Joabe Reis coloca o trombone no jazz urbano de São Paulo


Capixaba de 29 anos saído do ensino musical de uma igreja evangélica lança o álbum 'Crew in Church' e desponta como um dos brilhantes de sua geração

Por Julio Maria

Nem a Assembleia de Deus talvez soubesse o que estava criando quando aceitou Joabe Reis entre seus aprendizes. Ele tinha 11 anos, gostava de ver o irmão mais velho tocar na Banda Lira de Ouro, ouvia tudo o que o pai mecânico colocava no toca discos e já começava a demonstrar alguns talentos no sax-horn e no bombardino. Mas tudo dentro dos hinos e dos temas sacros que os jovens executam nas formações evangélicas. 

Joabe Reis Foto: Thiago Bruno

Um dia, o regente pediu que deixasse tudo e assumisse o trombone. Ainda que ele não fizesse muita noção do que fosse um, assim como nenhum professor nem ninguém por perto parecia fazer, Joabe aprendeu nota por nota mais por instinto do que por ensinamento. O instrutor sabia de trompete, mas acertou ao dizer que, um dia, as notas viriam.

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Meio que por acidente, o trombone foi ocupando espaço em sua vida. De um bairro vizinho ao da casa de Roberto Carlos em Cachoeiro do Itapemirim, no Espírito Santo, conseguiu ter aulas com Jorge Luís de Melo, da Orquestra Sinfônica do Espírito Santo, e, uma vez por mês, viajava a Vitória para uma única aula mensal com o professor Alexandre Teixeira. Com a mudança dos pais para Vitória, comovidos com a luta do filho em dominar o instrumento, ele começou a trabalhar em big bands e a aceitar convites para fazer gravações em estúdio. E as notas não pararam mais de chegar.

Aos 29 anos, Joabe Reis, em São Paulo desde 2013, quando começou a estudar no Conservatório Souza Lima, chega ao ponto das conquistas. Seu primeiro álbum é espetacular e se chama Crew in Church, uma expressão que no hip hop diz algo como ‘trutas’ da igreja ou galera gospel. Ele mesmo define o que faz como urban jazz, um termo quase pleonástico quando lembramos da origem muito urbana do jazz. Mas é isso mesmo. Autor de quase todos os nove temas, Joabe traz assunto para bases de funk, usa o espírito harmônico da neo soul, cria linhas para o naipe de sopros que passam por Earth Wind and Fire, conversa com o hip hop de igual para igual e consegue, com todas as suas urbanidades, uma comunicação que tira a música que faz das cercanias introspectivas do instrumental.

Um show presencial, com transmissão também por redes sociais, vai mostrá-lo em sexteto. Será no projeto Jazz.Br do Bourbon Street, quinta, 22, às 20h. O Bourbon tem tomado cuidados com os novos protocolos em decorrência da covid-19, conforme acompanhou a reportagem no dia da reabertura, na quinta, 15, mas a opção da exibição em live é sempre um alívio para quem ainda não se sente preparado a estar em uma plateia. De qualquer forma, seu álbum, lançado em parceria com o selo TFunky, do baterista e produtor Tuto Ferraz, também está nas plataformas.

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A base fixa instrumental de Joabe diz bastante a quem acompanha a cena de São Paulo, que o especialista em jazz Zuza Homem de Mello dizia ser tão rica quanto os anos de ouro da década de 60, no Beco das Garrafas. Josué Lopez no sax-tenor, Sidmar Vieira no trompete, Vitor Cabral na bateria, Felipe Pizzutiello no contrabaixo e Leandro Cabral no teclado. E as faixas contam com participações de Toninho Horta, em um raro momento de fazer apenas vocalise, sem tocar guitarra, em Tema pro Joabe, feito por Rafael Rocha, com o teclado de Nelson Aires. O virtuoso Diego Garbin, um dos grandes de sua geração, faz o trompete de J & J, e Jessé Sadoc, trompete, mais Marcelo Martins, sax, e o baixista Alberto Continentino estão na ‘gig carioca’ do tema Segundo Reis, de Bruno Santos. Muita gente boa em um mesmo lugar.

