Guitarrista lembra das brigas do The Police, mas se arrepende do fim prematuro: ‘Acabou muito cedo’


Andy Summers, de 81 anos, fala ao ‘Estadão’ sobre os novos shows no Brasil, da relação conturbada do trio britânico, de Jimi Hendrix e do vínculo com o País: ‘Minha segunda casa’

Por Gabriel Zorzetto
Atualização:
Foto: Denise Andrade
Entrevista comAndy SummersMúsico

Andy Summers é um dos britânicos mais brasileiros que se tem notícia. Roqueiro fã da bossa nova, o eterno guitarrista do The Police detém relação especial com o País desde os 16 anos, quando se apaixonou pelo filme Orfeu do Carnaval (1959) e a trilha de Luiz Bonfá e Tom Jobim.

Hoje, aos 81 anos, ele considera o Brasil sua “segunda casa”. Não apenas por visitar o País de forma constante ou colaborar ao lado de nomes como Roberto Menescal e a cantora Fernanda Takai, mas também por formar, desde 2017, um trio-tributo com músicos cariocas para homenagear seu antigo grupo, expoente fundamental da música pop.

De Los Angeles, Summers falou com exclusividade ao Estadão antes da nova turnê sul-americana do projeto Call The Police. O show em São Paulo em 3 de agosto, no Vibra.

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A homenagem inclui o baixista/vocalista Rodrigo Santos (ex-Barão Vermelho) e João Barone (dos Paralamas do Sucesso), herdeiros da mistura única de rock, reagge e punk que a banda inglesa estabeleceu em apenas cinco discos de estúdio, antes de encerrar as atividades em 1983.

Por videoconferência, o artista falou sobre a longa carreira, incluindo uma passagem fugaz pelo The Animals e um encontro com Jimi Hendrix; o amor pela fotografia; a relação conturbada com seus antigos parceiros Sting e Stewart Copeland; a conquista inusitada de um Grammy; além de sua criação mais reconhecida: o riff de Every Breath You Take, um dos maiores hits de todos os tempos, pelo qual não recebeu crédito de composição.

O vocalista e baixista Sting (e), o baterista Stewart Copeland (c) e o guitarrista Summers (d), durante o show do grupo inglês The Police, no Estádio do Maracanã Foto: Marcos D'paula/AE
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Queria começar falando sobre o breve período que você fez parte do The Animals...

Ah, sério? [faz cara de tédio]

Só um pouco (risos)... Qual sua melhor lembrança daquele período? E você gosta do único álbum do qual fez parte (’Love Is’, de 1968)?

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Eu era muito jovem, morava em Laurel Canyon e fumava muita maconha... [O álbum] É ok, quero dizer, pelos padrões modernos, eu provavelmente mudaria muitas coisas.

Nessa época você teve um encontro com Jimi Hendrix, como foi?

Ele era um cara muito doce, muito introvertido, quieto. Não que ele não fosse um roqueiro monstruoso. Ele realmente gostava de tocar guitarra. Era o oposto do que as pessoas pensam porque ele podia tocar música selvagem, mas não era realmente um cara selvagem na vida. “Tímido” é a palavra que eu usaria.

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Ele foi o maior de todos?

Não, não...

Quem foi então?

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Bem, não há um. Esta a pergunta não faz sentido. Existem muitos guitarristas diferentes, milhões de guitarristas no mundo e há muitos estilos diferentes. Jimmy tocava em seu estilo blues e era o melhor nisso. Ele foi uma grande influência para muitos guitarristas no mundo do rock, mas isso não o torna o maior guitarrista de todos os tempos... Essa entrevista é sobre Jimi Hendrix ou sobre mim? [tom provocativo, com algum humor britânico]

É claro que é sobre você, estamos apenas começando... Você considera o Brasil uma segunda casa? Como começou essa relação?

Sim, considero uma segunda casa. A primeira semente de ideia sobre o Brasil foi quando eu tinha cerca de 16 anos e fui ao cinema de arte que exibia todos esses filmes incríveis de Fellini, Truffaut, Goddard e diretores assim. Eu gostava muito de cinema. Um dos filmes que vi naquela idade foi Orfeu do Carnaval. Eu não sabia onde era esse lugar. Eu não sabia que era o Rio de Janeiro. E esse filme maravilhoso, com ótima música, em particular de Luiz Bonfá, me impressionou. Ele escreveu uma música maravilhosa chamada Manhã de Carnaval e aprendi a tocá-la. Aprendi a tocar violão no estilo brasileiro quando eu era bem jovem. Eu estava destinado a ir para o Brasil e tocar aí em várias situações. Eu amo estar aí. Foi algo que começou quando eu tinha apenas 16 anos e eventualmente preencheu minha vida. Então, é um lugar especial.

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E como você se sente em relação à nossa sociedade sendo um estrangeiro? Acha que somos semelhantes aos norte-americanos?

Sim, em algum grau. Sinto isso mais do que no México. Sinto que o Brasil é muito mais próximo em vários aspectos da vida americana. É um País grande, há muitas partes distintas no Brasil, desde a Amazônia até a parte mais germânica no Sul. Estive em todos os lugares do Brasil.

Já assisti ao Call The Police três vezes, sinto que há variações em relação as músicas originais e você fica mais livre para fazer solos, correto?

Sim, é adorável para mim porque consigo tocar muito mais solos. Não é tão sisudo e os caras estão realmente comigo. É um pouco mais louco, solto e eu gosto desse aspecto.

Por que escolheu Rodrigo e João para o projeto?

Bem, eles são grandes músicos. A coisa começou porque o Rodrigo estava sendo gerenciado pelo cara que sempre me traz ao Brasil e cuida de mim todos esses anos. E naturalmente nós nos juntamos. No começo, não estávamos fazendo nada do The Police, fazíamos outros tipos de música. Até que o nosso empresário, pensando com a cabeça de promotor, pensou: ‘Espere um minuto, vamos pegar um baterista famoso’. Então, ele construiu essa situação. É uma grande atração. Todos nós nos divertimos muito.

Rodrigo Santos, Andy Summers e João Barone formam o tributo Call The Police Foto: Patrícia Câmara

Você já escutou algo do rock brasileiro, como Barão, Paralamas ou Titãs?

