Livro conta dramas do período da escravidão nos Estados Unidos


‘Yonder’ sai quando o País discute a importância de ensinar sobre o tema nas escolas

Por Evangeline Lawson
Atualização:

Traçar a linhagem de uma pessoa começa com uma espécie de maravilhamento, alimentado pela curiosidade intelectual e pelo irresistível desejo de pertencer. Mas pode resultar em frustração e tristeza quando a busca se interrompe de repente, quando o registro das vidas se esgota. Surgem lacunas onde deveriam estar gerações e gerações; a única evidência de sua existência é você mesmo. Esta é a luta dos descendentes de pessoas escravizadas na América.

No romance Yonder, Jabari Asim pega detalhes horríveis da experiência negra americana e lhes dá vida, brilhantemente. Ele confere profundidade a imagens anônimas e monocromáticas, oferecendo traços vívidos e incentivando os leitores a se comprometerem com uma compreensão mais profunda do impacto duradouro de ser uma pessoa escravizada.

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Situado no ano de 1852 em uma fazenda do sul chamada – talvez com uma piscadela – Placid Hall, Yonder entrelaça as vidas de quatro pessoas escravizadas: William, Cato, Margaret e Pandora. Conhecidos como os Roubados, eles medem o tempo pelas colheitas e não pelos tique-taques do relógio. Os capítulos alternam entre os pontos de vista de cada personagem, permitindo que os leitores ouçam suas vozes e entendam seus pensamentos, esperanças e medos. Isto as humaniza enquanto elas enfrentam o abuso nas mãos de seu dono, Randolph “Cannonball” Greene, conhecido como Ladrão.

Asim, poeta, autor de livros infantis e crítico cultural que publicou várias obras de não-ficção, entre elas We Can’t BreatheThe N Word e What Obama Means, investiga as nuances e complexidades da escravidão. Ele explora as reviravoltas emocionais e psicológicas pelas quais os Roubados devem passar para transcender as muitas camadas de sua subjugação: primeiro como cargas humanas, depois como propriedade – compradas, negociadas e, se tiverem a sorte de sobreviver, descartadas feito mercadorias estragadas. “Era parte de nosso trabalho diário antecipar os humores dos Ladrões que nos oprimiam”, diz Pandora. “Muitas vezes tínhamos apenas alguns segundos para entender se eles estavam sozinhos ou tristes o suficiente começar uma conversa civilizada, se deveríamos dar ouvidos ou ficar tão rígidos e insensíveis quanto a mobília. Se era melhor passar por eles rapidamente ou ficar parada para que suas mãos pudessem vagar”.

Asim justapõe a selvageria violenta com incômodos familiares – insetos importunos, calor sufocante, o cheiro pútrido da morte – enfatizando como os Roubados lidam com essas situações. “As moscas pousavam na nuca, pousavam nos nós dos dedos, até rastejavam pelas pálpebras – e ainda assim meu pessoal continuava trabalhando, inconscientes ou incrivelmente disciplinados”, diz Pandora.

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As personagens muitas vezes lutam com o amor profundo, lutam para combater os sentimentos de apego, temendo que, se essas emoções forem reveladas, serão exploradas e extintas à força. Algumas delas chegam a acreditar que a conexão humana é inútil porque a qualquer momento essas alianças podem ser rompidas, deixando um profundo vazio que as faz questionar sua própria existência: “Assim que aprendemos a andar com os próprios pés e sentir o peso do mundo, começamos a nos perguntar por quê. Não por que nascemos, mas por que nascemos lá”, diz Cato.

Em meio à desolação, porém, há resiliência, ternura e comunidade entre os Roubados, um fio de espiritualidade e um respeito às tradições. “Nossos mais velhos nos ensinaram que as palavras eram poderosas o suficiente para mudar nossa condição”, diz William. “Eles sussurravam sete palavras nos ouvidos de cada Roubado recém-nascido antes que a criança recebesse um nome, sete palavras cuidadosamente escolhidas apenas para aquela criança. Depois que a criança as aprendia, esperava-se que as recitasse fielmente todas as manhãs e noites (...) às vezes parecia ser tudo o que tínhamos. Nossa língua, nossa língua secreta, era nossa última defesa”.

