que ele mesmo ganha.

O influenciador diz que costuma escolher uma livraria próxima à sua casa para fazer a surpresa para desconhecidos – geralmente, ele grava os vídeos semanalmente. Para filmar, ele conta com a ajuda de amigos ou, até mesmo, pede auxílio para os próprios funcionários do estabelecimento.

Lucas conta que seleciona livros que recebe - prática comum na divulgação das editoras. Em alguns casos, ele escolhe aqueles que estão parados em sua estante ou que já leu e quer passar para frente. Às vezes, como Digão, ele tira dinheiro do próprio bolso para presentear os escolhidos. É o caso de vídeos em ele permite que a pessoa escolha quais (e, às vezes, quantos) livros ela quer levar para casa.

Em uma gravação recente, o influenciador ofereceu a uma jovem: “Vou comprar todos os livros que você quiser, mas tem uma regra secreta”. E a regra era, no fim das contas, que ela só poderia escolher livros de autores brasileiros.

Lucas também já fez parceiras, mas afirma que esses vídeos são menos comuns. Ele explica que gosta de gravar este tipo de conteúdo em eventos literários, como Bienais, ou em livrarias (na cidade dele, são apenas duas, mas só uma permite a gravação). Ele explica a preferência: “Quero que quem ganhe esses livros sejam pessoas que realmente vão ler”.

Já Tiago Valente diz que optou por selecionar livros que já tinha em casa ou foram enviados por editoras. Ele pretende ter um diferencial a partir de curadoria das obras: “Na Bienal da Bahia, distribui só livros com representatividade, com protagonismo LGBT+. Foi uma escolha consciente, com a intenção de levar essas histórias para frente”.

O que eles ‘ganham’ em troca?

Digão conta que sabe que os vídeos em que aparece presenteando desconhecidos com livros recebem mais visualizações. Para além de números, porém, o influenciador se diz grato por perceber que o conteúdo – por “flertar” com o humor e o inesperado – atingiu pessoas não leitoras.

“O meu maior objetivo sempre foi alcançar pessoas que não leem”, afirma. “Muita gente já me contou que via meus vídeos e achava engraçado, mas, como não entendia 100% da piada, começava a ler o livro para entender.”

Em relação ao retorno financeiro, o influenciador diz não monetizar nenhum de seus vídeos em nenhuma de suas redes sociais, já que produz vídeos muito curtos. No TikTok, criadores só ganham dinheiro por postagens com mais de um minuto de duração. Por esse motivo, ele não ganha diretamente com as publicações em que presenteia as pessoas com livros, mas sim com parcerias de publicidade e outras formas de apoio.

Tiago Valente diz monetizar seus vídeos, mas conta que grande parte da renda vem de conteúdos patrocinados. Foto: Felipe Rau/Estadão

Já Tiago e Lucas monetizam as publicações, mas explicam que, da mesma forma, a maior parte da renda vem dos conteúdos patrocinados. Ambos afirmam que o retorno dos vídeos presentando pessoas vem apenas pelo engajamento, que costuma ser maior do que o de outras postagens.

“Ganhei muitos seguidores por esses vídeos”, conta Lucas. “Na Bienal da Bahia, postei um vídeo dizendo que eu ia me livrar de uma mala de livros. Esse vídeo acabou furando um pouco e minha bolha, e comecei a ganhar muitos seguidores por causa disso. É muito legal, porque ajuda do lado de cá, e eu ajudo a galera também, dando livros pra eles.”

Afinal, por que eles distribuem livros?

Para os influenciadores literários, distribuir livros é uma forma de criar um conteúdo inusitado e que pode atrair um público ainda maior. Mas também pode ser mais que isso: “O livro é uma coisa muito cara, então acaba sendo pouco acessível para algumas pessoas terem. Chegar em pessoas que eu sei que não têm condições e que querem muito ler é uma forma de democratizar”, diz Lucas.

“Sei que é um jeito diferente e complexo, porque não vai chegar em todo mundo, mas acho que é uma iniciativa bacana e é muito legal ver também que isso se espalhou muito”, diz Lucas. Para o influenciador, também é uma forma de retribuir.

Obviamente, eu não tenho tanto dinheiro ainda para fazer muito, mas faço sempre que percebo que dá pra separar um pouquinho do que eu estou recebendo com a internet. Na minha cabeça, também é uma forma de devolver, porque, querendo ou não, só tenho esse dinheiro porque a galera me assiste.

Lucas Barros

Tiago Valente diz fazer uma 'curadoria' dos livros que distribui. Foto: Felipe Rau/Estadão

Para Tiago, é uma maneira de apoiar causas em que acredita. “Eu já fui a pessoa que não tinha dinheiro para comprar livros”, diz. “Para além da parte material, penso muito também na questão de histórias, e como elas me transformaram, me ajudaram a construir a empatia, entender pessoas e realidades diferentes das minhas. É justamente por isso que eu gosto de fazer essa curadoria.”

Digão também cita os valores cada vez mais altos dos livros e diz que seu trabalho é uma forma de democratizar o acesso à leitura. “O meu foco é ajudar com as condições que eu tenho hoje. [...] O objetivo é incentivar não só as pessoas a doarem livros, mas também influenciadores literários a doarem livros”, diz.

Graças à visibilidade que ganhou com o TikTok, o booktoker pôde se envolver ativamente em prol das vítimas das enchentes do Rio Grande do Sul. Recentemente, ele fez uma ação na Livraria da Vila, em São Paulo, em que trocava livros por doações.

