'A Time For Love', disco cheio de exceções de Oscar Peterson, leva a uma viagem no tempo


Álbum do pianista canadense morto em 2007 já está disponível em plataformas de streaming de música

Por João Marcos Coelho
Atualização:

Uma viagem no tempo. Foi assim que soaram em meus ouvidos as quase duas horas de mainstream jazz de alta voltagem, comandadas por um dos mais virtuosos pianistas do século 20, o canadense Oscar Peterson (1925-2007), em Helsinki, na Finlândia. Era o último show de uma turnê europeia de outono, em 1987. A seu lado, outro gênio do jazz, de nome de batismo Joseph Anthony Passalacqua, mas que o mundo conheceu e reverenciou como Joe Pass (1929-1994), um dos mais refinados guitarristas do jazz, em sentido absoluto (às vezes ele me lembra outro músico de exceção, o notável Jim Hall, mas esta é outra história). O álbum, recém-lançado e já disponível, claro, nas plataformas de streaming, intitula-se A Time For Love.

Oscar Peterson em apresentação no Parque do Ibirapuera em 1998 Foto: Kathia Tamanaha/Estadão

É um reencontro para os que acompanharam a enxurrada de LPs e depois CDs do pianista preferencialmente nos formatos em trio ou em solo. Um site cataloga 572 álbuns. Oscar gravou bastante em duo com o próprio Pass, mas é rara em sua discografia a formação de trio clássico piano-contrabaixo-bateria mais guitarra.

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É um álbum cheio de exceções em relação aos temas que ele revisitou incessantemente ao longo de sua carreira. Como a faixa inicial, de quase 21 minutos, um tributo a Bach. Oscar intitulou-o A salute to Bach Medley. Você lê o título inteiro e logo pensa num “concerto” inspirado em Bach. Esqueça o “medley” do título. É bem mais do que mero pretexto para os improvisos. Ali há um belo solo inicial de piano, mas também jazz de primeira em quarteto, que de repente volta ao contraponto do piano solo e retorna ao leito sagrado do blues na “coda”. Entre parênteses, ele indicou os “movimentos”: Allegro; Andante; Bach’s; e Blues. Mas não há nenhum fio solto. A interligação é plena, o virtuosismo aqui está a serviço da musicalidade. Há momentos em trio e solos de Pass que são sua marca registrada: calmos, mas sempre intensos. E duos mostrando por que Oscar & Joe construíram algumas das performances mais emocionantes da música improvisada no século 20.

Entusiasmado diante destes dois iluminados, nem falei do contrabaixista e do baterista, ambos competentes e sabiamente discretos: Dave Young e Martin Drew. Curioso: a segunda faixa mais longa, 19 minutos, é um Duke Ellington Medley, e aqui estamos diante de um medley mesmo. Ele vai desfilando clássicos como C-Jam Blues e Caravan. Ouça com atenção como na altura dos 8 minutos Peterson e Pass se desafiam em breaks alternando solos de um de outro.

'A Time for Love', de Oscar Peterson, foi gravado em Helsinque Foto: Mack Avenue
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Os 10 minutos mais empolgantes destas duas horas acontecem quando cada um deles toca sozinho. Primeiro o toque preciso, macio, envolvente de Joe Pass na clássica canção When You Wish Upon a Star, de 1940, de Pinóquio, dos Estúdios Disney. Pass explora os intervalos-chaves da melodia, descarnados, até introduzir lentamente um balanço discretíssimo. Toca as notas principais da melodia e as ornamenta com buquês de notas intermediárias em torno da nota principal, as chamadas “appogiaturas”, como faziam os barrocos em seus improvisos. Estou ficando entusiasmado demais, mas parece um recitativo e ária. Em seguida, só um Oscar Peterson teria coragem de fazer um solo. E o que ele escolheu? Waltz for Debby, uma das assinaturas musicais de outro pianista de exceção, Bill Evans, nascido em 1929 como Pass e morto em 1980.