A liberdade – a vida no além – é algo que os Roubados mal podem imaginar. “Eu via esses voos de fantasia como uma forma de fraqueza”, diz William. Mas, no fim, William, Cato, Margaret, Pandora e um menino chamado Zander decidem tentar a sorte. Seu destino: o Canadá, um lugar que uma personagem imagina estar ao seu alcance, com a África logo além das fronteiras. A seção final do livro segue seu êxodo, uma jornada ousada e perigosa cujo desfecho permanece incerto até a última página.

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A história dos escravizados americanos costuma ser apresentada com pouca profundidade, reduzindo sua presença a sequestro, leilão, labuta e morte, mas raramente tocando nos momentos que tecem a vida. Yonder é muito diferente da história típica dos capturados que só colhem algodão e se esquivam do chicote do feitor. Asim, professor do Emerson College e ex-editor do Washington Post, articula toda a humanidade das personagens escravizadas, acrescentando dimensões que reforçam ainda mais o valor da narrativa.

Diante do atual clima cultural, com as pessoas questionando a importância de ensinar a história da escravidão dentro do escopo mais amplo da história americana, Yonder é um recurso oportuno. Não é deprimente, é maravilhosamente honesto – oferecendo esperança e empoderamento. É a história de origem da qual muitos foram privados e, em alguns casos, nem sabiam que precisavam. Ela destaca as lacunas de suas realidades, expondo buracos e abismos onde deveriam estar a família e as evocações da experiência de vida. Apesar dos detalhes angustiantes, conhecer essa história é fundamental para desenvolver compaixão e uma compreensão mais profunda da experiência negra americana. Yonder pinta um quadro do que precisou acontecer para uma população inteira de pessoas existir aqui, agora. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU

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Evangeline Lawson é escritora e seus trabalhos apareceram no GuardianV-Day e Progressive.

Serviço 

Yonder

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Jabari Asim

Simon & Schuster - 272 páginas - US $27

Traçar a linhagem de uma pessoa começa com uma espécie de maravilhamento, alimentado pela curiosidade intelectual e pelo irresistível desejo de pertencer. Mas pode resultar em frustração e tristeza quando a busca se interrompe de repente, quando o registro das vidas se esgota. Surgem lacunas onde deveriam estar gerações e gerações; a única evidência de sua existência é você mesmo. Esta é a luta dos descendentes de pessoas escravizadas na América.

No romance Yonder, Jabari Asim pega detalhes horríveis da experiência negra americana e lhes dá vida, brilhantemente. Ele confere profundidade a imagens anônimas e monocromáticas, oferecendo traços vívidos e incentivando os leitores a se comprometerem com uma compreensão mais profunda do impacto duradouro de ser uma pessoa escravizada.

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Situado no ano de 1852 em uma fazenda do sul chamada – talvez com uma piscadela – Placid Hall, Yonder entrelaça as vidas de quatro pessoas escravizadas: William, Cato, Margaret e Pandora. Conhecidos como os Roubados, eles medem o tempo pelas colheitas e não pelos tique-taques do relógio. Os capítulos alternam entre os pontos de vista de cada personagem, permitindo que os leitores ouçam suas vozes e entendam seus pensamentos, esperanças e medos. Isto as humaniza enquanto elas enfrentam o abuso nas mãos de seu dono, Randolph “Cannonball” Greene, conhecido como Ladrão.