O jazz e seu poder de abarcar tudo é o que prevalece, mesmo quando o despudor pop de Joabe em lidar com andamentos e harmonias mais retas e simples se impõe. Sua percepção de que há um espaço a se explorar no meio instrumental pode fazer a diferença. Ao contrário dos músicos norte-americanos e alguns europeus, que buscam a renovação em produção cheias de elementos do hip hop, do R&B e do neo soul que Joabe usa, muitos brasileiros ainda resistem a se encontrar com a turma dos gêneros periféricos não letrados, como o rap, o blues (brasileiro), o funk (carioca), o samba (de morro) e os pontos das religiões afro brasileiras. E eis outra lição de um jovem que, saído de uma igreja evangélica, poderia ter argumentos para não pisar em um terreiro de umbanda.

A faixa Sobre o Mesmo Chão, com o trombonista convidado da Jazz at Lincoln Center Orchestra, Elliot Mason, traz a clave dos atabaques. “Gosto de fazer essas alianças entre o jazz e as músicas urbanas”, diz Joabe. Mas não seria esse o caminho se ele deixasse pesar sobre os ombros algo que a religião poderia lhe dar. “Eu tenho a minha fé, mas sei que muito amigos sofrem pressões com o fato de tocarem temas que não são cristãos. Isso ainda acontece.” 

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De qualquer forma, foi sua fé na música que fez Joabe assumir o mesmo instrumento do gigante J.J. Johnson, um mestre do trombone no jazz americano que resolveu desafiar a maldição que os ases do bebop o jogou para trazer o universo dos graves mais belos e macios que um sopro humano pode produzir.

Nem a Assembleia de Deus talvez soubesse o que estava criando quando aceitou Joabe Reis entre seus aprendizes. Ele tinha 11 anos, gostava de ver o irmão mais velho tocar na Banda Lira de Ouro, ouvia tudo o que o pai mecânico colocava no toca discos e já começava a demonstrar alguns talentos no sax-horn e no bombardino. Mas tudo dentro dos hinos e dos temas sacros que os jovens executam nas formações evangélicas. 

Joabe Reis Foto: Thiago Bruno

Um dia, o regente pediu que deixasse tudo e assumisse o trombone. Ainda que ele não fizesse muita noção do que fosse um, assim como nenhum professor nem ninguém por perto parecia fazer, Joabe aprendeu nota por nota mais por instinto do que por ensinamento. O instrutor sabia de trompete, mas acertou ao dizer que, um dia, as notas viriam.

Meio que por acidente, o trombone foi ocupando espaço em sua vida. De um bairro vizinho ao da casa de Roberto Carlos em Cachoeiro do Itapemirim, no Espírito Santo, conseguiu ter aulas com Jorge Luís de Melo, da Orquestra Sinfônica do Espírito Santo, e, uma vez por mês, viajava a Vitória para uma única aula mensal com o professor Alexandre Teixeira. Com a mudança dos pais para Vitória, comovidos com a luta do filho em dominar o instrumento, ele começou a trabalhar em big bands e a aceitar convites para fazer gravações em estúdio. E as notas não pararam mais de chegar.

Aos 29 anos, Joabe Reis, em São Paulo desde 2013, quando começou a estudar no Conservatório Souza Lima, chega ao ponto das conquistas. Seu primeiro álbum é espetacular e se chama Crew in Church, uma expressão que no hip hop diz algo como ‘trutas’ da igreja ou galera gospel. Ele mesmo define o que faz como urban jazz, um termo quase pleonástico quando lembramos da origem muito urbana do jazz. Mas é isso mesmo. Autor de quase todos os nove temas, Joabe traz assunto para bases de funk, usa o espírito harmônico da neo soul, cria linhas para o naipe de sopros que passam por Earth Wind and Fire, conversa com o hip hop de igual para igual e consegue, com todas as suas urbanidades, uma comunicação que tira a música que faz das cercanias introspectivas do instrumental.