Aos que não o conhecem, também é um acréscimo obrigatório às suas centenas de gravações. Aposto que ouvi-los vai levar ouvidos deslumbrados para passeios por mais de 500 gravações. Entre elas, séries inteiras de piano solo. Aqui, ele mostra por que tocava toda manhã, para “acordar” os dedos, como disse em entrevistas, peças de Bach, Liszt, Ravel e outros “eruditos”. Claro, há muitos outros virtuoses, sobretudo no mundo clássico. Nenhum deles possui técnica superior à de Peterson. Nos domínios do jazz, porém, ele só teve uma alma gêmea, o lendário pianista negro cego Art Tatum (1910-1956), que em apenas 46 anos de vida varreu qualquer possível concorrência. Concorrente não, ídolo. Reza a lenda que o jovem Oscar Peterson tocava no Village Vanguard quando chegou Art Tatum. Ele imediatamente parou de tocar e reverenciou-o com estas palavras: “God is in the house”.

Uma viagem no tempo. Foi assim que soaram em meus ouvidos as quase duas horas de mainstream jazz de alta voltagem, comandadas por um dos mais virtuosos pianistas do século 20, o canadense Oscar Peterson (1925-2007), em Helsinki, na Finlândia. Era o último show de uma turnê europeia de outono, em 1987. A seu lado, outro gênio do jazz, de nome de batismo Joseph Anthony Passalacqua, mas que o mundo conheceu e reverenciou como Joe Pass (1929-1994), um dos mais refinados guitarristas do jazz, em sentido absoluto (às vezes ele me lembra outro músico de exceção, o notável Jim Hall, mas esta é outra história). O álbum, recém-lançado e já disponível, claro, nas plataformas de streaming, intitula-se A Time For Love.

Oscar Peterson em apresentação no Parque do Ibirapuera em 1998 Foto: Kathia Tamanaha/Estadão

É um reencontro para os que acompanharam a enxurrada de LPs e depois CDs do pianista preferencialmente nos formatos em trio ou em solo. Um site cataloga 572 álbuns. Oscar gravou bastante em duo com o próprio Pass, mas é rara em sua discografia a formação de trio clássico piano-contrabaixo-bateria mais guitarra.

É um álbum cheio de exceções em relação aos temas que ele revisitou incessantemente ao longo de sua carreira. Como a faixa inicial, de quase 21 minutos, um tributo a Bach. Oscar intitulou-o A salute to Bach Medley. Você lê o título inteiro e logo pensa num “concerto” inspirado em Bach. Esqueça o “medley” do título. É bem mais do que mero pretexto para os improvisos. Ali há um belo solo inicial de piano, mas também jazz de primeira em quarteto, que de repente volta ao contraponto do piano solo e retorna ao leito sagrado do blues na “coda”. Entre parênteses, ele indicou os “movimentos”: Allegro; Andante; Bach’s; e Blues. Mas não há nenhum fio solto. A interligação é plena, o virtuosismo aqui está a serviço da musicalidade. Há momentos em trio e solos de Pass que são sua marca registrada: calmos, mas sempre intensos. E duos mostrando por que Oscar & Joe construíram algumas das performances mais emocionantes da música improvisada no século 20.

Entusiasmado diante destes dois iluminados, nem falei do contrabaixista e do baterista, ambos competentes e sabiamente discretos: Dave Young e Martin Drew. Curioso: a segunda faixa mais longa, 19 minutos, é um Duke Ellington Medley, e aqui estamos diante de um medley mesmo. Ele vai desfilando clássicos como C-Jam Blues e Caravan. Ouça com atenção como na altura dos 8 minutos Peterson e Pass se desafiam em breaks alternando solos de um de outro.

