Edu Lobo celebra 80 anos com álbum e deixa dúvida sobre novos trabalhos: ‘Vamos ver o que acontece’


Compositor, que fez shows lotados em São Paulo e no Rio de Janeiro, fala sobre o futuro e diz que ainda se surpreende pelo fato de ‘Beatriz’ ser uma música popular

Por Danilo Casaletti
Atualização:

“A harmonia é poderosa”, diz Edu Lobo, 80 anos, que tem como talvez a prova mais irrefutável de sua fala a canção, temidas por muitos cantores, Beatriz, parceria dele com Chico Buarque. Foi mexendo em harmonias que Edu, ao lado do arranjador Cristovão Bastos, encontrou novos caminhos para 24 de suas canções, reunidas no álbum comemorativo Oitenta (Biscoto Fino), que ele acaba de lançar.

O cantor e compositor Edu Lobo lança o álbum 'Oitenta' Foto: Nana Moraes

Os shows de lançamento do novo trabalho, no Rio de Janeiro e São Paulo estavam lotados. Os ingressos se esgotaram com uma semana de antecedência. Edu, assim como outros nomes de sua geração, todos ligados à MPB, sigla com a qual ele diz ter implicância, tem despertado a atenção de um público mais jovem, interessado e atento.

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A cantora Mônica Salmaso, uma das convidadas do disco, recentemente lhe mandou vídeos de uma plateia de quatro mil pessoas cantando Beatriz. Pelo seu site oficial, chegam pedidos de inclusão de músicas que há tempos não entravam no repertório de suas apresentações. Edu conta tudo isso com entusiasmo. Nem de longe é um cara sisudo, como muitos dizem. Porém, não negocia sua sinceridade e, principalmente, o gosto por boas canções.

Mônica está no álbum Oitenta. Canta com Edu justamente Beatriz, entre outras faixas. Das mais conhecidas de seu repertório, o disco traz Bancarrota Blues, Ciranda da Bailarina e Sobre Todas as Coisas. Há outras menos lembradas como Branca Dias, Salmo e Tango de Nancy. Não coube a Edu cantar todas essas canções. Além de Mônica, ele convidou ainda os cantores Zé Renato, Vanessa Moreno e Ayrton Montarroyos, que ora se revezam, ora se juntam nas faixas.

Edu não sabe se Oitenta será seu último álbum ou se ainda fará um novo trabalho. “Se eu fizer, terá que ser de inéditas. Vou ter que compor de novo, ter novos parceiros”, diz o compositor que, por vários motivos, ficou sem os principais letristas com quem trabalhou desde os anos 1960.

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Neste novo álbum, você mistura músicas mais conhecidas pelo público e que não fizeram tanto sucesso. Como chegou a esse formato?

Comecei a reouvir discos que eu não ouvia há, sei lá, 40 anos ou até mais. O (a trilha sonora) do Castelo Rá-Tim-Bum (para o qual ele fez as músicas como Primeira Cantiga e Salabim) eu nem sabia como era o disco. Eu redescobri as músicas. No CD tem umas 12 ou 14 músicas que as pessoas nunca ouviram, que nunca tocaram no rádio ou nem se lembram. Já no show, eu coloco alguns sucessos, porque o público gosta. Isso tem total importância para mim.

E você buscou novos caminhos harmônicos para essas canções…

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Eu tenho uma teoria: uma canção nunca fica pronta. Algum dia alguém vai descobrir um acorde novo e vai colocar nela e ela vai se transformar mais um pouquinho. A harmonia é poderosa. Ela não para, ao contrário da melodia. A harmonia é a dona da canção.

No CD e no show há Beatriz. Só Mônica Salmaso para cantá-la corretamente atualmente, além de você?

E o Milton (Nascimento) que pode cantá-la quando quiser, claro. Muita gente gravou e muita gente errou nota porque é uma música que se você não prestar atenção faz uma nota que não está nela. Quando Milton gravou (1983), coloquei o cassete para ouvir, achei a gravação espetacular e pensei: “quanto tempo será que vai demorar para alguém conhecer essa música, se é que um dia alguém irá conhece-la”.

