Nestes momentos de angústia, tenho procurado diversificar minhas leituras. Dedico meu tempo mais aos livros que aos jornais. Folheando um volume de Roland Barthes, O Grão da Voz, deparo-me com uma reflexão sobre a função do intelectual na sociedade.
Barthes, na verdade, responde a um questionário do Le Monde proposto a homens e mulheres de pensamento. Os chamados "intelectuais", termo que parece ter nascido na própria França, por ocasião do caso Dreyfuss e da redação do panfleto J'Accuse, por Émile Zola.
Por um momento, Barthes reflete sobre o intelectual e o intelectualismo que, segundo ele, aparece com a ascensão da pequena burguesia. Não se trata de algo politicamente neutro. No limite, o risco político do antiintelectualismo é o fascismo. O primeiro objetivo do fascismo, lembre-se, consiste em eliminar a inteligência, pelo incomodo que esta provoca.
Enfim, para definir esse papel tão ambivalente do intelectual (como veremos adiante), Barthes relembra Bertolt Brecht. Para Brecht, diz Barthes, a função do intelectual, descrita em vários escritos, compreende, no principal, três tarefas:
- Decompor a ideologia burguesa (e pequeno-burguesa)
- Estudar as forças que movem o mundo
- Fazer progredir a teoria.
Tarefas políticas, eu diria, e interligadas. Desconstruir o discurso dominante. Analisar com realismo (e sem idealismo) as engrenagens da sociedade. Acreditar que nossa arma é a palavra e que o entendimento pode ter a força relativa de provocar mudanças. Este é o nosso alcance e estes são os nossos limites.
Mas Barthes era lúcido o bastante para notar a ambiguidade do trabalho de quem pensa de forma crítica a sociedade:
"A função do intelectual é criticar a linguagem burguesa sob o próprio reinado da burguesia". Nada menos.
Escrevo esse pequeno texto em reação a uma grande decepção deste domingo, o artigo tão parcial e abaixo de sua capacidade assinado na Folha de S. Paulo por um escritor que admiro, Cristóvão Tezza. Em compensação, devo destacar o belo e agudo texto de Bernardo Carvalho, no mesmo jornal.