'A Time for Love', de Oscar Peterson, foi gravado em Helsinque Foto: Mack Avenue

Os 10 minutos mais empolgantes destas duas horas acontecem quando cada um deles toca sozinho. Primeiro o toque preciso, macio, envolvente de Joe Pass na clássica canção When You Wish Upon a Star, de 1940, de Pinóquio, dos Estúdios Disney. Pass explora os intervalos-chaves da melodia, descarnados, até introduzir lentamente um balanço discretíssimo. Toca as notas principais da melodia e as ornamenta com buquês de notas intermediárias em torno da nota principal, as chamadas “appogiaturas”, como faziam os barrocos em seus improvisos. Estou ficando entusiasmado demais, mas parece um recitativo e ária. Em seguida, só um Oscar Peterson teria coragem de fazer um solo. E o que ele escolheu? Waltz for Debby, uma das assinaturas musicais de outro pianista de exceção, Bill Evans, nascido em 1929 como Pass e morto em 1980.

Aos que não o conhecem, também é um acréscimo obrigatório às suas centenas de gravações. Aposto que ouvi-los vai levar ouvidos deslumbrados para passeios por mais de 500 gravações. Entre elas, séries inteiras de piano solo. Aqui, ele mostra por que tocava toda manhã, para “acordar” os dedos, como disse em entrevistas, peças de Bach, Liszt, Ravel e outros “eruditos”. Claro, há muitos outros virtuoses, sobretudo no mundo clássico. Nenhum deles possui técnica superior à de Peterson. Nos domínios do jazz, porém, ele só teve uma alma gêmea, o lendário pianista negro cego Art Tatum (1910-1956), que em apenas 46 anos de vida varreu qualquer possível concorrência. Concorrente não, ídolo. Reza a lenda que o jovem Oscar Peterson tocava no Village Vanguard quando chegou Art Tatum. Ele imediatamente parou de tocar e reverenciou-o com estas palavras: “God is in the house”.

Uma viagem no tempo. Foi assim que soaram em meus ouvidos as quase duas horas de mainstream jazz de alta voltagem, comandadas por um dos mais virtuosos pianistas do século 20, o canadense Oscar Peterson (1925-2007), em Helsinki, na Finlândia. Era o último show de uma turnê europeia de outono, em 1987. A seu lado, outro gênio do jazz, de nome de batismo Joseph Anthony Passalacqua, mas que o mundo conheceu e reverenciou como Joe Pass (1929-1994), um dos mais refinados guitarristas do jazz, em sentido absoluto (às vezes ele me lembra outro músico de exceção, o notável Jim Hall, mas esta é outra história). O álbum, recém-lançado e já disponível, claro, nas plataformas de streaming, intitula-se A Time For Love.

Oscar Peterson em apresentação no Parque do Ibirapuera em 1998 Foto: Kathia Tamanaha/Estadão

É um reencontro para os que acompanharam a enxurrada de LPs e depois CDs do pianista preferencialmente nos formatos em trio ou em solo. Um site cataloga 572 álbuns. Oscar gravou bastante em duo com o próprio Pass, mas é rara em sua discografia a formação de trio clássico piano-contrabaixo-bateria mais guitarra.

É um álbum cheio de exceções em relação aos temas que ele revisitou incessantemente ao longo de sua carreira. Como a faixa inicial, de quase 21 minutos, um tributo a Bach. Oscar intitulou-o A salute to Bach Medley. Você lê o título inteiro e logo pensa num “concerto” inspirado em Bach. Esqueça o “medley” do título. É bem mais do que mero pretexto para os improvisos. Ali há um belo solo inicial de piano, mas também jazz de primeira em quarteto, que de repente volta ao contraponto do piano solo e retorna ao leito sagrado do blues na “coda”. Entre parênteses, ele indicou os “movimentos”: Allegro; Andante; Bach’s; e Blues. Mas não há nenhum fio solto. A interligação é plena, o virtuosismo aqui está a serviço da musicalidade. Há momentos em trio e solos de Pass que são sua marca registrada: calmos, mas sempre intensos. E duos mostrando por que Oscar & Joe construíram algumas das performances mais emocionantes da música improvisada no século 20.

