Coluna quinzenal da jornalista Maria Fernanda Rodrigues com dicas de leitura

Opinião|‘A Vida Brinca Muito Comigo’ conta uma assombrosa história real baseada em silêncios e cicatrizes


Livro de David Grossman mistura realidade e ficção para retratar Eva Panic Nahir, que, por amor e lealdade, foi mandada para um gulag - abandonando sua filha pequena

Por Maria Fernanda Rodrigues

Alguns meses atrás, entrevistei o escritor israelense David Grossman (leia aqui), que estava lançando A Vida Brinca Muito Comigo, e às vezes me volta algo que ele disse, e que poderia ser aplicado a pessoas e nações – sobre como poderia ser transformador usar novas palavras para pensar e contar nossa história e nossos traumas e olhar isso tudo de uma outra perspectiva em vez de continuar repetindo tudo da mesma forma ano após ano, encontro após encontro.

Ou seja, sobre como uma dor ou um conflito podem perder força quando entendemos que estamos hoje em outro lugar e somos diferentes, que nossos pais são outras pessoas e não aquelas que conhecemos na infância, que o antigo inimigo talvez não seja mais um inimigo. Se falarmos, se usarmos outras palavras, se nos abrirmos a outras versões e se olharmos para o outro, talvez a vida possa ficar mais leve.

O livro que motivou a conversa com o escritor e que retomo agora passa por essas questões ao retratar o reencontro de uma família que, há mais de 50 anos, gira em torno de abandonos, traumas e não ditos (e não perguntados).

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A Vida Brinca Muito Comigo é um romance baseado na trajetória de Eva Panic Nahir (1918-2015). Ela confidenciou sua saga de amor, lealdade e luta por seus ideais a Grossman, que ganhou carta branca para inventar o que fosse necessário.

Entre 1949 e 1956, mais de 13 mil pessoas foram presas em Goli Otok, gulag de Tito na Croácia Foto: Antonio Bronic/Reuters

Imaginação nenhuma, porém, seria capaz de inventar o que Eva, que virou Vera no livro, passou em Goli Otok, gulag de Josip Broz Tito (1892-980), por quase três anos, na década de 1950 – nem o que ela viveu antes ou depois dessa experiência que marcaria profundamente também sua filha Nina, à época com pouco mais de seis anos, e a filha dela, Guili, a narradora.

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Tudo começa quando Vera é presa pela polícia de Tito, na antiga Iugoslávia, e se recusa a assinar um documento que dizia que seu marido era um informante de Stalin, ou seja, um traidor. Ele tinha acabado de se suicidar na prisão, após ser torturado, e, mesmo sabendo que acabaria em um campo de trabalho forçado para ser submetida às piores barbaridades e que sua filha seria jogada na rua, ela não aceitou.

A vida seguiu, em silêncio e com profundas cicatrizes em cada membro dessa família, que inclui ainda Rafi, que foi criado por Vera quando ela se casou com o pai dele e que passou a vida apaixonado por Nina, com quem teve Guili.

O acerto de contas catártico ocorre quando os quatro partem de Israel para a ilha de Goli Otok (Croácia), nos 90 anos de Vera, para, sob o pretexto de fazer um filme, perguntar o que foi calado, revirar a memória e buscar um pouco de paz.

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A Vida Brinca Muito Comigo

Autor: David Grossman

Trad.: Paulo Geiger

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Editora: Companhia das Letras (296 págs,; R$ 99,90; R$ 44,90 o e-book)

Alguns meses atrás, entrevistei o escritor israelense David Grossman (leia aqui), que estava lançando A Vida Brinca Muito Comigo, e às vezes me volta algo que ele disse, e que poderia ser aplicado a pessoas e nações – sobre como poderia ser transformador usar novas palavras para pensar e contar nossa história e nossos traumas e olhar isso tudo de uma outra perspectiva em vez de continuar repetindo tudo da mesma forma ano após ano, encontro após encontro.

Ou seja, sobre como uma dor ou um conflito podem perder força quando entendemos que estamos hoje em outro lugar e somos diferentes, que nossos pais são outras pessoas e não aquelas que conhecemos na infância, que o antigo inimigo talvez não seja mais um inimigo. Se falarmos, se usarmos outras palavras, se nos abrirmos a outras versões e se olharmos para o outro, talvez a vida possa ficar mais leve.