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É uma música de cinco minutos, lenta, não é alegre, é difícil de cantar. Não tocava no rádio. De repente, todo mundo começou a falar dela. Deve ter sido o boca a boca. Recentemente, a Mônica me mandou um vídeo em que quatro mil pessoas cantavam Beatriz junto com ela. Se você passar o microfone pela boca das pessoas, cada uma vai estar cantando uma nota. Mas, junto, fica muito bonito.

Os shows de lançamento desse novo álbum, Oitenta, estavam lotados. Os ingressos se esgotaram com bastante antecedência. Além do valor do seu trabalho, há um olhar muito interessante para sua geração, inclusive de pessoas mais novas. O que isso te mostra?

É muito bom ver que tem uma garotada interessada no meu trabalho. Dá aquela sensação de que valeu a pena.

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Há uma nova onda de interesse pela bossa nova, da qual você não fez parte diretamente, mas foi influenciada por ela...

Você sabe que eu tenho uma profunda implicância - não é horror - é implicância com esses nomes. Eles não são precisos, mesmo se você pensar na bossa nova. Ok. Garota de Ipanema, continua maravilhosa. Mas, você pula para Matita Perê (1972), também do Tom Jobim.

É um som que já andou, entendeu? Não é bossa nova... Aí tem uma coisa chamada MPB. Implico porque parece nome de partido político, parece MDB. Aí chega a Tropicália. Depois, o Clube da Esquina...

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Clube da Esquina que você elogiou recentemente...

O Clube da Esquina foi dos movimentos mais importantes que a gente teve porque ele era um pouquinho à frente de tudo que estava acontecendo. Não só pela voz do Milton (Nascimento) que era extraordinária, mas também por suas composições, completamente originais. Nele, você tem Wagner Tiso, Beto Guedes, Nelson Ângelo, Luiz Alves...Toninho Horta é um dos maiores violonistas que eu vi na minha vida em qualquer lugar. Não estou falando do Brasil, é no mundo. A crítica falava na música antiga, na bossa nova, na MPB (Edu solta um “Meu Deus do Céu” por pronunciar a sigla) e a Tropicália. E o Clube da Esquina, onde fica, entendeu? Não quis atiçar (discussão) nada. Quero que se dê o devido valor. Depois da minha chegada à música, foi um dos movimentos que mais me interessaram.

Você já declarou inúmeras vezes que não ouve rádio há muito tempo, há décadas. Nenhuma música das que hoje são as mais tocadas te atrai, te chama atenção ou pode, de alguma forma, influenciar seu trabalho?

Não tem nada para ouvir no rádio. Por isso, nem ligo. E te garanto que nada vai me influenciar. O que pode me influenciar, sem dúvida, é descobrir um grupo de Minas Gerais que está fazendo uma música diferente do que todo mundo faz.

Você falou em Tropicália. Em 1968, você participou da passeata em favor da música popular brasileira. Ela entrou para história com o nome de ‘passeata contra a guitarra elétrica’ (além de Edu, Elis Regina, Jair Rodrigues, Gilberto Gil, entre outros artistas, participaram do ato). Qual era a real intenção dela?

Essa coisa de generalizar que era contra as guitarras elétricas... Não é bem isso. O que eu acho desse episódio é o seguinte: foi interessante para a televisão (A TV Record, que abrigava os programas musicais da época). Porque daí faz aquele fuzuê. Eu não lembro, sinceramente, quanto tempo eu fiquei, o que que eu fiz lá. Eu acho que eu dei uma passada e fui embora porque não tinha muita coisa para fazer lá. Foi a Elis que organizou.

Nessa época, você já estava querendo sair daquele esquema de televisão e festivais depois de Ponteio, não?

Eu me lembro que eu fiz dois shows com a (cantora que cantou Ponteio ao seu lado no festival de 1967) Marília Medalha na mesma noite. A gente saiu de um clube e foi para o outro. E todo mundo que estava lá só queria ouvir Ponteio. Ninguém estava interessado no meu trabalho. Eles queriam ouvir uma música só. Aí fiz o que devia ter feito há muito tempo: fui para Los Angeles estudar orquestração.

Elis, Nara Leão, Maria Bethânia, Marília Medalha, Nana Caymmi, Gal Costa, Mônica Salmaso são suas principais intérpretes. As mulheres compreenderam melhor sua música?