Sim, ouvi um pouco. É muito bom, mas rock eu já faço, de qualquer forma. Gosto da música verdadeiramente brasileira, a que realmente começou no final dos anos 50, bossa nova e João Gilberto. Essa é minha ideia de música brasileira. É muito forte no meu coração. Peguei esse tipo de abordagem harmônica mais interessante e levei para o The Police. Por isso a guitarra não soa como uma guitarra de rock padrão do velho estilo. É mais interessante do que isso.

Sei que com o The Police fomos muito copiados no Brasil por muitas dessas bandas, mas está tudo bem.

Andy Summers

A música do The Police soa muito atual e moderna em 2024. Qual é o segredo?

Me sinto muito orgulhoso do fato de que não soar datado. Soa moderno e atribuo isso ao fato de que éramos apenas três e tentávamos manter bem enxuto. É também a maneira como toco guitarra porque, como eu disse, havia certas coisas que eu evitava. Não soava como o rock padrão. E meio que saiu da minha formação. Então, se você quiser ser realmente técnico, eu praticamente não tocava terças menores ou maiores, nós meio que evitávamos a ideia óbvia de harmonia menor e maior. Havia uma espécie de truque harmônico que eu fiz que deu à música um tipo de som legal. Isso não envelheceu tão facilmente e acho que é por isso que ainda parece tão moderno. As melodias são ótimas. É meio como a influência de Miles Davis que usa o espaço como uma qualidade musical.

Seu navegador não suporta esse video.

Você criou o riff de ‘Every Breath You Take’, por que não foi creditado como compositor?

É o que todo mundo fala. É um ponto de discórdia. Não sei, é claro que eu deveria ter recebido [o crédito]. É loucura. Então, não sei como responder a você, entrar em questões legais e todo o resto.

O importante é que quem conhece a história te dá o devido crédito...

[O riff] é a assinatura da canção. Nós realmente não queríamos fazê-la porque não achávamos que era boa o suficiente. Era como se fosse uma música meio cafona. Stewart e Sting estavam discutindo sobre onde o baixo iria, onde a bateria iria. E chegou a um ponto em que iríamos jogá-la fora. Então Sting se virou para mim. Estávamos sentados na mesa de controle e ele disse: ‘Vá lá, torne-a sua’. Em outras palavras, ‘Vá e seja o outro compositor’. Então eu rapidamente toquei a famosa parte da guitarra. Todo mundo se levantou e aplaudiu. Foi o momento em que todo mundo enlouqueceu e disse: ‘Agora vai ser uma música número 1′. E foi direto para o topo das paradas dos EUA.

Há uma canção obscura e instrumental do The Police chamada ‘Behind My Camel’, pela qual você ganhou um Grammy mesmo com resistência do Sting, correto?

É uma história engraçada. Sting não queria fazer essa faixa. Ele pegou a fita e a escondeu no jardim. Mas a recuperamos e o Stewart tocou ela comigo. Depois, eu estava na praia no Rio e me disseram ‘Hey, boas notícias, você ganhou um Grammy por Behind My Camel’. Fiquei muito satisfeito.

Sobre as brigas famosas na banda, quanto é lenda e o quanto é verdade?

Há um pouco de mitologia porque se tudo o que fizéssemos fosse brigar, teríamos terminado bem antes. As pessoas gostavam do papel que a mídia estampava: de que a gente só brigava... Não, nós nos divertimos muito, na maior parte do tempo, mas tinham muitas faíscas, porque todos temos personalidades fortes, e tinha muito ego. Todo mundo queria ser o líder da banda, mas não havia um, então às vezes tivemos que chegar a essas situações: dois, três homens lutando.

Não gosto de pensar como se odiássemos uns aos outros. Não é verdade. É a mídia que fez isso.

Andy Summers, sobre as folclóricas brigas no The Police

O guitarrista Andy Summers (d), tendo ao fundo o baterista Stewart Copeland e a imagem do vocalista e baixista Sting, durante o show do grupo inglês The Police, no Estádio do Maracanã Foto: Marcos D'paula/AE

E olhando para trás, você acha que a banda terminou no momento certo, no auge?

Estávamos no topo do mundo naquela época. Acho que acabou muito cedo. Poderíamos ter continuado, ter tido muito mais discos em primeiro lugar das paradas, mas o cantor queria sair e achava que poderia fazer isso por conta própria, o que até certo ponto ele fez, mas ele não é tão grande quanto o The Police. Sem dúvidas sobre isso. Ele consegue atrair, sei lá, 5 mil pessoas por noite. Com o The Police eram 50 mil.

Como é sua relação com Sting e Copeland hoje? São amigos?

Bem, não somos inimigos. São negócios. Há um legado com todos esses discos vendidos aos milhões, todos esses sucessos [que chegaram ao] número 1 e nós cuidamos disso. Temos advogados e tudo mais, sabe como é.

Há muito material inédito que ainda pode ser lançado?

Pode até haver algumas gravações ao vivo por aí, mas acho que já vasculhamos praticamente tudo. Este novo lançamento que está saindo agora [disponível a partir de 26/07 nos EUA], o box da reedição de Synchronicity (1983), tem um monte de faixas que eu nunca nem ouvi, mas a gravadora encontrou elas.

É o seu álbum favorito?

Não, meu favorito é o segundo disco, Regatta de Blanc (1979), porque eu senti que estávamos realmente começando a ter a nossa cara e foi um momento muito empolgante. Fizemos aquele disco em 10 dias. Foi rápido porque estávamos começando a realmente encontrar o nosso jeito de tocar.

'Legs', fotografia de Andy Summers Foto: Andy Summers

Pra finalizar, por favor, queria que falasse sobre como desenvolveu seu amor pela fotografia...

A semente foi também quando vi Orfeu de Carnaval, por causa da fotografia em preto e branco. Eu pensava que seria diretor de cinema, mas também era um guitarrista obsessivo. Certa vez, com o The Police, estávamos em Nova York e nos primeiros dias tínhamos muito tempo de espera para os shows. Estávamos rodeados por fotógrafos, na maioria mulheres por alguma razão, sempre tirando fotos nossas. Comecei a olhar para as câmeras delas, os equipamentos e fiquei meio interessado. Uma das garotas me levou a uma ótima loja de câmeras, comprei uma e comecei a levar isso a sério. Estudei os grandes fotógrafos, melhorei tecnicamente, usando lentes diferentes e tudo mais. Por sorte, eu estava viajando o mundo com o The Police e tirava fotos o tempo todo. Então, tive uma incrível visão por dentro do The Police que nenhum outro fotógrafo teve.

