‘A música vive um momento sofrível, com futuro tenebroso’, diz Nico Rezende, do hit ‘Esquece e Vem’


Cantor e compositor carioca fala sobre o novo álbum ‘Primeira Vez’ e lembra suas colaborações com Roberto Carlos e Cazuza, além de refletir sobre inteligência artificial e projetar o futuro com pessimismo

Por Gabriel Zorzetto
Atualização:
Foto: Divulgação/Nico Rezende
Entrevista comNico RezendeMúsico

‘Dói mais teu silêncio que tua agressão’, cantou Nico Rezende em Esquece e Vem, uma das mais belas baladas brasileiras dos anos 1980, sucesso nas rádios e tema da novela O Outro, da Rede Globo.

Em celebração aos 40 anos de carreira do compositor e arranjador carioca, uma versão repaginada do hit – com participação da cantora Ive Greice – foi incluída no novo álbum Primeira Vez, já disponível ao público nas plataformas de streaming. Trata-se do 10º trabalho autoral de Rezende, reconhecido no cenário musical por parcerias memoráveis com Cazuza, Roberto Carlos, Ritchie, Gal Costa e Lulu Santos.

Em entrevista ao Estadão, por telefone, o artista de 64 anos, hábil para transitar entre jazz, pop e MPB, se mostrou entusiasmado com o lançamento e alertou para a superficialidade da música atual, além de comentar sobre as transformações no setor e projetar o futuro com pessimismo.

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Nico fará um show comemorativo do projeto em São Paulo, no dia 11 de janeiro, no Blue Note.

O cantor e compositor Nico Rezende celebra 40 anos de carreira com o novo álbum 'Primeira Vez' Foto: Divulgação/Nico Rezende
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Como surgiu a ideia do título do novo álbum, ‘Primeira Vez’?

É o título da canção mais recente do álbum, minha parceria com Nelson Motta. Estávamos ensaiando essa parceria há muito tempo. Ele ficou um tempo com uma melodia que mandei para ele, até que fez a letra, sobre um amor maduro como se fosse a primeira vez. É algo que ele realmente estava vivendo. Depois que eu tinha gravado as primeiras versões da canção, eu estava andando pela praia e vi o sol nascendo. Falei: ‘caramba, estou fazendo 40 anos de estrada e o sol está aqui nascendo como se fosse a primeira vez’. Foi daí que surgiu a ideia do título e da capa.

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Por que você quis revisitar seu maior clássico, ‘Esquece e Vem’?

Gravei essa canção uns dois anos antes porque pintou uma parceria com a Rádio JB FM. Me convidaram pra fazer um quadro chamado JB Sessions, que é sempre um ‘feat’ no qual você convida alguém pra cantar com você. Decidi revisitar a música com minha amiga Ive Greice justamente para trazer, até para novas gerações, um clima mais lual, em uma versão mais despojada.

Musicalmente, quais aspectos fizeram a versão original ser um hit tão grande nos anos 80?

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Ela era bem diferente do que se tocava no rádio. Começa com uma guitarra que vem lá de longe, é bem cinematográfica. E as pessoas se identificam muito com a frase de abertura: ‘dói mais o seu silêncio que a tua agressão’. Todo o desenvolvimento do arranjo, o baixo fretless, bem pop, minimalista. E eu estava com os músicos certos, na hora certa: Léo Gandelman, Torcuato Mariano, Arthur Maia... Tudo isso cativou as pessoas.

Como foi produzir o primeiro disco solo do Cazuza, ‘Exagerado’ (1985)?

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Ele me procurou quando estava saindo do Barão Vermelho, disse que queria fazer uma mescla entre MPB e rock. O Cazuza era um cara muito divertido, era o próprio exagerado. Eu falei que queria fazer os arranjos. Então, me deram canções que não eram como ficaram no disco, por exemplo, Codinome Beija-flor. Subvertemos um pouco a canção original e levamos para o lado mais lúdico. Uma lembrança engraçada do Cazuza foi quando ele veio ao meu primeiro casamento, e chegou virado na igreja, de bermuda. Então, um amigo meu o levou até a cobertura dele para colocar uma calça jeans, senão não ia ter casamento. E o Cazuza me deu de presente a festa de casamento. Ele convidou Deus e o mundo.