Para o evento, ele doou todos os livros que tinha na estante - ao todo, foram mais de 600 exemplares. “Eu fiquei pensando de que maneira faria mais sentido eu ajudar. [...] Concluí que seria difícil se eu me desapegasse de todos os meus livros. E foi o que eu fiz”, afirma. A ação também contou com obras doadas pela livraria e por editoras e, agora, o influenciador está promovendo eventos de “livros por doações” em diversos pontos do País.

Três livros que os três dariam para qualquer pessoa

Se o objetivo dos influenciadores é fazer com que histórias em que acreditam sejam lidas, quais livros eles dariam para qualquer pessoa? O Estadão fez essa pergunta para os três. Confira as indicações de cada um abaixo.

Digão Roque

  • Os Sete Maridos de Evelyn Hugo, de Taylor Jenkins Reid
  • Pessoas Normais, de Sally Rooney
  • Amanhã, Amanhã, E Ainda Outro Amanhã, de Gabrielle Zevin

Lucas Barros

  • Tudo é Rio, de Carla Madeira
  • O Quarto de Despejo, de Carolina Maria de Jesus
  • A Insustentável Leveza do Ser, de Milan Kundera

Tiago Valente

  • Felix Para Sempre, de Kacen Callender
  • Foi Assim Que Tudo Explodiu, de Arvin Ahmadi
  • Heartstopper, de Alice Oseman

“Oi, tudo bem? Quero saber quanto você trouxe para gastar aqui na Bienal”, pergunta Digão Roque. “Cinquenta reais que o governo deu”, responde uma adolescente com um uniforme de uma escola estadual da Bahia. “Você aceita trocar esses R$ 50 por R$ 1 mil?”. O diálogo parece cena de filme – ou, melhor, de livro –, mas a possibilidade de ganhar exemplares enquanto se passeia em livrarias, bienais e eventos se tornou real por causa de influenciadores literários.

Rodrigo, o Digão, tem 23 anos e é um dos muitos booktokers (nome dado àqueles que criam conteúdos literários para o TikTok) que agora dedicam parte de seus vídeos para mostrar reações de pessoas ao receberem livros de surpresa. Foi ele quem lançou a moda por aqui.

Observando a tendência do “dois reais ou um presente misterioso?”, que tomou conta da rede de vídeos no Brasil e no exterior, Digão resolveu adaptar a brincadeira para o meio literário. No vídeo citado no início da reportagem, o influenciador foi até a Bienal da Bahia, em abril, e se gravou distribuindo exemplares para desconhecidos. Mas ele já faz publicações desse tipo há três anos.

“Eu sou a pessoa que ajuda a minha família, mas eu pego uma parte do que eu ganho para investir no meu trabalho e comprar livros para as pessoas”, comenta ele. “Eu sinto que preciso retribuir. Se eu estou ganhando dinheiro, é porque elas estão me apoiando.”

Carioca, mas morando em São Paulo, Digão começou a falar sobre livros no TikTok “no calor do momento”. “Eu li É Assim Que Acaba, da Colleen Hoover, e estava com muita ‘raiva’ porque era um livro muito bom e eu fiquei com medo de nunca mais ler um livro tão bom”, brinca.

O influenciador, então, criou o costume de gravar vídeos no estilo “apertar o play e começar a falar”. Hoje, os temas das postagens são mais variados e ele tem mais de 700 mil seguidores. O boom da conta, porém, veio após a Bienal do Livro em São Paulo de 2021 – a primeira vez em que ele se gravou distribuindo livros. “Eu ganhei 70 mil seguidores com esse vídeo e eu ainda não tinha nem 100 mil”, diz.

O conteúdo acabou inspirando outros influenciadores do meio literário a fazerem o mesmo. Tiago Valente, de 26 anos, é um deles. Natural de São Paulo, ele produz conteúdo para o TikTok desde 2017 e acumula 523 mil seguidores, mas, neste ano, resolveu fazer um vídeo diferente: ele se gravou “perdendo” livros pela capital paulista.

No Dia do Livro, 23 de abril, Tiago fez uma seleção de títulos que tinha repetidos em sua casa e escreveu um bilhete explicando a ação e encorajando quem encontrasse o exemplar que o passasse para frente depois. Em seguida, ele foi deixando os livros por onde passava: no cinema, no shopping, em uma cafeteria e no metrô. O vídeo foi bem e, alguns dias depois, ele repetiu a ação na Bienal da Bahia - desta vez, esperou para registrar a reação de quem achava os objetos “perdidos”.

O influenciador literário Tiago Valente. Foto: Felipe Rau/Estadão

“A própria dinâmica do vídeo já é interessante e desperta essa curiosidade. É um tipo de conteúdo diferente do que costumamos produzir no BookTok. Geralmente, sou eu no meu quarto falando sobre livros. Esse tem mais interesse entre pessoas [fora do nicho]. É muito legal de acompanhar as reações”, explica ele.

Quem também investiu na distribuição de livros foi o estudante de comunicação social Lucas Barros, de 22 anos. De Caruaru, Pernambuco, ele começou a postar vídeos sobre livros no YouTube em 2020 e, no ano seguinte, resolveu se arriscar no TikTok. Hoje, são mais de 182 mil seguidores e 9,8 milhões de curtidas.

Ele já havia consumido vídeos semelhantes de criadores de conteúdo estrangeiros e, neste mesmo período, Rodrigo Roque, o Digão, havia feito suas primeiras publicações distribuindo livros. “Fui conversar com ele sobre isso na época e concordamos que há muitas pessoas que querem ler, mas não têm condição de comprar livros. Entramos nessa conclusão de que, agora, temos condições de fazer isso pelas pessoas”, diz.

