Paul McCartney, aos 81 anos, encerra turnê no Rio sugerindo novo reencontro


No último espetáculo desta passagem pelo Brasil, o ex-beatle prometeu futuros encontros, afastando rumores de aposentadoria

Por Pedro Só
Atualização:

“Até a próxima. Fui! See you next time!” Assim, misturando português e inglês, Paul McCartney, de 81 anos, se despediu do último show da turnê Got Back, no Maracanã, no Rio, na noite deste sábado, 16, dissipando boatos sobre uma suposta aposentadoria dos palcos que seria anunciada.

Não era exatamente o mesmo estádio em que se apresentou pela primeira vez no Brasil, em abril de 1990 — a reforma para a Copa do Mundo de 2014 demoliu inteiramente a cobertura característica do estádio. E, de fato, o retorno do ex-beatle ao local, para fazer sua 36ª apresentação em solo brasileiro, pouco teve de fechamento de ciclo. Pelo contrário, a impressão que deixa é de ciclo a ser renovado.

No ano passado, ao lançar a turnê Got Back, Paul divulgou uma declaração realçando a mesma expressão que usou no Rio de Janeiro: “Ao fim da turnê passada, eu disse ‘vejo vocês na próxima vez’. Eu disse que iria voltar para vocês. Bem, eu voltei!”

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Com a barba por fazer, revelando fios brancos, e a capacidade vocal afetada, mas nem de longe comprometida pela idade, ele entreteve e comoveu os 66 mil presentes durante mais de duas horas e meia (151 minutos, incluindo o caprichado bis). Começou às 21h03, encerrou às 23h34.

O repertório, é verdade, inclui várias escolhas idiossincráticas, músicas que não entrariam numa lista top 100 das composições de McCartney, seja solo, com os Beatles ou na fase Wings.

Mas o espetáculo é montado, acima de tudo, para divertir, com espaço para interações que colocam o público como coadjuvante, ao segurar balões iluminados por celulares durante “Ob-La-Di, Ob-La-Da”, e os já tradicionais cartazes com “Na Na Na” exibidos durante o refrão prolongado de “Hey Jude”. Não falta o momento TikTok, “Dance Tonight”, quando o baterista Abe Laboriel Jr. se solta em coreografias infantis — rola até uma do game Fortnite.

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Paul McCartney em Turnê Got Back durante show, no Estádio do Maracanã  Foto: Pedro Kirilos/Estadão

Além da excelência musical (cantando e tocando o legendário baixo Hofner, guitarras, violão, ukulele, piano e órgão), o ex-beatle é um animador de plateias gigantes imensamente talentoso. Instiga, conversa, rege coros, responde às declarações de amor (curiosamente não entendeu quando surgiu o coro “eu te amo”, mas a massa tratou de traduzir “we love you”, ganhando logo um “I love you back”) e se supera no uso de gírias e expressões locais.

Abriu com “Can’t Buy Me Love” (que costuma revezar com “A Hard Day’s Night” nos setlists) e emendou com duas canções dos tempos setentistas de Wings, com sabor mais americanizado (natural, pois seus dois principais sidemen são californianos: o guitarrista Rusty Anderson e o baixista e guitarrista Brian Ray): “Junior’s Farm” e “Letting Go”. Entre uma e outra, cumprimentou a massa com um “qualé, cariocas?”. Antes de “She’s a Woman”, a segunda pepita beatle da noite, avisou, fofo: “Esta noite vou tentar falar um pouquinho de português. Um pouquinho”.

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Ao longo do show, elogiou as reações do público com um “irado!” e, após “Lady Madonna”, repetiu o bordão “o pai tá on”, usado nos shows em São Paulo. O melhor gracejo com sabor local ficou para depois de “Ob-La-Di, Ob-La-Da”: “Arrá, urrú, o Maraca é nosso”, reproduzindo um clássico grito das arquibancadas. “Obrigado por esses balões. Muito Disney”, emendou, talvez com ironia, mas fazendo um merchanzinho para a empresa que transmitiu o show por streaming.

