Entenda a relação do tema do ‘Show de Calouros’ de Silvio Santos com a URSS e Paul McCartney


O tradutor Irineu Franco Perpetuo e o poeta Guilherme Gontijo Flores traduziram a música dos anos 1920 e regravaram a faixa em português em seu sentido original, que remete a um certo romantismo russo; ouça

Por Damy Coelho
Atualização:

“O Silvio Santos, la, la, la, la, la, la, la...”. Quando ouvia a abertura do Show de Calouros de Silvio Santos, na casa da avó, todo santo domingo, o jornalista e tradutor Irineu Franco Perpetuo não imaginava que por trás da música chiclete existiria uma história envolvendo uma “moda” russa dos tempos da União Soviética e que teve envolvimento até de Paul McCartney.

Anos depois, ao pesquisar a música popular russa, Perpeuto, autor de Como Ler os Russos, se deparou com a melodia que já era velha conhecida. “Foi um espanto”, revela.

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A música do Show de Calouros remonta a um sucesso russo de 1925. Chamada Dorogoi Dlinnoyu, a faixa foi composta pelo músico Boris Fomin e por Konstantin Podrévski. A versão mais conhecida na Rússia é de Aleksandr Vertínski, um cantor de cabaré. Ele gravou a faixa em Paris, onde morava, no ano seguinte. Ouça abaixo:

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“Era uma canção sentimental, do gênero chamado romança”, explica o jornalista. A “romança” foi uma popular música de salão do século 19, semelhante às nossas modinhas brasileiras.

A letra, romântica, é um lamento nostálgico a um amor que já se foi. A faixa carrega elementos folclóricos e instrumentos populares como violão de sete cordas.

Proibida

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Apesar de não apresentar um tom politico, Dorogoi Dlinnoyu foi proibida no país justamente pelo contexto de sua reprodução. A Revolução Russa aconteceu em 1917 e, em 1929, a Conferência Musical de Toda a URSS, em Leningrado, considerou a romança um gênero contrarrevolucionário por remeter aos salões burgueses e aristocráticos, como explica Perpetuo.

Com isso, músicas de Podrévski, o autor da letra, foram proibidas. Fomin, o compositor, foi preso em 1937. Só nos anos 1960 a faixa voltaria a se popularizar na Rússia.

Da Sibéria a Liverpool

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Porém, a essa altura a música já tinha atravessando o oceano. Durante a Guerra Fria, em 1953, foi trilha sonora do filme Inocentes em Paris, com roteiro assinado pelo cineasta russo Anatole de Grunwald.

Chegou nos Estados Unidos e, no início dos anos 1960, o músico Gene Raskin correu para registrá-la em seu nome após lançar uma versão adaptada com sua mulher, Francesca. Em inglês, virou These Were The Days e ganhou a cena folk de Nova York.

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Em 1968, ninguém menos que Paul McCartney estaria envolvido com a música - ele foi o produtor da versão cantada por Mary Hopkin, justamente a que fez mais sucesso. Na época, conseguiu os direitos autorais da música. Dessa versão, surgiram versões em outras línguas, como o francês e português.

“Acho que dá para cravar que Silvio Santos não conhecia a versão russa, e que o arranjo que ele usou em seu programa certamente vinha dessa versão em inglês”, explica Irineu.

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Tema do 'Show de Calouros' é uma românia, semelhante a uma modinha brasileira  Foto: Luludi/ Estadão

No Brasil, virou Aqueles tempos, de Joelma (a da Jovem Guarda, não a do Calypso). A faixa começa ritmada em um tom alegre, que chega a lembrar a abertura do programa de Silvio Santos, mas logo retoma a dramaticidade melódica.

No Show de Calouros, a faixa ganhou uma nova versão mais animada, inspirada nas marchinhas, adaptada pelo maestro Zezinho, que combinava mais com o anúncio dos jurados de Silvio Santos. O que ninguém poderia imaginar é que a melodia que embalava as entradas de Sergio Mallandro e companhia vinha da gelada Rússia no auge de um conflito político.