Um show presencial, com transmissão também por redes sociais, vai mostrá-lo em sexteto. Será no projeto Jazz.Br do Bourbon Street, quinta, 22, às 20h. O Bourbon tem tomado cuidados com os novos protocolos em decorrência da covid-19, conforme acompanhou a reportagem no dia da reabertura, na quinta, 15, mas a opção da exibição em live é sempre um alívio para quem ainda não se sente preparado a estar em uma plateia. De qualquer forma, seu álbum, lançado em parceria com o selo TFunky, do baterista e produtor Tuto Ferraz, também está nas plataformas.

A base fixa instrumental de Joabe diz bastante a quem acompanha a cena de São Paulo, que o especialista em jazz Zuza Homem de Mello dizia ser tão rica quanto os anos de ouro da década de 60, no Beco das Garrafas. Josué Lopez no sax-tenor, Sidmar Vieira no trompete, Vitor Cabral na bateria, Felipe Pizzutiello no contrabaixo e Leandro Cabral no teclado. E as faixas contam com participações de Toninho Horta, em um raro momento de fazer apenas vocalise, sem tocar guitarra, em Tema pro Joabe, feito por Rafael Rocha, com o teclado de Nelson Aires. O virtuoso Diego Garbin, um dos grandes de sua geração, faz o trompete de J & J, e Jessé Sadoc, trompete, mais Marcelo Martins, sax, e o baixista Alberto Continentino estão na ‘gig carioca’ do tema Segundo Reis, de Bruno Santos. Muita gente boa em um mesmo lugar.

O jazz e seu poder de abarcar tudo é o que prevalece, mesmo quando o despudor pop de Joabe em lidar com andamentos e harmonias mais retas e simples se impõe. Sua percepção de que há um espaço a se explorar no meio instrumental pode fazer a diferença. Ao contrário dos músicos norte-americanos e alguns europeus, que buscam a renovação em produção cheias de elementos do hip hop, do R&B e do neo soul que Joabe usa, muitos brasileiros ainda resistem a se encontrar com a turma dos gêneros periféricos não letrados, como o rap, o blues (brasileiro), o funk (carioca), o samba (de morro) e os pontos das religiões afro brasileiras. E eis outra lição de um jovem que, saído de uma igreja evangélica, poderia ter argumentos para não pisar em um terreiro de umbanda.

A faixa Sobre o Mesmo Chão, com o trombonista convidado da Jazz at Lincoln Center Orchestra, Elliot Mason, traz a clave dos atabaques. “Gosto de fazer essas alianças entre o jazz e as músicas urbanas”, diz Joabe. Mas não seria esse o caminho se ele deixasse pesar sobre os ombros algo que a religião poderia lhe dar. “Eu tenho a minha fé, mas sei que muito amigos sofrem pressões com o fato de tocarem temas que não são cristãos. Isso ainda acontece.” 

De qualquer forma, foi sua fé na música que fez Joabe assumir o mesmo instrumento do gigante J.J. Johnson, um mestre do trombone no jazz americano que resolveu desafiar a maldição que os ases do bebop o jogou para trazer o universo dos graves mais belos e macios que um sopro humano pode produzir.

Nem a Assembleia de Deus talvez soubesse o que estava criando quando aceitou Joabe Reis entre seus aprendizes. Ele tinha 11 anos, gostava de ver o irmão mais velho tocar na Banda Lira de Ouro, ouvia tudo o que o pai mecânico colocava no toca discos e já começava a demonstrar alguns talentos no sax-horn e no bombardino. Mas tudo dentro dos hinos e dos temas sacros que os jovens executam nas formações evangélicas. 

Joabe Reis Foto: Thiago Bruno

Um dia, o regente pediu que deixasse tudo e assumisse o trombone. Ainda que ele não fizesse muita noção do que fosse um, assim como nenhum professor nem ninguém por perto parecia fazer, Joabe aprendeu nota por nota mais por instinto do que por ensinamento. O instrutor sabia de trompete, mas acertou ao dizer que, um dia, as notas viriam.

Meio que por acidente, o trombone foi ocupando espaço em sua vida. De um bairro vizinho ao da casa de Roberto Carlos em Cachoeiro do Itapemirim, no Espírito Santo, conseguiu ter aulas com Jorge Luís de Melo, da Orquestra Sinfônica do Espírito Santo, e, uma vez por mês, viajava a Vitória para uma única aula mensal com o professor Alexandre Teixeira. Com a mudança dos pais para Vitória, comovidos com a luta do filho em dominar o instrumento, ele começou a trabalhar em big bands e a aceitar convites para fazer gravações em estúdio. E as notas não pararam mais de chegar.