Call The Police 2024 – The Police Greatest Hits

  • Onde: Vibra São Paulo (Av. das Nações Unidas, 17955)
  • Data: 3 de agosto de 2024
  • Ingressos: uhuu.com
  • Preços: a partir de R$60,00

Andy Summers é um dos britânicos mais brasileiros que se tem notícia. Roqueiro fã da bossa nova, o eterno guitarrista do The Police detém relação especial com o País desde os 16 anos, quando se apaixonou pelo filme Orfeu do Carnaval (1959) e a trilha de Luiz Bonfá e Tom Jobim.

Hoje, aos 81 anos, ele considera o Brasil sua “segunda casa”. Não apenas por visitar o País de forma constante ou colaborar ao lado de nomes como Roberto Menescal e a cantora Fernanda Takai, mas também por formar, desde 2017, um trio-tributo com músicos cariocas para homenagear seu antigo grupo, expoente fundamental da música pop.

De Los Angeles, Summers falou com exclusividade ao Estadão antes da nova turnê sul-americana do projeto Call The Police. O show em São Paulo em 3 de agosto, no Vibra.

A homenagem inclui o baixista/vocalista Rodrigo Santos (ex-Barão Vermelho) e João Barone (dos Paralamas do Sucesso), herdeiros da mistura única de rock, reagge e punk que a banda inglesa estabeleceu em apenas cinco discos de estúdio, antes de encerrar as atividades em 1983.

Por videoconferência, o artista falou sobre a longa carreira, incluindo uma passagem fugaz pelo The Animals e um encontro com Jimi Hendrix; o amor pela fotografia; a relação conturbada com seus antigos parceiros Sting e Stewart Copeland; a conquista inusitada de um Grammy; além de sua criação mais reconhecida: o riff de Every Breath You Take, um dos maiores hits de todos os tempos, pelo qual não recebeu crédito de composição.

O vocalista e baixista Sting (e), o baterista Stewart Copeland (c) e o guitarrista Summers (d), durante o show do grupo inglês The Police, no Estádio do Maracanã Foto: Marcos D'paula/AE

Queria começar falando sobre o breve período que você fez parte do The Animals...

Ah, sério? [faz cara de tédio]

Só um pouco (risos)... Qual sua melhor lembrança daquele período? E você gosta do único álbum do qual fez parte (’Love Is’, de 1968)?

Eu era muito jovem, morava em Laurel Canyon e fumava muita maconha... [O álbum] É ok, quero dizer, pelos padrões modernos, eu provavelmente mudaria muitas coisas.

Nessa época você teve um encontro com Jimi Hendrix, como foi?

Ele era um cara muito doce, muito introvertido, quieto. Não que ele não fosse um roqueiro monstruoso. Ele realmente gostava de tocar guitarra. Era o oposto do que as pessoas pensam porque ele podia tocar música selvagem, mas não era realmente um cara selvagem na vida. “Tímido” é a palavra que eu usaria.

Ele foi o maior de todos?

Não, não...

Quem foi então?

Bem, não há um. Esta a pergunta não faz sentido. Existem muitos guitarristas diferentes, milhões de guitarristas no mundo e há muitos estilos diferentes. Jimmy tocava em seu estilo blues e era o melhor nisso. Ele foi uma grande influência para muitos guitarristas no mundo do rock, mas isso não o torna o maior guitarrista de todos os tempos... Essa entrevista é sobre Jimi Hendrix ou sobre mim? [tom provocativo, com algum humor britânico]

É claro que é sobre você, estamos apenas começando... Você considera o Brasil uma segunda casa? Como começou essa relação?

Sim, considero uma segunda casa. A primeira semente de ideia sobre o Brasil foi quando eu tinha cerca de 16 anos e fui ao cinema de arte que exibia todos esses filmes incríveis de Fellini, Truffaut, Goddard e diretores assim. Eu gostava muito de cinema. Um dos filmes que vi naquela idade foi Orfeu do Carnaval. Eu não sabia onde era esse lugar. Eu não sabia que era o Rio de Janeiro. E esse filme maravilhoso, com ótima música, em particular de Luiz Bonfá, me impressionou. Ele escreveu uma música maravilhosa chamada Manhã de Carnaval e aprendi a tocá-la. Aprendi a tocar violão no estilo brasileiro quando eu era bem jovem. Eu estava destinado a ir para o Brasil e tocar aí em várias situações. Eu amo estar aí. Foi algo que começou quando eu tinha apenas 16 anos e eventualmente preencheu minha vida. Então, é um lugar especial.

E como você se sente em relação à nossa sociedade sendo um estrangeiro? Acha que somos semelhantes aos norte-americanos?

Sim, em algum grau. Sinto isso mais do que no México. Sinto que o Brasil é muito mais próximo em vários aspectos da vida americana. É um País grande, há muitas partes distintas no Brasil, desde a Amazônia até a parte mais germânica no Sul. Estive em todos os lugares do Brasil.

Já assisti ao Call The Police três vezes, sinto que há variações em relação as músicas originais e você fica mais livre para fazer solos, correto?

Sim, é adorável para mim porque consigo tocar muito mais solos. Não é tão sisudo e os caras estão realmente comigo. É um pouco mais louco, solto e eu gosto desse aspecto.

Por que escolheu Rodrigo e João para o projeto?

Bem, eles são grandes músicos. A coisa começou porque o Rodrigo estava sendo gerenciado pelo cara que sempre me traz ao Brasil e cuida de mim todos esses anos. E naturalmente nós nos juntamos. No começo, não estávamos fazendo nada do The Police, fazíamos outros tipos de música. Até que o nosso empresário, pensando com a cabeça de promotor, pensou: ‘Espere um minuto, vamos pegar um baterista famoso’. Então, ele construiu essa situação. É uma grande atração. Todos nós nos divertimos muito.

Rodrigo Santos, Andy Summers e João Barone formam o tributo Call The Police Foto: Patrícia Câmara

Você já escutou algo do rock brasileiro, como Barão, Paralamas ou Titãs?

Sim, ouvi um pouco. É muito bom, mas rock eu já faço, de qualquer forma. Gosto da música verdadeiramente brasileira, a que realmente começou no final dos anos 50, bossa nova e João Gilberto. Essa é minha ideia de música brasileira. É muito forte no meu coração. Peguei esse tipo de abordagem harmônica mais interessante e levei para o The Police. Por isso a guitarra não soa como uma guitarra de rock padrão do velho estilo. É mais interessante do que isso.