Falamos em seis, sete cantoras. E quais cantores? Tinha o Emílio Santiago. E outra: temos a questão dos compositores que cantam suas próprias músicas. E eu gosto de ouvir um compositor cantando suas próprias músicas. Não tem ninguém melhor do que ele para interpretar o que ele fez. Adorava o Tom cantando. Adoro, ou gosto muito, do João Bosco e do Ivan Lins. O Djavan canta muitíssimo bem. Ele poderia ter feito uma carreira só cantando, se quisesse, mas também faz uma música ótima. O cantor isolado, que não compõe, é pouquíssimo comum. Isso é uma uma coisa do Brasil.

Edu Lobo e Gal Costa em show que fizeram juntos em 2000 Foto: Marcelo Ximenez/ Agência Estado

Você fez um disco junto com a Bethânia (1966). É verdade que, inicialmente, tinha pensado em Gal para esse trabalho?

Sim. Eu conheci a Gal na Bahia. Ela nem era cantora profissional ainda. O Caetano estava num barzinho e eu fui até lá. Quando Gal chegou e cantou, eu fiquei encantado com a voz dela. Que voz! Era linda, meu Deus! Quis fazer o meu disco seguinte com ela. Mas eu estava na (gravadora) Elenco. O Aloysio de Oliveira (produtor) escolheu a Bethânia, que estava estourada. É normal que o produtor queira se garantir e tal. Eu fiz, então, com a Bethânia. E foi ótimo.

Como você pensa em sua obra daqui para frente? Quer fazer mais discos?

Se eu fizer, terá que ser de inéditas. Vou ter que compor de novo, ter novos parceiros. Cacaso e Torquato Neto foram embora (morreram). Com Chico eu fiz muita música, mas sempre com patrão (encomendas para peças de teatro e balés). Capinam mora na Bahia, não sei dele. Não sei como vai ser, então.

Mas se esse for o último disco, eu fico feliz. Fiz do jeito eu que queria, no tempo que queria

E com músicas de seus cinco parceiros importantes (Chico, Aldir Blanc, Paulo César Pinheiro, Cacaso e Vinicius de Moraes), a quem você deve ter grande apreço, não?

Do Vinicius tem algo importante. Há poucos anos, a Luciana, filha dele, ainda era viva, me mandou uma letra inédita, chamada Silêncio. E, engraçado, que ela não mandou para o Toquinho, último parceiro do Vinicius, mandou para mim. Essa letra, que é de 1957, foi dada ao Baden Powell, que não fez a música. Não tenho hábito de musicar letra pronta, mas essa é linda, poderosíssima. Pedi apenas para trocar um verbo por outro. O curioso é que eu fiz minha primeira música profissional com o Vinicius, Só Me Fez Bem, quando tinha 19 anos, e minha última música é com o Vinicius, embora ele já não estivesse por aqui há muito tempo (as duas estão no álbum Oitenta).

Mas é a última por enquanto, não?

Vamos ver o que acontece...

“A harmonia é poderosa”, diz Edu Lobo, 80 anos, que tem como talvez a prova mais irrefutável de sua fala a canção, temidas por muitos cantores, Beatriz, parceria dele com Chico Buarque. Foi mexendo em harmonias que Edu, ao lado do arranjador Cristovão Bastos, encontrou novos caminhos para 24 de suas canções, reunidas no álbum comemorativo Oitenta (Biscoto Fino), que ele acaba de lançar.

O cantor e compositor Edu Lobo lança o álbum 'Oitenta' Foto: Nana Moraes

Os shows de lançamento do novo trabalho, no Rio de Janeiro e São Paulo estavam lotados. Os ingressos se esgotaram com uma semana de antecedência. Edu, assim como outros nomes de sua geração, todos ligados à MPB, sigla com a qual ele diz ter implicância, tem despertado a atenção de um público mais jovem, interessado e atento.

