Cinema, cultura & afins

Opinião|'Napoleão': suas conquistas, suas derrotas, seus amores. Mas falta um pouco de História


Por Luiz Zanin Oricchio
 

Para quem não esperava grande coisa do Napoleão de Ridley Scott, o resultado parece bem razoável. Até mesmo bom, em especial por Joaquin Phoenix, que interpreta o Corso, um dos mais formidáveis senhores da guerra da história da humanidade. Claro, o espectador encontra dificuldades a serem vencidas. A primeira delas é ouvir toda a Corte francesa, os revolucionários e o populacho de Paris se exprimindo em inglês de vários sotaques. Do americano descomplexado de Phoenix ao puro British de Everett Rupert, intérprete do Duque de Wellington, famoso por ter liquidado Bonaparte em Waterloo.  

O rosto de Joaquin Phoenix é o mesmo, do princípio ao fim, sem recurso ao envelhecimento artificial - desde que era um jovem militar ambicioso, que assiste à decapitação de Maria Antonieta na Place de la Concorde, até o ex-imperador derrotado no exílio da Ilha de Santa Helena. Esse rosto atravessa os anos, sem efeitos ostensivos de envelhecimento via truques de maquiagem. Um rosto duro, capaz de exprimir  da ambição mais gigantesca ao desamparo mais infantil. Não por acaso, quando Scott o viu interpretar o Coringa, antagonista de Batman, disse para si mesmo: "Eis aí meu Napoleão". 

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E lá está Joaquin Phoenix, cumprindo do começo ao fim a saga de Napoleão Bonaparte (1769-1821), sua ascensão e queda, como se costuma dizer. É um filme de batalhas, incluindo as mais famosas - a de Toulon, Austerlitz, Borodino, até a retirada fatídica da Rússia e o naufrágio definitivo em Waterloo. Segue o personagem em dois exílios forçados, ambos em ilhas, o primeiro em Elba, o segundo, definitivo, em Santa Helena, onde, a acreditar na versão de Scott, passava o tempo contando vantagem para crianças. Dizia que havia incendiado Moscou quando, na verdade, os próprios russos tocaram fogo na cidade para não deixar nada de aproveitável para os conquistadores. 

Aliás, esta é uma das sequências mais belas do filme. O orgulhoso guerreiro toma uma cidade vazia, sem habitantes, e senta-se num trono abandonado, signo habitual do poder, mas que, pela ausência de súditos, deixa de ter qualquer significado. Em seguida, vem o incêndio. O intrépido conquistador conquistou apenas escombros e cinzas. Em seguida, chega o inverno russo e envolve o exército francês. Dos 60 mil soldados que invadiram a Rússia, quatro mil voltaram para casa. 

A outra sequência memorável registra uma vitória de Bonaparte e testemunha seu gênio estratégico. Manda bombardear o lago congelado sobre o qual se encontrava o exército adversário e, com o rompimento da camada de gelo pelas balas de canhão, cavalos e soldados mergulham para a morte nas águas geladas. Cena macabra, sem dúvida, mas, ainda assim, um espetáculo cinematográfico do tipo que Ridley Scott sempre busca. 

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A outra face do gênio bélico é seu amor por Josefina (Josephine de Beauharnais), vivida por Vanessa Kirby, relacionamento conturbado cuja história atravessou séculos. Ela tinha dois filhos quando ele a conheceu. Viveram uma paixão tórrida, pouco convencional para a época e posição social dos parceiros. Consta que ela o traía quando ele se ausentava em campanhas militares. Casaram-se e ela se tornou imperatriz quando ele colocou a coroa em sua cabeça. Separaram-se pois ela foi incapaz de lhe dar um herdeiro para continuar a dinastia. Scott filma o sexo entre eles de maneira fria, mecânica e distanciada. Também aqui, no campo amoroso, o registro é do tipo "ascensão e queda". 

 Enfim, esse retrato biográfico de Napoleão Bonaparte é marcado pelo signo do fracasso e da tragédia, especialmente realçados pela ambição extrema de um conquistador de mundos que termina derrotado e só. Mas que deixa uma marca indelével na história do seu país e da Europa. Napoleão não foi apenas um guerreiro talentoso e um temperamento forte. Marcou sua época e ganhou a eternidade, porque, malgrado suas contradições, era, também, homem político de visão. E esta é, talvez, a maior omissão no perfil traçado por Ridley Scott. 