Aos 29 anos, Joabe Reis, em São Paulo desde 2013, quando começou a estudar no Conservatório Souza Lima, chega ao ponto das conquistas. Seu primeiro álbum é espetacular e se chama Crew in Church, uma expressão que no hip hop diz algo como ‘trutas’ da igreja ou galera gospel. Ele mesmo define o que faz como urban jazz, um termo quase pleonástico quando lembramos da origem muito urbana do jazz. Mas é isso mesmo. Autor de quase todos os nove temas, Joabe traz assunto para bases de funk, usa o espírito harmônico da neo soul, cria linhas para o naipe de sopros que passam por Earth Wind and Fire, conversa com o hip hop de igual para igual e consegue, com todas as suas urbanidades, uma comunicação que tira a música que faz das cercanias introspectivas do instrumental.

Um show presencial, com transmissão também por redes sociais, vai mostrá-lo em sexteto. Será no projeto Jazz.Br do Bourbon Street, quinta, 22, às 20h. O Bourbon tem tomado cuidados com os novos protocolos em decorrência da covid-19, conforme acompanhou a reportagem no dia da reabertura, na quinta, 15, mas a opção da exibição em live é sempre um alívio para quem ainda não se sente preparado a estar em uma plateia. De qualquer forma, seu álbum, lançado em parceria com o selo TFunky, do baterista e produtor Tuto Ferraz, também está nas plataformas.

A base fixa instrumental de Joabe diz bastante a quem acompanha a cena de São Paulo, que o especialista em jazz Zuza Homem de Mello dizia ser tão rica quanto os anos de ouro da década de 60, no Beco das Garrafas. Josué Lopez no sax-tenor, Sidmar Vieira no trompete, Vitor Cabral na bateria, Felipe Pizzutiello no contrabaixo e Leandro Cabral no teclado. E as faixas contam com participações de Toninho Horta, em um raro momento de fazer apenas vocalise, sem tocar guitarra, em Tema pro Joabe, feito por Rafael Rocha, com o teclado de Nelson Aires. O virtuoso Diego Garbin, um dos grandes de sua geração, faz o trompete de J & J, e Jessé Sadoc, trompete, mais Marcelo Martins, sax, e o baixista Alberto Continentino estão na ‘gig carioca’ do tema Segundo Reis, de Bruno Santos. Muita gente boa em um mesmo lugar.

O jazz e seu poder de abarcar tudo é o que prevalece, mesmo quando o despudor pop de Joabe em lidar com andamentos e harmonias mais retas e simples se impõe. Sua percepção de que há um espaço a se explorar no meio instrumental pode fazer a diferença. Ao contrário dos músicos norte-americanos e alguns europeus, que buscam a renovação em produção cheias de elementos do hip hop, do R&B e do neo soul que Joabe usa, muitos brasileiros ainda resistem a se encontrar com a turma dos gêneros periféricos não letrados, como o rap, o blues (brasileiro), o funk (carioca), o samba (de morro) e os pontos das religiões afro brasileiras. E eis outra lição de um jovem que, saído de uma igreja evangélica, poderia ter argumentos para não pisar em um terreiro de umbanda.

A faixa Sobre o Mesmo Chão, com o trombonista convidado da Jazz at Lincoln Center Orchestra, Elliot Mason, traz a clave dos atabaques. “Gosto de fazer essas alianças entre o jazz e as músicas urbanas”, diz Joabe. Mas não seria esse o caminho se ele deixasse pesar sobre os ombros algo que a religião poderia lhe dar. “Eu tenho a minha fé, mas sei que muito amigos sofrem pressões com o fato de tocarem temas que não são cristãos. Isso ainda acontece.” 

De qualquer forma, foi sua fé na música que fez Joabe assumir o mesmo instrumento do gigante J.J. Johnson, um mestre do trombone no jazz americano que resolveu desafiar a maldição que os ases do bebop o jogou para trazer o universo dos graves mais belos e macios que um sopro humano pode produzir.

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