Paul McCartney afastou boatos de aposentadoria e prometeu reencontro Foto: Pedro Kirilos/Estadão
Paul McCartney encantou 66 mil fãs no Maracanã em mais de duas horas e meia de show Foto: Pedro Kirilos/Estadão
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Já no bis — iniciado com dueto virtual com John Lennon, em “I’ve Got a Feeling” e o populismo pop de “Birthday” —, depois do tour de force de “Helter Skelter”, ao qual se entrega destemido, com energia incrível, Paul anuncia, em português de quem já tem certa quilometragem brasileira: “Agora é hora de vazar. Gotta vazar”.

Antes de ser Sir, astro de fama mundial, ele é um músico com ética de trabalho, egresso de uma banda de rock moldada pela vivência nos bares portuários de Hamburgo, na Alemanha. Nessas espeluncas, ele e outros rapazes humildes de Liverpool eram obrigados a dar tudo para conquistar a atenção de sujeitos que tinham entrado ali para ver strip-tease. O espírito beatle é crowdpleaser mesmo. Antes de fazer seu “get back” final, Paul ainda emocionou a todos com a clássica “Carry that weight”, seguida pela inevitável “The End”.

Nascido em 1942, em uma safra que precede a dos chamados baby boomers, Paul McCartney é parte de uma geração que mudou o mundo nos anos 1960. Agora, quase seis décadas depois, segue transformando a visão do que um homem de sua idade é capaz de fazer.

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Sozinho ao violão, em uma estrutura elevada, cantando e tocando seu grande clássico “Blackbird”, ele aparece como gigante da canção popular que é. Comandando os hits de arena dos Wings como “Let Me Roll It” e “Jet” (dedicado ao parceiro de grupo Denny Laine, morto em 5 de dezembro), Paul canta o que é possível, com total autoridade e entrega rock’n’roll.

Não faz sentido comparar com o vocalista destemido que registrou isso tudo em estúdio — e que começou a carreira, vale lembrar, imitando o inimitável Little Richard no estilo “dedo no piano e gritaria”.

Como um craque experiente, Paul pareceu ter guardado forças para as notas mais difíceis de “Maybe I’m Amazed”, uma de suas mais reluzentes jóias melódicas. Para muitos da plateia, que incluía na ala vip Milton Nascimento, Gilberto Gil e Jards Macalé, foi o ponto alto dessa noite carioca de 16 de dezembro de 2023, capaz de afastar por algumas horas a tristeza pela perda, horas antes, de outro gigante da melodia, o carioca Carlos Lyra.

“Até a próxima. Fui! See you next time!” Assim, misturando português e inglês, Paul McCartney, de 81 anos, se despediu do último show da turnê Got Back, no Maracanã, no Rio, na noite deste sábado, 16, dissipando boatos sobre uma suposta aposentadoria dos palcos que seria anunciada.

Não era exatamente o mesmo estádio em que se apresentou pela primeira vez no Brasil, em abril de 1990 — a reforma para a Copa do Mundo de 2014 demoliu inteiramente a cobertura característica do estádio. E, de fato, o retorno do ex-beatle ao local, para fazer sua 36ª apresentação em solo brasileiro, pouco teve de fechamento de ciclo. Pelo contrário, a impressão que deixa é de ciclo a ser renovado.

No ano passado, ao lançar a turnê Got Back, Paul divulgou uma declaração realçando a mesma expressão que usou no Rio de Janeiro: “Ao fim da turnê passada, eu disse ‘vejo vocês na próxima vez’. Eu disse que iria voltar para vocês. Bem, eu voltei!”

Com a barba por fazer, revelando fios brancos, e a capacidade vocal afetada, mas nem de longe comprometida pela idade, ele entreteve e comoveu os 66 mil presentes durante mais de duas horas e meia (151 minutos, incluindo o caprichado bis). Começou às 21h03, encerrou às 23h34.

O repertório, é verdade, inclui várias escolhas idiossincráticas, músicas que não entrariam numa lista top 100 das composições de McCartney, seja solo, com os Beatles ou na fase Wings.

Mas o espetáculo é montado, acima de tudo, para divertir, com espaço para interações que colocam o público como coadjuvante, ao segurar balões iluminados por celulares durante “Ob-La-Di, Ob-La-Da”, e os já tradicionais cartazes com “Na Na Na” exibidos durante o refrão prolongado de “Hey Jude”. Não falta o momento TikTok, “Dance Tonight”, quando o baterista Abe Laboriel Jr. se solta em coreografias infantis — rola até uma do game Fortnite.