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Te impactou muito vê-lo doente?

Não, porque eu o via quase diariamente. A doença em si já era um choque. Na gravação da nossa música Sonho Estranho, eu ia ao hospital, levava o instrumento, tocava, ficava levando o som com ele, tudo para tentar deixar aquele desfecho menos dolorido. Ele foi um cara que brigou muito para viver e viveu intensamente.

Depois disso você gravou com Roberto Carlos. Era difícil lidar com ele?

Não, o Roberto sempre foi fácil, uma pessoa maravilhosa. Ele tinha algumas questões com as cores, coisas assim, mas nunca entrei nesse mérito com ele. Fazíamos a sessão de gravação e terminava, tipo, 22h. Ficávamos tomando drinks, às vezes o Erasmo [Carlos] aparecia. Escrevi um arranjo de metais para ele, na música Tô Chutando Lata [lançada em 1987]. E recentemente estive com Roberto no camarim do show dele no Rio. A primeira coisa que ele falou foi que naquela semana tinha escutado Tô Chutando Lata. Foi uma lembrança carinhosa.

É verdade que o Roberto tinha ciúmes do sucesso do Ritchie, outro músico com quem você trabalhou?

Correm histórias, e para dizer a verdade, eu não sei a verdade do que aconteceu. Sei que ele era o grande vendedor de discos da CBS na época, e claro, o Ritchie vendeu muito com Voo de Coração (1983), um álbum lindo. Mas não sei se teve algum estresse entre os dois. Sinceramente, não tenho essa informação.

Sobre o papel do compositor hoje em dia, você acha que virou uma atividade banalizada?

Olha, eu acho que a música vive um momento bem sofrível. Eu estava viajando hoje com o [Roberto] Menescal e conversamos sobre os perigos da inteligência artificial. As pessoas estão fazendo música com IA, e registrando em seu nome, editando. Então, é um futuro tenebroso que teremos pela frente. A música está muito banalizada no sentido melódico e harmônico, isso se repete e começa a ficar chato.

O que explica o sucesso do sertanejo e do funk no Brasil?

Primeiro, é a questão da educação. Não vivemos um bom momento em termos de escolarização. A internet também contribui muito para isso. Mas eu acho que a grande virada aconteceu nos anos 90. Antes dos anos 90 existiam festivais, onde as famílias se juntavam para escutar canções novas, aplaudir, torcer por uma canção. Os festivais eram muito saudáveis. A partir dos anos 90, quem estava no palco passou a ser apenas um contribuinte da festa (...) É uma conjuntura bastante problemática. Torcemos pelo resgate da boa música, da boa letra. Isso é uma questão de lutar. É a luta do bem contra o mal. Temos que estimular compositores, criar novos festivais. Estou com projetos no Rio nesse sentido. Quanto melhor a música, melhor para o mundo.

‘Dói mais teu silêncio que tua agressão’, cantou Nico Rezende em Esquece e Vem, uma das mais belas baladas brasileiras dos anos 1980, sucesso nas rádios e tema da novela O Outro, da Rede Globo.

Em celebração aos 40 anos de carreira do compositor e arranjador carioca, uma versão repaginada do hit – com participação da cantora Ive Greice – foi incluída no novo álbum Primeira Vez, já disponível ao público nas plataformas de streaming. Trata-se do 10º trabalho autoral de Rezende, reconhecido no cenário musical por parcerias memoráveis com Cazuza, Roberto Carlos, Ritchie, Gal Costa e Lulu Santos.

Em entrevista ao Estadão, por telefone, o artista de 64 anos, hábil para transitar entre jazz, pop e MPB, se mostrou entusiasmado com o lançamento e alertou para a superficialidade da música atual, além de comentar sobre as transformações no setor e projetar o futuro com pessimismo.

Nico fará um show comemorativo do projeto em São Paulo, no dia 11 de janeiro, no Blue Note.

O cantor e compositor Nico Rezende celebra 40 anos de carreira com o novo álbum 'Primeira Vez' Foto: Divulgação/Nico Rezende

Como surgiu a ideia do título do novo álbum, ‘Primeira Vez’?