Resgate de memória

Com a morte de Silvio Santos, a curiosa história em torno do “hit russo” voltou à tona. Foi quando Irineu Franco Perpetuo e o poeta Guilherme Gontijo Flores tiveram a ideia de traduzi-la para o português, para que os brasileiros pudessem conhecer a verdadeira história por trás da canção original.

“Resolvemos partir da versão de Vertínski”, explica o jornalista. “Queríamos mostrar de onde veio essa melodia que tanta gente conhecia no Brasil, além de trazer também o sentido da letra original, que é de um romantismo nostálgico, lírico e melancólico”, finaliza.

Parte da letra diz:

Nós íamos na troica em guizo e calma,E ao longe umas luzinhas a tremer.Pra dissipar a ángustia de minh'alma,Meu bem, queria estar só com você!

'Na Via Longuíssima'

A versão, gravada de forma caseira, recebeu o nome de Na Via Longuíssima. A melodia retoma o romantismo que a consagrou. Ouça abaixo:

“O Silvio Santos, la, la, la, la, la, la, la...”. Quando ouvia a abertura do Show de Calouros de Silvio Santos, na casa da avó, todo santo domingo, o jornalista e tradutor Irineu Franco Perpetuo não imaginava que por trás da música chiclete existiria uma história envolvendo uma “moda” russa dos tempos da União Soviética e que teve envolvimento até de Paul McCartney.

Anos depois, ao pesquisar a música popular russa, Perpeuto, autor de Como Ler os Russos, se deparou com a melodia que já era velha conhecida. “Foi um espanto”, revela.

A música do Show de Calouros remonta a um sucesso russo de 1925. Chamada Dorogoi Dlinnoyu, a faixa foi composta pelo músico Boris Fomin e por Konstantin Podrévski. A versão mais conhecida na Rússia é de Aleksandr Vertínski, um cantor de cabaré. Ele gravou a faixa em Paris, onde morava, no ano seguinte. Ouça abaixo:

“Era uma canção sentimental, do gênero chamado romança”, explica o jornalista. A “romança” foi uma popular música de salão do século 19, semelhante às nossas modinhas brasileiras.

A letra, romântica, é um lamento nostálgico a um amor que já se foi. A faixa carrega elementos folclóricos e instrumentos populares como violão de sete cordas.

Proibida

Apesar de não apresentar um tom politico, Dorogoi Dlinnoyu foi proibida no país justamente pelo contexto de sua reprodução. A Revolução Russa aconteceu em 1917 e, em 1929, a Conferência Musical de Toda a URSS, em Leningrado, considerou a romança um gênero contrarrevolucionário por remeter aos salões burgueses e aristocráticos, como explica Perpetuo.

Com isso, músicas de Podrévski, o autor da letra, foram proibidas. Fomin, o compositor, foi preso em 1937. Só nos anos 1960 a faixa voltaria a se popularizar na Rússia.

Da Sibéria a Liverpool

Porém, a essa altura a música já tinha atravessando o oceano. Durante a Guerra Fria, em 1953, foi trilha sonora do filme Inocentes em Paris, com roteiro assinado pelo cineasta russo Anatole de Grunwald.

Chegou nos Estados Unidos e, no início dos anos 1960, o músico Gene Raskin correu para registrá-la em seu nome após lançar uma versão adaptada com sua mulher, Francesca. Em inglês, virou These Were The Days e ganhou a cena folk de Nova York.

Em 1968, ninguém menos que Paul McCartney estaria envolvido com a música - ele foi o produtor da versão cantada por Mary Hopkin, justamente a que fez mais sucesso. Na época, conseguiu os direitos autorais da música. Dessa versão, surgiram versões em outras línguas, como o francês e português.

“Acho que dá para cravar que Silvio Santos não conhecia a versão russa, e que o arranjo que ele usou em seu programa certamente vinha dessa versão em inglês”, explica Irineu.