Asim, poeta, autor de livros infantis e crítico cultural que publicou várias obras de não-ficção, entre elas We Can’t BreatheThe N Word e What Obama Means, investiga as nuances e complexidades da escravidão. Ele explora as reviravoltas emocionais e psicológicas pelas quais os Roubados devem passar para transcender as muitas camadas de sua subjugação: primeiro como cargas humanas, depois como propriedade – compradas, negociadas e, se tiverem a sorte de sobreviver, descartadas feito mercadorias estragadas. “Era parte de nosso trabalho diário antecipar os humores dos Ladrões que nos oprimiam”, diz Pandora. “Muitas vezes tínhamos apenas alguns segundos para entender se eles estavam sozinhos ou tristes o suficiente começar uma conversa civilizada, se deveríamos dar ouvidos ou ficar tão rígidos e insensíveis quanto a mobília. Se era melhor passar por eles rapidamente ou ficar parada para que suas mãos pudessem vagar”.

Asim justapõe a selvageria violenta com incômodos familiares – insetos importunos, calor sufocante, o cheiro pútrido da morte – enfatizando como os Roubados lidam com essas situações. “As moscas pousavam na nuca, pousavam nos nós dos dedos, até rastejavam pelas pálpebras – e ainda assim meu pessoal continuava trabalhando, inconscientes ou incrivelmente disciplinados”, diz Pandora.

As personagens muitas vezes lutam com o amor profundo, lutam para combater os sentimentos de apego, temendo que, se essas emoções forem reveladas, serão exploradas e extintas à força. Algumas delas chegam a acreditar que a conexão humana é inútil porque a qualquer momento essas alianças podem ser rompidas, deixando um profundo vazio que as faz questionar sua própria existência: “Assim que aprendemos a andar com os próprios pés e sentir o peso do mundo, começamos a nos perguntar por quê. Não por que nascemos, mas por que nascemos lá”, diz Cato.

Em meio à desolação, porém, há resiliência, ternura e comunidade entre os Roubados, um fio de espiritualidade e um respeito às tradições. “Nossos mais velhos nos ensinaram que as palavras eram poderosas o suficiente para mudar nossa condição”, diz William. “Eles sussurravam sete palavras nos ouvidos de cada Roubado recém-nascido antes que a criança recebesse um nome, sete palavras cuidadosamente escolhidas apenas para aquela criança. Depois que a criança as aprendia, esperava-se que as recitasse fielmente todas as manhãs e noites (...) às vezes parecia ser tudo o que tínhamos. Nossa língua, nossa língua secreta, era nossa última defesa”.

A liberdade – a vida no além – é algo que os Roubados mal podem imaginar. “Eu via esses voos de fantasia como uma forma de fraqueza”, diz William. Mas, no fim, William, Cato, Margaret, Pandora e um menino chamado Zander decidem tentar a sorte. Seu destino: o Canadá, um lugar que uma personagem imagina estar ao seu alcance, com a África logo além das fronteiras. A seção final do livro segue seu êxodo, uma jornada ousada e perigosa cujo desfecho permanece incerto até a última página.

A história dos escravizados americanos costuma ser apresentada com pouca profundidade, reduzindo sua presença a sequestro, leilão, labuta e morte, mas raramente tocando nos momentos que tecem a vida. Yonder é muito diferente da história típica dos capturados que só colhem algodão e se esquivam do chicote do feitor. Asim, professor do Emerson College e ex-editor do Washington Post, articula toda a humanidade das personagens escravizadas, acrescentando dimensões que reforçam ainda mais o valor da narrativa.

Diante do atual clima cultural, com as pessoas questionando a importância de ensinar a história da escravidão dentro do escopo mais amplo da história americana, Yonder é um recurso oportuno. Não é deprimente, é maravilhosamente honesto – oferecendo esperança e empoderamento. É a história de origem da qual muitos foram privados e, em alguns casos, nem sabiam que precisavam. Ela destaca as lacunas de suas realidades, expondo buracos e abismos onde deveriam estar a família e as evocações da experiência de vida. Apesar dos detalhes angustiantes, conhecer essa história é fundamental para desenvolver compaixão e uma compreensão mais profunda da experiência negra americana. Yonder pinta um quadro do que precisou acontecer para uma população inteira de pessoas existir aqui, agora. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU

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Evangeline Lawson é escritora e seus trabalhos apareceram no GuardianV-Day e Progressive.