O livro que motivou a conversa com o escritor e que retomo agora passa por essas questões ao retratar o reencontro de uma família que, há mais de 50 anos, gira em torno de abandonos, traumas e não ditos (e não perguntados).

A Vida Brinca Muito Comigo é um romance baseado na trajetória de Eva Panic Nahir (1918-2015). Ela confidenciou sua saga de amor, lealdade e luta por seus ideais a Grossman, que ganhou carta branca para inventar o que fosse necessário.

Entre 1949 e 1956, mais de 13 mil pessoas foram presas em Goli Otok, gulag de Tito na Croácia Foto: Antonio Bronic/Reuters

Imaginação nenhuma, porém, seria capaz de inventar o que Eva, que virou Vera no livro, passou em Goli Otok, gulag de Josip Broz Tito (1892-980), por quase três anos, na década de 1950 – nem o que ela viveu antes ou depois dessa experiência que marcaria profundamente também sua filha Nina, à época com pouco mais de seis anos, e a filha dela, Guili, a narradora.

Tudo começa quando Vera é presa pela polícia de Tito, na antiga Iugoslávia, e se recusa a assinar um documento que dizia que seu marido era um informante de Stalin, ou seja, um traidor. Ele tinha acabado de se suicidar na prisão, após ser torturado, e, mesmo sabendo que acabaria em um campo de trabalho forçado para ser submetida às piores barbaridades e que sua filha seria jogada na rua, ela não aceitou.

A vida seguiu, em silêncio e com profundas cicatrizes em cada membro dessa família, que inclui ainda Rafi, que foi criado por Vera quando ela se casou com o pai dele e que passou a vida apaixonado por Nina, com quem teve Guili.

O acerto de contas catártico ocorre quando os quatro partem de Israel para a ilha de Goli Otok (Croácia), nos 90 anos de Vera, para, sob o pretexto de fazer um filme, perguntar o que foi calado, revirar a memória e buscar um pouco de paz.

A Vida Brinca Muito Comigo

Autor: David Grossman

Trad.: Paulo Geiger

Editora: Companhia das Letras (296 págs,; R$ 99,90; R$ 44,90 o e-book)

Alguns meses atrás, entrevistei o escritor israelense David Grossman (leia aqui), que estava lançando A Vida Brinca Muito Comigo, e às vezes me volta algo que ele disse, e que poderia ser aplicado a pessoas e nações – sobre como poderia ser transformador usar novas palavras para pensar e contar nossa história e nossos traumas e olhar isso tudo de uma outra perspectiva em vez de continuar repetindo tudo da mesma forma ano após ano, encontro após encontro.

Ou seja, sobre como uma dor ou um conflito podem perder força quando entendemos que estamos hoje em outro lugar e somos diferentes, que nossos pais são outras pessoas e não aquelas que conhecemos na infância, que o antigo inimigo talvez não seja mais um inimigo. Se falarmos, se usarmos outras palavras, se nos abrirmos a outras versões e se olharmos para o outro, talvez a vida possa ficar mais leve.

O livro que motivou a conversa com o escritor e que retomo agora passa por essas questões ao retratar o reencontro de uma família que, há mais de 50 anos, gira em torno de abandonos, traumas e não ditos (e não perguntados).

A Vida Brinca Muito Comigo é um romance baseado na trajetória de Eva Panic Nahir (1918-2015). Ela confidenciou sua saga de amor, lealdade e luta por seus ideais a Grossman, que ganhou carta branca para inventar o que fosse necessário.

Entre 1949 e 1956, mais de 13 mil pessoas foram presas em Goli Otok, gulag de Tito na Croácia Foto: Antonio Bronic/Reuters

Imaginação nenhuma, porém, seria capaz de inventar o que Eva, que virou Vera no livro, passou em Goli Otok, gulag de Josip Broz Tito (1892-980), por quase três anos, na década de 1950 – nem o que ela viveu antes ou depois dessa experiência que marcaria profundamente também sua filha Nina, à época com pouco mais de seis anos, e a filha dela, Guili, a narradora.