Tema do 'Show de Calouros' é uma românia, semelhante a uma modinha brasileira  Foto: Luludi/ Estadão

No Brasil, virou Aqueles tempos, de Joelma (a da Jovem Guarda, não a do Calypso). A faixa começa ritmada em um tom alegre, que chega a lembrar a abertura do programa de Silvio Santos, mas logo retoma a dramaticidade melódica.

No Show de Calouros, a faixa ganhou uma nova versão mais animada, inspirada nas marchinhas, adaptada pelo maestro Zezinho, que combinava mais com o anúncio dos jurados de Silvio Santos. O que ninguém poderia imaginar é que a melodia que embalava as entradas de Sergio Mallandro e companhia vinha da gelada Rússia no auge de um conflito político.

Resgate de memória

Com a morte de Silvio Santos, a curiosa história em torno do “hit russo” voltou à tona. Foi quando Irineu Franco Perpetuo e o poeta Guilherme Gontijo Flores tiveram a ideia de traduzi-la para o português, para que os brasileiros pudessem conhecer a verdadeira história por trás da canção original.

“Resolvemos partir da versão de Vertínski”, explica o jornalista. “Queríamos mostrar de onde veio essa melodia que tanta gente conhecia no Brasil, além de trazer também o sentido da letra original, que é de um romantismo nostálgico, lírico e melancólico”, finaliza.

Parte da letra diz:

Nós íamos na troica em guizo e calma,E ao longe umas luzinhas a tremer.Pra dissipar a ángustia de minh'alma,Meu bem, queria estar só com você!

'Na Via Longuíssima'

A versão, gravada de forma caseira, recebeu o nome de Na Via Longuíssima. A melodia retoma o romantismo que a consagrou. Ouça abaixo:

“O Silvio Santos, la, la, la, la, la, la, la...”. Quando ouvia a abertura do Show de Calouros de Silvio Santos, na casa da avó, todo santo domingo, o jornalista e tradutor Irineu Franco Perpetuo não imaginava que por trás da música chiclete existiria uma história envolvendo uma “moda” russa dos tempos da União Soviética e que teve envolvimento até de Paul McCartney.

Anos depois, ao pesquisar a música popular russa, Perpeuto, autor de Como Ler os Russos, se deparou com a melodia que já era velha conhecida. “Foi um espanto”, revela.

A música do Show de Calouros remonta a um sucesso russo de 1925. Chamada Dorogoi Dlinnoyu, a faixa foi composta pelo músico Boris Fomin e por Konstantin Podrévski. A versão mais conhecida na Rússia é de Aleksandr Vertínski, um cantor de cabaré. Ele gravou a faixa em Paris, onde morava, no ano seguinte. Ouça abaixo:

“Era uma canção sentimental, do gênero chamado romança”, explica o jornalista. A “romança” foi uma popular música de salão do século 19, semelhante às nossas modinhas brasileiras.

A letra, romântica, é um lamento nostálgico a um amor que já se foi. A faixa carrega elementos folclóricos e instrumentos populares como violão de sete cordas.

Proibida

Apesar de não apresentar um tom politico, Dorogoi Dlinnoyu foi proibida no país justamente pelo contexto de sua reprodução. A Revolução Russa aconteceu em 1917 e, em 1929, a Conferência Musical de Toda a URSS, em Leningrado, considerou a romança um gênero contrarrevolucionário por remeter aos salões burgueses e aristocráticos, como explica Perpetuo.

Com isso, músicas de Podrévski, o autor da letra, foram proibidas. Fomin, o compositor, foi preso em 1937. Só nos anos 1960 a faixa voltaria a se popularizar na Rússia.

Da Sibéria a Liverpool

Porém, a essa altura a música já tinha atravessando o oceano. Durante a Guerra Fria, em 1953, foi trilha sonora do filme Inocentes em Paris, com roteiro assinado pelo cineasta russo Anatole de Grunwald.