“Comecei com aquele ‘trocando livros por qualquer coisa’. Resolvi fazer a ideia do nada. Fui na livraria e gravei o vídeo. Deu muito certo, o público achou legal e continuei fazendo. Depois, eu fui buscando outras ideias”, explica. Uma delas foi um vídeo “vendendo lixo”, também gravado na Bienal do Livro da Bahia. Na gravação, Lucas oferece um pedaço de papel amassado por R$ 2. Quem aceita comprá-lo abre a folha e recebe uma surpresa: “Você ganhou 10 livros!”.

Quem paga e como funciona?

Digão explica que “já aconteceu” de firmar parcerias para distribuir os livros, mas garante: “90% sou eu que pago”. Em um de seus vídeos, o influenciador pediu para que uma desconhecida usasse seu cartão para comprar quantos livros quisesse, desde que não passasse o limite disponível - mas ele não disse qual era. Ao final, ele revela que o cartão era ilimitado.

Com relação a este vídeo, por exemplo, o booktoker disse ter arcado com todos os exemplares escolhidos. Nas publicações em que pede para que as pessoas escolham entre “10 reais ou uma caixa de livros misteriosa”, ele diz que varia entre as obras compradas por ele e as que ele mesmo ganha.

O influenciador diz que costuma escolher uma livraria próxima à sua casa para fazer a surpresa para desconhecidos – geralmente, ele grava os vídeos semanalmente. Para filmar, ele conta com a ajuda de amigos ou, até mesmo, pede auxílio para os próprios funcionários do estabelecimento.

Lucas conta que seleciona livros que recebe - prática comum na divulgação das editoras. Em alguns casos, ele escolhe aqueles que estão parados em sua estante ou que já leu e quer passar para frente. Às vezes, como Digão, ele tira dinheiro do próprio bolso para presentear os escolhidos. É o caso de vídeos em ele permite que a pessoa escolha quais (e, às vezes, quantos) livros ela quer levar para casa.

Em uma gravação recente, o influenciador ofereceu a uma jovem: “Vou comprar todos os livros que você quiser, mas tem uma regra secreta”. E a regra era, no fim das contas, que ela só poderia escolher livros de autores brasileiros.

Lucas também já fez parceiras, mas afirma que esses vídeos são menos comuns. Ele explica que gosta de gravar este tipo de conteúdo em eventos literários, como Bienais, ou em livrarias (na cidade dele, são apenas duas, mas só uma permite a gravação). Ele explica a preferência: “Quero que quem ganhe esses livros sejam pessoas que realmente vão ler”.

Já Tiago Valente diz que optou por selecionar livros que já tinha em casa ou foram enviados por editoras. Ele pretende ter um diferencial a partir de curadoria das obras: “Na Bienal da Bahia, distribui só livros com representatividade, com protagonismo LGBT+. Foi uma escolha consciente, com a intenção de levar essas histórias para frente”.

O que eles ‘ganham’ em troca?

Digão conta que sabe que os vídeos em que aparece presenteando desconhecidos com livros recebem mais visualizações. Para além de números, porém, o influenciador se diz grato por perceber que o conteúdo – por “flertar” com o humor e o inesperado – atingiu pessoas não leitoras.

“O meu maior objetivo sempre foi alcançar pessoas que não leem”, afirma. “Muita gente já me contou que via meus vídeos e achava engraçado, mas, como não entendia 100% da piada, começava a ler o livro para entender.”

Em relação ao retorno financeiro, o influenciador diz não monetizar nenhum de seus vídeos em nenhuma de suas redes sociais, já que produz vídeos muito curtos. No TikTok, criadores só ganham dinheiro por postagens com mais de um minuto de duração. Por esse motivo, ele não ganha diretamente com as publicações em que presenteia as pessoas com livros, mas sim com parcerias de publicidade e outras formas de apoio.

Tiago Valente diz monetizar seus vídeos, mas conta que grande parte da renda vem de conteúdos patrocinados. Foto: Felipe Rau/Estadão

Já Tiago e Lucas monetizam as publicações, mas explicam que, da mesma forma, a maior parte da renda vem dos conteúdos patrocinados. Ambos afirmam que o retorno dos vídeos presentando pessoas vem apenas pelo engajamento, que costuma ser maior do que o de outras postagens.

“Ganhei muitos seguidores por esses vídeos”, conta Lucas. “Na Bienal da Bahia, postei um vídeo dizendo que eu ia me livrar de uma mala de livros. Esse vídeo acabou furando um pouco e minha bolha, e comecei a ganhar muitos seguidores por causa disso. É muito legal, porque ajuda do lado de cá, e eu ajudo a galera também, dando livros pra eles.”

Afinal, por que eles distribuem livros?

Para os influenciadores literários, distribuir livros é uma forma de criar um conteúdo inusitado e que pode atrair um público ainda maior. Mas também pode ser mais que isso: “O livro é uma coisa muito cara, então acaba sendo pouco acessível para algumas pessoas terem. Chegar em pessoas que eu sei que não têm condições e que querem muito ler é uma forma de democratizar”, diz Lucas.

“Sei que é um jeito diferente e complexo, porque não vai chegar em todo mundo, mas acho que é uma iniciativa bacana e é muito legal ver também que isso se espalhou muito”, diz Lucas. Para o influenciador, também é uma forma de retribuir.