Paul McCartney em Turnê Got Back durante show, no Estádio do Maracanã  Foto: Pedro Kirilos/Estadão

Além da excelência musical (cantando e tocando o legendário baixo Hofner, guitarras, violão, ukulele, piano e órgão), o ex-beatle é um animador de plateias gigantes imensamente talentoso. Instiga, conversa, rege coros, responde às declarações de amor (curiosamente não entendeu quando surgiu o coro “eu te amo”, mas a massa tratou de traduzir “we love you”, ganhando logo um “I love you back”) e se supera no uso de gírias e expressões locais.

Abriu com “Can’t Buy Me Love” (que costuma revezar com “A Hard Day’s Night” nos setlists) e emendou com duas canções dos tempos setentistas de Wings, com sabor mais americanizado (natural, pois seus dois principais sidemen são californianos: o guitarrista Rusty Anderson e o baixista e guitarrista Brian Ray): “Junior’s Farm” e “Letting Go”. Entre uma e outra, cumprimentou a massa com um “qualé, cariocas?”. Antes de “She’s a Woman”, a segunda pepita beatle da noite, avisou, fofo: “Esta noite vou tentar falar um pouquinho de português. Um pouquinho”.

Ao longo do show, elogiou as reações do público com um “irado!” e, após “Lady Madonna”, repetiu o bordão “o pai tá on”, usado nos shows em São Paulo. O melhor gracejo com sabor local ficou para depois de “Ob-La-Di, Ob-La-Da”: “Arrá, urrú, o Maraca é nosso”, reproduzindo um clássico grito das arquibancadas. “Obrigado por esses balões. Muito Disney”, emendou, talvez com ironia, mas fazendo um merchanzinho para a empresa que transmitiu o show por streaming.

Paul McCartney afastou boatos de aposentadoria e prometeu reencontro Foto: Pedro Kirilos/Estadão
Paul McCartney encantou 66 mil fãs no Maracanã em mais de duas horas e meia de show Foto: Pedro Kirilos/Estadão

Já no bis — iniciado com dueto virtual com John Lennon, em “I’ve Got a Feeling” e o populismo pop de “Birthday” —, depois do tour de force de “Helter Skelter”, ao qual se entrega destemido, com energia incrível, Paul anuncia, em português de quem já tem certa quilometragem brasileira: “Agora é hora de vazar. Gotta vazar”.

Antes de ser Sir, astro de fama mundial, ele é um músico com ética de trabalho, egresso de uma banda de rock moldada pela vivência nos bares portuários de Hamburgo, na Alemanha. Nessas espeluncas, ele e outros rapazes humildes de Liverpool eram obrigados a dar tudo para conquistar a atenção de sujeitos que tinham entrado ali para ver strip-tease. O espírito beatle é crowdpleaser mesmo. Antes de fazer seu “get back” final, Paul ainda emocionou a todos com a clássica “Carry that weight”, seguida pela inevitável “The End”.

Nascido em 1942, em uma safra que precede a dos chamados baby boomers, Paul McCartney é parte de uma geração que mudou o mundo nos anos 1960. Agora, quase seis décadas depois, segue transformando a visão do que um homem de sua idade é capaz de fazer.

Sozinho ao violão, em uma estrutura elevada, cantando e tocando seu grande clássico “Blackbird”, ele aparece como gigante da canção popular que é. Comandando os hits de arena dos Wings como “Let Me Roll It” e “Jet” (dedicado ao parceiro de grupo Denny Laine, morto em 5 de dezembro), Paul canta o que é possível, com total autoridade e entrega rock’n’roll.

Não faz sentido comparar com o vocalista destemido que registrou isso tudo em estúdio — e que começou a carreira, vale lembrar, imitando o inimitável Little Richard no estilo “dedo no piano e gritaria”.

Como um craque experiente, Paul pareceu ter guardado forças para as notas mais difíceis de “Maybe I’m Amazed”, uma de suas mais reluzentes jóias melódicas. Para muitos da plateia, que incluía na ala vip Milton Nascimento, Gilberto Gil e Jards Macalé, foi o ponto alto dessa noite carioca de 16 de dezembro de 2023, capaz de afastar por algumas horas a tristeza pela perda, horas antes, de outro gigante da melodia, o carioca Carlos Lyra.

