A esquerda sempre teve candidatos nas eleições americanas, mesmo que a maioria da população nem fique sabendo quem são. O próprio Partido Comunista não deixa de sempre apresentar candidatos à presidência. O partido nunca foi prescrito nos Estados Unidos, embora digam que o que o mantém vivo são os agentes do FBI infiltrados nos seus quadros. (Seria fácil identificar os agentes: são os únicos que pagam suas mensalidades em dia.) A diferença entre Sanders e os candidatos semiclandestinos da esquerda protocolar é que Sanders tem atraído multidões a seus comícios e aparecido com destaque surpreendente nas pesquisas de intenção de voto. Ou seja: tem despertado a atenção que a esquerda, no passado, não teve nem em sonho.
Sanders fala de radicalizar o controle dos grandes bancos e do capital financeiro em geral e acabar com a festa do “um por cento”, como chamam a casta dos supermilionários que personificam, ao absurdo, a concentração de renda no país. Sua agenda social para amenizar a desigualdade é bem mais “progressista” do que a do Obama. Porém, ah porém. A mensagem de Sanders e sua repercussão são novas, mas não devem entusiasmar demais. Primeiro porque sua candidatura dificilmente sobreviverá à convenção do partido, onde a escolha do candidato se dá entre conchavos e sussurros e onde o dinheiro também manda. Segundo porque tem outro candidato a candidato fazendo o mesmo tipo de barulho, o Republicano Donald Trump, uma piada humana que também não chegará lá. O sucesso de Trump, de alguma maneira, desmoraliza o sucesso de Sanders. Seriam dois fenômenos passageiros, sem tração e sem futuro. Vamos ver.
Papo vovô. Lucinda, nossa neta de 7 anos, está tendo aulas de música. No outro dia, a mãe dela reclamou do misterioso desaparecimento de um par de meias na bagunça do seu quarto e ela retrucou com a ária “Nessum dorma” da ópera Turandot, do Puccini: “Il mio mistero é chiuso in me”... Ela decidiu apreender a tocar bateria. A família está preparando o espírito.