Sei que com o The Police fomos muito copiados no Brasil por muitas dessas bandas, mas está tudo bem.

Andy Summers

A música do The Police soa muito atual e moderna em 2024. Qual é o segredo?

Me sinto muito orgulhoso do fato de que não soar datado. Soa moderno e atribuo isso ao fato de que éramos apenas três e tentávamos manter bem enxuto. É também a maneira como toco guitarra porque, como eu disse, havia certas coisas que eu evitava. Não soava como o rock padrão. E meio que saiu da minha formação. Então, se você quiser ser realmente técnico, eu praticamente não tocava terças menores ou maiores, nós meio que evitávamos a ideia óbvia de harmonia menor e maior. Havia uma espécie de truque harmônico que eu fiz que deu à música um tipo de som legal. Isso não envelheceu tão facilmente e acho que é por isso que ainda parece tão moderno. As melodias são ótimas. É meio como a influência de Miles Davis que usa o espaço como uma qualidade musical.

Seu navegador não suporta esse video.

Você criou o riff de ‘Every Breath You Take’, por que não foi creditado como compositor?

É o que todo mundo fala. É um ponto de discórdia. Não sei, é claro que eu deveria ter recebido [o crédito]. É loucura. Então, não sei como responder a você, entrar em questões legais e todo o resto.

O importante é que quem conhece a história te dá o devido crédito...

[O riff] é a assinatura da canção. Nós realmente não queríamos fazê-la porque não achávamos que era boa o suficiente. Era como se fosse uma música meio cafona. Stewart e Sting estavam discutindo sobre onde o baixo iria, onde a bateria iria. E chegou a um ponto em que iríamos jogá-la fora. Então Sting se virou para mim. Estávamos sentados na mesa de controle e ele disse: ‘Vá lá, torne-a sua’. Em outras palavras, ‘Vá e seja o outro compositor’. Então eu rapidamente toquei a famosa parte da guitarra. Todo mundo se levantou e aplaudiu. Foi o momento em que todo mundo enlouqueceu e disse: ‘Agora vai ser uma música número 1′. E foi direto para o topo das paradas dos EUA.

Há uma canção obscura e instrumental do The Police chamada ‘Behind My Camel’, pela qual você ganhou um Grammy mesmo com resistência do Sting, correto?

É uma história engraçada. Sting não queria fazer essa faixa. Ele pegou a fita e a escondeu no jardim. Mas a recuperamos e o Stewart tocou ela comigo. Depois, eu estava na praia no Rio e me disseram ‘Hey, boas notícias, você ganhou um Grammy por Behind My Camel’. Fiquei muito satisfeito.

Sobre as brigas famosas na banda, quanto é lenda e o quanto é verdade?

Há um pouco de mitologia porque se tudo o que fizéssemos fosse brigar, teríamos terminado bem antes. As pessoas gostavam do papel que a mídia estampava: de que a gente só brigava... Não, nós nos divertimos muito, na maior parte do tempo, mas tinham muitas faíscas, porque todos temos personalidades fortes, e tinha muito ego. Todo mundo queria ser o líder da banda, mas não havia um, então às vezes tivemos que chegar a essas situações: dois, três homens lutando.

Não gosto de pensar como se odiássemos uns aos outros. Não é verdade. É a mídia que fez isso.

Andy Summers, sobre as folclóricas brigas no The Police

O guitarrista Andy Summers (d), tendo ao fundo o baterista Stewart Copeland e a imagem do vocalista e baixista Sting, durante o show do grupo inglês The Police, no Estádio do Maracanã Foto: Marcos D'paula/AE

E olhando para trás, você acha que a banda terminou no momento certo, no auge?

Estávamos no topo do mundo naquela época. Acho que acabou muito cedo. Poderíamos ter continuado, ter tido muito mais discos em primeiro lugar das paradas, mas o cantor queria sair e achava que poderia fazer isso por conta própria, o que até certo ponto ele fez, mas ele não é tão grande quanto o The Police. Sem dúvidas sobre isso. Ele consegue atrair, sei lá, 5 mil pessoas por noite. Com o The Police eram 50 mil.

Como é sua relação com Sting e Copeland hoje? São amigos?

Bem, não somos inimigos. São negócios. Há um legado com todos esses discos vendidos aos milhões, todos esses sucessos [que chegaram ao] número 1 e nós cuidamos disso. Temos advogados e tudo mais, sabe como é.

Há muito material inédito que ainda pode ser lançado?

Pode até haver algumas gravações ao vivo por aí, mas acho que já vasculhamos praticamente tudo. Este novo lançamento que está saindo agora [disponível a partir de 26/07 nos EUA], o box da reedição de Synchronicity (1983), tem um monte de faixas que eu nunca nem ouvi, mas a gravadora encontrou elas.

É o seu álbum favorito?

Não, meu favorito é o segundo disco, Regatta de Blanc (1979), porque eu senti que estávamos realmente começando a ter a nossa cara e foi um momento muito empolgante. Fizemos aquele disco em 10 dias. Foi rápido porque estávamos começando a realmente encontrar o nosso jeito de tocar.

'Legs', fotografia de Andy Summers Foto: Andy Summers

Pra finalizar, por favor, queria que falasse sobre como desenvolveu seu amor pela fotografia...

A semente foi também quando vi Orfeu de Carnaval, por causa da fotografia em preto e branco. Eu pensava que seria diretor de cinema, mas também era um guitarrista obsessivo. Certa vez, com o The Police, estávamos em Nova York e nos primeiros dias tínhamos muito tempo de espera para os shows. Estávamos rodeados por fotógrafos, na maioria mulheres por alguma razão, sempre tirando fotos nossas. Comecei a olhar para as câmeras delas, os equipamentos e fiquei meio interessado. Uma das garotas me levou a uma ótima loja de câmeras, comprei uma e comecei a levar isso a sério. Estudei os grandes fotógrafos, melhorei tecnicamente, usando lentes diferentes e tudo mais. Por sorte, eu estava viajando o mundo com o The Police e tirava fotos o tempo todo. Então, tive uma incrível visão por dentro do The Police que nenhum outro fotógrafo teve.

