Cinema, cultura & afins

Opinião|Mostra 2024: Dying - a última sinfonia, brilhante drama alemão com toques de humor negro


Por Luiz Zanin Oricchio
 

Dying - A Última Sinfonia, de Matthias Glasner, é um drama familiar alemão - duro, rigoroso e encantador. Ao longo de três horas conheceremos os membros da família Lunie. O pai, Gerd (Hans-Uwe Bauer), parece atingido por uma doença degenerativa e não responde mais por si. Sua mulher, Lissy (Corina Harfouch), impaciente, fria, também não tem motivos para se alegrar com sua saúde. Nem com a vida, em geral.

Um dos filhos é maestro. Tom (Lars Eidinger) ensaia uma peça orquestral composta por um amigo de tendências suicidas, cujo título é exatamente este - Morte. A ex-namorada, Liv (Anna Bederke), deu à luz um filho de outro homem e pede que Tom o assuma como pai. Não como pai exclusivo, mas que divida a paternidade com o pai biológico, pouco confiável. Ellen ((Lilith Stangenberg), irmã do maestro, é uma assistente de dentista, doidivanas, louca por sexo e álcool.

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Glasner tempera o tom pesado, com algumas tiradas cômicas, ou, pelo menos, de humor negro. Por exemplo, quando pai e mãe saem de carro. O homem não consegue mais dirigir e a mulher não enxerga direito. Ela vai guiando e ele vai descrevendo o que se encontra pelo caminho. Em outra cena, vemos a extração de um molar em pleno boteco e em meio a uma bebedeira. A assistente de dentista maluquinha é apresentada ao público ao despertar num quarto de hotel na Letônia sem saber onde está nem como foi parar ali, e muito menos em que companhia. Em outra cena, Ellen, de ressaca, interrompe um concerto de forma inesperada. Nesses "esquetes", o trágico vira cômico e vice-versa.

Mas esses "alívios cômicos", se é lícito falar desse jeito, pouco atenuam o tom sombrio, porém de modo algum grave ou engravatado. Tudo flui muito bem, ao longo das três horas de duração. A gente se interessa pelos personagens, vê as relações humanas duras como partes da vida e de uma determinada cultura, e recebe, com algum alívio, os poucos raios de sol que iluminam a cena - de modo geral, com a chegada de crianças que, talvez, no futuro, possam criar um modo de vida menos depressivo. O filme ganhou o Urso de Prata de melhor roteiro no Festival de Berlim.

Em outro aspecto - bastante cuidado - temos a música a guiar a trama. Não se trata apenas de ilustrá-la, como muitas vezes sucede, mas de fazer parte da estrutura daquelas vidas, embora apenas dois personagens, o maestro e o compositor a vivam de maneira profissional. No entanto, a patética e às vezes comovente Ellen, canta de maneira emocionante quando está sob efeito do álcool.

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Há também a relação do maestro e do compositor com uma orquestra jovem e internacional. Por um lado, a exigência pela expressão exata, que jamais contenta o autor da obra. Por outro, o envolvimento amoroso deste com uma jovem violoncelista.

Tão duras quanto as alusões à morte são os relacionamentos entre eles. Há uma longa cena em particular em que Lissy, sentindo-se próxima do fim, promove um acerto de contas com o filho, Tom. Esse diálogo, duro e frio, embora se sinta a emoção palpitando por trás, é uma espécie de centro nervoso da obra, como um acorde dissonante e sem resolução. Filme adulto, sem qualquer atenuante, muitíssimo bem dirigido e interpretado - além do roteiro premiado, em que não sobra nem falta uma palavra.

Junto com Levados pelas Marés, de Jia Zhangke, Dying foi o que de melhor vi nesta Mostra, que hoje chega ao fim com a premiação e apresentação de Megalópolis, de Francis Ford Coppola.

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Dying ainda passa hoje às 16h, no Espaço Augusta, sala 1

 

Dying - A Última Sinfonia, de Matthias Glasner, é um drama familiar alemão - duro, rigoroso e encantador. Ao longo de três horas conheceremos os membros da família Lunie. O pai, Gerd (Hans-Uwe Bauer), parece atingido por uma doença degenerativa e não responde mais por si. Sua mulher, Lissy (Corina Harfouch), impaciente, fria, também não tem motivos para se alegrar com sua saúde. Nem com a vida, em geral.

Um dos filhos é maestro. Tom (Lars Eidinger) ensaia uma peça orquestral composta por um amigo de tendências suicidas, cujo título é exatamente este - Morte. A ex-namorada, Liv (Anna Bederke), deu à luz um filho de outro homem e pede que Tom o assuma como pai. Não como pai exclusivo, mas que divida a paternidade com o pai biológico, pouco confiável. Ellen ((Lilith Stangenberg), irmã do maestro, é uma assistente de dentista, doidivanas, louca por sexo e álcool.