“Até a próxima. Fui! See you next time!” Assim, misturando português e inglês, Paul McCartney, de 81 anos, se despediu do último show da turnê Got Back, no Maracanã, no Rio, na noite deste sábado, 16, dissipando boatos sobre uma suposta aposentadoria dos palcos que seria anunciada.

Não era exatamente o mesmo estádio em que se apresentou pela primeira vez no Brasil, em abril de 1990 — a reforma para a Copa do Mundo de 2014 demoliu inteiramente a cobertura característica do estádio. E, de fato, o retorno do ex-beatle ao local, para fazer sua 36ª apresentação em solo brasileiro, pouco teve de fechamento de ciclo. Pelo contrário, a impressão que deixa é de ciclo a ser renovado.

No ano passado, ao lançar a turnê Got Back, Paul divulgou uma declaração realçando a mesma expressão que usou no Rio de Janeiro: “Ao fim da turnê passada, eu disse ‘vejo vocês na próxima vez’. Eu disse que iria voltar para vocês. Bem, eu voltei!”

Com a barba por fazer, revelando fios brancos, e a capacidade vocal afetada, mas nem de longe comprometida pela idade, ele entreteve e comoveu os 66 mil presentes durante mais de duas horas e meia (151 minutos, incluindo o caprichado bis). Começou às 21h03, encerrou às 23h34.

O repertório, é verdade, inclui várias escolhas idiossincráticas, músicas que não entrariam numa lista top 100 das composições de McCartney, seja solo, com os Beatles ou na fase Wings.

Mas o espetáculo é montado, acima de tudo, para divertir, com espaço para interações que colocam o público como coadjuvante, ao segurar balões iluminados por celulares durante “Ob-La-Di, Ob-La-Da”, e os já tradicionais cartazes com “Na Na Na” exibidos durante o refrão prolongado de “Hey Jude”. Não falta o momento TikTok, “Dance Tonight”, quando o baterista Abe Laboriel Jr. se solta em coreografias infantis — rola até uma do game Fortnite.

Paul McCartney em Turnê Got Back durante show, no Estádio do Maracanã  Foto: Pedro Kirilos/Estadão

Além da excelência musical (cantando e tocando o legendário baixo Hofner, guitarras, violão, ukulele, piano e órgão), o ex-beatle é um animador de plateias gigantes imensamente talentoso. Instiga, conversa, rege coros, responde às declarações de amor (curiosamente não entendeu quando surgiu o coro “eu te amo”, mas a massa tratou de traduzir “we love you”, ganhando logo um “I love you back”) e se supera no uso de gírias e expressões locais.

Abriu com “Can’t Buy Me Love” (que costuma revezar com “A Hard Day’s Night” nos setlists) e emendou com duas canções dos tempos setentistas de Wings, com sabor mais americanizado (natural, pois seus dois principais sidemen são californianos: o guitarrista Rusty Anderson e o baixista e guitarrista Brian Ray): “Junior’s Farm” e “Letting Go”. Entre uma e outra, cumprimentou a massa com um “qualé, cariocas?”. Antes de “She’s a Woman”, a segunda pepita beatle da noite, avisou, fofo: “Esta noite vou tentar falar um pouquinho de português. Um pouquinho”.

Ao longo do show, elogiou as reações do público com um “irado!” e, após “Lady Madonna”, repetiu o bordão “o pai tá on”, usado nos shows em São Paulo. O melhor gracejo com sabor local ficou para depois de “Ob-La-Di, Ob-La-Da”: “Arrá, urrú, o Maraca é nosso”, reproduzindo um clássico grito das arquibancadas. “Obrigado por esses balões. Muito Disney”, emendou, talvez com ironia, mas fazendo um merchanzinho para a empresa que transmitiu o show por streaming.

Paul McCartney afastou boatos de aposentadoria e prometeu reencontro Foto: Pedro Kirilos/Estadão
Paul McCartney encantou 66 mil fãs no Maracanã em mais de duas horas e meia de show Foto: Pedro Kirilos/Estadão

Já no bis — iniciado com dueto virtual com John Lennon, em “I’ve Got a Feeling” e o populismo pop de “Birthday” —, depois do tour de force de “Helter Skelter”, ao qual se entrega destemido, com energia incrível, Paul anuncia, em português de quem já tem certa quilometragem brasileira: “Agora é hora de vazar. Gotta vazar”.