A cantora Mônica Salmaso, uma das convidadas do disco, recentemente lhe mandou vídeos de uma plateia de quatro mil pessoas cantando Beatriz. Pelo seu site oficial, chegam pedidos de inclusão de músicas que há tempos não entravam no repertório de suas apresentações. Edu conta tudo isso com entusiasmo. Nem de longe é um cara sisudo, como muitos dizem. Porém, não negocia sua sinceridade e, principalmente, o gosto por boas canções.

Mônica está no álbum Oitenta. Canta com Edu justamente Beatriz, entre outras faixas. Das mais conhecidas de seu repertório, o disco traz Bancarrota Blues, Ciranda da Bailarina e Sobre Todas as Coisas. Há outras menos lembradas como Branca Dias, Salmo e Tango de Nancy. Não coube a Edu cantar todas essas canções. Além de Mônica, ele convidou ainda os cantores Zé Renato, Vanessa Moreno e Ayrton Montarroyos, que ora se revezam, ora se juntam nas faixas.

Edu não sabe se Oitenta será seu último álbum ou se ainda fará um novo trabalho. “Se eu fizer, terá que ser de inéditas. Vou ter que compor de novo, ter novos parceiros”, diz o compositor que, por vários motivos, ficou sem os principais letristas com quem trabalhou desde os anos 1960.

Neste novo álbum, você mistura músicas mais conhecidas pelo público e que não fizeram tanto sucesso. Como chegou a esse formato?

Comecei a reouvir discos que eu não ouvia há, sei lá, 40 anos ou até mais. O (a trilha sonora) do Castelo Rá-Tim-Bum (para o qual ele fez as músicas como Primeira Cantiga e Salabim) eu nem sabia como era o disco. Eu redescobri as músicas. No CD tem umas 12 ou 14 músicas que as pessoas nunca ouviram, que nunca tocaram no rádio ou nem se lembram. Já no show, eu coloco alguns sucessos, porque o público gosta. Isso tem total importância para mim.

E você buscou novos caminhos harmônicos para essas canções…

Eu tenho uma teoria: uma canção nunca fica pronta. Algum dia alguém vai descobrir um acorde novo e vai colocar nela e ela vai se transformar mais um pouquinho. A harmonia é poderosa. Ela não para, ao contrário da melodia. A harmonia é a dona da canção.

No CD e no show há Beatriz. Só Mônica Salmaso para cantá-la corretamente atualmente, além de você?

E o Milton (Nascimento) que pode cantá-la quando quiser, claro. Muita gente gravou e muita gente errou nota porque é uma música que se você não prestar atenção faz uma nota que não está nela. Quando Milton gravou (1983), coloquei o cassete para ouvir, achei a gravação espetacular e pensei: “quanto tempo será que vai demorar para alguém conhecer essa música, se é que um dia alguém irá conhece-la”.

É uma música de cinco minutos, lenta, não é alegre, é difícil de cantar. Não tocava no rádio. De repente, todo mundo começou a falar dela. Deve ter sido o boca a boca. Recentemente, a Mônica me mandou um vídeo em que quatro mil pessoas cantavam Beatriz junto com ela. Se você passar o microfone pela boca das pessoas, cada uma vai estar cantando uma nota. Mas, junto, fica muito bonito.

Os shows de lançamento desse novo álbum, Oitenta, estavam lotados. Os ingressos se esgotaram com bastante antecedência. Além do valor do seu trabalho, há um olhar muito interessante para sua geração, inclusive de pessoas mais novas. O que isso te mostra?

É muito bom ver que tem uma garotada interessada no meu trabalho. Dá aquela sensação de que valeu a pena.

Há uma nova onda de interesse pela bossa nova, da qual você não fez parte diretamente, mas foi influenciada por ela...

Você sabe que eu tenho uma profunda implicância - não é horror - é implicância com esses nomes. Eles não são precisos, mesmo se você pensar na bossa nova. Ok. Garota de Ipanema, continua maravilhosa. Mas, você pula para Matita Perê (1972), também do Tom Jobim.

É um som que já andou, entendeu? Não é bossa nova... Aí tem uma coisa chamada MPB. Implico porque parece nome de partido político, parece MDB. Aí chega a Tropicália. Depois, o Clube da Esquina...

Clube da Esquina que você elogiou recentemente...