É o título da canção mais recente do álbum, minha parceria com Nelson Motta. Estávamos ensaiando essa parceria há muito tempo. Ele ficou um tempo com uma melodia que mandei para ele, até que fez a letra, sobre um amor maduro como se fosse a primeira vez. É algo que ele realmente estava vivendo. Depois que eu tinha gravado as primeiras versões da canção, eu estava andando pela praia e vi o sol nascendo. Falei: ‘caramba, estou fazendo 40 anos de estrada e o sol está aqui nascendo como se fosse a primeira vez’. Foi daí que surgiu a ideia do título e da capa.

Por que você quis revisitar seu maior clássico, ‘Esquece e Vem’?

Gravei essa canção uns dois anos antes porque pintou uma parceria com a Rádio JB FM. Me convidaram pra fazer um quadro chamado JB Sessions, que é sempre um ‘feat’ no qual você convida alguém pra cantar com você. Decidi revisitar a música com minha amiga Ive Greice justamente para trazer, até para novas gerações, um clima mais lual, em uma versão mais despojada.

Musicalmente, quais aspectos fizeram a versão original ser um hit tão grande nos anos 80?

Ela era bem diferente do que se tocava no rádio. Começa com uma guitarra que vem lá de longe, é bem cinematográfica. E as pessoas se identificam muito com a frase de abertura: ‘dói mais o seu silêncio que a tua agressão’. Todo o desenvolvimento do arranjo, o baixo fretless, bem pop, minimalista. E eu estava com os músicos certos, na hora certa: Léo Gandelman, Torcuato Mariano, Arthur Maia... Tudo isso cativou as pessoas.

Como foi produzir o primeiro disco solo do Cazuza, ‘Exagerado’ (1985)?

Ele me procurou quando estava saindo do Barão Vermelho, disse que queria fazer uma mescla entre MPB e rock. O Cazuza era um cara muito divertido, era o próprio exagerado. Eu falei que queria fazer os arranjos. Então, me deram canções que não eram como ficaram no disco, por exemplo, Codinome Beija-flor. Subvertemos um pouco a canção original e levamos para o lado mais lúdico. Uma lembrança engraçada do Cazuza foi quando ele veio ao meu primeiro casamento, e chegou virado na igreja, de bermuda. Então, um amigo meu o levou até a cobertura dele para colocar uma calça jeans, senão não ia ter casamento. E o Cazuza me deu de presente a festa de casamento. Ele convidou Deus e o mundo.

Te impactou muito vê-lo doente?

Não, porque eu o via quase diariamente. A doença em si já era um choque. Na gravação da nossa música Sonho Estranho, eu ia ao hospital, levava o instrumento, tocava, ficava levando o som com ele, tudo para tentar deixar aquele desfecho menos dolorido. Ele foi um cara que brigou muito para viver e viveu intensamente.

Depois disso você gravou com Roberto Carlos. Era difícil lidar com ele?

Não, o Roberto sempre foi fácil, uma pessoa maravilhosa. Ele tinha algumas questões com as cores, coisas assim, mas nunca entrei nesse mérito com ele. Fazíamos a sessão de gravação e terminava, tipo, 22h. Ficávamos tomando drinks, às vezes o Erasmo [Carlos] aparecia. Escrevi um arranjo de metais para ele, na música Tô Chutando Lata [lançada em 1987]. E recentemente estive com Roberto no camarim do show dele no Rio. A primeira coisa que ele falou foi que naquela semana tinha escutado Tô Chutando Lata. Foi uma lembrança carinhosa.

É verdade que o Roberto tinha ciúmes do sucesso do Ritchie, outro músico com quem você trabalhou?

Correm histórias, e para dizer a verdade, eu não sei a verdade do que aconteceu. Sei que ele era o grande vendedor de discos da CBS na época, e claro, o Ritchie vendeu muito com Voo de Coração (1983), um álbum lindo. Mas não sei se teve algum estresse entre os dois. Sinceramente, não tenho essa informação.

Sobre o papel do compositor hoje em dia, você acha que virou uma atividade banalizada?

