Cinema, cultura & afins

Opinião|Adeus ao Gilles


Por Luiz Zanin Oricchio

Fiquei espantado quando li a notícia de que Gilles Lapouge havia morrido, aos 96 anos. 

Não parecia. Não mostrava a idade. Quando esteve no jornal, anos atrás, parecia um jovem senhor, cheio de energia, bom humor e sabedoria. 

Deu uma espécie de master class a nós, jornalistas da casa, contando de sua experiência como correspondente do Estadão na França. Falou de política, de guerra, de paz, do estado do mundo, de cultura. Encantou a todos nós, seus fãs, inclusive porque nos tratava como seus iguais, colegas do mesmo periódico. 

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De fato, Gilles Lapouge era uma figura familiar a todos nós, embora vivesse na França e nós em São Paulo. No tempo em que editamos o suplemento Cultura era comum, quando havia alguma pauta referente à França, alguém da equipe logo sugerir: "Pede para o Gilles!". 

Era a solução mágica. Não importava o assunto - Sartre, Simone de Beauvoir, Camus, maio de 68, De Gaulle, Aron, nouvelle vague, etc. - e o texto vinha célere, no dia seguinte, ou no mesmo dia. Texto perfeito, incrível, coloquial e original. Gilles não enrolava. Sentava e escrevia. Tinha o timing do jornalista e o conhecimento do erudito. Um não negava o outro. Ajudavam-se. 

Além de jornalista, Gilles era mesmo um escritor muito considerado em seu próprio país, conhecido pela exigência com seus intelectuais. Pude avaliar isso um dia, quando caminhava por uma rua de Paris e vi numa banca de jornais um suplemento cultural estampando sua foto, de página inteira, na capa, chamando para matéria dedicada a um dos seus livros, recém-lançado. 

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Gilles Lapouge foi uma dessas inteligências que a Europa presenteou ao Brasil e nos fizeram melhorar. Gostava do nosso país e escreveu muito sobre ele. Mandou-me de presente um livro seu sobre a Amazônia, com dedicatória. 

Talvez sua curiosidade por inumeráveis assuntos tenha sido uma das chaves da sua longa juventude. Escreveu sobre anarquistas (Anarchistes d'Espagne), política (Utopie et Civilisation), revolução (La Révolution sans Modèles), guerra (Un Soldat en Déroute), além de romances como La Bataille de Wagram. É autor de um dicionário amoroso do Brasil. Colaborava regularmente no Le Monde des Livres e na Quinzaine Littéraire

Muitos anos atrás, eu estava numa feira de livros em Portugal e, como tenho gosto por histórias de navegação e marinheiros, um título exposto logo me chamou a atenção: Os Piratas - flibusteiros, bucaneiros e outros párias do mar. Quem era o autor? Gilles Lapouge, edições Antígona, de Lisboa. No avião, vim lendo as saborosas histórias de piratas, contadas por Lapouge e transcritas do francês a um elegante português lusitano. Vou reler, em honra ao colega. 

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 Foto: Estadão

 

Fiquei espantado quando li a notícia de que Gilles Lapouge havia morrido, aos 96 anos. 

Não parecia. Não mostrava a idade. Quando esteve no jornal, anos atrás, parecia um jovem senhor, cheio de energia, bom humor e sabedoria. 

Deu uma espécie de master class a nós, jornalistas da casa, contando de sua experiência como correspondente do Estadão na França. Falou de política, de guerra, de paz, do estado do mundo, de cultura. Encantou a todos nós, seus fãs, inclusive porque nos tratava como seus iguais, colegas do mesmo periódico. 

De fato, Gilles Lapouge era uma figura familiar a todos nós, embora vivesse na França e nós em São Paulo. No tempo em que editamos o suplemento Cultura era comum, quando havia alguma pauta referente à França, alguém da equipe logo sugerir: "Pede para o Gilles!". 

Era a solução mágica. Não importava o assunto - Sartre, Simone de Beauvoir, Camus, maio de 68, De Gaulle, Aron, nouvelle vague, etc. - e o texto vinha célere, no dia seguinte, ou no mesmo dia. Texto perfeito, incrível, coloquial e original. Gilles não enrolava. Sentava e escrevia. Tinha o timing do jornalista e o conhecimento do erudito. Um não negava o outro. Ajudavam-se. 