O Clube da Esquina foi dos movimentos mais importantes que a gente teve porque ele era um pouquinho à frente de tudo que estava acontecendo. Não só pela voz do Milton (Nascimento) que era extraordinária, mas também por suas composições, completamente originais. Nele, você tem Wagner Tiso, Beto Guedes, Nelson Ângelo, Luiz Alves...Toninho Horta é um dos maiores violonistas que eu vi na minha vida em qualquer lugar. Não estou falando do Brasil, é no mundo. A crítica falava na música antiga, na bossa nova, na MPB (Edu solta um “Meu Deus do Céu” por pronunciar a sigla) e a Tropicália. E o Clube da Esquina, onde fica, entendeu? Não quis atiçar (discussão) nada. Quero que se dê o devido valor. Depois da minha chegada à música, foi um dos movimentos que mais me interessaram.

Você já declarou inúmeras vezes que não ouve rádio há muito tempo, há décadas. Nenhuma música das que hoje são as mais tocadas te atrai, te chama atenção ou pode, de alguma forma, influenciar seu trabalho?

Não tem nada para ouvir no rádio. Por isso, nem ligo. E te garanto que nada vai me influenciar. O que pode me influenciar, sem dúvida, é descobrir um grupo de Minas Gerais que está fazendo uma música diferente do que todo mundo faz.

Você falou em Tropicália. Em 1968, você participou da passeata em favor da música popular brasileira. Ela entrou para história com o nome de ‘passeata contra a guitarra elétrica’ (além de Edu, Elis Regina, Jair Rodrigues, Gilberto Gil, entre outros artistas, participaram do ato). Qual era a real intenção dela?

Essa coisa de generalizar que era contra as guitarras elétricas... Não é bem isso. O que eu acho desse episódio é o seguinte: foi interessante para a televisão (A TV Record, que abrigava os programas musicais da época). Porque daí faz aquele fuzuê. Eu não lembro, sinceramente, quanto tempo eu fiquei, o que que eu fiz lá. Eu acho que eu dei uma passada e fui embora porque não tinha muita coisa para fazer lá. Foi a Elis que organizou.

Nessa época, você já estava querendo sair daquele esquema de televisão e festivais depois de Ponteio, não?

Eu me lembro que eu fiz dois shows com a (cantora que cantou Ponteio ao seu lado no festival de 1967) Marília Medalha na mesma noite. A gente saiu de um clube e foi para o outro. E todo mundo que estava lá só queria ouvir Ponteio. Ninguém estava interessado no meu trabalho. Eles queriam ouvir uma música só. Aí fiz o que devia ter feito há muito tempo: fui para Los Angeles estudar orquestração.

Elis, Nara Leão, Maria Bethânia, Marília Medalha, Nana Caymmi, Gal Costa, Mônica Salmaso são suas principais intérpretes. As mulheres compreenderam melhor sua música?

Falamos em seis, sete cantoras. E quais cantores? Tinha o Emílio Santiago. E outra: temos a questão dos compositores que cantam suas próprias músicas. E eu gosto de ouvir um compositor cantando suas próprias músicas. Não tem ninguém melhor do que ele para interpretar o que ele fez. Adorava o Tom cantando. Adoro, ou gosto muito, do João Bosco e do Ivan Lins. O Djavan canta muitíssimo bem. Ele poderia ter feito uma carreira só cantando, se quisesse, mas também faz uma música ótima. O cantor isolado, que não compõe, é pouquíssimo comum. Isso é uma uma coisa do Brasil.

Edu Lobo e Gal Costa em show que fizeram juntos em 2000 Foto: Marcelo Ximenez/ Agência Estado

Você fez um disco junto com a Bethânia (1966). É verdade que, inicialmente, tinha pensado em Gal para esse trabalho?

Sim. Eu conheci a Gal na Bahia. Ela nem era cantora profissional ainda. O Caetano estava num barzinho e eu fui até lá. Quando Gal chegou e cantou, eu fiquei encantado com a voz dela. Que voz! Era linda, meu Deus! Quis fazer o meu disco seguinte com ela. Mas eu estava na (gravadora) Elenco. O Aloysio de Oliveira (produtor) escolheu a Bethânia, que estava estourada. É normal que o produtor queira se garantir e tal. Eu fiz, então, com a Bethânia. E foi ótimo.