Olha, eu acho que a música vive um momento bem sofrível. Eu estava viajando hoje com o [Roberto] Menescal e conversamos sobre os perigos da inteligência artificial. As pessoas estão fazendo música com IA, e registrando em seu nome, editando. Então, é um futuro tenebroso que teremos pela frente. A música está muito banalizada no sentido melódico e harmônico, isso se repete e começa a ficar chato.

O que explica o sucesso do sertanejo e do funk no Brasil?

Primeiro, é a questão da educação. Não vivemos um bom momento em termos de escolarização. A internet também contribui muito para isso. Mas eu acho que a grande virada aconteceu nos anos 90. Antes dos anos 90 existiam festivais, onde as famílias se juntavam para escutar canções novas, aplaudir, torcer por uma canção. Os festivais eram muito saudáveis. A partir dos anos 90, quem estava no palco passou a ser apenas um contribuinte da festa (...) É uma conjuntura bastante problemática. Torcemos pelo resgate da boa música, da boa letra. Isso é uma questão de lutar. É a luta do bem contra o mal. Temos que estimular compositores, criar novos festivais. Estou com projetos no Rio nesse sentido. Quanto melhor a música, melhor para o mundo.

‘Dói mais teu silêncio que tua agressão’, cantou Nico Rezende em Esquece e Vem, uma das mais belas baladas brasileiras dos anos 1980, sucesso nas rádios e tema da novela O Outro, da Rede Globo.

Em celebração aos 40 anos de carreira do compositor e arranjador carioca, uma versão repaginada do hit – com participação da cantora Ive Greice – foi incluída no novo álbum Primeira Vez, já disponível ao público nas plataformas de streaming. Trata-se do 10º trabalho autoral de Rezende, reconhecido no cenário musical por parcerias memoráveis com Cazuza, Roberto Carlos, Ritchie, Gal Costa e Lulu Santos.

Em entrevista ao Estadão, por telefone, o artista de 64 anos, hábil para transitar entre jazz, pop e MPB, se mostrou entusiasmado com o lançamento e alertou para a superficialidade da música atual, além de comentar sobre as transformações no setor e projetar o futuro com pessimismo.

Nico fará um show comemorativo do projeto em São Paulo, no dia 11 de janeiro, no Blue Note.

O cantor e compositor Nico Rezende celebra 40 anos de carreira com o novo álbum 'Primeira Vez' Foto: Divulgação/Nico Rezende

Como surgiu a ideia do título do novo álbum, ‘Primeira Vez’?

É o título da canção mais recente do álbum, minha parceria com Nelson Motta. Estávamos ensaiando essa parceria há muito tempo. Ele ficou um tempo com uma melodia que mandei para ele, até que fez a letra, sobre um amor maduro como se fosse a primeira vez. É algo que ele realmente estava vivendo. Depois que eu tinha gravado as primeiras versões da canção, eu estava andando pela praia e vi o sol nascendo. Falei: ‘caramba, estou fazendo 40 anos de estrada e o sol está aqui nascendo como se fosse a primeira vez’. Foi daí que surgiu a ideia do título e da capa.

Por que você quis revisitar seu maior clássico, ‘Esquece e Vem’?

Gravei essa canção uns dois anos antes porque pintou uma parceria com a Rádio JB FM. Me convidaram pra fazer um quadro chamado JB Sessions, que é sempre um ‘feat’ no qual você convida alguém pra cantar com você. Decidi revisitar a música com minha amiga Ive Greice justamente para trazer, até para novas gerações, um clima mais lual, em uma versão mais despojada.

Musicalmente, quais aspectos fizeram a versão original ser um hit tão grande nos anos 80?

Ela era bem diferente do que se tocava no rádio. Começa com uma guitarra que vem lá de longe, é bem cinematográfica. E as pessoas se identificam muito com a frase de abertura: ‘dói mais o seu silêncio que a tua agressão’. Todo o desenvolvimento do arranjo, o baixo fretless, bem pop, minimalista. E eu estava com os músicos certos, na hora certa: Léo Gandelman, Torcuato Mariano, Arthur Maia... Tudo isso cativou as pessoas.

Como foi produzir o primeiro disco solo do Cazuza, ‘Exagerado’ (1985)?