Call The Police 2024 – The Police Greatest Hits

  • Onde: Vibra São Paulo (Av. das Nações Unidas, 17955)
  • Data: 3 de agosto de 2024
  • Ingressos: uhuu.com
  • Preços: a partir de R$60,00

Andy Summers é um dos britânicos mais brasileiros que se tem notícia. Roqueiro fã da bossa nova, o eterno guitarrista do The Police detém relação especial com o País desde os 16 anos, quando se apaixonou pelo filme Orfeu do Carnaval (1959) e a trilha de Luiz Bonfá e Tom Jobim.

Hoje, aos 81 anos, ele considera o Brasil sua “segunda casa”. Não apenas por visitar o País de forma constante ou colaborar ao lado de nomes como Roberto Menescal e a cantora Fernanda Takai, mas também por formar, desde 2017, um trio-tributo com músicos cariocas para homenagear seu antigo grupo, expoente fundamental da música pop.

De Los Angeles, Summers falou com exclusividade ao Estadão antes da nova turnê sul-americana do projeto Call The Police. O show em São Paulo em 3 de agosto, no Vibra.

A homenagem inclui o baixista/vocalista Rodrigo Santos (ex-Barão Vermelho) e João Barone (dos Paralamas do Sucesso), herdeiros da mistura única de rock, reagge e punk que a banda inglesa estabeleceu em apenas cinco discos de estúdio, antes de encerrar as atividades em 1983.

Por videoconferência, o artista falou sobre a longa carreira, incluindo uma passagem fugaz pelo The Animals e um encontro com Jimi Hendrix; o amor pela fotografia; a relação conturbada com seus antigos parceiros Sting e Stewart Copeland; a conquista inusitada de um Grammy; além de sua criação mais reconhecida: o riff de Every Breath You Take, um dos maiores hits de todos os tempos, pelo qual não recebeu crédito de composição.

O vocalista e baixista Sting (e), o baterista Stewart Copeland (c) e o guitarrista Summers (d), durante o show do grupo inglês The Police, no Estádio do Maracanã Foto: Marcos D'paula/AE

Queria começar falando sobre o breve período que você fez parte do The Animals...

Ah, sério? [faz cara de tédio]

Só um pouco (risos)... Qual sua melhor lembrança daquele período? E você gosta do único álbum do qual fez parte (’Love Is’, de 1968)?

Eu era muito jovem, morava em Laurel Canyon e fumava muita maconha... [O álbum] É ok, quero dizer, pelos padrões modernos, eu provavelmente mudaria muitas coisas.

Nessa época você teve um encontro com Jimi Hendrix, como foi?

Ele era um cara muito doce, muito introvertido, quieto. Não que ele não fosse um roqueiro monstruoso. Ele realmente gostava de tocar guitarra. Era o oposto do que as pessoas pensam porque ele podia tocar música selvagem, mas não era realmente um cara selvagem na vida. “Tímido” é a palavra que eu usaria.

Ele foi o maior de todos?

Não, não...

Quem foi então?

Bem, não há um. Esta a pergunta não faz sentido. Existem muitos guitarristas diferentes, milhões de guitarristas no mundo e há muitos estilos diferentes. Jimmy tocava em seu estilo blues e era o melhor nisso. Ele foi uma grande influência para muitos guitarristas no mundo do rock, mas isso não o torna o maior guitarrista de todos os tempos... Essa entrevista é sobre Jimi Hendrix ou sobre mim? [tom provocativo, com algum humor britânico]

É claro que é sobre você, estamos apenas começando... Você considera o Brasil uma segunda casa? Como começou essa relação?

Sim, considero uma segunda casa. A primeira semente de ideia sobre o Brasil foi quando eu tinha cerca de 16 anos e fui ao cinema de arte que exibia todos esses filmes incríveis de Fellini, Truffaut, Goddard e diretores assim. Eu gostava muito de cinema. Um dos filmes que vi naquela idade foi Orfeu do Carnaval. Eu não sabia onde era esse lugar. Eu não sabia que era o Rio de Janeiro. E esse filme maravilhoso, com ótima música, em particular de Luiz Bonfá, me impressionou. Ele escreveu uma música maravilhosa chamada Manhã de Carnaval e aprendi a tocá-la. Aprendi a tocar violão no estilo brasileiro quando eu era bem jovem. Eu estava destinado a ir para o Brasil e tocar aí em várias situações. Eu amo estar aí. Foi algo que começou quando eu tinha apenas 16 anos e eventualmente preencheu minha vida. Então, é um lugar especial.

E como você se sente em relação à nossa sociedade sendo um estrangeiro? Acha que somos semelhantes aos norte-americanos?

Sim, em algum grau. Sinto isso mais do que no México. Sinto que o Brasil é muito mais próximo em vários aspectos da vida americana. É um País grande, há muitas partes distintas no Brasil, desde a Amazônia até a parte mais germânica no Sul. Estive em todos os lugares do Brasil.

Já assisti ao Call The Police três vezes, sinto que há variações em relação as músicas originais e você fica mais livre para fazer solos, correto?

Sim, é adorável para mim porque consigo tocar muito mais solos. Não é tão sisudo e os caras estão realmente comigo. É um pouco mais louco, solto e eu gosto desse aspecto.

Por que escolheu Rodrigo e João para o projeto?

Bem, eles são grandes músicos. A coisa começou porque o Rodrigo estava sendo gerenciado pelo cara que sempre me traz ao Brasil e cuida de mim todos esses anos. E naturalmente nós nos juntamos. No começo, não estávamos fazendo nada do The Police, fazíamos outros tipos de música. Até que o nosso empresário, pensando com a cabeça de promotor, pensou: ‘Espere um minuto, vamos pegar um baterista famoso’. Então, ele construiu essa situação. É uma grande atração. Todos nós nos divertimos muito.

Rodrigo Santos, Andy Summers e João Barone formam o tributo Call The Police Foto: Patrícia Câmara

Você já escutou algo do rock brasileiro, como Barão, Paralamas ou Titãs?

Sim, ouvi um pouco. É muito bom, mas rock eu já faço, de qualquer forma. Gosto da música verdadeiramente brasileira, a que realmente começou no final dos anos 50, bossa nova e João Gilberto. Essa é minha ideia de música brasileira. É muito forte no meu coração. Peguei esse tipo de abordagem harmônica mais interessante e levei para o The Police. Por isso a guitarra não soa como uma guitarra de rock padrão do velho estilo. É mais interessante do que isso.