Como você pensa em sua obra daqui para frente? Quer fazer mais discos?

Se eu fizer, terá que ser de inéditas. Vou ter que compor de novo, ter novos parceiros. Cacaso e Torquato Neto foram embora (morreram). Com Chico eu fiz muita música, mas sempre com patrão (encomendas para peças de teatro e balés). Capinam mora na Bahia, não sei dele. Não sei como vai ser, então.

Mas se esse for o último disco, eu fico feliz. Fiz do jeito eu que queria, no tempo que queria

E com músicas de seus cinco parceiros importantes (Chico, Aldir Blanc, Paulo César Pinheiro, Cacaso e Vinicius de Moraes), a quem você deve ter grande apreço, não?

Do Vinicius tem algo importante. Há poucos anos, a Luciana, filha dele, ainda era viva, me mandou uma letra inédita, chamada Silêncio. E, engraçado, que ela não mandou para o Toquinho, último parceiro do Vinicius, mandou para mim. Essa letra, que é de 1957, foi dada ao Baden Powell, que não fez a música. Não tenho hábito de musicar letra pronta, mas essa é linda, poderosíssima. Pedi apenas para trocar um verbo por outro. O curioso é que eu fiz minha primeira música profissional com o Vinicius, Só Me Fez Bem, quando tinha 19 anos, e minha última música é com o Vinicius, embora ele já não estivesse por aqui há muito tempo (as duas estão no álbum Oitenta).

Mas é a última por enquanto, não?

Vamos ver o que acontece...

“A harmonia é poderosa”, diz Edu Lobo, 80 anos, que tem como talvez a prova mais irrefutável de sua fala a canção, temidas por muitos cantores, Beatriz, parceria dele com Chico Buarque. Foi mexendo em harmonias que Edu, ao lado do arranjador Cristovão Bastos, encontrou novos caminhos para 24 de suas canções, reunidas no álbum comemorativo Oitenta (Biscoto Fino), que ele acaba de lançar.

O cantor e compositor Edu Lobo lança o álbum 'Oitenta' Foto: Nana Moraes

Os shows de lançamento do novo trabalho, no Rio de Janeiro e São Paulo estavam lotados. Os ingressos se esgotaram com uma semana de antecedência. Edu, assim como outros nomes de sua geração, todos ligados à MPB, sigla com a qual ele diz ter implicância, tem despertado a atenção de um público mais jovem, interessado e atento.

A cantora Mônica Salmaso, uma das convidadas do disco, recentemente lhe mandou vídeos de uma plateia de quatro mil pessoas cantando Beatriz. Pelo seu site oficial, chegam pedidos de inclusão de músicas que há tempos não entravam no repertório de suas apresentações. Edu conta tudo isso com entusiasmo. Nem de longe é um cara sisudo, como muitos dizem. Porém, não negocia sua sinceridade e, principalmente, o gosto por boas canções.

Mônica está no álbum Oitenta. Canta com Edu justamente Beatriz, entre outras faixas. Das mais conhecidas de seu repertório, o disco traz Bancarrota Blues, Ciranda da Bailarina e Sobre Todas as Coisas. Há outras menos lembradas como Branca Dias, Salmo e Tango de Nancy. Não coube a Edu cantar todas essas canções. Além de Mônica, ele convidou ainda os cantores Zé Renato, Vanessa Moreno e Ayrton Montarroyos, que ora se revezam, ora se juntam nas faixas.

Edu não sabe se Oitenta será seu último álbum ou se ainda fará um novo trabalho. “Se eu fizer, terá que ser de inéditas. Vou ter que compor de novo, ter novos parceiros”, diz o compositor que, por vários motivos, ficou sem os principais letristas com quem trabalhou desde os anos 1960.

Neste novo álbum, você mistura músicas mais conhecidas pelo público e que não fizeram tanto sucesso. Como chegou a esse formato?

Comecei a reouvir discos que eu não ouvia há, sei lá, 40 anos ou até mais. O (a trilha sonora) do Castelo Rá-Tim-Bum (para o qual ele fez as músicas como Primeira Cantiga e Salabim) eu nem sabia como era o disco. Eu redescobri as músicas. No CD tem umas 12 ou 14 músicas que as pessoas nunca ouviram, que nunca tocaram no rádio ou nem se lembram. Já no show, eu coloco alguns sucessos, porque o público gosta. Isso tem total importância para mim.