Apesar do alinhamento dos fatos históricos - a começar pela execução da rainha durante a Revolução Francesa ao golpe do 18 Brumário - estes parecem não estabelecer conexão entre si. Conceda-se que a história francesa do período, no quadro de uma Europa belicosa, com países ainda formados por principados e reinados ora aliados ora inimigos, é mesmo bem complexa. Mas talvez fosse preciso fazer um esforço para dar um sentido político a tantas expedições militares comandadas por Bonaparte (Segundo o próprio filme informa, Napoleão conduziu 61 batalhas ao longo de sua vida militar, que somaram cerca de 3 milhões de mortos). 

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Os fatos políticos estão lá, mesclados à história militar e à saga amorosa, mas ocupam apenas o fundo da cena, pouco chamando a atenção de um espectador que deseja ver o espetáculo na tela mas também gosta de conhecer as motivações históricas que moldam o drama humano.

 

 

Para quem não esperava grande coisa do Napoleão de Ridley Scott, o resultado parece bem razoável. Até mesmo bom, em especial por Joaquin Phoenix, que interpreta o Corso, um dos mais formidáveis senhores da guerra da história da humanidade. Claro, o espectador encontra dificuldades a serem vencidas. A primeira delas é ouvir toda a Corte francesa, os revolucionários e o populacho de Paris se exprimindo em inglês de vários sotaques. Do americano descomplexado de Phoenix ao puro British de Everett Rupert, intérprete do Duque de Wellington, famoso por ter liquidado Bonaparte em Waterloo.  

O rosto de Joaquin Phoenix é o mesmo, do princípio ao fim, sem recurso ao envelhecimento artificial - desde que era um jovem militar ambicioso, que assiste à decapitação de Maria Antonieta na Place de la Concorde, até o ex-imperador derrotado no exílio da Ilha de Santa Helena. Esse rosto atravessa os anos, sem efeitos ostensivos de envelhecimento via truques de maquiagem. Um rosto duro, capaz de exprimir  da ambição mais gigantesca ao desamparo mais infantil. Não por acaso, quando Scott o viu interpretar o Coringa, antagonista de Batman, disse para si mesmo: "Eis aí meu Napoleão". 

E lá está Joaquin Phoenix, cumprindo do começo ao fim a saga de Napoleão Bonaparte (1769-1821), sua ascensão e queda, como se costuma dizer. É um filme de batalhas, incluindo as mais famosas - a de Toulon, Austerlitz, Borodino, até a retirada fatídica da Rússia e o naufrágio definitivo em Waterloo. Segue o personagem em dois exílios forçados, ambos em ilhas, o primeiro em Elba, o segundo, definitivo, em Santa Helena, onde, a acreditar na versão de Scott, passava o tempo contando vantagem para crianças. Dizia que havia incendiado Moscou quando, na verdade, os próprios russos tocaram fogo na cidade para não deixar nada de aproveitável para os conquistadores. 

Aliás, esta é uma das sequências mais belas do filme. O orgulhoso guerreiro toma uma cidade vazia, sem habitantes, e senta-se num trono abandonado, signo habitual do poder, mas que, pela ausência de súditos, deixa de ter qualquer significado. Em seguida, vem o incêndio. O intrépido conquistador conquistou apenas escombros e cinzas. Em seguida, chega o inverno russo e envolve o exército francês. Dos 60 mil soldados que invadiram a Rússia, quatro mil voltaram para casa. 

A outra sequência memorável registra uma vitória de Bonaparte e testemunha seu gênio estratégico. Manda bombardear o lago congelado sobre o qual se encontrava o exército adversário e, com o rompimento da camada de gelo pelas balas de canhão, cavalos e soldados mergulham para a morte nas águas geladas. Cena macabra, sem dúvida, mas, ainda assim, um espetáculo cinematográfico do tipo que Ridley Scott sempre busca. 

A outra face do gênio bélico é seu amor por Josefina (Josephine de Beauharnais), vivida por Vanessa Kirby, relacionamento conturbado cuja história atravessou séculos. Ela tinha dois filhos quando ele a conheceu. Viveram uma paixão tórrida, pouco convencional para a época e posição social dos parceiros. Consta que ela o traía quando ele se ausentava em campanhas militares. Casaram-se e ela se tornou imperatriz quando ele colocou a coroa em sua cabeça. Separaram-se pois ela foi incapaz de lhe dar um herdeiro para continuar a dinastia. Scott filma o sexo entre eles de maneira fria, mecânica e distanciada. Também aqui, no campo amoroso, o registro é do tipo "ascensão e queda". 