Glasner tempera o tom pesado, com algumas tiradas cômicas, ou, pelo menos, de humor negro. Por exemplo, quando pai e mãe saem de carro. O homem não consegue mais dirigir e a mulher não enxerga direito. Ela vai guiando e ele vai descrevendo o que se encontra pelo caminho. Em outra cena, vemos a extração de um molar em pleno boteco e em meio a uma bebedeira. A assistente de dentista maluquinha é apresentada ao público ao despertar num quarto de hotel na Letônia sem saber onde está nem como foi parar ali, e muito menos em que companhia. Em outra cena, Ellen, de ressaca, interrompe um concerto de forma inesperada. Nesses "esquetes", o trágico vira cômico e vice-versa.

Mas esses "alívios cômicos", se é lícito falar desse jeito, pouco atenuam o tom sombrio, porém de modo algum grave ou engravatado. Tudo flui muito bem, ao longo das três horas de duração. A gente se interessa pelos personagens, vê as relações humanas duras como partes da vida e de uma determinada cultura, e recebe, com algum alívio, os poucos raios de sol que iluminam a cena - de modo geral, com a chegada de crianças que, talvez, no futuro, possam criar um modo de vida menos depressivo. O filme ganhou o Urso de Prata de melhor roteiro no Festival de Berlim.

Em outro aspecto - bastante cuidado - temos a música a guiar a trama. Não se trata apenas de ilustrá-la, como muitas vezes sucede, mas de fazer parte da estrutura daquelas vidas, embora apenas dois personagens, o maestro e o compositor a vivam de maneira profissional. No entanto, a patética e às vezes comovente Ellen, canta de maneira emocionante quando está sob efeito do álcool.

Há também a relação do maestro e do compositor com uma orquestra jovem e internacional. Por um lado, a exigência pela expressão exata, que jamais contenta o autor da obra. Por outro, o envolvimento amoroso deste com uma jovem violoncelista.

Tão duras quanto as alusões à morte são os relacionamentos entre eles. Há uma longa cena em particular em que Lissy, sentindo-se próxima do fim, promove um acerto de contas com o filho, Tom. Esse diálogo, duro e frio, embora se sinta a emoção palpitando por trás, é uma espécie de centro nervoso da obra, como um acorde dissonante e sem resolução. Filme adulto, sem qualquer atenuante, muitíssimo bem dirigido e interpretado - além do roteiro premiado, em que não sobra nem falta uma palavra.

Junto com Levados pelas Marés, de Jia Zhangke, Dying foi o que de melhor vi nesta Mostra, que hoje chega ao fim com a premiação e apresentação de Megalópolis, de Francis Ford Coppola.

Dying ainda passa hoje às 16h, no Espaço Augusta, sala 1

 

Dying - A Última Sinfonia, de Matthias Glasner, é um drama familiar alemão - duro, rigoroso e encantador. Ao longo de três horas conheceremos os membros da família Lunie. O pai, Gerd (Hans-Uwe Bauer), parece atingido por uma doença degenerativa e não responde mais por si. Sua mulher, Lissy (Corina Harfouch), impaciente, fria, também não tem motivos para se alegrar com sua saúde. Nem com a vida, em geral.

Um dos filhos é maestro. Tom (Lars Eidinger) ensaia uma peça orquestral composta por um amigo de tendências suicidas, cujo título é exatamente este - Morte. A ex-namorada, Liv (Anna Bederke), deu à luz um filho de outro homem e pede que Tom o assuma como pai. Não como pai exclusivo, mas que divida a paternidade com o pai biológico, pouco confiável. Ellen ((Lilith Stangenberg), irmã do maestro, é uma assistente de dentista, doidivanas, louca por sexo e álcool.

Glasner tempera o tom pesado, com algumas tiradas cômicas, ou, pelo menos, de humor negro. Por exemplo, quando pai e mãe saem de carro. O homem não consegue mais dirigir e a mulher não enxerga direito. Ela vai guiando e ele vai descrevendo o que se encontra pelo caminho. Em outra cena, vemos a extração de um molar em pleno boteco e em meio a uma bebedeira. A assistente de dentista maluquinha é apresentada ao público ao despertar num quarto de hotel na Letônia sem saber onde está nem como foi parar ali, e muito menos em que companhia. Em outra cena, Ellen, de ressaca, interrompe um concerto de forma inesperada. Nesses "esquetes", o trágico vira cômico e vice-versa.

Mas esses "alívios cômicos", se é lícito falar desse jeito, pouco atenuam o tom sombrio, porém de modo algum grave ou engravatado. Tudo flui muito bem, ao longo das três horas de duração. A gente se interessa pelos personagens, vê as relações humanas duras como partes da vida e de uma determinada cultura, e recebe, com algum alívio, os poucos raios de sol que iluminam a cena - de modo geral, com a chegada de crianças que, talvez, no futuro, possam criar um modo de vida menos depressivo. O filme ganhou o Urso de Prata de melhor roteiro no Festival de Berlim.

Em outro aspecto - bastante cuidado - temos a música a guiar a trama. Não se trata apenas de ilustrá-la, como muitas vezes sucede, mas de fazer parte da estrutura daquelas vidas, embora apenas dois personagens, o maestro e o compositor a vivam de maneira profissional. No entanto, a patética e às vezes comovente Ellen, canta de maneira emocionante quando está sob efeito do álcool.