E você buscou novos caminhos harmônicos para essas canções…

Eu tenho uma teoria: uma canção nunca fica pronta. Algum dia alguém vai descobrir um acorde novo e vai colocar nela e ela vai se transformar mais um pouquinho. A harmonia é poderosa. Ela não para, ao contrário da melodia. A harmonia é a dona da canção.

No CD e no show há Beatriz. Só Mônica Salmaso para cantá-la corretamente atualmente, além de você?

E o Milton (Nascimento) que pode cantá-la quando quiser, claro. Muita gente gravou e muita gente errou nota porque é uma música que se você não prestar atenção faz uma nota que não está nela. Quando Milton gravou (1983), coloquei o cassete para ouvir, achei a gravação espetacular e pensei: “quanto tempo será que vai demorar para alguém conhecer essa música, se é que um dia alguém irá conhece-la”.

É uma música de cinco minutos, lenta, não é alegre, é difícil de cantar. Não tocava no rádio. De repente, todo mundo começou a falar dela. Deve ter sido o boca a boca. Recentemente, a Mônica me mandou um vídeo em que quatro mil pessoas cantavam Beatriz junto com ela. Se você passar o microfone pela boca das pessoas, cada uma vai estar cantando uma nota. Mas, junto, fica muito bonito.

Os shows de lançamento desse novo álbum, Oitenta, estavam lotados. Os ingressos se esgotaram com bastante antecedência. Além do valor do seu trabalho, há um olhar muito interessante para sua geração, inclusive de pessoas mais novas. O que isso te mostra?

É muito bom ver que tem uma garotada interessada no meu trabalho. Dá aquela sensação de que valeu a pena.

Há uma nova onda de interesse pela bossa nova, da qual você não fez parte diretamente, mas foi influenciada por ela...

Você sabe que eu tenho uma profunda implicância - não é horror - é implicância com esses nomes. Eles não são precisos, mesmo se você pensar na bossa nova. Ok. Garota de Ipanema, continua maravilhosa. Mas, você pula para Matita Perê (1972), também do Tom Jobim.

É um som que já andou, entendeu? Não é bossa nova... Aí tem uma coisa chamada MPB. Implico porque parece nome de partido político, parece MDB. Aí chega a Tropicália. Depois, o Clube da Esquina...

Clube da Esquina que você elogiou recentemente...

O Clube da Esquina foi dos movimentos mais importantes que a gente teve porque ele era um pouquinho à frente de tudo que estava acontecendo. Não só pela voz do Milton (Nascimento) que era extraordinária, mas também por suas composições, completamente originais. Nele, você tem Wagner Tiso, Beto Guedes, Nelson Ângelo, Luiz Alves...Toninho Horta é um dos maiores violonistas que eu vi na minha vida em qualquer lugar. Não estou falando do Brasil, é no mundo. A crítica falava na música antiga, na bossa nova, na MPB (Edu solta um “Meu Deus do Céu” por pronunciar a sigla) e a Tropicália. E o Clube da Esquina, onde fica, entendeu? Não quis atiçar (discussão) nada. Quero que se dê o devido valor. Depois da minha chegada à música, foi um dos movimentos que mais me interessaram.

Você já declarou inúmeras vezes que não ouve rádio há muito tempo, há décadas. Nenhuma música das que hoje são as mais tocadas te atrai, te chama atenção ou pode, de alguma forma, influenciar seu trabalho?

Não tem nada para ouvir no rádio. Por isso, nem ligo. E te garanto que nada vai me influenciar. O que pode me influenciar, sem dúvida, é descobrir um grupo de Minas Gerais que está fazendo uma música diferente do que todo mundo faz.

Você falou em Tropicália. Em 1968, você participou da passeata em favor da música popular brasileira. Ela entrou para história com o nome de ‘passeata contra a guitarra elétrica’ (além de Edu, Elis Regina, Jair Rodrigues, Gilberto Gil, entre outros artistas, participaram do ato). Qual era a real intenção dela?