Além de jornalista, Gilles era mesmo um escritor muito considerado em seu próprio país, conhecido pela exigência com seus intelectuais. Pude avaliar isso um dia, quando caminhava por uma rua de Paris e vi numa banca de jornais um suplemento cultural estampando sua foto, de página inteira, na capa, chamando para matéria dedicada a um dos seus livros, recém-lançado. 

Gilles Lapouge foi uma dessas inteligências que a Europa presenteou ao Brasil e nos fizeram melhorar. Gostava do nosso país e escreveu muito sobre ele. Mandou-me de presente um livro seu sobre a Amazônia, com dedicatória. 

Talvez sua curiosidade por inumeráveis assuntos tenha sido uma das chaves da sua longa juventude. Escreveu sobre anarquistas (Anarchistes d'Espagne), política (Utopie et Civilisation), revolução (La Révolution sans Modèles), guerra (Un Soldat en Déroute), além de romances como La Bataille de Wagram. É autor de um dicionário amoroso do Brasil. Colaborava regularmente no Le Monde des Livres e na Quinzaine Littéraire

Muitos anos atrás, eu estava numa feira de livros em Portugal e, como tenho gosto por histórias de navegação e marinheiros, um título exposto logo me chamou a atenção: Os Piratas - flibusteiros, bucaneiros e outros párias do mar. Quem era o autor? Gilles Lapouge, edições Antígona, de Lisboa. No avião, vim lendo as saborosas histórias de piratas, contadas por Lapouge e transcritas do francês a um elegante português lusitano. Vou reler, em honra ao colega. 

 Foto: Estadão

 

Fiquei espantado quando li a notícia de que Gilles Lapouge havia morrido, aos 96 anos. 

Não parecia. Não mostrava a idade. Quando esteve no jornal, anos atrás, parecia um jovem senhor, cheio de energia, bom humor e sabedoria. 

Deu uma espécie de master class a nós, jornalistas da casa, contando de sua experiência como correspondente do Estadão na França. Falou de política, de guerra, de paz, do estado do mundo, de cultura. Encantou a todos nós, seus fãs, inclusive porque nos tratava como seus iguais, colegas do mesmo periódico. 

De fato, Gilles Lapouge era uma figura familiar a todos nós, embora vivesse na França e nós em São Paulo. No tempo em que editamos o suplemento Cultura era comum, quando havia alguma pauta referente à França, alguém da equipe logo sugerir: "Pede para o Gilles!". 

Era a solução mágica. Não importava o assunto - Sartre, Simone de Beauvoir, Camus, maio de 68, De Gaulle, Aron, nouvelle vague, etc. - e o texto vinha célere, no dia seguinte, ou no mesmo dia. Texto perfeito, incrível, coloquial e original. Gilles não enrolava. Sentava e escrevia. Tinha o timing do jornalista e o conhecimento do erudito. Um não negava o outro. Ajudavam-se. 

Além de jornalista, Gilles era mesmo um escritor muito considerado em seu próprio país, conhecido pela exigência com seus intelectuais. Pude avaliar isso um dia, quando caminhava por uma rua de Paris e vi numa banca de jornais um suplemento cultural estampando sua foto, de página inteira, na capa, chamando para matéria dedicada a um dos seus livros, recém-lançado. 

Gilles Lapouge foi uma dessas inteligências que a Europa presenteou ao Brasil e nos fizeram melhorar. Gostava do nosso país e escreveu muito sobre ele. Mandou-me de presente um livro seu sobre a Amazônia, com dedicatória. 

Talvez sua curiosidade por inumeráveis assuntos tenha sido uma das chaves da sua longa juventude. Escreveu sobre anarquistas (Anarchistes d'Espagne), política (Utopie et Civilisation), revolução (La Révolution sans Modèles), guerra (Un Soldat en Déroute), além de romances como La Bataille de Wagram. É autor de um dicionário amoroso do Brasil. Colaborava regularmente no Le Monde des Livres e na Quinzaine Littéraire

Muitos anos atrás, eu estava numa feira de livros em Portugal e, como tenho gosto por histórias de navegação e marinheiros, um título exposto logo me chamou a atenção: Os Piratas - flibusteiros, bucaneiros e outros párias do mar. Quem era o autor? Gilles Lapouge, edições Antígona, de Lisboa. No avião, vim lendo as saborosas histórias de piratas, contadas por Lapouge e transcritas do francês a um elegante português lusitano. Vou reler, em honra ao colega. 

 Foto: Estadão

 

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Opinião por Luiz Zanin Oricchio

É jornalista, psicanalista e crítico de cinema

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