Ele me procurou quando estava saindo do Barão Vermelho, disse que queria fazer uma mescla entre MPB e rock. O Cazuza era um cara muito divertido, era o próprio exagerado. Eu falei que queria fazer os arranjos. Então, me deram canções que não eram como ficaram no disco, por exemplo, Codinome Beija-flor. Subvertemos um pouco a canção original e levamos para o lado mais lúdico. Uma lembrança engraçada do Cazuza foi quando ele veio ao meu primeiro casamento, e chegou virado na igreja, de bermuda. Então, um amigo meu o levou até a cobertura dele para colocar uma calça jeans, senão não ia ter casamento. E o Cazuza me deu de presente a festa de casamento. Ele convidou Deus e o mundo.

Te impactou muito vê-lo doente?

Não, porque eu o via quase diariamente. A doença em si já era um choque. Na gravação da nossa música Sonho Estranho, eu ia ao hospital, levava o instrumento, tocava, ficava levando o som com ele, tudo para tentar deixar aquele desfecho menos dolorido. Ele foi um cara que brigou muito para viver e viveu intensamente.

Depois disso você gravou com Roberto Carlos. Era difícil lidar com ele?

Não, o Roberto sempre foi fácil, uma pessoa maravilhosa. Ele tinha algumas questões com as cores, coisas assim, mas nunca entrei nesse mérito com ele. Fazíamos a sessão de gravação e terminava, tipo, 22h. Ficávamos tomando drinks, às vezes o Erasmo [Carlos] aparecia. Escrevi um arranjo de metais para ele, na música Tô Chutando Lata [lançada em 1987]. E recentemente estive com Roberto no camarim do show dele no Rio. A primeira coisa que ele falou foi que naquela semana tinha escutado Tô Chutando Lata. Foi uma lembrança carinhosa.

É verdade que o Roberto tinha ciúmes do sucesso do Ritchie, outro músico com quem você trabalhou?

Correm histórias, e para dizer a verdade, eu não sei a verdade do que aconteceu. Sei que ele era o grande vendedor de discos da CBS na época, e claro, o Ritchie vendeu muito com Voo de Coração (1983), um álbum lindo. Mas não sei se teve algum estresse entre os dois. Sinceramente, não tenho essa informação.

Sobre o papel do compositor hoje em dia, você acha que virou uma atividade banalizada?

Olha, eu acho que a música vive um momento bem sofrível. Eu estava viajando hoje com o [Roberto] Menescal e conversamos sobre os perigos da inteligência artificial. As pessoas estão fazendo música com IA, e registrando em seu nome, editando. Então, é um futuro tenebroso que teremos pela frente. A música está muito banalizada no sentido melódico e harmônico, isso se repete e começa a ficar chato.

O que explica o sucesso do sertanejo e do funk no Brasil?

Primeiro, é a questão da educação. Não vivemos um bom momento em termos de escolarização. A internet também contribui muito para isso. Mas eu acho que a grande virada aconteceu nos anos 90. Antes dos anos 90 existiam festivais, onde as famílias se juntavam para escutar canções novas, aplaudir, torcer por uma canção. Os festivais eram muito saudáveis. A partir dos anos 90, quem estava no palco passou a ser apenas um contribuinte da festa (...) É uma conjuntura bastante problemática. Torcemos pelo resgate da boa música, da boa letra. Isso é uma questão de lutar. É a luta do bem contra o mal. Temos que estimular compositores, criar novos festivais. Estou com projetos no Rio nesse sentido. Quanto melhor a música, melhor para o mundo.

‘Dói mais teu silêncio que tua agressão’, cantou Nico Rezende em Esquece e Vem, uma das mais belas baladas brasileiras dos anos 1980, sucesso nas rádios e tema da novela O Outro, da Rede Globo.

Em celebração aos 40 anos de carreira do compositor e arranjador carioca, uma versão repaginada do hit – com participação da cantora Ive Greice – foi incluída no novo álbum Primeira Vez, já disponível ao público nas plataformas de streaming. Trata-se do 10º trabalho autoral de Rezende, reconhecido no cenário musical por parcerias memoráveis com Cazuza, Roberto Carlos, Ritchie, Gal Costa e Lulu Santos.