Chegou nos Estados Unidos e, no início dos anos 1960, o músico Gene Raskin correu para registrá-la em seu nome após lançar uma versão adaptada com sua mulher, Francesca. Em inglês, virou These Were The Days e ganhou a cena folk de Nova York.

Em 1968, ninguém menos que Paul McCartney estaria envolvido com a música - ele foi o produtor da versão cantada por Mary Hopkin, justamente a que fez mais sucesso. Na época, conseguiu os direitos autorais da música. Dessa versão, surgiram versões em outras línguas, como o francês e português.

“Acho que dá para cravar que Silvio Santos não conhecia a versão russa, e que o arranjo que ele usou em seu programa certamente vinha dessa versão em inglês”, explica Irineu.

Tema do 'Show de Calouros' é uma românia, semelhante a uma modinha brasileira  Foto: Luludi/ Estadão

No Brasil, virou Aqueles tempos, de Joelma (a da Jovem Guarda, não a do Calypso). A faixa começa ritmada em um tom alegre, que chega a lembrar a abertura do programa de Silvio Santos, mas logo retoma a dramaticidade melódica.

No Show de Calouros, a faixa ganhou uma nova versão mais animada, inspirada nas marchinhas, adaptada pelo maestro Zezinho, que combinava mais com o anúncio dos jurados de Silvio Santos. O que ninguém poderia imaginar é que a melodia que embalava as entradas de Sergio Mallandro e companhia vinha da gelada Rússia no auge de um conflito político.

Resgate de memória

Com a morte de Silvio Santos, a curiosa história em torno do “hit russo” voltou à tona. Foi quando Irineu Franco Perpetuo e o poeta Guilherme Gontijo Flores tiveram a ideia de traduzi-la para o português, para que os brasileiros pudessem conhecer a verdadeira história por trás da canção original.

“Resolvemos partir da versão de Vertínski”, explica o jornalista. “Queríamos mostrar de onde veio essa melodia que tanta gente conhecia no Brasil, além de trazer também o sentido da letra original, que é de um romantismo nostálgico, lírico e melancólico”, finaliza.

Parte da letra diz:

Nós íamos na troica em guizo e calma,E ao longe umas luzinhas a tremer.Pra dissipar a ángustia de minh'alma,Meu bem, queria estar só com você!

'Na Via Longuíssima'

A versão, gravada de forma caseira, recebeu o nome de Na Via Longuíssima. A melodia retoma o romantismo que a consagrou. Ouça abaixo:

“O Silvio Santos, la, la, la, la, la, la, la...”. Quando ouvia a abertura do Show de Calouros de Silvio Santos, na casa da avó, todo santo domingo, o jornalista e tradutor Irineu Franco Perpetuo não imaginava que por trás da música chiclete existiria uma história envolvendo uma “moda” russa dos tempos da União Soviética e que teve envolvimento até de Paul McCartney.

Anos depois, ao pesquisar a música popular russa, Perpeuto, autor de Como Ler os Russos, se deparou com a melodia que já era velha conhecida. “Foi um espanto”, revela.

A música do Show de Calouros remonta a um sucesso russo de 1925. Chamada Dorogoi Dlinnoyu, a faixa foi composta pelo músico Boris Fomin e por Konstantin Podrévski. A versão mais conhecida na Rússia é de Aleksandr Vertínski, um cantor de cabaré. Ele gravou a faixa em Paris, onde morava, no ano seguinte. Ouça abaixo:

“Era uma canção sentimental, do gênero chamado romança”, explica o jornalista. A “romança” foi uma popular música de salão do século 19, semelhante às nossas modinhas brasileiras.

A letra, romântica, é um lamento nostálgico a um amor que já se foi. A faixa carrega elementos folclóricos e instrumentos populares como violão de sete cordas.