Antes de ser Sir, astro de fama mundial, ele é um músico com ética de trabalho, egresso de uma banda de rock moldada pela vivência nos bares portuários de Hamburgo, na Alemanha. Nessas espeluncas, ele e outros rapazes humildes de Liverpool eram obrigados a dar tudo para conquistar a atenção de sujeitos que tinham entrado ali para ver strip-tease. O espírito beatle é crowdpleaser mesmo. Antes de fazer seu “get back” final, Paul ainda emocionou a todos com a clássica “Carry that weight”, seguida pela inevitável “The End”.

Nascido em 1942, em uma safra que precede a dos chamados baby boomers, Paul McCartney é parte de uma geração que mudou o mundo nos anos 1960. Agora, quase seis décadas depois, segue transformando a visão do que um homem de sua idade é capaz de fazer.

Sozinho ao violão, em uma estrutura elevada, cantando e tocando seu grande clássico “Blackbird”, ele aparece como gigante da canção popular que é. Comandando os hits de arena dos Wings como “Let Me Roll It” e “Jet” (dedicado ao parceiro de grupo Denny Laine, morto em 5 de dezembro), Paul canta o que é possível, com total autoridade e entrega rock’n’roll.

Não faz sentido comparar com o vocalista destemido que registrou isso tudo em estúdio — e que começou a carreira, vale lembrar, imitando o inimitável Little Richard no estilo “dedo no piano e gritaria”.

Como um craque experiente, Paul pareceu ter guardado forças para as notas mais difíceis de “Maybe I’m Amazed”, uma de suas mais reluzentes jóias melódicas. Para muitos da plateia, que incluía na ala vip Milton Nascimento, Gilberto Gil e Jards Macalé, foi o ponto alto dessa noite carioca de 16 de dezembro de 2023, capaz de afastar por algumas horas a tristeza pela perda, horas antes, de outro gigante da melodia, o carioca Carlos Lyra.

“Até a próxima. Fui! See you next time!” Assim, misturando português e inglês, Paul McCartney, de 81 anos, se despediu do último show da turnê Got Back, no Maracanã, no Rio, na noite deste sábado, 16, dissipando boatos sobre uma suposta aposentadoria dos palcos que seria anunciada.

Não era exatamente o mesmo estádio em que se apresentou pela primeira vez no Brasil, em abril de 1990 — a reforma para a Copa do Mundo de 2014 demoliu inteiramente a cobertura característica do estádio. E, de fato, o retorno do ex-beatle ao local, para fazer sua 36ª apresentação em solo brasileiro, pouco teve de fechamento de ciclo. Pelo contrário, a impressão que deixa é de ciclo a ser renovado.

No ano passado, ao lançar a turnê Got Back, Paul divulgou uma declaração realçando a mesma expressão que usou no Rio de Janeiro: “Ao fim da turnê passada, eu disse ‘vejo vocês na próxima vez’. Eu disse que iria voltar para vocês. Bem, eu voltei!”

Com a barba por fazer, revelando fios brancos, e a capacidade vocal afetada, mas nem de longe comprometida pela idade, ele entreteve e comoveu os 66 mil presentes durante mais de duas horas e meia (151 minutos, incluindo o caprichado bis). Começou às 21h03, encerrou às 23h34.

O repertório, é verdade, inclui várias escolhas idiossincráticas, músicas que não entrariam numa lista top 100 das composições de McCartney, seja solo, com os Beatles ou na fase Wings.

Mas o espetáculo é montado, acima de tudo, para divertir, com espaço para interações que colocam o público como coadjuvante, ao segurar balões iluminados por celulares durante “Ob-La-Di, Ob-La-Da”, e os já tradicionais cartazes com “Na Na Na” exibidos durante o refrão prolongado de “Hey Jude”. Não falta o momento TikTok, “Dance Tonight”, quando o baterista Abe Laboriel Jr. se solta em coreografias infantis — rola até uma do game Fortnite.