Em entrevista ao Estadão, por telefone, o artista de 64 anos, hábil para transitar entre jazz, pop e MPB, se mostrou entusiasmado com o lançamento e alertou para a superficialidade da música atual, além de comentar sobre as transformações no setor e projetar o futuro com pessimismo.

Nico fará um show comemorativo do projeto em São Paulo, no dia 11 de janeiro, no Blue Note.

O cantor e compositor Nico Rezende celebra 40 anos de carreira com o novo álbum 'Primeira Vez' Foto: Divulgação/Nico Rezende

Como surgiu a ideia do título do novo álbum, ‘Primeira Vez’?

É o título da canção mais recente do álbum, minha parceria com Nelson Motta. Estávamos ensaiando essa parceria há muito tempo. Ele ficou um tempo com uma melodia que mandei para ele, até que fez a letra, sobre um amor maduro como se fosse a primeira vez. É algo que ele realmente estava vivendo. Depois que eu tinha gravado as primeiras versões da canção, eu estava andando pela praia e vi o sol nascendo. Falei: ‘caramba, estou fazendo 40 anos de estrada e o sol está aqui nascendo como se fosse a primeira vez’. Foi daí que surgiu a ideia do título e da capa.

Por que você quis revisitar seu maior clássico, ‘Esquece e Vem’?

Gravei essa canção uns dois anos antes porque pintou uma parceria com a Rádio JB FM. Me convidaram pra fazer um quadro chamado JB Sessions, que é sempre um ‘feat’ no qual você convida alguém pra cantar com você. Decidi revisitar a música com minha amiga Ive Greice justamente para trazer, até para novas gerações, um clima mais lual, em uma versão mais despojada.

Musicalmente, quais aspectos fizeram a versão original ser um hit tão grande nos anos 80?

Ela era bem diferente do que se tocava no rádio. Começa com uma guitarra que vem lá de longe, é bem cinematográfica. E as pessoas se identificam muito com a frase de abertura: ‘dói mais o seu silêncio que a tua agressão’. Todo o desenvolvimento do arranjo, o baixo fretless, bem pop, minimalista. E eu estava com os músicos certos, na hora certa: Léo Gandelman, Torcuato Mariano, Arthur Maia... Tudo isso cativou as pessoas.

Como foi produzir o primeiro disco solo do Cazuza, ‘Exagerado’ (1985)?

Ele me procurou quando estava saindo do Barão Vermelho, disse que queria fazer uma mescla entre MPB e rock. O Cazuza era um cara muito divertido, era o próprio exagerado. Eu falei que queria fazer os arranjos. Então, me deram canções que não eram como ficaram no disco, por exemplo, Codinome Beija-flor. Subvertemos um pouco a canção original e levamos para o lado mais lúdico. Uma lembrança engraçada do Cazuza foi quando ele veio ao meu primeiro casamento, e chegou virado na igreja, de bermuda. Então, um amigo meu o levou até a cobertura dele para colocar uma calça jeans, senão não ia ter casamento. E o Cazuza me deu de presente a festa de casamento. Ele convidou Deus e o mundo.

Te impactou muito vê-lo doente?

Não, porque eu o via quase diariamente. A doença em si já era um choque. Na gravação da nossa música Sonho Estranho, eu ia ao hospital, levava o instrumento, tocava, ficava levando o som com ele, tudo para tentar deixar aquele desfecho menos dolorido. Ele foi um cara que brigou muito para viver e viveu intensamente.

Depois disso você gravou com Roberto Carlos. Era difícil lidar com ele?

Não, o Roberto sempre foi fácil, uma pessoa maravilhosa. Ele tinha algumas questões com as cores, coisas assim, mas nunca entrei nesse mérito com ele. Fazíamos a sessão de gravação e terminava, tipo, 22h. Ficávamos tomando drinks, às vezes o Erasmo [Carlos] aparecia. Escrevi um arranjo de metais para ele, na música Tô Chutando Lata [lançada em 1987]. E recentemente estive com Roberto no camarim do show dele no Rio. A primeira coisa que ele falou foi que naquela semana tinha escutado Tô Chutando Lata. Foi uma lembrança carinhosa.