Obviamente, eu não tenho tanto dinheiro ainda para fazer muito, mas faço sempre que percebo que dá pra separar um pouquinho do que eu estou recebendo com a internet. Na minha cabeça, também é uma forma de devolver, porque, querendo ou não, só tenho esse dinheiro porque a galera me assiste.

Lucas Barros

Tiago Valente diz fazer uma 'curadoria' dos livros que distribui. Foto: Felipe Rau/Estadão

Para Tiago, é uma maneira de apoiar causas em que acredita. “Eu já fui a pessoa que não tinha dinheiro para comprar livros”, diz. “Para além da parte material, penso muito também na questão de histórias, e como elas me transformaram, me ajudaram a construir a empatia, entender pessoas e realidades diferentes das minhas. É justamente por isso que eu gosto de fazer essa curadoria.”

Digão também cita os valores cada vez mais altos dos livros e diz que seu trabalho é uma forma de democratizar o acesso à leitura. “O meu foco é ajudar com as condições que eu tenho hoje. [...] O objetivo é incentivar não só as pessoas a doarem livros, mas também influenciadores literários a doarem livros”, diz.

Graças à visibilidade que ganhou com o TikTok, o booktoker pôde se envolver ativamente em prol das vítimas das enchentes do Rio Grande do Sul. Recentemente, ele fez uma ação na Livraria da Vila, em São Paulo, em que trocava livros por doações.

Para o evento, ele doou todos os livros que tinha na estante - ao todo, foram mais de 600 exemplares. “Eu fiquei pensando de que maneira faria mais sentido eu ajudar. [...] Concluí que seria difícil se eu me desapegasse de todos os meus livros. E foi o que eu fiz”, afirma. A ação também contou com obras doadas pela livraria e por editoras e, agora, o influenciador está promovendo eventos de “livros por doações” em diversos pontos do País.

Três livros que os três dariam para qualquer pessoa

Se o objetivo dos influenciadores é fazer com que histórias em que acreditam sejam lidas, quais livros eles dariam para qualquer pessoa? O Estadão fez essa pergunta para os três. Confira as indicações de cada um abaixo.

Digão Roque

  • Os Sete Maridos de Evelyn Hugo, de Taylor Jenkins Reid
  • Pessoas Normais, de Sally Rooney
  • Amanhã, Amanhã, E Ainda Outro Amanhã, de Gabrielle Zevin

Lucas Barros

  • Tudo é Rio, de Carla Madeira
  • O Quarto de Despejo, de Carolina Maria de Jesus
  • A Insustentável Leveza do Ser, de Milan Kundera

Tiago Valente

  • Felix Para Sempre, de Kacen Callender
  • Foi Assim Que Tudo Explodiu, de Arvin Ahmadi
  • Heartstopper, de Alice Oseman

“Oi, tudo bem? Quero saber quanto você trouxe para gastar aqui na Bienal”, pergunta Digão Roque. “Cinquenta reais que o governo deu”, responde uma adolescente com um uniforme de uma escola estadual da Bahia. “Você aceita trocar esses R$ 50 por R$ 1 mil?”. O diálogo parece cena de filme – ou, melhor, de livro –, mas a possibilidade de ganhar exemplares enquanto se passeia em livrarias, bienais e eventos se tornou real por causa de influenciadores literários.

Rodrigo, o Digão, tem 23 anos e é um dos muitos booktokers (nome dado àqueles que criam conteúdos literários para o TikTok) que agora dedicam parte de seus vídeos para mostrar reações de pessoas ao receberem livros de surpresa. Foi ele quem lançou a moda por aqui.

Observando a tendência do “dois reais ou um presente misterioso?”, que tomou conta da rede de vídeos no Brasil e no exterior, Digão resolveu adaptar a brincadeira para o meio literário. No vídeo citado no início da reportagem, o influenciador foi até a Bienal da Bahia, em abril, e se gravou distribuindo exemplares para desconhecidos. Mas ele já faz publicações desse tipo há três anos.

“Eu sou a pessoa que ajuda a minha família, mas eu pego uma parte do que eu ganho para investir no meu trabalho e comprar livros para as pessoas”, comenta ele. “Eu sinto que preciso retribuir. Se eu estou ganhando dinheiro, é porque elas estão me apoiando.”

Carioca, mas morando em São Paulo, Digão começou a falar sobre livros no TikTok “no calor do momento”. “Eu li É Assim Que Acaba, da Colleen Hoover, e estava com muita ‘raiva’ porque era um livro muito bom e eu fiquei com medo de nunca mais ler um livro tão bom”, brinca.

O influenciador, então, criou o costume de gravar vídeos no estilo “apertar o play e começar a falar”. Hoje, os temas das postagens são mais variados e ele tem mais de 700 mil seguidores. O boom da conta, porém, veio após a Bienal do Livro em São Paulo de 2021 – a primeira vez em que ele se gravou distribuindo livros. “Eu ganhei 70 mil seguidores com esse vídeo e eu ainda não tinha nem 100 mil”, diz.

O conteúdo acabou inspirando outros influenciadores do meio literário a fazerem o mesmo. Tiago Valente, de 26 anos, é um deles. Natural de São Paulo, ele produz conteúdo para o TikTok desde 2017 e acumula 523 mil seguidores, mas, neste ano, resolveu fazer um vídeo diferente: ele se gravou “perdendo” livros pela capital paulista.