Sei que com o The Police fomos muito copiados no Brasil por muitas dessas bandas, mas está tudo bem.

Andy Summers

A música do The Police soa muito atual e moderna em 2024. Qual é o segredo?

Me sinto muito orgulhoso do fato de que não soar datado. Soa moderno e atribuo isso ao fato de que éramos apenas três e tentávamos manter bem enxuto. É também a maneira como toco guitarra porque, como eu disse, havia certas coisas que eu evitava. Não soava como o rock padrão. E meio que saiu da minha formação. Então, se você quiser ser realmente técnico, eu praticamente não tocava terças menores ou maiores, nós meio que evitávamos a ideia óbvia de harmonia menor e maior. Havia uma espécie de truque harmônico que eu fiz que deu à música um tipo de som legal. Isso não envelheceu tão facilmente e acho que é por isso que ainda parece tão moderno. As melodias são ótimas. É meio como a influência de Miles Davis que usa o espaço como uma qualidade musical.

Seu navegador não suporta esse video.

Você criou o riff de ‘Every Breath You Take’, por que não foi creditado como compositor?

É o que todo mundo fala. É um ponto de discórdia. Não sei, é claro que eu deveria ter recebido [o crédito]. É loucura. Então, não sei como responder a você, entrar em questões legais e todo o resto.

O importante é que quem conhece a história te dá o devido crédito...

[O riff] é a assinatura da canção. Nós realmente não queríamos fazê-la porque não achávamos que era boa o suficiente. Era como se fosse uma música meio cafona. Stewart e Sting estavam discutindo sobre onde o baixo iria, onde a bateria iria. E chegou a um ponto em que iríamos jogá-la fora. Então Sting se virou para mim. Estávamos sentados na mesa de controle e ele disse: ‘Vá lá, torne-a sua’. Em outras palavras, ‘Vá e seja o outro compositor’. Então eu rapidamente toquei a famosa parte da guitarra. Todo mundo se levantou e aplaudiu. Foi o momento em que todo mundo enlouqueceu e disse: ‘Agora vai ser uma música número 1′. E foi direto para o topo das paradas dos EUA.

Há uma canção obscura e instrumental do The Police chamada ‘Behind My Camel’, pela qual você ganhou um Grammy mesmo com resistência do Sting, correto?

É uma história engraçada. Sting não queria fazer essa faixa. Ele pegou a fita e a escondeu no jardim. Mas a recuperamos e o Stewart tocou ela comigo. Depois, eu estava na praia no Rio e me disseram ‘Hey, boas notícias, você ganhou um Grammy por Behind My Camel’. Fiquei muito satisfeito.

Sobre as brigas famosas na banda, quanto é lenda e o quanto é verdade?

Há um pouco de mitologia porque se tudo o que fizéssemos fosse brigar, teríamos terminado bem antes. As pessoas gostavam do papel que a mídia estampava: de que a gente só brigava... Não, nós nos divertimos muito, na maior parte do tempo, mas tinham muitas faíscas, porque todos temos personalidades fortes, e tinha muito ego. Todo mundo queria ser o líder da banda, mas não havia um, então às vezes tivemos que chegar a essas situações: dois, três homens lutando.

Não gosto de pensar como se odiássemos uns aos outros. Não é verdade. É a mídia que fez isso.

Andy Summers, sobre as folclóricas brigas no The Police

O guitarrista Andy Summers (d), tendo ao fundo o baterista Stewart Copeland e a imagem do vocalista e baixista Sting, durante o show do grupo inglês The Police, no Estádio do Maracanã Foto: Marcos D'paula/AE

E olhando para trás, você acha que a banda terminou no momento certo, no auge?

Estávamos no topo do mundo naquela época. Acho que acabou muito cedo. Poderíamos ter continuado, ter tido muito mais discos em primeiro lugar das paradas, mas o cantor queria sair e achava que poderia fazer isso por conta própria, o que até certo ponto ele fez, mas ele não é tão grande quanto o The Police. Sem dúvidas sobre isso. Ele consegue atrair, sei lá, 5 mil pessoas por noite. Com o The Police eram 50 mil.

Como é sua relação com Sting e Copeland hoje? São amigos?

Bem, não somos inimigos. São negócios. Há um legado com todos esses discos vendidos aos milhões, todos esses sucessos [que chegaram ao] número 1 e nós cuidamos disso. Temos advogados e tudo mais, sabe como é.

Há muito material inédito que ainda pode ser lançado?

Pode até haver algumas gravações ao vivo por aí, mas acho que já vasculhamos praticamente tudo. Este novo lançamento que está saindo agora [disponível a partir de 26/07 nos EUA], o box da reedição de Synchronicity (1983), tem um monte de faixas que eu nunca nem ouvi, mas a gravadora encontrou elas.

É o seu álbum favorito?

Não, meu favorito é o segundo disco, Regatta de Blanc (1979), porque eu senti que estávamos realmente começando a ter a nossa cara e foi um momento muito empolgante. Fizemos aquele disco em 10 dias. Foi rápido porque estávamos começando a realmente encontrar o nosso jeito de tocar.

'Legs', fotografia de Andy Summers Foto: Andy Summers

Pra finalizar, por favor, queria que falasse sobre como desenvolveu seu amor pela fotografia...

A semente foi também quando vi Orfeu de Carnaval, por causa da fotografia em preto e branco. Eu pensava que seria diretor de cinema, mas também era um guitarrista obsessivo. Certa vez, com o The Police, estávamos em Nova York e nos primeiros dias tínhamos muito tempo de espera para os shows. Estávamos rodeados por fotógrafos, na maioria mulheres por alguma razão, sempre tirando fotos nossas. Comecei a olhar para as câmeras delas, os equipamentos e fiquei meio interessado. Uma das garotas me levou a uma ótima loja de câmeras, comprei uma e comecei a levar isso a sério. Estudei os grandes fotógrafos, melhorei tecnicamente, usando lentes diferentes e tudo mais. Por sorte, eu estava viajando o mundo com o The Police e tirava fotos o tempo todo. Então, tive uma incrível visão por dentro do The Police que nenhum outro fotógrafo teve.