Entusiasmado diante destes dois iluminados, nem falei do contrabaixista e do baterista, ambos competentes e sabiamente discretos: Dave Young e Martin Drew. Curioso: a segunda faixa mais longa, 19 minutos, é um Duke Ellington Medley, e aqui estamos diante de um medley mesmo. Ele vai desfilando clássicos como C-Jam Blues e Caravan. Ouça com atenção como na altura dos 8 minutos Peterson e Pass se desafiam em breaks alternando solos de um de outro.

'A Time for Love', de Oscar Peterson, foi gravado em Helsinque Foto: Mack Avenue

Os 10 minutos mais empolgantes destas duas horas acontecem quando cada um deles toca sozinho. Primeiro o toque preciso, macio, envolvente de Joe Pass na clássica canção When You Wish Upon a Star, de 1940, de Pinóquio, dos Estúdios Disney. Pass explora os intervalos-chaves da melodia, descarnados, até introduzir lentamente um balanço discretíssimo. Toca as notas principais da melodia e as ornamenta com buquês de notas intermediárias em torno da nota principal, as chamadas “appogiaturas”, como faziam os barrocos em seus improvisos. Estou ficando entusiasmado demais, mas parece um recitativo e ária. Em seguida, só um Oscar Peterson teria coragem de fazer um solo. E o que ele escolheu? Waltz for Debby, uma das assinaturas musicais de outro pianista de exceção, Bill Evans, nascido em 1929 como Pass e morto em 1980.

Aos que não o conhecem, também é um acréscimo obrigatório às suas centenas de gravações. Aposto que ouvi-los vai levar ouvidos deslumbrados para passeios por mais de 500 gravações. Entre elas, séries inteiras de piano solo. Aqui, ele mostra por que tocava toda manhã, para “acordar” os dedos, como disse em entrevistas, peças de Bach, Liszt, Ravel e outros “eruditos”. Claro, há muitos outros virtuoses, sobretudo no mundo clássico. Nenhum deles possui técnica superior à de Peterson. Nos domínios do jazz, porém, ele só teve uma alma gêmea, o lendário pianista negro cego Art Tatum (1910-1956), que em apenas 46 anos de vida varreu qualquer possível concorrência. Concorrente não, ídolo. Reza a lenda que o jovem Oscar Peterson tocava no Village Vanguard quando chegou Art Tatum. Ele imediatamente parou de tocar e reverenciou-o com estas palavras: “God is in the house”.

Uma viagem no tempo. Foi assim que soaram em meus ouvidos as quase duas horas de mainstream jazz de alta voltagem, comandadas por um dos mais virtuosos pianistas do século 20, o canadense Oscar Peterson (1925-2007), em Helsinki, na Finlândia. Era o último show de uma turnê europeia de outono, em 1987. A seu lado, outro gênio do jazz, de nome de batismo Joseph Anthony Passalacqua, mas que o mundo conheceu e reverenciou como Joe Pass (1929-1994), um dos mais refinados guitarristas do jazz, em sentido absoluto (às vezes ele me lembra outro músico de exceção, o notável Jim Hall, mas esta é outra história). O álbum, recém-lançado e já disponível, claro, nas plataformas de streaming, intitula-se A Time For Love.

Oscar Peterson em apresentação no Parque do Ibirapuera em 1998 Foto: Kathia Tamanaha/Estadão

É um reencontro para os que acompanharam a enxurrada de LPs e depois CDs do pianista preferencialmente nos formatos em trio ou em solo. Um site cataloga 572 álbuns. Oscar gravou bastante em duo com o próprio Pass, mas é rara em sua discografia a formação de trio clássico piano-contrabaixo-bateria mais guitarra.

