Crítica: Na Sala São Paulo, as memoráveis ‘Visões do Amém’ de Messiaen


Concerto foi marcado por um alto nível de interpretação para dois pianos com Pierre-Laurent Aimard e Tamara Stefanovich

Por João Marcos Coelho
Atualização:

Há experiências musicais que levamos conosco pela vida inteira. Uma delas foi a interpretação memorável de Visões do Amém, de Olivier Messiaen para dois pianos, com o francês Pierre-Laurent Aimard e a sérvia Tamara Stefanovich na fria noite de terça-feira, dia 7, na Sala São Paulo. 

Tamara Stefanovich Foto: Sala São Paulo

O primeiro dos sete Améns, o da Criação, já estabeleceu o nível elevadíssimo de execução. “Os acordes congelados como fragmentos de matéria flutuando no espaço” na região mais aguda do primeiro piano nos compassos iniciais, pilotado por Tamara, ganham “a luz e a vida dados pelo tema recorrente da Criação elevando-se das profundezas” dos acordes na região mais grave do segundo piano, pilotado por Aimard. A frase é dos musicólogos britânicos Peter Hill e Nigel Simeone no livro Olivier Messiaen (Fayard, 2008). Aimard/Tamara pareciam almas gêmeas, apesar das imensas dificuldades técnicas não só da escrita como, principalmente, o fato de

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Tamara tocar células rítmicas precisas no primeiro enquanto o segundo piano de Aimard “tem necessidade do espaço vital da retórica” (Hill). O maior espectro de dinâmica ficou com Tamara, enquanto Aimard tocou boa parte do tempo em triplo “fff”. Não por acaso, a Sagração da Primavera, do russo Igor Stravinski, era tema recorrente das aulas do francês Messiaen no Conservatório de Paris por 36 anos, até 1977. O ritmo é elemento-chave dessa peça farol da literatura pianística do século 20.

Em vários momentos, lembra a música de Elliott Carter, pois cada piano tem discurso independente, e a única coisa em comum é o início de cada frase. No quinto Amém, “dos Anjos e Santos, do Canto dos Pássaros”, por exemplo, os dois pianos começam em uníssono, mas na retomada da exposição o tema volta em acordes quebrados e cânones rítmicos. Nesse Amém, o piano de Tamara brilha numa mistura de cantos de pássaros (paixão de Messiaen) acompanhado por ritmos de dança no piano de Aimard – raro momento de descontração num ciclo que privilegia a tensão.

Descrevo com minúcias a obra – que também inclui o segundo Amém, “das estrelas, do planeta dos anéis”, e o terceiro Amém, “da agonia de Jesus”, para dar uma ideia mínima das monumentais dificuldades superadas nessa leitura modelar. A partitura de Aimard exige muito esforço físico: no quarto Amém, “do Desejo”, a parte rápida é tecnicamente dificílima. Tamara foi exigida no Amém final, “da Consumação”, que foi precedido pelo sexto Amém, “do Julgamento”, com “o piano descendo do céu como tempestade num crescendo de virtuosismo” (Hill). É para não esquecer.

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Brahms. Na primeira parte, o duo Aimard/Tamara interpretou a Sonata em Fá Menor, op. 34b, de Brahms, segunda versão da obra nascida como desequilibrado quinteto de cordas (2 violinos, 1 viola e 2 cellos) e que encontrou sua forma definitiva, piano e quarteto de cordas, a pedido da pianista e compositora romântica alemã Clara Schumann. Apesar da ótima execução de Aimard/Tamara, não dá para esquecer que a versão definitiva é muito superior. Clara tinha razão. 

Há experiências musicais que levamos conosco pela vida inteira. Uma delas foi a interpretação memorável de Visões do Amém, de Olivier Messiaen para dois pianos, com o francês Pierre-Laurent Aimard e a sérvia Tamara Stefanovich na fria noite de terça-feira, dia 7, na Sala São Paulo. 

Tamara Stefanovich Foto: Sala São Paulo

O primeiro dos sete Améns, o da Criação, já estabeleceu o nível elevadíssimo de execução. “Os acordes congelados como fragmentos de matéria flutuando no espaço” na região mais aguda do primeiro piano nos compassos iniciais, pilotado por Tamara, ganham “a luz e a vida dados pelo tema recorrente da Criação elevando-se das profundezas” dos acordes na região mais grave do segundo piano, pilotado por Aimard. A frase é dos musicólogos britânicos Peter Hill e Nigel Simeone no livro Olivier Messiaen (Fayard, 2008). Aimard/Tamara pareciam almas gêmeas, apesar das imensas dificuldades técnicas não só da escrita como, principalmente, o fato de

Tamara tocar células rítmicas precisas no primeiro enquanto o segundo piano de Aimard “tem necessidade do espaço vital da retórica” (Hill). O maior espectro de dinâmica ficou com Tamara, enquanto Aimard tocou boa parte do tempo em triplo “fff”. Não por acaso, a Sagração da Primavera, do russo Igor Stravinski, era tema recorrente das aulas do francês Messiaen no Conservatório de Paris por 36 anos, até 1977. O ritmo é elemento-chave dessa peça farol da literatura pianística do século 20.