 Enfim, esse retrato biográfico de Napoleão Bonaparte é marcado pelo signo do fracasso e da tragédia, especialmente realçados pela ambição extrema de um conquistador de mundos que termina derrotado e só. Mas que deixa uma marca indelével na história do seu país e da Europa. Napoleão não foi apenas um guerreiro talentoso e um temperamento forte. Marcou sua época e ganhou a eternidade, porque, malgrado suas contradições, era, também, homem político de visão. E esta é, talvez, a maior omissão no perfil traçado por Ridley Scott. 

Apesar do alinhamento dos fatos históricos - a começar pela execução da rainha durante a Revolução Francesa ao golpe do 18 Brumário - estes parecem não estabelecer conexão entre si. Conceda-se que a história francesa do período, no quadro de uma Europa belicosa, com países ainda formados por principados e reinados ora aliados ora inimigos, é mesmo bem complexa. Mas talvez fosse preciso fazer um esforço para dar um sentido político a tantas expedições militares comandadas por Bonaparte (Segundo o próprio filme informa, Napoleão conduziu 61 batalhas ao longo de sua vida militar, que somaram cerca de 3 milhões de mortos). 

Os fatos políticos estão lá, mesclados à história militar e à saga amorosa, mas ocupam apenas o fundo da cena, pouco chamando a atenção de um espectador que deseja ver o espetáculo na tela mas também gosta de conhecer as motivações históricas que moldam o drama humano.

 

 

Para quem não esperava grande coisa do Napoleão de Ridley Scott, o resultado parece bem razoável. Até mesmo bom, em especial por Joaquin Phoenix, que interpreta o Corso, um dos mais formidáveis senhores da guerra da história da humanidade. Claro, o espectador encontra dificuldades a serem vencidas. A primeira delas é ouvir toda a Corte francesa, os revolucionários e o populacho de Paris se exprimindo em inglês de vários sotaques. Do americano descomplexado de Phoenix ao puro British de Everett Rupert, intérprete do Duque de Wellington, famoso por ter liquidado Bonaparte em Waterloo.  

O rosto de Joaquin Phoenix é o mesmo, do princípio ao fim, sem recurso ao envelhecimento artificial - desde que era um jovem militar ambicioso, que assiste à decapitação de Maria Antonieta na Place de la Concorde, até o ex-imperador derrotado no exílio da Ilha de Santa Helena. Esse rosto atravessa os anos, sem efeitos ostensivos de envelhecimento via truques de maquiagem. Um rosto duro, capaz de exprimir  da ambição mais gigantesca ao desamparo mais infantil. Não por acaso, quando Scott o viu interpretar o Coringa, antagonista de Batman, disse para si mesmo: "Eis aí meu Napoleão". 

E lá está Joaquin Phoenix, cumprindo do começo ao fim a saga de Napoleão Bonaparte (1769-1821), sua ascensão e queda, como se costuma dizer. É um filme de batalhas, incluindo as mais famosas - a de Toulon, Austerlitz, Borodino, até a retirada fatídica da Rússia e o naufrágio definitivo em Waterloo. Segue o personagem em dois exílios forçados, ambos em ilhas, o primeiro em Elba, o segundo, definitivo, em Santa Helena, onde, a acreditar na versão de Scott, passava o tempo contando vantagem para crianças. Dizia que havia incendiado Moscou quando, na verdade, os próprios russos tocaram fogo na cidade para não deixar nada de aproveitável para os conquistadores. 

Aliás, esta é uma das sequências mais belas do filme. O orgulhoso guerreiro toma uma cidade vazia, sem habitantes, e senta-se num trono abandonado, signo habitual do poder, mas que, pela ausência de súditos, deixa de ter qualquer significado. Em seguida, vem o incêndio. O intrépido conquistador conquistou apenas escombros e cinzas. Em seguida, chega o inverno russo e envolve o exército francês. Dos 60 mil soldados que invadiram a Rússia, quatro mil voltaram para casa. 