No Dia do Livro, 23 de abril, Tiago fez uma seleção de títulos que tinha repetidos em sua casa e escreveu um bilhete explicando a ação e encorajando quem encontrasse o exemplar que o passasse para frente depois. Em seguida, ele foi deixando os livros por onde passava: no cinema, no shopping, em uma cafeteria e no metrô. O vídeo foi bem e, alguns dias depois, ele repetiu a ação na Bienal da Bahia - desta vez, esperou para registrar a reação de quem achava os objetos “perdidos”.

O influenciador literário Tiago Valente. Foto: Felipe Rau/Estadão

“A própria dinâmica do vídeo já é interessante e desperta essa curiosidade. É um tipo de conteúdo diferente do que costumamos produzir no BookTok. Geralmente, sou eu no meu quarto falando sobre livros. Esse tem mais interesse entre pessoas [fora do nicho]. É muito legal de acompanhar as reações”, explica ele.

Quem também investiu na distribuição de livros foi o estudante de comunicação social Lucas Barros, de 22 anos. De Caruaru, Pernambuco, ele começou a postar vídeos sobre livros no YouTube em 2020 e, no ano seguinte, resolveu se arriscar no TikTok. Hoje, são mais de 182 mil seguidores e 9,8 milhões de curtidas.

Ele já havia consumido vídeos semelhantes de criadores de conteúdo estrangeiros e, neste mesmo período, Rodrigo Roque, o Digão, havia feito suas primeiras publicações distribuindo livros. “Fui conversar com ele sobre isso na época e concordamos que há muitas pessoas que querem ler, mas não têm condição de comprar livros. Entramos nessa conclusão de que, agora, temos condições de fazer isso pelas pessoas”, diz.

“Comecei com aquele ‘trocando livros por qualquer coisa’. Resolvi fazer a ideia do nada. Fui na livraria e gravei o vídeo. Deu muito certo, o público achou legal e continuei fazendo. Depois, eu fui buscando outras ideias”, explica. Uma delas foi um vídeo “vendendo lixo”, também gravado na Bienal do Livro da Bahia. Na gravação, Lucas oferece um pedaço de papel amassado por R$ 2. Quem aceita comprá-lo abre a folha e recebe uma surpresa: “Você ganhou 10 livros!”.

Quem paga e como funciona?

Digão explica que “já aconteceu” de firmar parcerias para distribuir os livros, mas garante: “90% sou eu que pago”. Em um de seus vídeos, o influenciador pediu para que uma desconhecida usasse seu cartão para comprar quantos livros quisesse, desde que não passasse o limite disponível - mas ele não disse qual era. Ao final, ele revela que o cartão era ilimitado.

Com relação a este vídeo, por exemplo, o booktoker disse ter arcado com todos os exemplares escolhidos. Nas publicações em que pede para que as pessoas escolham entre “10 reais ou uma caixa de livros misteriosa”, ele diz que varia entre as obras compradas por ele e as que ele mesmo ganha.

O influenciador diz que costuma escolher uma livraria próxima à sua casa para fazer a surpresa para desconhecidos – geralmente, ele grava os vídeos semanalmente. Para filmar, ele conta com a ajuda de amigos ou, até mesmo, pede auxílio para os próprios funcionários do estabelecimento.

Lucas conta que seleciona livros que recebe - prática comum na divulgação das editoras. Em alguns casos, ele escolhe aqueles que estão parados em sua estante ou que já leu e quer passar para frente. Às vezes, como Digão, ele tira dinheiro do próprio bolso para presentear os escolhidos. É o caso de vídeos em ele permite que a pessoa escolha quais (e, às vezes, quantos) livros ela quer levar para casa.

Em uma gravação recente, o influenciador ofereceu a uma jovem: “Vou comprar todos os livros que você quiser, mas tem uma regra secreta”. E a regra era, no fim das contas, que ela só poderia escolher livros de autores brasileiros.

Lucas também já fez parceiras, mas afirma que esses vídeos são menos comuns. Ele explica que gosta de gravar este tipo de conteúdo em eventos literários, como Bienais, ou em livrarias (na cidade dele, são apenas duas, mas só uma permite a gravação). Ele explica a preferência: “Quero que quem ganhe esses livros sejam pessoas que realmente vão ler”.

Já Tiago Valente diz que optou por selecionar livros que já tinha em casa ou foram enviados por editoras. Ele pretende ter um diferencial a partir de curadoria das obras: “Na Bienal da Bahia, distribui só livros com representatividade, com protagonismo LGBT+. Foi uma escolha consciente, com a intenção de levar essas histórias para frente”.

O que eles ‘ganham’ em troca?

Digão conta que sabe que os vídeos em que aparece presenteando desconhecidos com livros recebem mais visualizações. Para além de números, porém, o influenciador se diz grato por perceber que o conteúdo – por “flertar” com o humor e o inesperado – atingiu pessoas não leitoras.

“O meu maior objetivo sempre foi alcançar pessoas que não leem”, afirma. “Muita gente já me contou que via meus vídeos e achava engraçado, mas, como não entendia 100% da piada, começava a ler o livro para entender.”

Em relação ao retorno financeiro, o influenciador diz não monetizar nenhum de seus vídeos em nenhuma de suas redes sociais, já que produz vídeos muito curtos. No TikTok, criadores só ganham dinheiro por postagens com mais de um minuto de duração. Por esse motivo, ele não ganha diretamente com as publicações em que presenteia as pessoas com livros, mas sim com parcerias de publicidade e outras formas de apoio.