Há também a relação do maestro e do compositor com uma orquestra jovem e internacional. Por um lado, a exigência pela expressão exata, que jamais contenta o autor da obra. Por outro, o envolvimento amoroso deste com uma jovem violoncelista.

Tão duras quanto as alusões à morte são os relacionamentos entre eles. Há uma longa cena em particular em que Lissy, sentindo-se próxima do fim, promove um acerto de contas com o filho, Tom. Esse diálogo, duro e frio, embora se sinta a emoção palpitando por trás, é uma espécie de centro nervoso da obra, como um acorde dissonante e sem resolução. Filme adulto, sem qualquer atenuante, muitíssimo bem dirigido e interpretado - além do roteiro premiado, em que não sobra nem falta uma palavra.

Junto com Levados pelas Marés, de Jia Zhangke, Dying foi o que de melhor vi nesta Mostra, que hoje chega ao fim com a premiação e apresentação de Megalópolis, de Francis Ford Coppola.

Dying ainda passa hoje às 16h, no Espaço Augusta, sala 1

 

Dying - A Última Sinfonia, de Matthias Glasner, é um drama familiar alemão - duro, rigoroso e encantador. Ao longo de três horas conheceremos os membros da família Lunie. O pai, Gerd (Hans-Uwe Bauer), parece atingido por uma doença degenerativa e não responde mais por si. Sua mulher, Lissy (Corina Harfouch), impaciente, fria, também não tem motivos para se alegrar com sua saúde. Nem com a vida, em geral.

Um dos filhos é maestro. Tom (Lars Eidinger) ensaia uma peça orquestral composta por um amigo de tendências suicidas, cujo título é exatamente este - Morte. A ex-namorada, Liv (Anna Bederke), deu à luz um filho de outro homem e pede que Tom o assuma como pai. Não como pai exclusivo, mas que divida a paternidade com o pai biológico, pouco confiável. Ellen ((Lilith Stangenberg), irmã do maestro, é uma assistente de dentista, doidivanas, louca por sexo e álcool.

Glasner tempera o tom pesado, com algumas tiradas cômicas, ou, pelo menos, de humor negro. Por exemplo, quando pai e mãe saem de carro. O homem não consegue mais dirigir e a mulher não enxerga direito. Ela vai guiando e ele vai descrevendo o que se encontra pelo caminho. Em outra cena, vemos a extração de um molar em pleno boteco e em meio a uma bebedeira. A assistente de dentista maluquinha é apresentada ao público ao despertar num quarto de hotel na Letônia sem saber onde está nem como foi parar ali, e muito menos em que companhia. Em outra cena, Ellen, de ressaca, interrompe um concerto de forma inesperada. Nesses "esquetes", o trágico vira cômico e vice-versa.

Mas esses "alívios cômicos", se é lícito falar desse jeito, pouco atenuam o tom sombrio, porém de modo algum grave ou engravatado. Tudo flui muito bem, ao longo das três horas de duração. A gente se interessa pelos personagens, vê as relações humanas duras como partes da vida e de uma determinada cultura, e recebe, com algum alívio, os poucos raios de sol que iluminam a cena - de modo geral, com a chegada de crianças que, talvez, no futuro, possam criar um modo de vida menos depressivo. O filme ganhou o Urso de Prata de melhor roteiro no Festival de Berlim.

Em outro aspecto - bastante cuidado - temos a música a guiar a trama. Não se trata apenas de ilustrá-la, como muitas vezes sucede, mas de fazer parte da estrutura daquelas vidas, embora apenas dois personagens, o maestro e o compositor a vivam de maneira profissional. No entanto, a patética e às vezes comovente Ellen, canta de maneira emocionante quando está sob efeito do álcool.

Há também a relação do maestro e do compositor com uma orquestra jovem e internacional. Por um lado, a exigência pela expressão exata, que jamais contenta o autor da obra. Por outro, o envolvimento amoroso deste com uma jovem violoncelista.

Tão duras quanto as alusões à morte são os relacionamentos entre eles. Há uma longa cena em particular em que Lissy, sentindo-se próxima do fim, promove um acerto de contas com o filho, Tom. Esse diálogo, duro e frio, embora se sinta a emoção palpitando por trás, é uma espécie de centro nervoso da obra, como um acorde dissonante e sem resolução. Filme adulto, sem qualquer atenuante, muitíssimo bem dirigido e interpretado - além do roteiro premiado, em que não sobra nem falta uma palavra.

Junto com Levados pelas Marés, de Jia Zhangke, Dying foi o que de melhor vi nesta Mostra, que hoje chega ao fim com a premiação e apresentação de Megalópolis, de Francis Ford Coppola.

Dying ainda passa hoje às 16h, no Espaço Augusta, sala 1

Opinião por Luiz Zanin Oricchio

É jornalista, psicanalista e crítico de cinema

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