Quando esteve no Brasil, em maio do ano passado, Matthieu Blazy, diretor criativo da grife italiana Bottega Veneta, não poupou elogios ao trabalho da arquiteta ítalo-brasileira Lina Bo Bardi - e não por acaso ele escolheu a icônica Casa de Vidro de Lina para receber a ação nômade de intercâmbio cultural e artístico organizada pela Bottega na época de sua visita, o The Square.
Com seu trabalho, Bo Bardi teve papel fundamental na definição do emblemático movimento modernista brasileiro na arquitetura, cujo conceito principal buscava um retorno à simplicidade das formas e das linhas arquitetônicas, mas sempre para criar composições surpreendentes. Essa busca pelo impacto visual e sensorial atingido pela força dos elementos da natureza, dos materiais brutos e do conjunto como um todo - em detrimento de elementos decorativos e adornos - é também o que ressoa na coleção apresentada pela Bottega Veneta em fevereiro, na Semana de Moda de Milão.
“Eu estava interessado em criar um monumento a partir do cotidiano”, explicou o diretor em conversa divulgada pela jornalista e crítica de moda britânica Suzy Menkes em seu Instagram. “O que fizemos foi tirar todas as decorações, tudo gira em torno dos materiais”, concluiu, em uma proposta que pode ser entendida como extremamente modernista. Associações conceituais à parte, Matthieu Blazy vai além na descrição da nova temporada; ele conta que se inspirou principalmente no cair da noite e suas nuances, “no limite das chamas, quando os vermelhos se tornam bordôs e os verdes viram tons de oliva”.
A partir desse ponto de partida, a Bottega criou uma experiência imersiva, que teve a sala de desfile assinada pelo Bureau Betak, escritório de design especializado em shows e eventos de moda. O ambiente tem madeira, luzes em tons quentes, sons crepitantes de fogo e esculturas da famosa ilha de Murano - uma provável referência à força da tradição criativa e produtiva italiana.
Nesta coleção, Blazy - um dos maiores pragmáticos da moda contemporânea, que tem como base para sua moda a vida real contemporânea - está em flerte com os fascínios da noite, que em francês, o diretor define como seu allure. “Quando passeio com meu cachorro, gosto de ver a transição das roupas do dia para a noite. É um momento em que você deixa de ver os detalhes e observa sombras e formas”, conta ele. “Na prática, o que emociona as pessoas não é a peça de roupa que você está vestindo, mas sim como cria combinações. É isso que origina a beleza.”
Dinamismo
A cada temporada Blazy reafirma sua posição como um criador de moda atento à vida nas ruas e nesta estação ele o fez de forma mais clara do que nunca. Em vez de modelos andando ordenadamente em uma linha reta, seu show trouxe movimento e dinamismo até no modo como suas criações cruzaram a passarela. Com caminhares em diferentes direções, os looks Bottega desta estação são feitos para integrar combinações reais e possíveis.
Além disso, a marca desfilou uma coleção que exalta ao máximo as características de cada material. O couro, por exemplo, é uma das expertises Bottega e surge quase esculpido, em peças que se estruturam sobre o corpo e criam impressionantes texturas. As plumas adicionam volumes às silhuetas. A história ficou completa com o uso de cores marcantes - com prioridade para os bordôs e olivas, estampas geométricas e o uso preciso dos acessórios e joias. Estes últimos, todos criações do time de design e artesãos da equipe Bottega Veneta. Mais do que uma história, a nova temporada da marca italiana chegou com um conjunto de percepções e abordagens que pontua um importante e inesquecível capítulo de sua história.