A outra sequência memorável registra uma vitória de Bonaparte e testemunha seu gênio estratégico. Manda bombardear o lago congelado sobre o qual se encontrava o exército adversário e, com o rompimento da camada de gelo pelas balas de canhão, cavalos e soldados mergulham para a morte nas águas geladas. Cena macabra, sem dúvida, mas, ainda assim, um espetáculo cinematográfico do tipo que Ridley Scott sempre busca. 

A outra face do gênio bélico é seu amor por Josefina (Josephine de Beauharnais), vivida por Vanessa Kirby, relacionamento conturbado cuja história atravessou séculos. Ela tinha dois filhos quando ele a conheceu. Viveram uma paixão tórrida, pouco convencional para a época e posição social dos parceiros. Consta que ela o traía quando ele se ausentava em campanhas militares. Casaram-se e ela se tornou imperatriz quando ele colocou a coroa em sua cabeça. Separaram-se pois ela foi incapaz de lhe dar um herdeiro para continuar a dinastia. Scott filma o sexo entre eles de maneira fria, mecânica e distanciada. Também aqui, no campo amoroso, o registro é do tipo "ascensão e queda". 

 Enfim, esse retrato biográfico de Napoleão Bonaparte é marcado pelo signo do fracasso e da tragédia, especialmente realçados pela ambição extrema de um conquistador de mundos que termina derrotado e só. Mas que deixa uma marca indelével na história do seu país e da Europa. Napoleão não foi apenas um guerreiro talentoso e um temperamento forte. Marcou sua época e ganhou a eternidade, porque, malgrado suas contradições, era, também, homem político de visão. E esta é, talvez, a maior omissão no perfil traçado por Ridley Scott. 

Apesar do alinhamento dos fatos históricos - a começar pela execução da rainha durante a Revolução Francesa ao golpe do 18 Brumário - estes parecem não estabelecer conexão entre si. Conceda-se que a história francesa do período, no quadro de uma Europa belicosa, com países ainda formados por principados e reinados ora aliados ora inimigos, é mesmo bem complexa. Mas talvez fosse preciso fazer um esforço para dar um sentido político a tantas expedições militares comandadas por Bonaparte (Segundo o próprio filme informa, Napoleão conduziu 61 batalhas ao longo de sua vida militar, que somaram cerca de 3 milhões de mortos). 

Os fatos políticos estão lá, mesclados à história militar e à saga amorosa, mas ocupam apenas o fundo da cena, pouco chamando a atenção de um espectador que deseja ver o espetáculo na tela mas também gosta de conhecer as motivações históricas que moldam o drama humano.

 

 

Para quem não esperava grande coisa do Napoleão de Ridley Scott, o resultado parece bem razoável. Até mesmo bom, em especial por Joaquin Phoenix, que interpreta o Corso, um dos mais formidáveis senhores da guerra da história da humanidade. Claro, o espectador encontra dificuldades a serem vencidas. A primeira delas é ouvir toda a Corte francesa, os revolucionários e o populacho de Paris se exprimindo em inglês de vários sotaques. Do americano descomplexado de Phoenix ao puro British de Everett Rupert, intérprete do Duque de Wellington, famoso por ter liquidado Bonaparte em Waterloo.  

O rosto de Joaquin Phoenix é o mesmo, do princípio ao fim, sem recurso ao envelhecimento artificial - desde que era um jovem militar ambicioso, que assiste à decapitação de Maria Antonieta na Place de la Concorde, até o ex-imperador derrotado no exílio da Ilha de Santa Helena. Esse rosto atravessa os anos, sem efeitos ostensivos de envelhecimento via truques de maquiagem. Um rosto duro, capaz de exprimir  da ambição mais gigantesca ao desamparo mais infantil. Não por acaso, quando Scott o viu interpretar o Coringa, antagonista de Batman, disse para si mesmo: "Eis aí meu Napoleão". 

E lá está Joaquin Phoenix, cumprindo do começo ao fim a saga de Napoleão Bonaparte (1769-1821), sua ascensão e queda, como se costuma dizer. É um filme de batalhas, incluindo as mais famosas - a de Toulon, Austerlitz, Borodino, até a retirada fatídica da Rússia e o naufrágio definitivo em Waterloo. Segue o personagem em dois exílios forçados, ambos em ilhas, o primeiro em Elba, o segundo, definitivo, em Santa Helena, onde, a acreditar na versão de Scott, passava o tempo contando vantagem para crianças. Dizia que havia incendiado Moscou quando, na verdade, os próprios russos tocaram fogo na cidade para não deixar nada de aproveitável para os conquistadores. 

