Análise: Luiz Melodia, um tropicalista dos morros


Ao surgir com seu primeiro álbum, em 1973, artista já deixava evidente seu campo de atuação absolutamente fora dos padrões

Por Julio Maria
Atualização:

"Como assim, o rapaz é negro, desce do morro do Estácio e não é sambista?". Um jornalista do qual Luiz Melodia não citava o nome o recebeu assim em 1973, quando ouviu o que ele poderia fazer ao lançar o álbum Pérola Negra, sua estreia, pela Philips. Eram anos de liberdade criativa mesmo nas gravadoras, de produção livre e "orgânica", de colocar para fora tudo o que bossistas, jovem guardistas e tropicalistas haviam deixado de legado na década anterior.

Melodia surge como o filho mais bem acabado do espírito tropicalista do 'tudo é possível'. Não por acaso, se aproximou de mentes livres como Waly Salomão, Torquato Neto e Helio Oiticica. Gravou rock, samba, samba rock e todo o universo que existe entre os dois. O preconceito despejado na infeliz frase do jornalista carioca era sinal do embaralhamento que aquela imagem cheia de atitude poderia causar. Não havia como classificar Melodia. E Pérola Negra, um dos grandes álbuns da música brasileira percebido assim logo de cara, não deixava dúvidas de que Melodia era um nome incontornável. Era preciso falar sobre ele. 

Luiz Melodia no dia 23 de abril de 2008 Foto: TASSO MARCELO/ESTADÃO
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Melodia explicava aos jornalistas que se debruçavam para saber de onde vinham tantas informações na música de um homem que parecia predestinado ao samba. "Eu ouvia tudo isso no rádio e talvez tenha sido isso o motivo dos discos que até hoje gravo, sempre com variedade, desde o rock, o pop. Eu sempre tive essa malícia pra poder passar para os discos que eu componho." Jazz e blues, idiomas que aprendeu, já eram presentes em criações iniciais como a própria Pérola Negra e em Magrelinha (basta ouvir as frases de guitarra blues de Perinho Albuquerque). "Uma vez vi minha mulher conversando com meu filho: 'Você já ouviu seu pai cantando blues? É genial.'" Ele mesmo se surpreendeu até identificar o quanto blues eram suas abordagens. Mas o mesmo disco tinha também Forró de Janeiro, com acordeon de Dominguinhos. O tropicalismo, definitivamente, havia subido o morro.

De fala curta e objetiva, olhar cortante para entender a pergunta antes de respondê-la, Melodia gostava de exercer o controle da situação e o distanciamento profissional diante de jornalistas. "Não faço ideia do que você está falando", respondeu a um deles quando perguntado se a imagem de 'maldito' por parte da mídia não o havia prejudicado. Respondia que sempre fez os discos que gostaria de ter feito, sem jamais deixar sair de si o Estácio que o havia ensinado tanto. Falava por si e olhava para os lados, sem medo de esfriar a festa quando preciso. Em 2014, em pleno palco Julio Prestes, na Virada Cultural, foi o único a lembrar que estavam todos ali em um território marcado pela calamidade humana. "Vamos olhar por esse pessoal que está nessa dependência dessa droga filha da p.. Qualquer ajuda é importante." Disse isso e cantou Magrelinha aos agoniados do crack.

"Como assim, o rapaz é negro, desce do morro do Estácio e não é sambista?". Um jornalista do qual Luiz Melodia não citava o nome o recebeu assim em 1973, quando ouviu o que ele poderia fazer ao lançar o álbum Pérola Negra, sua estreia, pela Philips. Eram anos de liberdade criativa mesmo nas gravadoras, de produção livre e "orgânica", de colocar para fora tudo o que bossistas, jovem guardistas e tropicalistas haviam deixado de legado na década anterior.

Melodia surge como o filho mais bem acabado do espírito tropicalista do 'tudo é possível'. Não por acaso, se aproximou de mentes livres como Waly Salomão, Torquato Neto e Helio Oiticica. Gravou rock, samba, samba rock e todo o universo que existe entre os dois. O preconceito despejado na infeliz frase do jornalista carioca era sinal do embaralhamento que aquela imagem cheia de atitude poderia causar. Não havia como classificar Melodia. E Pérola Negra, um dos grandes álbuns da música brasileira percebido assim logo de cara, não deixava dúvidas de que Melodia era um nome incontornável. Era preciso falar sobre ele. 