Call The Police 2024 – The Police Greatest Hits

  • Onde: Vibra São Paulo (Av. das Nações Unidas, 17955)
  • Data: 3 de agosto de 2024
  • Ingressos: uhuu.com
  • Preços: a partir de R$60,00

Andy Summers é um dos britânicos mais brasileiros que se tem notícia. Roqueiro fã da bossa nova, o eterno guitarrista do The Police detém relação especial com o País desde os 16 anos, quando se apaixonou pelo filme Orfeu do Carnaval (1959) e a trilha de Luiz Bonfá e Tom Jobim.

Hoje, aos 81 anos, ele considera o Brasil sua “segunda casa”. Não apenas por visitar o País de forma constante ou colaborar ao lado de nomes como Roberto Menescal e a cantora Fernanda Takai, mas também por formar, desde 2017, um trio-tributo com músicos cariocas para homenagear seu antigo grupo, expoente fundamental da música pop.

De Los Angeles, Summers falou com exclusividade ao Estadão antes da nova turnê sul-americana do projeto Call The Police. O show em São Paulo em 3 de agosto, no Vibra.

A homenagem inclui o baixista/vocalista Rodrigo Santos (ex-Barão Vermelho) e João Barone (dos Paralamas do Sucesso), herdeiros da mistura única de rock, reagge e punk que a banda inglesa estabeleceu em apenas cinco discos de estúdio, antes de encerrar as atividades em 1983.

Por videoconferência, o artista falou sobre a longa carreira, incluindo uma passagem fugaz pelo The Animals e um encontro com Jimi Hendrix; o amor pela fotografia; a relação conturbada com seus antigos parceiros Sting e Stewart Copeland; a conquista inusitada de um Grammy; além de sua criação mais reconhecida: o riff de Every Breath You Take, um dos maiores hits de todos os tempos, pelo qual não recebeu crédito de composição.

O vocalista e baixista Sting (e), o baterista Stewart Copeland (c) e o guitarrista Summers (d), durante o show do grupo inglês The Police, no Estádio do Maracanã Foto: Marcos D'paula/AE

Queria começar falando sobre o breve período que você fez parte do The Animals...

Ah, sério? [faz cara de tédio]

Só um pouco (risos)... Qual sua melhor lembrança daquele período? E você gosta do único álbum do qual fez parte (’Love Is’, de 1968)?

Eu era muito jovem, morava em Laurel Canyon e fumava muita maconha... [O álbum] É ok, quero dizer, pelos padrões modernos, eu provavelmente mudaria muitas coisas.

Nessa época você teve um encontro com Jimi Hendrix, como foi?

Ele era um cara muito doce, muito introvertido, quieto. Não que ele não fosse um roqueiro monstruoso. Ele realmente gostava de tocar guitarra. Era o oposto do que as pessoas pensam porque ele podia tocar música selvagem, mas não era realmente um cara selvagem na vida. “Tímido” é a palavra que eu usaria.

Ele foi o maior de todos?

Não, não...

Quem foi então?

Bem, não há um. Esta a pergunta não faz sentido. Existem muitos guitarristas diferentes, milhões de guitarristas no mundo e há muitos estilos diferentes. Jimmy tocava em seu estilo blues e era o melhor nisso. Ele foi uma grande influência para muitos guitarristas no mundo do rock, mas isso não o torna o maior guitarrista de todos os tempos... Essa entrevista é sobre Jimi Hendrix ou sobre mim? [tom provocativo, com algum humor britânico]

É claro que é sobre você, estamos apenas começando... Você considera o Brasil uma segunda casa? Como começou essa relação?

Sim, considero uma segunda casa. A primeira semente de ideia sobre o Brasil foi quando eu tinha cerca de 16 anos e fui ao cinema de arte que exibia todos esses filmes incríveis de Fellini, Truffaut, Goddard e diretores assim. Eu gostava muito de cinema. Um dos filmes que vi naquela idade foi Orfeu do Carnaval. Eu não sabia onde era esse lugar. Eu não sabia que era o Rio de Janeiro. E esse filme maravilhoso, com ótima música, em particular de Luiz Bonfá, me impressionou. Ele escreveu uma música maravilhosa chamada Manhã de Carnaval e aprendi a tocá-la. Aprendi a tocar violão no estilo brasileiro quando eu era bem jovem. Eu estava destinado a ir para o Brasil e tocar aí em várias situações. Eu amo estar aí. Foi algo que começou quando eu tinha apenas 16 anos e eventualmente preencheu minha vida. Então, é um lugar especial.

E como você se sente em relação à nossa sociedade sendo um estrangeiro? Acha que somos semelhantes aos norte-americanos?

Sim, em algum grau. Sinto isso mais do que no México. Sinto que o Brasil é muito mais próximo em vários aspectos da vida americana. É um País grande, há muitas partes distintas no Brasil, desde a Amazônia até a parte mais germânica no Sul. Estive em todos os lugares do Brasil.

Já assisti ao Call The Police três vezes, sinto que há variações em relação as músicas originais e você fica mais livre para fazer solos, correto?

Sim, é adorável para mim porque consigo tocar muito mais solos. Não é tão sisudo e os caras estão realmente comigo. É um pouco mais louco, solto e eu gosto desse aspecto.

Por que escolheu Rodrigo e João para o projeto?

Bem, eles são grandes músicos. A coisa começou porque o Rodrigo estava sendo gerenciado pelo cara que sempre me traz ao Brasil e cuida de mim todos esses anos. E naturalmente nós nos juntamos. No começo, não estávamos fazendo nada do The Police, fazíamos outros tipos de música. Até que o nosso empresário, pensando com a cabeça de promotor, pensou: ‘Espere um minuto, vamos pegar um baterista famoso’. Então, ele construiu essa situação. É uma grande atração. Todos nós nos divertimos muito.

Rodrigo Santos, Andy Summers e João Barone formam o tributo Call The Police Foto: Patrícia Câmara

Você já escutou algo do rock brasileiro, como Barão, Paralamas ou Titãs?

Sim, ouvi um pouco. É muito bom, mas rock eu já faço, de qualquer forma. Gosto da música verdadeiramente brasileira, a que realmente começou no final dos anos 50, bossa nova e João Gilberto. Essa é minha ideia de música brasileira. É muito forte no meu coração. Peguei esse tipo de abordagem harmônica mais interessante e levei para o The Police. Por isso a guitarra não soa como uma guitarra de rock padrão do velho estilo. É mais interessante do que isso.

Sei que com o The Police fomos muito copiados no Brasil por muitas dessas bandas, mas está tudo bem.