Tudo começa quando Vera é presa pela polícia de Tito, na antiga Iugoslávia, e se recusa a assinar um documento que dizia que seu marido era um informante de Stalin, ou seja, um traidor. Ele tinha acabado de se suicidar na prisão, após ser torturado, e, mesmo sabendo que acabaria em um campo de trabalho forçado para ser submetida às piores barbaridades e que sua filha seria jogada na rua, ela não aceitou.

A vida seguiu, em silêncio e com profundas cicatrizes em cada membro dessa família, que inclui ainda Rafi, que foi criado por Vera quando ela se casou com o pai dele e que passou a vida apaixonado por Nina, com quem teve Guili.

O acerto de contas catártico ocorre quando os quatro partem de Israel para a ilha de Goli Otok (Croácia), nos 90 anos de Vera, para, sob o pretexto de fazer um filme, perguntar o que foi calado, revirar a memória e buscar um pouco de paz.

A Vida Brinca Muito Comigo

Autor: David Grossman

Trad.: Paulo Geiger

Editora: Companhia das Letras (296 págs,; R$ 99,90; R$ 44,90 o e-book)

Alguns meses atrás, entrevistei o escritor israelense David Grossman (leia aqui), que estava lançando A Vida Brinca Muito Comigo, e às vezes me volta algo que ele disse, e que poderia ser aplicado a pessoas e nações – sobre como poderia ser transformador usar novas palavras para pensar e contar nossa história e nossos traumas e olhar isso tudo de uma outra perspectiva em vez de continuar repetindo tudo da mesma forma ano após ano, encontro após encontro.

Ou seja, sobre como uma dor ou um conflito podem perder força quando entendemos que estamos hoje em outro lugar e somos diferentes, que nossos pais são outras pessoas e não aquelas que conhecemos na infância, que o antigo inimigo talvez não seja mais um inimigo. Se falarmos, se usarmos outras palavras, se nos abrirmos a outras versões e se olharmos para o outro, talvez a vida possa ficar mais leve.

O livro que motivou a conversa com o escritor e que retomo agora passa por essas questões ao retratar o reencontro de uma família que, há mais de 50 anos, gira em torno de abandonos, traumas e não ditos (e não perguntados).

A Vida Brinca Muito Comigo é um romance baseado na trajetória de Eva Panic Nahir (1918-2015). Ela confidenciou sua saga de amor, lealdade e luta por seus ideais a Grossman, que ganhou carta branca para inventar o que fosse necessário.

Entre 1949 e 1956, mais de 13 mil pessoas foram presas em Goli Otok, gulag de Tito na Croácia Foto: Antonio Bronic/Reuters

Imaginação nenhuma, porém, seria capaz de inventar o que Eva, que virou Vera no livro, passou em Goli Otok, gulag de Josip Broz Tito (1892-980), por quase três anos, na década de 1950 – nem o que ela viveu antes ou depois dessa experiência que marcaria profundamente também sua filha Nina, à época com pouco mais de seis anos, e a filha dela, Guili, a narradora.

Tudo começa quando Vera é presa pela polícia de Tito, na antiga Iugoslávia, e se recusa a assinar um documento que dizia que seu marido era um informante de Stalin, ou seja, um traidor. Ele tinha acabado de se suicidar na prisão, após ser torturado, e, mesmo sabendo que acabaria em um campo de trabalho forçado para ser submetida às piores barbaridades e que sua filha seria jogada na rua, ela não aceitou.

A vida seguiu, em silêncio e com profundas cicatrizes em cada membro dessa família, que inclui ainda Rafi, que foi criado por Vera quando ela se casou com o pai dele e que passou a vida apaixonado por Nina, com quem teve Guili.

O acerto de contas catártico ocorre quando os quatro partem de Israel para a ilha de Goli Otok (Croácia), nos 90 anos de Vera, para, sob o pretexto de fazer um filme, perguntar o que foi calado, revirar a memória e buscar um pouco de paz.

A Vida Brinca Muito Comigo

Autor: David Grossman

Trad.: Paulo Geiger

Editora: Companhia das Letras (296 págs,; R$ 99,90; R$ 44,90 o e-book)

Opinião por Maria Fernanda Rodrigues

Editora de Cultura e jornalista especializada em literatura e mercado editorial

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