É um álbum cheio de exceções em relação aos temas que ele revisitou incessantemente ao longo de sua carreira. Como a faixa inicial, de quase 21 minutos, um tributo a Bach. Oscar intitulou-o A salute to Bach Medley. Você lê o título inteiro e logo pensa num “concerto” inspirado em Bach. Esqueça o “medley” do título. É bem mais do que mero pretexto para os improvisos. Ali há um belo solo inicial de piano, mas também jazz de primeira em quarteto, que de repente volta ao contraponto do piano solo e retorna ao leito sagrado do blues na “coda”. Entre parênteses, ele indicou os “movimentos”: Allegro; Andante; Bach’s; e Blues. Mas não há nenhum fio solto. A interligação é plena, o virtuosismo aqui está a serviço da musicalidade. Há momentos em trio e solos de Pass que são sua marca registrada: calmos, mas sempre intensos. E duos mostrando por que Oscar & Joe construíram algumas das performances mais emocionantes da música improvisada no século 20.

Entusiasmado diante destes dois iluminados, nem falei do contrabaixista e do baterista, ambos competentes e sabiamente discretos: Dave Young e Martin Drew. Curioso: a segunda faixa mais longa, 19 minutos, é um Duke Ellington Medley, e aqui estamos diante de um medley mesmo. Ele vai desfilando clássicos como C-Jam Blues e Caravan. Ouça com atenção como na altura dos 8 minutos Peterson e Pass se desafiam em breaks alternando solos de um de outro.

'A Time for Love', de Oscar Peterson, foi gravado em Helsinque Foto: Mack Avenue

Os 10 minutos mais empolgantes destas duas horas acontecem quando cada um deles toca sozinho. Primeiro o toque preciso, macio, envolvente de Joe Pass na clássica canção When You Wish Upon a Star, de 1940, de Pinóquio, dos Estúdios Disney. Pass explora os intervalos-chaves da melodia, descarnados, até introduzir lentamente um balanço discretíssimo. Toca as notas principais da melodia e as ornamenta com buquês de notas intermediárias em torno da nota principal, as chamadas “appogiaturas”, como faziam os barrocos em seus improvisos. Estou ficando entusiasmado demais, mas parece um recitativo e ária. Em seguida, só um Oscar Peterson teria coragem de fazer um solo. E o que ele escolheu? Waltz for Debby, uma das assinaturas musicais de outro pianista de exceção, Bill Evans, nascido em 1929 como Pass e morto em 1980.

Aos que não o conhecem, também é um acréscimo obrigatório às suas centenas de gravações. Aposto que ouvi-los vai levar ouvidos deslumbrados para passeios por mais de 500 gravações. Entre elas, séries inteiras de piano solo. Aqui, ele mostra por que tocava toda manhã, para “acordar” os dedos, como disse em entrevistas, peças de Bach, Liszt, Ravel e outros “eruditos”. Claro, há muitos outros virtuoses, sobretudo no mundo clássico. Nenhum deles possui técnica superior à de Peterson. Nos domínios do jazz, porém, ele só teve uma alma gêmea, o lendário pianista negro cego Art Tatum (1910-1956), que em apenas 46 anos de vida varreu qualquer possível concorrência. Concorrente não, ídolo. Reza a lenda que o jovem Oscar Peterson tocava no Village Vanguard quando chegou Art Tatum. Ele imediatamente parou de tocar e reverenciou-o com estas palavras: “God is in the house”.

Uma viagem no tempo. Foi assim que soaram em meus ouvidos as quase duas horas de mainstream jazz de alta voltagem, comandadas por um dos mais virtuosos pianistas do século 20, o canadense Oscar Peterson (1925-2007), em Helsinki, na Finlândia. Era o último show de uma turnê europeia de outono, em 1987. A seu lado, outro gênio do jazz, de nome de batismo Joseph Anthony Passalacqua, mas que o mundo conheceu e reverenciou como Joe Pass (1929-1994), um dos mais refinados guitarristas do jazz, em sentido absoluto (às vezes ele me lembra outro músico de exceção, o notável Jim Hall, mas esta é outra história). O álbum, recém-lançado e já disponível, claro, nas plataformas de streaming, intitula-se A Time For Love.