Andy Summers

A música do The Police soa muito atual e moderna em 2024. Qual é o segredo?

Me sinto muito orgulhoso do fato de que não soar datado. Soa moderno e atribuo isso ao fato de que éramos apenas três e tentávamos manter bem enxuto. É também a maneira como toco guitarra porque, como eu disse, havia certas coisas que eu evitava. Não soava como o rock padrão. E meio que saiu da minha formação. Então, se você quiser ser realmente técnico, eu praticamente não tocava terças menores ou maiores, nós meio que evitávamos a ideia óbvia de harmonia menor e maior. Havia uma espécie de truque harmônico que eu fiz que deu à música um tipo de som legal. Isso não envelheceu tão facilmente e acho que é por isso que ainda parece tão moderno. As melodias são ótimas. É meio como a influência de Miles Davis que usa o espaço como uma qualidade musical.

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Você criou o riff de ‘Every Breath You Take’, por que não foi creditado como compositor?

É o que todo mundo fala. É um ponto de discórdia. Não sei, é claro que eu deveria ter recebido [o crédito]. É loucura. Então, não sei como responder a você, entrar em questões legais e todo o resto.

O importante é que quem conhece a história te dá o devido crédito...

[O riff] é a assinatura da canção. Nós realmente não queríamos fazê-la porque não achávamos que era boa o suficiente. Era como se fosse uma música meio cafona. Stewart e Sting estavam discutindo sobre onde o baixo iria, onde a bateria iria. E chegou a um ponto em que iríamos jogá-la fora. Então Sting se virou para mim. Estávamos sentados na mesa de controle e ele disse: ‘Vá lá, torne-a sua’. Em outras palavras, ‘Vá e seja o outro compositor’. Então eu rapidamente toquei a famosa parte da guitarra. Todo mundo se levantou e aplaudiu. Foi o momento em que todo mundo enlouqueceu e disse: ‘Agora vai ser uma música número 1′. E foi direto para o topo das paradas dos EUA.

Há uma canção obscura e instrumental do The Police chamada ‘Behind My Camel’, pela qual você ganhou um Grammy mesmo com resistência do Sting, correto?

É uma história engraçada. Sting não queria fazer essa faixa. Ele pegou a fita e a escondeu no jardim. Mas a recuperamos e o Stewart tocou ela comigo. Depois, eu estava na praia no Rio e me disseram ‘Hey, boas notícias, você ganhou um Grammy por Behind My Camel’. Fiquei muito satisfeito.

Sobre as brigas famosas na banda, quanto é lenda e o quanto é verdade?

Há um pouco de mitologia porque se tudo o que fizéssemos fosse brigar, teríamos terminado bem antes. As pessoas gostavam do papel que a mídia estampava: de que a gente só brigava... Não, nós nos divertimos muito, na maior parte do tempo, mas tinham muitas faíscas, porque todos temos personalidades fortes, e tinha muito ego. Todo mundo queria ser o líder da banda, mas não havia um, então às vezes tivemos que chegar a essas situações: dois, três homens lutando.

Não gosto de pensar como se odiássemos uns aos outros. Não é verdade. É a mídia que fez isso.

Andy Summers, sobre as folclóricas brigas no The Police

O guitarrista Andy Summers (d), tendo ao fundo o baterista Stewart Copeland e a imagem do vocalista e baixista Sting, durante o show do grupo inglês The Police, no Estádio do Maracanã Foto: Marcos D'paula/AE

E olhando para trás, você acha que a banda terminou no momento certo, no auge?

Estávamos no topo do mundo naquela época. Acho que acabou muito cedo. Poderíamos ter continuado, ter tido muito mais discos em primeiro lugar das paradas, mas o cantor queria sair e achava que poderia fazer isso por conta própria, o que até certo ponto ele fez, mas ele não é tão grande quanto o The Police. Sem dúvidas sobre isso. Ele consegue atrair, sei lá, 5 mil pessoas por noite. Com o The Police eram 50 mil.

Como é sua relação com Sting e Copeland hoje? São amigos?

Bem, não somos inimigos. São negócios. Há um legado com todos esses discos vendidos aos milhões, todos esses sucessos [que chegaram ao] número 1 e nós cuidamos disso. Temos advogados e tudo mais, sabe como é.

Há muito material inédito que ainda pode ser lançado?

Pode até haver algumas gravações ao vivo por aí, mas acho que já vasculhamos praticamente tudo. Este novo lançamento que está saindo agora [disponível a partir de 26/07 nos EUA], o box da reedição de Synchronicity (1983), tem um monte de faixas que eu nunca nem ouvi, mas a gravadora encontrou elas.

É o seu álbum favorito?

Não, meu favorito é o segundo disco, Regatta de Blanc (1979), porque eu senti que estávamos realmente começando a ter a nossa cara e foi um momento muito empolgante. Fizemos aquele disco em 10 dias. Foi rápido porque estávamos começando a realmente encontrar o nosso jeito de tocar.

'Legs', fotografia de Andy Summers Foto: Andy Summers

Pra finalizar, por favor, queria que falasse sobre como desenvolveu seu amor pela fotografia...

A semente foi também quando vi Orfeu de Carnaval, por causa da fotografia em preto e branco. Eu pensava que seria diretor de cinema, mas também era um guitarrista obsessivo. Certa vez, com o The Police, estávamos em Nova York e nos primeiros dias tínhamos muito tempo de espera para os shows. Estávamos rodeados por fotógrafos, na maioria mulheres por alguma razão, sempre tirando fotos nossas. Comecei a olhar para as câmeras delas, os equipamentos e fiquei meio interessado. Uma das garotas me levou a uma ótima loja de câmeras, comprei uma e comecei a levar isso a sério. Estudei os grandes fotógrafos, melhorei tecnicamente, usando lentes diferentes e tudo mais. Por sorte, eu estava viajando o mundo com o The Police e tirava fotos o tempo todo. Então, tive uma incrível visão por dentro do The Police que nenhum outro fotógrafo teve.

Call The Police 2024 – The Police Greatest Hits

  • Onde: Vibra São Paulo (Av. das Nações Unidas, 17955)
  • Data: 3 de agosto de 2024
  • Ingressos: uhuu.com
  • Preços: a partir de R$60,00
Entrevista por Gabriel Zorzetto

Repórter de Cultura do Estadão

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