Paul McCartney em Turnê Got Back durante show, no Estádio do Maracanã  Foto: Pedro Kirilos/Estadão

Além da excelência musical (cantando e tocando o legendário baixo Hofner, guitarras, violão, ukulele, piano e órgão), o ex-beatle é um animador de plateias gigantes imensamente talentoso. Instiga, conversa, rege coros, responde às declarações de amor (curiosamente não entendeu quando surgiu o coro “eu te amo”, mas a massa tratou de traduzir “we love you”, ganhando logo um “I love you back”) e se supera no uso de gírias e expressões locais.

Abriu com “Can’t Buy Me Love” (que costuma revezar com “A Hard Day’s Night” nos setlists) e emendou com duas canções dos tempos setentistas de Wings, com sabor mais americanizado (natural, pois seus dois principais sidemen são californianos: o guitarrista Rusty Anderson e o baixista e guitarrista Brian Ray): “Junior’s Farm” e “Letting Go”. Entre uma e outra, cumprimentou a massa com um “qualé, cariocas?”. Antes de “She’s a Woman”, a segunda pepita beatle da noite, avisou, fofo: “Esta noite vou tentar falar um pouquinho de português. Um pouquinho”.

Ao longo do show, elogiou as reações do público com um “irado!” e, após “Lady Madonna”, repetiu o bordão “o pai tá on”, usado nos shows em São Paulo. O melhor gracejo com sabor local ficou para depois de “Ob-La-Di, Ob-La-Da”: “Arrá, urrú, o Maraca é nosso”, reproduzindo um clássico grito das arquibancadas. “Obrigado por esses balões. Muito Disney”, emendou, talvez com ironia, mas fazendo um merchanzinho para a empresa que transmitiu o show por streaming.

Paul McCartney afastou boatos de aposentadoria e prometeu reencontro Foto: Pedro Kirilos/Estadão
Paul McCartney encantou 66 mil fãs no Maracanã em mais de duas horas e meia de show Foto: Pedro Kirilos/Estadão

Já no bis — iniciado com dueto virtual com John Lennon, em “I’ve Got a Feeling” e o populismo pop de “Birthday” —, depois do tour de force de “Helter Skelter”, ao qual se entrega destemido, com energia incrível, Paul anuncia, em português de quem já tem certa quilometragem brasileira: “Agora é hora de vazar. Gotta vazar”.

Antes de ser Sir, astro de fama mundial, ele é um músico com ética de trabalho, egresso de uma banda de rock moldada pela vivência nos bares portuários de Hamburgo, na Alemanha. Nessas espeluncas, ele e outros rapazes humildes de Liverpool eram obrigados a dar tudo para conquistar a atenção de sujeitos que tinham entrado ali para ver strip-tease. O espírito beatle é crowdpleaser mesmo. Antes de fazer seu “get back” final, Paul ainda emocionou a todos com a clássica “Carry that weight”, seguida pela inevitável “The End”.

Nascido em 1942, em uma safra que precede a dos chamados baby boomers, Paul McCartney é parte de uma geração que mudou o mundo nos anos 1960. Agora, quase seis décadas depois, segue transformando a visão do que um homem de sua idade é capaz de fazer.

Sozinho ao violão, em uma estrutura elevada, cantando e tocando seu grande clássico “Blackbird”, ele aparece como gigante da canção popular que é. Comandando os hits de arena dos Wings como “Let Me Roll It” e “Jet” (dedicado ao parceiro de grupo Denny Laine, morto em 5 de dezembro), Paul canta o que é possível, com total autoridade e entrega rock’n’roll.

Não faz sentido comparar com o vocalista destemido que registrou isso tudo em estúdio — e que começou a carreira, vale lembrar, imitando o inimitável Little Richard no estilo “dedo no piano e gritaria”.

Como um craque experiente, Paul pareceu ter guardado forças para as notas mais difíceis de “Maybe I’m Amazed”, uma de suas mais reluzentes jóias melódicas. Para muitos da plateia, que incluía na ala vip Milton Nascimento, Gilberto Gil e Jards Macalé, foi o ponto alto dessa noite carioca de 16 de dezembro de 2023, capaz de afastar por algumas horas a tristeza pela perda, horas antes, de outro gigante da melodia, o carioca Carlos Lyra.

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