Aliás, esta é uma das sequências mais belas do filme. O orgulhoso guerreiro toma uma cidade vazia, sem habitantes, e senta-se num trono abandonado, signo habitual do poder, mas que, pela ausência de súditos, deixa de ter qualquer significado. Em seguida, vem o incêndio. O intrépido conquistador conquistou apenas escombros e cinzas. Em seguida, chega o inverno russo e envolve o exército francês. Dos 60 mil soldados que invadiram a Rússia, quatro mil voltaram para casa. 

A outra sequência memorável registra uma vitória de Bonaparte e testemunha seu gênio estratégico. Manda bombardear o lago congelado sobre o qual se encontrava o exército adversário e, com o rompimento da camada de gelo pelas balas de canhão, cavalos e soldados mergulham para a morte nas águas geladas. Cena macabra, sem dúvida, mas, ainda assim, um espetáculo cinematográfico do tipo que Ridley Scott sempre busca. 

A outra face do gênio bélico é seu amor por Josefina (Josephine de Beauharnais), vivida por Vanessa Kirby, relacionamento conturbado cuja história atravessou séculos. Ela tinha dois filhos quando ele a conheceu. Viveram uma paixão tórrida, pouco convencional para a época e posição social dos parceiros. Consta que ela o traía quando ele se ausentava em campanhas militares. Casaram-se e ela se tornou imperatriz quando ele colocou a coroa em sua cabeça. Separaram-se pois ela foi incapaz de lhe dar um herdeiro para continuar a dinastia. Scott filma o sexo entre eles de maneira fria, mecânica e distanciada. Também aqui, no campo amoroso, o registro é do tipo "ascensão e queda". 

 Enfim, esse retrato biográfico de Napoleão Bonaparte é marcado pelo signo do fracasso e da tragédia, especialmente realçados pela ambição extrema de um conquistador de mundos que termina derrotado e só. Mas que deixa uma marca indelével na história do seu país e da Europa. Napoleão não foi apenas um guerreiro talentoso e um temperamento forte. Marcou sua época e ganhou a eternidade, porque, malgrado suas contradições, era, também, homem político de visão. E esta é, talvez, a maior omissão no perfil traçado por Ridley Scott. 

Apesar do alinhamento dos fatos históricos - a começar pela execução da rainha durante a Revolução Francesa ao golpe do 18 Brumário - estes parecem não estabelecer conexão entre si. Conceda-se que a história francesa do período, no quadro de uma Europa belicosa, com países ainda formados por principados e reinados ora aliados ora inimigos, é mesmo bem complexa. Mas talvez fosse preciso fazer um esforço para dar um sentido político a tantas expedições militares comandadas por Bonaparte (Segundo o próprio filme informa, Napoleão conduziu 61 batalhas ao longo de sua vida militar, que somaram cerca de 3 milhões de mortos). 

Os fatos políticos estão lá, mesclados à história militar e à saga amorosa, mas ocupam apenas o fundo da cena, pouco chamando a atenção de um espectador que deseja ver o espetáculo na tela mas também gosta de conhecer as motivações históricas que moldam o drama humano.

 

 

Para quem não esperava grande coisa do Napoleão de Ridley Scott, o resultado parece bem razoável. Até mesmo bom, em especial por Joaquin Phoenix, que interpreta o Corso, um dos mais formidáveis senhores da guerra da história da humanidade. Claro, o espectador encontra dificuldades a serem vencidas. A primeira delas é ouvir toda a Corte francesa, os revolucionários e o populacho de Paris se exprimindo em inglês de vários sotaques. Do americano descomplexado de Phoenix ao puro British de Everett Rupert, intérprete do Duque de Wellington, famoso por ter liquidado Bonaparte em Waterloo.  