Em vários momentos, lembra a música de Elliott Carter, pois cada piano tem discurso independente, e a única coisa em comum é o início de cada frase. No quinto Amém, “dos Anjos e Santos, do Canto dos Pássaros”, por exemplo, os dois pianos começam em uníssono, mas na retomada da exposição o tema volta em acordes quebrados e cânones rítmicos. Nesse Amém, o piano de Tamara brilha numa mistura de cantos de pássaros (paixão de Messiaen) acompanhado por ritmos de dança no piano de Aimard – raro momento de descontração num ciclo que privilegia a tensão.

Descrevo com minúcias a obra – que também inclui o segundo Amém, “das estrelas, do planeta dos anéis”, e o terceiro Amém, “da agonia de Jesus”, para dar uma ideia mínima das monumentais dificuldades superadas nessa leitura modelar. A partitura de Aimard exige muito esforço físico: no quarto Amém, “do Desejo”, a parte rápida é tecnicamente dificílima. Tamara foi exigida no Amém final, “da Consumação”, que foi precedido pelo sexto Amém, “do Julgamento”, com “o piano descendo do céu como tempestade num crescendo de virtuosismo” (Hill). É para não esquecer.

Brahms. Na primeira parte, o duo Aimard/Tamara interpretou a Sonata em Fá Menor, op. 34b, de Brahms, segunda versão da obra nascida como desequilibrado quinteto de cordas (2 violinos, 1 viola e 2 cellos) e que encontrou sua forma definitiva, piano e quarteto de cordas, a pedido da pianista e compositora romântica alemã Clara Schumann. Apesar da ótima execução de Aimard/Tamara, não dá para esquecer que a versão definitiva é muito superior. Clara tinha razão. 

Há experiências musicais que levamos conosco pela vida inteira. Uma delas foi a interpretação memorável de Visões do Amém, de Olivier Messiaen para dois pianos, com o francês Pierre-Laurent Aimard e a sérvia Tamara Stefanovich na fria noite de terça-feira, dia 7, na Sala São Paulo. 

Tamara Stefanovich Foto: Sala São Paulo

O primeiro dos sete Améns, o da Criação, já estabeleceu o nível elevadíssimo de execução. “Os acordes congelados como fragmentos de matéria flutuando no espaço” na região mais aguda do primeiro piano nos compassos iniciais, pilotado por Tamara, ganham “a luz e a vida dados pelo tema recorrente da Criação elevando-se das profundezas” dos acordes na região mais grave do segundo piano, pilotado por Aimard. A frase é dos musicólogos britânicos Peter Hill e Nigel Simeone no livro Olivier Messiaen (Fayard, 2008). Aimard/Tamara pareciam almas gêmeas, apesar das imensas dificuldades técnicas não só da escrita como, principalmente, o fato de

Tamara tocar células rítmicas precisas no primeiro enquanto o segundo piano de Aimard “tem necessidade do espaço vital da retórica” (Hill). O maior espectro de dinâmica ficou com Tamara, enquanto Aimard tocou boa parte do tempo em triplo “fff”. Não por acaso, a Sagração da Primavera, do russo Igor Stravinski, era tema recorrente das aulas do francês Messiaen no Conservatório de Paris por 36 anos, até 1977. O ritmo é elemento-chave dessa peça farol da literatura pianística do século 20.

Em vários momentos, lembra a música de Elliott Carter, pois cada piano tem discurso independente, e a única coisa em comum é o início de cada frase. No quinto Amém, “dos Anjos e Santos, do Canto dos Pássaros”, por exemplo, os dois pianos começam em uníssono, mas na retomada da exposição o tema volta em acordes quebrados e cânones rítmicos. Nesse Amém, o piano de Tamara brilha numa mistura de cantos de pássaros (paixão de Messiaen) acompanhado por ritmos de dança no piano de Aimard – raro momento de descontração num ciclo que privilegia a tensão.

Descrevo com minúcias a obra – que também inclui o segundo Amém, “das estrelas, do planeta dos anéis”, e o terceiro Amém, “da agonia de Jesus”, para dar uma ideia mínima das monumentais dificuldades superadas nessa leitura modelar. A partitura de Aimard exige muito esforço físico: no quarto Amém, “do Desejo”, a parte rápida é tecnicamente dificílima. Tamara foi exigida no Amém final, “da Consumação”, que foi precedido pelo sexto Amém, “do Julgamento”, com “o piano descendo do céu como tempestade num crescendo de virtuosismo” (Hill). É para não esquecer.

Brahms. Na primeira parte, o duo Aimard/Tamara interpretou a Sonata em Fá Menor, op. 34b, de Brahms, segunda versão da obra nascida como desequilibrado quinteto de cordas (2 violinos, 1 viola e 2 cellos) e que encontrou sua forma definitiva, piano e quarteto de cordas, a pedido da pianista e compositora romântica alemã Clara Schumann. Apesar da ótima execução de Aimard/Tamara, não dá para esquecer que a versão definitiva é muito superior. Clara tinha razão. 

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