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Yonder

Jabari Asim

Simon & Schuster - 272 páginas - US $27

Traçar a linhagem de uma pessoa começa com uma espécie de maravilhamento, alimentado pela curiosidade intelectual e pelo irresistível desejo de pertencer. Mas pode resultar em frustração e tristeza quando a busca se interrompe de repente, quando o registro das vidas se esgota. Surgem lacunas onde deveriam estar gerações e gerações; a única evidência de sua existência é você mesmo. Esta é a luta dos descendentes de pessoas escravizadas na América.

No romance Yonder, Jabari Asim pega detalhes horríveis da experiência negra americana e lhes dá vida, brilhantemente. Ele confere profundidade a imagens anônimas e monocromáticas, oferecendo traços vívidos e incentivando os leitores a se comprometerem com uma compreensão mais profunda do impacto duradouro de ser uma pessoa escravizada.

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Situado no ano de 1852 em uma fazenda do sul chamada – talvez com uma piscadela – Placid Hall, Yonder entrelaça as vidas de quatro pessoas escravizadas: William, Cato, Margaret e Pandora. Conhecidos como os Roubados, eles medem o tempo pelas colheitas e não pelos tique-taques do relógio. Os capítulos alternam entre os pontos de vista de cada personagem, permitindo que os leitores ouçam suas vozes e entendam seus pensamentos, esperanças e medos. Isto as humaniza enquanto elas enfrentam o abuso nas mãos de seu dono, Randolph “Cannonball” Greene, conhecido como Ladrão.

Asim, poeta, autor de livros infantis e crítico cultural que publicou várias obras de não-ficção, entre elas We Can’t BreatheThe N Word e What Obama Means, investiga as nuances e complexidades da escravidão. Ele explora as reviravoltas emocionais e psicológicas pelas quais os Roubados devem passar para transcender as muitas camadas de sua subjugação: primeiro como cargas humanas, depois como propriedade – compradas, negociadas e, se tiverem a sorte de sobreviver, descartadas feito mercadorias estragadas. “Era parte de nosso trabalho diário antecipar os humores dos Ladrões que nos oprimiam”, diz Pandora. “Muitas vezes tínhamos apenas alguns segundos para entender se eles estavam sozinhos ou tristes o suficiente começar uma conversa civilizada, se deveríamos dar ouvidos ou ficar tão rígidos e insensíveis quanto a mobília. Se era melhor passar por eles rapidamente ou ficar parada para que suas mãos pudessem vagar”.

Asim justapõe a selvageria violenta com incômodos familiares – insetos importunos, calor sufocante, o cheiro pútrido da morte – enfatizando como os Roubados lidam com essas situações. “As moscas pousavam na nuca, pousavam nos nós dos dedos, até rastejavam pelas pálpebras – e ainda assim meu pessoal continuava trabalhando, inconscientes ou incrivelmente disciplinados”, diz Pandora.

As personagens muitas vezes lutam com o amor profundo, lutam para combater os sentimentos de apego, temendo que, se essas emoções forem reveladas, serão exploradas e extintas à força. Algumas delas chegam a acreditar que a conexão humana é inútil porque a qualquer momento essas alianças podem ser rompidas, deixando um profundo vazio que as faz questionar sua própria existência: “Assim que aprendemos a andar com os próprios pés e sentir o peso do mundo, começamos a nos perguntar por quê. Não por que nascemos, mas por que nascemos lá”, diz Cato.