Oscar Peterson em apresentação no Parque do Ibirapuera em 1998 Foto: Kathia Tamanaha/Estadão

É um reencontro para os que acompanharam a enxurrada de LPs e depois CDs do pianista preferencialmente nos formatos em trio ou em solo. Um site cataloga 572 álbuns. Oscar gravou bastante em duo com o próprio Pass, mas é rara em sua discografia a formação de trio clássico piano-contrabaixo-bateria mais guitarra.

É um álbum cheio de exceções em relação aos temas que ele revisitou incessantemente ao longo de sua carreira. Como a faixa inicial, de quase 21 minutos, um tributo a Bach. Oscar intitulou-o A salute to Bach Medley. Você lê o título inteiro e logo pensa num “concerto” inspirado em Bach. Esqueça o “medley” do título. É bem mais do que mero pretexto para os improvisos. Ali há um belo solo inicial de piano, mas também jazz de primeira em quarteto, que de repente volta ao contraponto do piano solo e retorna ao leito sagrado do blues na “coda”. Entre parênteses, ele indicou os “movimentos”: Allegro; Andante; Bach’s; e Blues. Mas não há nenhum fio solto. A interligação é plena, o virtuosismo aqui está a serviço da musicalidade. Há momentos em trio e solos de Pass que são sua marca registrada: calmos, mas sempre intensos. E duos mostrando por que Oscar & Joe construíram algumas das performances mais emocionantes da música improvisada no século 20.

Entusiasmado diante destes dois iluminados, nem falei do contrabaixista e do baterista, ambos competentes e sabiamente discretos: Dave Young e Martin Drew. Curioso: a segunda faixa mais longa, 19 minutos, é um Duke Ellington Medley, e aqui estamos diante de um medley mesmo. Ele vai desfilando clássicos como C-Jam Blues e Caravan. Ouça com atenção como na altura dos 8 minutos Peterson e Pass se desafiam em breaks alternando solos de um de outro.

'A Time for Love', de Oscar Peterson, foi gravado em Helsinque Foto: Mack Avenue

Os 10 minutos mais empolgantes destas duas horas acontecem quando cada um deles toca sozinho. Primeiro o toque preciso, macio, envolvente de Joe Pass na clássica canção When You Wish Upon a Star, de 1940, de Pinóquio, dos Estúdios Disney. Pass explora os intervalos-chaves da melodia, descarnados, até introduzir lentamente um balanço discretíssimo. Toca as notas principais da melodia e as ornamenta com buquês de notas intermediárias em torno da nota principal, as chamadas “appogiaturas”, como faziam os barrocos em seus improvisos. Estou ficando entusiasmado demais, mas parece um recitativo e ária. Em seguida, só um Oscar Peterson teria coragem de fazer um solo. E o que ele escolheu? Waltz for Debby, uma das assinaturas musicais de outro pianista de exceção, Bill Evans, nascido em 1929 como Pass e morto em 1980.

Aos que não o conhecem, também é um acréscimo obrigatório às suas centenas de gravações. Aposto que ouvi-los vai levar ouvidos deslumbrados para passeios por mais de 500 gravações. Entre elas, séries inteiras de piano solo. Aqui, ele mostra por que tocava toda manhã, para “acordar” os dedos, como disse em entrevistas, peças de Bach, Liszt, Ravel e outros “eruditos”. Claro, há muitos outros virtuoses, sobretudo no mundo clássico. Nenhum deles possui técnica superior à de Peterson. Nos domínios do jazz, porém, ele só teve uma alma gêmea, o lendário pianista negro cego Art Tatum (1910-1956), que em apenas 46 anos de vida varreu qualquer possível concorrência. Concorrente não, ídolo. Reza a lenda que o jovem Oscar Peterson tocava no Village Vanguard quando chegou Art Tatum. Ele imediatamente parou de tocar e reverenciou-o com estas palavras: “God is in the house”.

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