Proibida

Apesar de não apresentar um tom politico, Dorogoi Dlinnoyu foi proibida no país justamente pelo contexto de sua reprodução. A Revolução Russa aconteceu em 1917 e, em 1929, a Conferência Musical de Toda a URSS, em Leningrado, considerou a romança um gênero contrarrevolucionário por remeter aos salões burgueses e aristocráticos, como explica Perpetuo.

Com isso, músicas de Podrévski, o autor da letra, foram proibidas. Fomin, o compositor, foi preso em 1937. Só nos anos 1960 a faixa voltaria a se popularizar na Rússia.

Da Sibéria a Liverpool

Porém, a essa altura a música já tinha atravessando o oceano. Durante a Guerra Fria, em 1953, foi trilha sonora do filme Inocentes em Paris, com roteiro assinado pelo cineasta russo Anatole de Grunwald.

Chegou nos Estados Unidos e, no início dos anos 1960, o músico Gene Raskin correu para registrá-la em seu nome após lançar uma versão adaptada com sua mulher, Francesca. Em inglês, virou These Were The Days e ganhou a cena folk de Nova York.

Em 1968, ninguém menos que Paul McCartney estaria envolvido com a música - ele foi o produtor da versão cantada por Mary Hopkin, justamente a que fez mais sucesso. Na época, conseguiu os direitos autorais da música. Dessa versão, surgiram versões em outras línguas, como o francês e português.

“Acho que dá para cravar que Silvio Santos não conhecia a versão russa, e que o arranjo que ele usou em seu programa certamente vinha dessa versão em inglês”, explica Irineu.

Tema do 'Show de Calouros' é uma românia, semelhante a uma modinha brasileira  Foto: Luludi/ Estadão

No Brasil, virou Aqueles tempos, de Joelma (a da Jovem Guarda, não a do Calypso). A faixa começa ritmada em um tom alegre, que chega a lembrar a abertura do programa de Silvio Santos, mas logo retoma a dramaticidade melódica.

No Show de Calouros, a faixa ganhou uma nova versão mais animada, inspirada nas marchinhas, adaptada pelo maestro Zezinho, que combinava mais com o anúncio dos jurados de Silvio Santos. O que ninguém poderia imaginar é que a melodia que embalava as entradas de Sergio Mallandro e companhia vinha da gelada Rússia no auge de um conflito político.

Resgate de memória

Com a morte de Silvio Santos, a curiosa história em torno do “hit russo” voltou à tona. Foi quando Irineu Franco Perpetuo e o poeta Guilherme Gontijo Flores tiveram a ideia de traduzi-la para o português, para que os brasileiros pudessem conhecer a verdadeira história por trás da canção original.

“Resolvemos partir da versão de Vertínski”, explica o jornalista. “Queríamos mostrar de onde veio essa melodia que tanta gente conhecia no Brasil, além de trazer também o sentido da letra original, que é de um romantismo nostálgico, lírico e melancólico”, finaliza.

Parte da letra diz:

Nós íamos na troica em guizo e calma,E ao longe umas luzinhas a tremer.Pra dissipar a ángustia de minh'alma,Meu bem, queria estar só com você!

'Na Via Longuíssima'

A versão, gravada de forma caseira, recebeu o nome de Na Via Longuíssima. A melodia retoma o romantismo que a consagrou. Ouça abaixo:

“O Silvio Santos, la, la, la, la, la, la, la...”. Quando ouvia a abertura do Show de Calouros de Silvio Santos, na casa da avó, todo santo domingo, o jornalista e tradutor Irineu Franco Perpetuo não imaginava que por trás da música chiclete existiria uma história envolvendo uma “moda” russa dos tempos da União Soviética e que teve envolvimento até de Paul McCartney.

Anos depois, ao pesquisar a música popular russa, Perpeuto, autor de Como Ler os Russos, se deparou com a melodia que já era velha conhecida. “Foi um espanto”, revela.