Em meio à desolação, porém, há resiliência, ternura e comunidade entre os Roubados, um fio de espiritualidade e um respeito às tradições. “Nossos mais velhos nos ensinaram que as palavras eram poderosas o suficiente para mudar nossa condição”, diz William. “Eles sussurravam sete palavras nos ouvidos de cada Roubado recém-nascido antes que a criança recebesse um nome, sete palavras cuidadosamente escolhidas apenas para aquela criança. Depois que a criança as aprendia, esperava-se que as recitasse fielmente todas as manhãs e noites (...) às vezes parecia ser tudo o que tínhamos. Nossa língua, nossa língua secreta, era nossa última defesa”.

A liberdade – a vida no além – é algo que os Roubados mal podem imaginar. “Eu via esses voos de fantasia como uma forma de fraqueza”, diz William. Mas, no fim, William, Cato, Margaret, Pandora e um menino chamado Zander decidem tentar a sorte. Seu destino: o Canadá, um lugar que uma personagem imagina estar ao seu alcance, com a África logo além das fronteiras. A seção final do livro segue seu êxodo, uma jornada ousada e perigosa cujo desfecho permanece incerto até a última página.

A história dos escravizados americanos costuma ser apresentada com pouca profundidade, reduzindo sua presença a sequestro, leilão, labuta e morte, mas raramente tocando nos momentos que tecem a vida. Yonder é muito diferente da história típica dos capturados que só colhem algodão e se esquivam do chicote do feitor. Asim, professor do Emerson College e ex-editor do Washington Post, articula toda a humanidade das personagens escravizadas, acrescentando dimensões que reforçam ainda mais o valor da narrativa.

Diante do atual clima cultural, com as pessoas questionando a importância de ensinar a história da escravidão dentro do escopo mais amplo da história americana, Yonder é um recurso oportuno. Não é deprimente, é maravilhosamente honesto – oferecendo esperança e empoderamento. É a história de origem da qual muitos foram privados e, em alguns casos, nem sabiam que precisavam. Ela destaca as lacunas de suas realidades, expondo buracos e abismos onde deveriam estar a família e as evocações da experiência de vida. Apesar dos detalhes angustiantes, conhecer essa história é fundamental para desenvolver compaixão e uma compreensão mais profunda da experiência negra americana. Yonder pinta um quadro do que precisou acontecer para uma população inteira de pessoas existir aqui, agora. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU

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Jabari Asim

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Traçar a linhagem de uma pessoa começa com uma espécie de maravilhamento, alimentado pela curiosidade intelectual e pelo irresistível desejo de pertencer. Mas pode resultar em frustração e tristeza quando a busca se interrompe de repente, quando o registro das vidas se esgota. Surgem lacunas onde deveriam estar gerações e gerações; a única evidência de sua existência é você mesmo. Esta é a luta dos descendentes de pessoas escravizadas na América.

No romance Yonder, Jabari Asim pega detalhes horríveis da experiência negra americana e lhes dá vida, brilhantemente. Ele confere profundidade a imagens anônimas e monocromáticas, oferecendo traços vívidos e incentivando os leitores a se comprometerem com uma compreensão mais profunda do impacto duradouro de ser uma pessoa escravizada.

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Situado no ano de 1852 em uma fazenda do sul chamada – talvez com uma piscadela – Placid Hall, Yonder entrelaça as vidas de quatro pessoas escravizadas: William, Cato, Margaret e Pandora. Conhecidos como os Roubados, eles medem o tempo pelas colheitas e não pelos tique-taques do relógio. Os capítulos alternam entre os pontos de vista de cada personagem, permitindo que os leitores ouçam suas vozes e entendam seus pensamentos, esperanças e medos. Isto as humaniza enquanto elas enfrentam o abuso nas mãos de seu dono, Randolph “Cannonball” Greene, conhecido como Ladrão.