Essa coisa de generalizar que era contra as guitarras elétricas... Não é bem isso. O que eu acho desse episódio é o seguinte: foi interessante para a televisão (A TV Record, que abrigava os programas musicais da época). Porque daí faz aquele fuzuê. Eu não lembro, sinceramente, quanto tempo eu fiquei, o que que eu fiz lá. Eu acho que eu dei uma passada e fui embora porque não tinha muita coisa para fazer lá. Foi a Elis que organizou.

Nessa época, você já estava querendo sair daquele esquema de televisão e festivais depois de Ponteio, não?

Eu me lembro que eu fiz dois shows com a (cantora que cantou Ponteio ao seu lado no festival de 1967) Marília Medalha na mesma noite. A gente saiu de um clube e foi para o outro. E todo mundo que estava lá só queria ouvir Ponteio. Ninguém estava interessado no meu trabalho. Eles queriam ouvir uma música só. Aí fiz o que devia ter feito há muito tempo: fui para Los Angeles estudar orquestração.

Elis, Nara Leão, Maria Bethânia, Marília Medalha, Nana Caymmi, Gal Costa, Mônica Salmaso são suas principais intérpretes. As mulheres compreenderam melhor sua música?

Falamos em seis, sete cantoras. E quais cantores? Tinha o Emílio Santiago. E outra: temos a questão dos compositores que cantam suas próprias músicas. E eu gosto de ouvir um compositor cantando suas próprias músicas. Não tem ninguém melhor do que ele para interpretar o que ele fez. Adorava o Tom cantando. Adoro, ou gosto muito, do João Bosco e do Ivan Lins. O Djavan canta muitíssimo bem. Ele poderia ter feito uma carreira só cantando, se quisesse, mas também faz uma música ótima. O cantor isolado, que não compõe, é pouquíssimo comum. Isso é uma uma coisa do Brasil.

Edu Lobo e Gal Costa em show que fizeram juntos em 2000 Foto: Marcelo Ximenez/ Agência Estado

Você fez um disco junto com a Bethânia (1966). É verdade que, inicialmente, tinha pensado em Gal para esse trabalho?

Sim. Eu conheci a Gal na Bahia. Ela nem era cantora profissional ainda. O Caetano estava num barzinho e eu fui até lá. Quando Gal chegou e cantou, eu fiquei encantado com a voz dela. Que voz! Era linda, meu Deus! Quis fazer o meu disco seguinte com ela. Mas eu estava na (gravadora) Elenco. O Aloysio de Oliveira (produtor) escolheu a Bethânia, que estava estourada. É normal que o produtor queira se garantir e tal. Eu fiz, então, com a Bethânia. E foi ótimo.

Como você pensa em sua obra daqui para frente? Quer fazer mais discos?

Se eu fizer, terá que ser de inéditas. Vou ter que compor de novo, ter novos parceiros. Cacaso e Torquato Neto foram embora (morreram). Com Chico eu fiz muita música, mas sempre com patrão (encomendas para peças de teatro e balés). Capinam mora na Bahia, não sei dele. Não sei como vai ser, então.

Mas se esse for o último disco, eu fico feliz. Fiz do jeito eu que queria, no tempo que queria

E com músicas de seus cinco parceiros importantes (Chico, Aldir Blanc, Paulo César Pinheiro, Cacaso e Vinicius de Moraes), a quem você deve ter grande apreço, não?

Do Vinicius tem algo importante. Há poucos anos, a Luciana, filha dele, ainda era viva, me mandou uma letra inédita, chamada Silêncio. E, engraçado, que ela não mandou para o Toquinho, último parceiro do Vinicius, mandou para mim. Essa letra, que é de 1957, foi dada ao Baden Powell, que não fez a música. Não tenho hábito de musicar letra pronta, mas essa é linda, poderosíssima. Pedi apenas para trocar um verbo por outro. O curioso é que eu fiz minha primeira música profissional com o Vinicius, Só Me Fez Bem, quando tinha 19 anos, e minha última música é com o Vinicius, embora ele já não estivesse por aqui há muito tempo (as duas estão no álbum Oitenta).

Mas é a última por enquanto, não?

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