Luiz Melodia no dia 23 de abril de 2008 Foto: TASSO MARCELO/ESTADÃO

Melodia explicava aos jornalistas que se debruçavam para saber de onde vinham tantas informações na música de um homem que parecia predestinado ao samba. "Eu ouvia tudo isso no rádio e talvez tenha sido isso o motivo dos discos que até hoje gravo, sempre com variedade, desde o rock, o pop. Eu sempre tive essa malícia pra poder passar para os discos que eu componho." Jazz e blues, idiomas que aprendeu, já eram presentes em criações iniciais como a própria Pérola Negra e em Magrelinha (basta ouvir as frases de guitarra blues de Perinho Albuquerque). "Uma vez vi minha mulher conversando com meu filho: 'Você já ouviu seu pai cantando blues? É genial.'" Ele mesmo se surpreendeu até identificar o quanto blues eram suas abordagens. Mas o mesmo disco tinha também Forró de Janeiro, com acordeon de Dominguinhos. O tropicalismo, definitivamente, havia subido o morro.

De fala curta e objetiva, olhar cortante para entender a pergunta antes de respondê-la, Melodia gostava de exercer o controle da situação e o distanciamento profissional diante de jornalistas. "Não faço ideia do que você está falando", respondeu a um deles quando perguntado se a imagem de 'maldito' por parte da mídia não o havia prejudicado. Respondia que sempre fez os discos que gostaria de ter feito, sem jamais deixar sair de si o Estácio que o havia ensinado tanto. Falava por si e olhava para os lados, sem medo de esfriar a festa quando preciso. Em 2014, em pleno palco Julio Prestes, na Virada Cultural, foi o único a lembrar que estavam todos ali em um território marcado pela calamidade humana. "Vamos olhar por esse pessoal que está nessa dependência dessa droga filha da p.. Qualquer ajuda é importante." Disse isso e cantou Magrelinha aos agoniados do crack.

"Como assim, o rapaz é negro, desce do morro do Estácio e não é sambista?". Um jornalista do qual Luiz Melodia não citava o nome o recebeu assim em 1973, quando ouviu o que ele poderia fazer ao lançar o álbum Pérola Negra, sua estreia, pela Philips. Eram anos de liberdade criativa mesmo nas gravadoras, de produção livre e "orgânica", de colocar para fora tudo o que bossistas, jovem guardistas e tropicalistas haviam deixado de legado na década anterior.

Melodia surge como o filho mais bem acabado do espírito tropicalista do 'tudo é possível'. Não por acaso, se aproximou de mentes livres como Waly Salomão, Torquato Neto e Helio Oiticica. Gravou rock, samba, samba rock e todo o universo que existe entre os dois. O preconceito despejado na infeliz frase do jornalista carioca era sinal do embaralhamento que aquela imagem cheia de atitude poderia causar. Não havia como classificar Melodia. E Pérola Negra, um dos grandes álbuns da música brasileira percebido assim logo de cara, não deixava dúvidas de que Melodia era um nome incontornável. Era preciso falar sobre ele. 

Luiz Melodia no dia 23 de abril de 2008 Foto: TASSO MARCELO/ESTADÃO

Melodia explicava aos jornalistas que se debruçavam para saber de onde vinham tantas informações na música de um homem que parecia predestinado ao samba. "Eu ouvia tudo isso no rádio e talvez tenha sido isso o motivo dos discos que até hoje gravo, sempre com variedade, desde o rock, o pop. Eu sempre tive essa malícia pra poder passar para os discos que eu componho." Jazz e blues, idiomas que aprendeu, já eram presentes em criações iniciais como a própria Pérola Negra e em Magrelinha (basta ouvir as frases de guitarra blues de Perinho Albuquerque). "Uma vez vi minha mulher conversando com meu filho: 'Você já ouviu seu pai cantando blues? É genial.'" Ele mesmo se surpreendeu até identificar o quanto blues eram suas abordagens. Mas o mesmo disco tinha também Forró de Janeiro, com acordeon de Dominguinhos. O tropicalismo, definitivamente, havia subido o morro.

De fala curta e objetiva, olhar cortante para entender a pergunta antes de respondê-la, Melodia gostava de exercer o controle da situação e o distanciamento profissional diante de jornalistas. "Não faço ideia do que você está falando", respondeu a um deles quando perguntado se a imagem de 'maldito' por parte da mídia não o havia prejudicado. Respondia que sempre fez os discos que gostaria de ter feito, sem jamais deixar sair de si o Estácio que o havia ensinado tanto. Falava por si e olhava para os lados, sem medo de esfriar a festa quando preciso. Em 2014, em pleno palco Julio Prestes, na Virada Cultural, foi o único a lembrar que estavam todos ali em um território marcado pela calamidade humana. "Vamos olhar por esse pessoal que está nessa dependência dessa droga filha da p.. Qualquer ajuda é importante." Disse isso e cantou Magrelinha aos agoniados do crack.

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