Asim, poeta, autor de livros infantis e crítico cultural que publicou várias obras de não-ficção, entre elas We Can’t BreatheThe N Word e What Obama Means, investiga as nuances e complexidades da escravidão. Ele explora as reviravoltas emocionais e psicológicas pelas quais os Roubados devem passar para transcender as muitas camadas de sua subjugação: primeiro como cargas humanas, depois como propriedade – compradas, negociadas e, se tiverem a sorte de sobreviver, descartadas feito mercadorias estragadas. “Era parte de nosso trabalho diário antecipar os humores dos Ladrões que nos oprimiam”, diz Pandora. “Muitas vezes tínhamos apenas alguns segundos para entender se eles estavam sozinhos ou tristes o suficiente começar uma conversa civilizada, se deveríamos dar ouvidos ou ficar tão rígidos e insensíveis quanto a mobília. Se era melhor passar por eles rapidamente ou ficar parada para que suas mãos pudessem vagar”.

Asim justapõe a selvageria violenta com incômodos familiares – insetos importunos, calor sufocante, o cheiro pútrido da morte – enfatizando como os Roubados lidam com essas situações. “As moscas pousavam na nuca, pousavam nos nós dos dedos, até rastejavam pelas pálpebras – e ainda assim meu pessoal continuava trabalhando, inconscientes ou incrivelmente disciplinados”, diz Pandora.

As personagens muitas vezes lutam com o amor profundo, lutam para combater os sentimentos de apego, temendo que, se essas emoções forem reveladas, serão exploradas e extintas à força. Algumas delas chegam a acreditar que a conexão humana é inútil porque a qualquer momento essas alianças podem ser rompidas, deixando um profundo vazio que as faz questionar sua própria existência: “Assim que aprendemos a andar com os próprios pés e sentir o peso do mundo, começamos a nos perguntar por quê. Não por que nascemos, mas por que nascemos lá”, diz Cato.

Em meio à desolação, porém, há resiliência, ternura e comunidade entre os Roubados, um fio de espiritualidade e um respeito às tradições. “Nossos mais velhos nos ensinaram que as palavras eram poderosas o suficiente para mudar nossa condição”, diz William. “Eles sussurravam sete palavras nos ouvidos de cada Roubado recém-nascido antes que a criança recebesse um nome, sete palavras cuidadosamente escolhidas apenas para aquela criança. Depois que a criança as aprendia, esperava-se que as recitasse fielmente todas as manhãs e noites (...) às vezes parecia ser tudo o que tínhamos. Nossa língua, nossa língua secreta, era nossa última defesa”.

A liberdade – a vida no além – é algo que os Roubados mal podem imaginar. “Eu via esses voos de fantasia como uma forma de fraqueza”, diz William. Mas, no fim, William, Cato, Margaret, Pandora e um menino chamado Zander decidem tentar a sorte. Seu destino: o Canadá, um lugar que uma personagem imagina estar ao seu alcance, com a África logo além das fronteiras. A seção final do livro segue seu êxodo, uma jornada ousada e perigosa cujo desfecho permanece incerto até a última página.

A história dos escravizados americanos costuma ser apresentada com pouca profundidade, reduzindo sua presença a sequestro, leilão, labuta e morte, mas raramente tocando nos momentos que tecem a vida. Yonder é muito diferente da história típica dos capturados que só colhem algodão e se esquivam do chicote do feitor. Asim, professor do Emerson College e ex-editor do Washington Post, articula toda a humanidade das personagens escravizadas, acrescentando dimensões que reforçam ainda mais o valor da narrativa.

Diante do atual clima cultural, com as pessoas questionando a importância de ensinar a história da escravidão dentro do escopo mais amplo da história americana, Yonder é um recurso oportuno. Não é deprimente, é maravilhosamente honesto – oferecendo esperança e empoderamento. É a história de origem da qual muitos foram privados e, em alguns casos, nem sabiam que precisavam. Ela destaca as lacunas de suas realidades, expondo buracos e abismos onde deveriam estar a família e as evocações da experiência de vida. Apesar dos detalhes angustiantes, conhecer essa história é fundamental para desenvolver compaixão e uma compreensão mais profunda da experiência negra americana. Yonder pinta um quadro do que precisou acontecer para uma população inteira de pessoas existir aqui, agora. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU

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