A música do Show de Calouros remonta a um sucesso russo de 1925. Chamada Dorogoi Dlinnoyu, a faixa foi composta pelo músico Boris Fomin e por Konstantin Podrévski. A versão mais conhecida na Rússia é de Aleksandr Vertínski, um cantor de cabaré. Ele gravou a faixa em Paris, onde morava, no ano seguinte. Ouça abaixo:

“Era uma canção sentimental, do gênero chamado romança”, explica o jornalista. A “romança” foi uma popular música de salão do século 19, semelhante às nossas modinhas brasileiras.

A letra, romântica, é um lamento nostálgico a um amor que já se foi. A faixa carrega elementos folclóricos e instrumentos populares como violão de sete cordas.

Proibida

Apesar de não apresentar um tom politico, Dorogoi Dlinnoyu foi proibida no país justamente pelo contexto de sua reprodução. A Revolução Russa aconteceu em 1917 e, em 1929, a Conferência Musical de Toda a URSS, em Leningrado, considerou a romança um gênero contrarrevolucionário por remeter aos salões burgueses e aristocráticos, como explica Perpetuo.

Com isso, músicas de Podrévski, o autor da letra, foram proibidas. Fomin, o compositor, foi preso em 1937. Só nos anos 1960 a faixa voltaria a se popularizar na Rússia.

Da Sibéria a Liverpool

Porém, a essa altura a música já tinha atravessando o oceano. Durante a Guerra Fria, em 1953, foi trilha sonora do filme Inocentes em Paris, com roteiro assinado pelo cineasta russo Anatole de Grunwald.

Chegou nos Estados Unidos e, no início dos anos 1960, o músico Gene Raskin correu para registrá-la em seu nome após lançar uma versão adaptada com sua mulher, Francesca. Em inglês, virou These Were The Days e ganhou a cena folk de Nova York.

Em 1968, ninguém menos que Paul McCartney estaria envolvido com a música - ele foi o produtor da versão cantada por Mary Hopkin, justamente a que fez mais sucesso. Na época, conseguiu os direitos autorais da música. Dessa versão, surgiram versões em outras línguas, como o francês e português.

“Acho que dá para cravar que Silvio Santos não conhecia a versão russa, e que o arranjo que ele usou em seu programa certamente vinha dessa versão em inglês”, explica Irineu.

Tema do 'Show de Calouros' é uma românia, semelhante a uma modinha brasileira  Foto: Luludi/ Estadão

No Brasil, virou Aqueles tempos, de Joelma (a da Jovem Guarda, não a do Calypso). A faixa começa ritmada em um tom alegre, que chega a lembrar a abertura do programa de Silvio Santos, mas logo retoma a dramaticidade melódica.

No Show de Calouros, a faixa ganhou uma nova versão mais animada, inspirada nas marchinhas, adaptada pelo maestro Zezinho, que combinava mais com o anúncio dos jurados de Silvio Santos. O que ninguém poderia imaginar é que a melodia que embalava as entradas de Sergio Mallandro e companhia vinha da gelada Rússia no auge de um conflito político.

Resgate de memória

Com a morte de Silvio Santos, a curiosa história em torno do “hit russo” voltou à tona. Foi quando Irineu Franco Perpetuo e o poeta Guilherme Gontijo Flores tiveram a ideia de traduzi-la para o português, para que os brasileiros pudessem conhecer a verdadeira história por trás da canção original.

“Resolvemos partir da versão de Vertínski”, explica o jornalista. “Queríamos mostrar de onde veio essa melodia que tanta gente conhecia no Brasil, além de trazer também o sentido da letra original, que é de um romantismo nostálgico, lírico e melancólico”, finaliza.

Parte da letra diz:

Nós íamos na troica em guizo e calma,E ao longe umas luzinhas a tremer.Pra dissipar a ángustia de minh'alma,Meu bem, queria estar só com você!

'Na Via Longuíssima'

A versão, gravada de forma caseira, recebeu o nome de Na Via Longuíssima. A melodia retoma o romantismo que a consagrou. Ouça abaixo:

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