Tiago Valente diz monetizar seus vídeos, mas conta que grande parte da renda vem de conteúdos patrocinados. Foto: Felipe Rau/Estadão

Já Tiago e Lucas monetizam as publicações, mas explicam que, da mesma forma, a maior parte da renda vem dos conteúdos patrocinados. Ambos afirmam que o retorno dos vídeos presentando pessoas vem apenas pelo engajamento, que costuma ser maior do que o de outras postagens.

“Ganhei muitos seguidores por esses vídeos”, conta Lucas. “Na Bienal da Bahia, postei um vídeo dizendo que eu ia me livrar de uma mala de livros. Esse vídeo acabou furando um pouco e minha bolha, e comecei a ganhar muitos seguidores por causa disso. É muito legal, porque ajuda do lado de cá, e eu ajudo a galera também, dando livros pra eles.”

Afinal, por que eles distribuem livros?

Para os influenciadores literários, distribuir livros é uma forma de criar um conteúdo inusitado e que pode atrair um público ainda maior. Mas também pode ser mais que isso: “O livro é uma coisa muito cara, então acaba sendo pouco acessível para algumas pessoas terem. Chegar em pessoas que eu sei que não têm condições e que querem muito ler é uma forma de democratizar”, diz Lucas.

“Sei que é um jeito diferente e complexo, porque não vai chegar em todo mundo, mas acho que é uma iniciativa bacana e é muito legal ver também que isso se espalhou muito”, diz Lucas. Para o influenciador, também é uma forma de retribuir.

Obviamente, eu não tenho tanto dinheiro ainda para fazer muito, mas faço sempre que percebo que dá pra separar um pouquinho do que eu estou recebendo com a internet. Na minha cabeça, também é uma forma de devolver, porque, querendo ou não, só tenho esse dinheiro porque a galera me assiste.

Lucas Barros

Tiago Valente diz fazer uma 'curadoria' dos livros que distribui. Foto: Felipe Rau/Estadão

Para Tiago, é uma maneira de apoiar causas em que acredita. “Eu já fui a pessoa que não tinha dinheiro para comprar livros”, diz. “Para além da parte material, penso muito também na questão de histórias, e como elas me transformaram, me ajudaram a construir a empatia, entender pessoas e realidades diferentes das minhas. É justamente por isso que eu gosto de fazer essa curadoria.”

Digão também cita os valores cada vez mais altos dos livros e diz que seu trabalho é uma forma de democratizar o acesso à leitura. “O meu foco é ajudar com as condições que eu tenho hoje. [...] O objetivo é incentivar não só as pessoas a doarem livros, mas também influenciadores literários a doarem livros”, diz.

Graças à visibilidade que ganhou com o TikTok, o booktoker pôde se envolver ativamente em prol das vítimas das enchentes do Rio Grande do Sul. Recentemente, ele fez uma ação na Livraria da Vila, em São Paulo, em que trocava livros por doações.

Para o evento, ele doou todos os livros que tinha na estante - ao todo, foram mais de 600 exemplares. “Eu fiquei pensando de que maneira faria mais sentido eu ajudar. [...] Concluí que seria difícil se eu me desapegasse de todos os meus livros. E foi o que eu fiz”, afirma. A ação também contou com obras doadas pela livraria e por editoras e, agora, o influenciador está promovendo eventos de “livros por doações” em diversos pontos do País.

Três livros que os três dariam para qualquer pessoa

Se o objetivo dos influenciadores é fazer com que histórias em que acreditam sejam lidas, quais livros eles dariam para qualquer pessoa? O Estadão fez essa pergunta para os três. Confira as indicações de cada um abaixo.

Digão Roque

  • Os Sete Maridos de Evelyn Hugo, de Taylor Jenkins Reid
  • Pessoas Normais, de Sally Rooney
  • Amanhã, Amanhã, E Ainda Outro Amanhã, de Gabrielle Zevin

Lucas Barros

  • Tudo é Rio, de Carla Madeira
  • O Quarto de Despejo, de Carolina Maria de Jesus
  • A Insustentável Leveza do Ser, de Milan Kundera

Tiago Valente

  • Felix Para Sempre, de Kacen Callender
  • Foi Assim Que Tudo Explodiu, de Arvin Ahmadi
  • Heartstopper, de Alice Oseman

“Oi, tudo bem? Quero saber quanto você trouxe para gastar aqui na Bienal”, pergunta Digão Roque. “Cinquenta reais que o governo deu”, responde uma adolescente com um uniforme de uma escola estadual da Bahia. “Você aceita trocar esses R$ 50 por R$ 1 mil?”. O diálogo parece cena de filme – ou, melhor, de livro –, mas a possibilidade de ganhar exemplares enquanto se passeia em livrarias, bienais e eventos se tornou real por causa de influenciadores literários.

Rodrigo, o Digão, tem 23 anos e é um dos muitos booktokers (nome dado àqueles que criam conteúdos literários para o TikTok) que agora dedicam parte de seus vídeos para mostrar reações de pessoas ao receberem livros de surpresa. Foi ele quem lançou a moda por aqui.

Observando a tendência do “dois reais ou um presente misterioso?”, que tomou conta da rede de vídeos no Brasil e no exterior, Digão resolveu adaptar a brincadeira para o meio literário. No vídeo citado no início da reportagem, o influenciador foi até a Bienal da Bahia, em abril, e se gravou distribuindo exemplares para desconhecidos. Mas ele já faz publicações desse tipo há três anos.

“Eu sou a pessoa que ajuda a minha família, mas eu pego uma parte do que eu ganho para investir no meu trabalho e comprar livros para as pessoas”, comenta ele. “Eu sinto que preciso retribuir. Se eu estou ganhando dinheiro, é porque elas estão me apoiando.”