É verdade que o Roberto tinha ciúmes do sucesso do Ritchie, outro músico com quem você trabalhou?

Correm histórias, e para dizer a verdade, eu não sei a verdade do que aconteceu. Sei que ele era o grande vendedor de discos da CBS na época, e claro, o Ritchie vendeu muito com Voo de Coração (1983), um álbum lindo. Mas não sei se teve algum estresse entre os dois. Sinceramente, não tenho essa informação.

Sobre o papel do compositor hoje em dia, você acha que virou uma atividade banalizada?

Olha, eu acho que a música vive um momento bem sofrível. Eu estava viajando hoje com o [Roberto] Menescal e conversamos sobre os perigos da inteligência artificial. As pessoas estão fazendo música com IA, e registrando em seu nome, editando. Então, é um futuro tenebroso que teremos pela frente. A música está muito banalizada no sentido melódico e harmônico, isso se repete e começa a ficar chato.

O que explica o sucesso do sertanejo e do funk no Brasil?

Primeiro, é a questão da educação. Não vivemos um bom momento em termos de escolarização. A internet também contribui muito para isso. Mas eu acho que a grande virada aconteceu nos anos 90. Antes dos anos 90 existiam festivais, onde as famílias se juntavam para escutar canções novas, aplaudir, torcer por uma canção. Os festivais eram muito saudáveis. A partir dos anos 90, quem estava no palco passou a ser apenas um contribuinte da festa (...) É uma conjuntura bastante problemática. Torcemos pelo resgate da boa música, da boa letra. Isso é uma questão de lutar. É a luta do bem contra o mal. Temos que estimular compositores, criar novos festivais. Estou com projetos no Rio nesse sentido. Quanto melhor a música, melhor para o mundo.

‘Dói mais teu silêncio que tua agressão’, cantou Nico Rezende em Esquece e Vem, uma das mais belas baladas brasileiras dos anos 1980, sucesso nas rádios e tema da novela O Outro, da Rede Globo.

Em celebração aos 40 anos de carreira do compositor e arranjador carioca, uma versão repaginada do hit – com participação da cantora Ive Greice – foi incluída no novo álbum Primeira Vez, já disponível ao público nas plataformas de streaming. Trata-se do 10º trabalho autoral de Rezende, reconhecido no cenário musical por parcerias memoráveis com Cazuza, Roberto Carlos, Ritchie, Gal Costa e Lulu Santos.

Em entrevista ao Estadão, por telefone, o artista de 64 anos, hábil para transitar entre jazz, pop e MPB, se mostrou entusiasmado com o lançamento e alertou para a superficialidade da música atual, além de comentar sobre as transformações no setor e projetar o futuro com pessimismo.

Nico fará um show comemorativo do projeto em São Paulo, no dia 11 de janeiro, no Blue Note.

O cantor e compositor Nico Rezende celebra 40 anos de carreira com o novo álbum 'Primeira Vez' Foto: Divulgação/Nico Rezende

Como surgiu a ideia do título do novo álbum, ‘Primeira Vez’?

É o título da canção mais recente do álbum, minha parceria com Nelson Motta. Estávamos ensaiando essa parceria há muito tempo. Ele ficou um tempo com uma melodia que mandei para ele, até que fez a letra, sobre um amor maduro como se fosse a primeira vez. É algo que ele realmente estava vivendo. Depois que eu tinha gravado as primeiras versões da canção, eu estava andando pela praia e vi o sol nascendo. Falei: ‘caramba, estou fazendo 40 anos de estrada e o sol está aqui nascendo como se fosse a primeira vez’. Foi daí que surgiu a ideia do título e da capa.

Por que você quis revisitar seu maior clássico, ‘Esquece e Vem’?

Gravei essa canção uns dois anos antes porque pintou uma parceria com a Rádio JB FM. Me convidaram pra fazer um quadro chamado JB Sessions, que é sempre um ‘feat’ no qual você convida alguém pra cantar com você. Decidi revisitar a música com minha amiga Ive Greice justamente para trazer, até para novas gerações, um clima mais lual, em uma versão mais despojada.

Musicalmente, quais aspectos fizeram a versão original ser um hit tão grande nos anos 80?