O rosto de Joaquin Phoenix é o mesmo, do princípio ao fim, sem recurso ao envelhecimento artificial - desde que era um jovem militar ambicioso, que assiste à decapitação de Maria Antonieta na Place de la Concorde, até o ex-imperador derrotado no exílio da Ilha de Santa Helena. Esse rosto atravessa os anos, sem efeitos ostensivos de envelhecimento via truques de maquiagem. Um rosto duro, capaz de exprimir  da ambição mais gigantesca ao desamparo mais infantil. Não por acaso, quando Scott o viu interpretar o Coringa, antagonista de Batman, disse para si mesmo: "Eis aí meu Napoleão". 

E lá está Joaquin Phoenix, cumprindo do começo ao fim a saga de Napoleão Bonaparte (1769-1821), sua ascensão e queda, como se costuma dizer. É um filme de batalhas, incluindo as mais famosas - a de Toulon, Austerlitz, Borodino, até a retirada fatídica da Rússia e o naufrágio definitivo em Waterloo. Segue o personagem em dois exílios forçados, ambos em ilhas, o primeiro em Elba, o segundo, definitivo, em Santa Helena, onde, a acreditar na versão de Scott, passava o tempo contando vantagem para crianças. Dizia que havia incendiado Moscou quando, na verdade, os próprios russos tocaram fogo na cidade para não deixar nada de aproveitável para os conquistadores. 

Aliás, esta é uma das sequências mais belas do filme. O orgulhoso guerreiro toma uma cidade vazia, sem habitantes, e senta-se num trono abandonado, signo habitual do poder, mas que, pela ausência de súditos, deixa de ter qualquer significado. Em seguida, vem o incêndio. O intrépido conquistador conquistou apenas escombros e cinzas. Em seguida, chega o inverno russo e envolve o exército francês. Dos 60 mil soldados que invadiram a Rússia, quatro mil voltaram para casa. 

A outra sequência memorável registra uma vitória de Bonaparte e testemunha seu gênio estratégico. Manda bombardear o lago congelado sobre o qual se encontrava o exército adversário e, com o rompimento da camada de gelo pelas balas de canhão, cavalos e soldados mergulham para a morte nas águas geladas. Cena macabra, sem dúvida, mas, ainda assim, um espetáculo cinematográfico do tipo que Ridley Scott sempre busca. 

A outra face do gênio bélico é seu amor por Josefina (Josephine de Beauharnais), vivida por Vanessa Kirby, relacionamento conturbado cuja história atravessou séculos. Ela tinha dois filhos quando ele a conheceu. Viveram uma paixão tórrida, pouco convencional para a época e posição social dos parceiros. Consta que ela o traía quando ele se ausentava em campanhas militares. Casaram-se e ela se tornou imperatriz quando ele colocou a coroa em sua cabeça. Separaram-se pois ela foi incapaz de lhe dar um herdeiro para continuar a dinastia. Scott filma o sexo entre eles de maneira fria, mecânica e distanciada. Também aqui, no campo amoroso, o registro é do tipo "ascensão e queda". 

 Enfim, esse retrato biográfico de Napoleão Bonaparte é marcado pelo signo do fracasso e da tragédia, especialmente realçados pela ambição extrema de um conquistador de mundos que termina derrotado e só. Mas que deixa uma marca indelével na história do seu país e da Europa. Napoleão não foi apenas um guerreiro talentoso e um temperamento forte. Marcou sua época e ganhou a eternidade, porque, malgrado suas contradições, era, também, homem político de visão. E esta é, talvez, a maior omissão no perfil traçado por Ridley Scott. 

Apesar do alinhamento dos fatos históricos - a começar pela execução da rainha durante a Revolução Francesa ao golpe do 18 Brumário - estes parecem não estabelecer conexão entre si. Conceda-se que a história francesa do período, no quadro de uma Europa belicosa, com países ainda formados por principados e reinados ora aliados ora inimigos, é mesmo bem complexa. Mas talvez fosse preciso fazer um esforço para dar um sentido político a tantas expedições militares comandadas por Bonaparte (Segundo o próprio filme informa, Napoleão conduziu 61 batalhas ao longo de sua vida militar, que somaram cerca de 3 milhões de mortos). 

Os fatos políticos estão lá, mesclados à história militar e à saga amorosa, mas ocupam apenas o fundo da cena, pouco chamando a atenção de um espectador que deseja ver o espetáculo na tela mas também gosta de conhecer as motivações históricas que moldam o drama humano.

 

Opinião por Luiz Zanin Oricchio

É jornalista, psicanalista e crítico de cinema

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