Carioca, mas morando em São Paulo, Digão começou a falar sobre livros no TikTok “no calor do momento”. “Eu li É Assim Que Acaba, da Colleen Hoover, e estava com muita ‘raiva’ porque era um livro muito bom e eu fiquei com medo de nunca mais ler um livro tão bom”, brinca.

O influenciador, então, criou o costume de gravar vídeos no estilo “apertar o play e começar a falar”. Hoje, os temas das postagens são mais variados e ele tem mais de 700 mil seguidores. O boom da conta, porém, veio após a Bienal do Livro em São Paulo de 2021 – a primeira vez em que ele se gravou distribuindo livros. “Eu ganhei 70 mil seguidores com esse vídeo e eu ainda não tinha nem 100 mil”, diz.

O conteúdo acabou inspirando outros influenciadores do meio literário a fazerem o mesmo. Tiago Valente, de 26 anos, é um deles. Natural de São Paulo, ele produz conteúdo para o TikTok desde 2017 e acumula 523 mil seguidores, mas, neste ano, resolveu fazer um vídeo diferente: ele se gravou “perdendo” livros pela capital paulista.

No Dia do Livro, 23 de abril, Tiago fez uma seleção de títulos que tinha repetidos em sua casa e escreveu um bilhete explicando a ação e encorajando quem encontrasse o exemplar que o passasse para frente depois. Em seguida, ele foi deixando os livros por onde passava: no cinema, no shopping, em uma cafeteria e no metrô. O vídeo foi bem e, alguns dias depois, ele repetiu a ação na Bienal da Bahia - desta vez, esperou para registrar a reação de quem achava os objetos “perdidos”.

O influenciador literário Tiago Valente. Foto: Felipe Rau/Estadão

“A própria dinâmica do vídeo já é interessante e desperta essa curiosidade. É um tipo de conteúdo diferente do que costumamos produzir no BookTok. Geralmente, sou eu no meu quarto falando sobre livros. Esse tem mais interesse entre pessoas [fora do nicho]. É muito legal de acompanhar as reações”, explica ele.

Quem também investiu na distribuição de livros foi o estudante de comunicação social Lucas Barros, de 22 anos. De Caruaru, Pernambuco, ele começou a postar vídeos sobre livros no YouTube em 2020 e, no ano seguinte, resolveu se arriscar no TikTok. Hoje, são mais de 182 mil seguidores e 9,8 milhões de curtidas.

Ele já havia consumido vídeos semelhantes de criadores de conteúdo estrangeiros e, neste mesmo período, Rodrigo Roque, o Digão, havia feito suas primeiras publicações distribuindo livros. “Fui conversar com ele sobre isso na época e concordamos que há muitas pessoas que querem ler, mas não têm condição de comprar livros. Entramos nessa conclusão de que, agora, temos condições de fazer isso pelas pessoas”, diz.

“Comecei com aquele ‘trocando livros por qualquer coisa’. Resolvi fazer a ideia do nada. Fui na livraria e gravei o vídeo. Deu muito certo, o público achou legal e continuei fazendo. Depois, eu fui buscando outras ideias”, explica. Uma delas foi um vídeo “vendendo lixo”, também gravado na Bienal do Livro da Bahia. Na gravação, Lucas oferece um pedaço de papel amassado por R$ 2. Quem aceita comprá-lo abre a folha e recebe uma surpresa: “Você ganhou 10 livros!”.

Quem paga e como funciona?

Digão explica que “já aconteceu” de firmar parcerias para distribuir os livros, mas garante: “90% sou eu que pago”. Em um de seus vídeos, o influenciador pediu para que uma desconhecida usasse seu cartão para comprar quantos livros quisesse, desde que não passasse o limite disponível - mas ele não disse qual era. Ao final, ele revela que o cartão era ilimitado.

Com relação a este vídeo, por exemplo, o booktoker disse ter arcado com todos os exemplares escolhidos. Nas publicações em que pede para que as pessoas escolham entre “10 reais ou uma caixa de livros misteriosa”, ele diz que varia entre as obras compradas por ele e as que ele mesmo ganha.

O influenciador diz que costuma escolher uma livraria próxima à sua casa para fazer a surpresa para desconhecidos – geralmente, ele grava os vídeos semanalmente. Para filmar, ele conta com a ajuda de amigos ou, até mesmo, pede auxílio para os próprios funcionários do estabelecimento.

Lucas conta que seleciona livros que recebe - prática comum na divulgação das editoras. Em alguns casos, ele escolhe aqueles que estão parados em sua estante ou que já leu e quer passar para frente. Às vezes, como Digão, ele tira dinheiro do próprio bolso para presentear os escolhidos. É o caso de vídeos em ele permite que a pessoa escolha quais (e, às vezes, quantos) livros ela quer levar para casa.

Em uma gravação recente, o influenciador ofereceu a uma jovem: “Vou comprar todos os livros que você quiser, mas tem uma regra secreta”. E a regra era, no fim das contas, que ela só poderia escolher livros de autores brasileiros.

Lucas também já fez parceiras, mas afirma que esses vídeos são menos comuns. Ele explica que gosta de gravar este tipo de conteúdo em eventos literários, como Bienais, ou em livrarias (na cidade dele, são apenas duas, mas só uma permite a gravação). Ele explica a preferência: “Quero que quem ganhe esses livros sejam pessoas que realmente vão ler”.