Ela era bem diferente do que se tocava no rádio. Começa com uma guitarra que vem lá de longe, é bem cinematográfica. E as pessoas se identificam muito com a frase de abertura: ‘dói mais o seu silêncio que a tua agressão’. Todo o desenvolvimento do arranjo, o baixo fretless, bem pop, minimalista. E eu estava com os músicos certos, na hora certa: Léo Gandelman, Torcuato Mariano, Arthur Maia... Tudo isso cativou as pessoas.

Como foi produzir o primeiro disco solo do Cazuza, ‘Exagerado’ (1985)?

Ele me procurou quando estava saindo do Barão Vermelho, disse que queria fazer uma mescla entre MPB e rock. O Cazuza era um cara muito divertido, era o próprio exagerado. Eu falei que queria fazer os arranjos. Então, me deram canções que não eram como ficaram no disco, por exemplo, Codinome Beija-flor. Subvertemos um pouco a canção original e levamos para o lado mais lúdico. Uma lembrança engraçada do Cazuza foi quando ele veio ao meu primeiro casamento, e chegou virado na igreja, de bermuda. Então, um amigo meu o levou até a cobertura dele para colocar uma calça jeans, senão não ia ter casamento. E o Cazuza me deu de presente a festa de casamento. Ele convidou Deus e o mundo.

Te impactou muito vê-lo doente?

Não, porque eu o via quase diariamente. A doença em si já era um choque. Na gravação da nossa música Sonho Estranho, eu ia ao hospital, levava o instrumento, tocava, ficava levando o som com ele, tudo para tentar deixar aquele desfecho menos dolorido. Ele foi um cara que brigou muito para viver e viveu intensamente.

Depois disso você gravou com Roberto Carlos. Era difícil lidar com ele?

Não, o Roberto sempre foi fácil, uma pessoa maravilhosa. Ele tinha algumas questões com as cores, coisas assim, mas nunca entrei nesse mérito com ele. Fazíamos a sessão de gravação e terminava, tipo, 22h. Ficávamos tomando drinks, às vezes o Erasmo [Carlos] aparecia. Escrevi um arranjo de metais para ele, na música Tô Chutando Lata [lançada em 1987]. E recentemente estive com Roberto no camarim do show dele no Rio. A primeira coisa que ele falou foi que naquela semana tinha escutado Tô Chutando Lata. Foi uma lembrança carinhosa.

É verdade que o Roberto tinha ciúmes do sucesso do Ritchie, outro músico com quem você trabalhou?

Correm histórias, e para dizer a verdade, eu não sei a verdade do que aconteceu. Sei que ele era o grande vendedor de discos da CBS na época, e claro, o Ritchie vendeu muito com Voo de Coração (1983), um álbum lindo. Mas não sei se teve algum estresse entre os dois. Sinceramente, não tenho essa informação.

Sobre o papel do compositor hoje em dia, você acha que virou uma atividade banalizada?

Olha, eu acho que a música vive um momento bem sofrível. Eu estava viajando hoje com o [Roberto] Menescal e conversamos sobre os perigos da inteligência artificial. As pessoas estão fazendo música com IA, e registrando em seu nome, editando. Então, é um futuro tenebroso que teremos pela frente. A música está muito banalizada no sentido melódico e harmônico, isso se repete e começa a ficar chato.

O que explica o sucesso do sertanejo e do funk no Brasil?

Primeiro, é a questão da educação. Não vivemos um bom momento em termos de escolarização. A internet também contribui muito para isso. Mas eu acho que a grande virada aconteceu nos anos 90. Antes dos anos 90 existiam festivais, onde as famílias se juntavam para escutar canções novas, aplaudir, torcer por uma canção. Os festivais eram muito saudáveis. A partir dos anos 90, quem estava no palco passou a ser apenas um contribuinte da festa (...) É uma conjuntura bastante problemática. Torcemos pelo resgate da boa música, da boa letra. Isso é uma questão de lutar. É a luta do bem contra o mal. Temos que estimular compositores, criar novos festivais. Estou com projetos no Rio nesse sentido. Quanto melhor a música, melhor para o mundo.

Entrevista por Gabriel Zorzetto

Repórter de Cultura do Estadão

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