Já Tiago Valente diz que optou por selecionar livros que já tinha em casa ou foram enviados por editoras. Ele pretende ter um diferencial a partir de curadoria das obras: “Na Bienal da Bahia, distribui só livros com representatividade, com protagonismo LGBT+. Foi uma escolha consciente, com a intenção de levar essas histórias para frente”.

O que eles ‘ganham’ em troca?

Digão conta que sabe que os vídeos em que aparece presenteando desconhecidos com livros recebem mais visualizações. Para além de números, porém, o influenciador se diz grato por perceber que o conteúdo – por “flertar” com o humor e o inesperado – atingiu pessoas não leitoras.

“O meu maior objetivo sempre foi alcançar pessoas que não leem”, afirma. “Muita gente já me contou que via meus vídeos e achava engraçado, mas, como não entendia 100% da piada, começava a ler o livro para entender.”

Em relação ao retorno financeiro, o influenciador diz não monetizar nenhum de seus vídeos em nenhuma de suas redes sociais, já que produz vídeos muito curtos. No TikTok, criadores só ganham dinheiro por postagens com mais de um minuto de duração. Por esse motivo, ele não ganha diretamente com as publicações em que presenteia as pessoas com livros, mas sim com parcerias de publicidade e outras formas de apoio.

Tiago Valente diz monetizar seus vídeos, mas conta que grande parte da renda vem de conteúdos patrocinados. Foto: Felipe Rau/Estadão

Já Tiago e Lucas monetizam as publicações, mas explicam que, da mesma forma, a maior parte da renda vem dos conteúdos patrocinados. Ambos afirmam que o retorno dos vídeos presentando pessoas vem apenas pelo engajamento, que costuma ser maior do que o de outras postagens.

“Ganhei muitos seguidores por esses vídeos”, conta Lucas. “Na Bienal da Bahia, postei um vídeo dizendo que eu ia me livrar de uma mala de livros. Esse vídeo acabou furando um pouco e minha bolha, e comecei a ganhar muitos seguidores por causa disso. É muito legal, porque ajuda do lado de cá, e eu ajudo a galera também, dando livros pra eles.”

Afinal, por que eles distribuem livros?

Para os influenciadores literários, distribuir livros é uma forma de criar um conteúdo inusitado e que pode atrair um público ainda maior. Mas também pode ser mais que isso: “O livro é uma coisa muito cara, então acaba sendo pouco acessível para algumas pessoas terem. Chegar em pessoas que eu sei que não têm condições e que querem muito ler é uma forma de democratizar”, diz Lucas.

“Sei que é um jeito diferente e complexo, porque não vai chegar em todo mundo, mas acho que é uma iniciativa bacana e é muito legal ver também que isso se espalhou muito”, diz Lucas. Para o influenciador, também é uma forma de retribuir.

Obviamente, eu não tenho tanto dinheiro ainda para fazer muito, mas faço sempre que percebo que dá pra separar um pouquinho do que eu estou recebendo com a internet. Na minha cabeça, também é uma forma de devolver, porque, querendo ou não, só tenho esse dinheiro porque a galera me assiste.

Lucas Barros

Tiago Valente diz fazer uma 'curadoria' dos livros que distribui. Foto: Felipe Rau/Estadão

Para Tiago, é uma maneira de apoiar causas em que acredita. “Eu já fui a pessoa que não tinha dinheiro para comprar livros”, diz. “Para além da parte material, penso muito também na questão de histórias, e como elas me transformaram, me ajudaram a construir a empatia, entender pessoas e realidades diferentes das minhas. É justamente por isso que eu gosto de fazer essa curadoria.”

Digão também cita os valores cada vez mais altos dos livros e diz que seu trabalho é uma forma de democratizar o acesso à leitura. “O meu foco é ajudar com as condições que eu tenho hoje. [...] O objetivo é incentivar não só as pessoas a doarem livros, mas também influenciadores literários a doarem livros”, diz.

Graças à visibilidade que ganhou com o TikTok, o booktoker pôde se envolver ativamente em prol das vítimas das enchentes do Rio Grande do Sul. Recentemente, ele fez uma ação na Livraria da Vila, em São Paulo, em que trocava livros por doações.

Para o evento, ele doou todos os livros que tinha na estante - ao todo, foram mais de 600 exemplares. “Eu fiquei pensando de que maneira faria mais sentido eu ajudar. [...] Concluí que seria difícil se eu me desapegasse de todos os meus livros. E foi o que eu fiz”, afirma. A ação também contou com obras doadas pela livraria e por editoras e, agora, o influenciador está promovendo eventos de “livros por doações” em diversos pontos do País.

Três livros que os três dariam para qualquer pessoa

Se o objetivo dos influenciadores é fazer com que histórias em que acreditam sejam lidas, quais livros eles dariam para qualquer pessoa? O Estadão fez essa pergunta para os três. Confira as indicações de cada um abaixo.

Digão Roque

  • Os Sete Maridos de Evelyn Hugo, de Taylor Jenkins Reid
  • Pessoas Normais, de Sally Rooney
  • Amanhã, Amanhã, E Ainda Outro Amanhã, de Gabrielle Zevin

Lucas Barros

  • Tudo é Rio, de Carla Madeira
  • O Quarto de Despejo, de Carolina Maria de Jesus
  • A Insustentável Leveza do Ser, de Milan Kundera

Tiago Valente

  • Felix Para Sempre, de Kacen Callender
  • Foi Assim Que Tudo Explodiu, de Arvin Ahmadi
  • Heartstopper, de Alice Oseman

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