Lição de 2023: não dá mais para pagar fortunas em festivais que só oferecem perrengue; leia análise


Eventos musicais caros ofereceram grandes atrações no palco e enormes problemas na plateia. Neste ano, caos em festivais e morte em show de Taylor Swift deixaram claro o descompasso entre preço alto e a experiência insalubre

Por Dora Guerra

Os festivais de música se tornaram a grande moda no Brasil. Surgem, crescem, e se expandem anualmente – mas com o crescimento, vêm as dores. Entre Lollapalooza, The Town, Primavera Sound, C6 Fest e outros eventos de médio e grande porte, uma série de dilemas se apresentou neste ano. O primeiro deles, e um dos mais urgentes, é financeiro.

Em 2023, alguns festivais chegaram a cobrar mais de mil reais por ingresso (a inteira por dia no Lollapalooza, por exemplo, chegou a custar R$1.500). Argumenta-se que o valor cobrado pelos fornecedores aumentou; que trazer os artistas gringos está mais caro e complexo (até turnês locais de artistas estadunidenses estão difíceis de bancar). Não à toa: enfrentamos um cenário pós-pandêmico e uma instável economia global.

Festivais The Town, Lollapalooza e shows de Taylor Swift reuniram milhares de pessoas em São Paulo e Rio, em 2023 Foto: Taba Benedicto/Estadão
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Os profissionais mudaram, os custos de serviço aumentaram e até os artistas estão mais criteriosos sobre o quanto querem viajar após a pandemia. Então, claro, a realização de um festival encareceu – como aconteceu com praticamente tudo desde 2020. Mas isso não significa que qualquer preço absurdo possa ser cobrado do público às custas dele mesmo. Afinal, um festival não é só o ingresso – antes fosse. Há a água, a cervejinha (ninguém é de ferro...), e as comidas, sempre superfaturadas.

Isso sem contar o constante perrengue. Em algum momento, tornou-se aceitável pagar mil reais em um festival para ter dificuldades da entrada à saída, com riscos inclusive à segurança física.

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Ao entrar em 2023, os shows ainda eram um acontecimento quase sem preço. A vida pós-pandemia também pegou no nosso emocional e não nos curamos totalmente dessa lógica. Quanto vale um show inesquecível, se três anos atrás você estava preso dentro de casa sem perspectiva de sair?

Nessa, os festivais se safaram com muita coisa. Isto é, até os desastres acontecerem.

O ano de 2023 nos deixou com algumas lições para os festivais – e dúvidas para 2024. Veja:

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A megalomania não vale o preço

Grupo Chainsmokers se apresenta no Palco Skyline durante o festival The Town 2023 Foto: Taba Benedicto/Estadão

Neste ano, a primeira edição do The Town fez barulho – mais no mau que no bom sentido. O festival megalomaníaco, estreante em São Paulo, levou 100 mil pessoas por dia ao Autódromo de Interlagos. Vendas esgotadas, afirmou a organização. Deu para ver.

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Pela recompensa de shows apoteóticos de Bruno Mars a Foo Fighters, os frequentadores tiveram que enfrentar um “funil” entre os palcos, chuvas torrenciais e um shopping de ativações de marcas (que, geralmente, agradam muito mais aos influencers convidados que os frequentadores comuns).

Cada frequentador pagou aproximadamente meio salário mínimo no ingresso (no último lote, a inteira para cada dia custava R$815). Isso tudo para o que, teoricamente, seria um evento divertido e leve; na prática, foi uma prova de resistência.

O Estadão registrou: “No caminho, fãs já encontraram problemas, com dificuldades no deslocamento nos trens, lotados e atrasos na entrada. Um ônibus a serviço do festival pegou fogo na avenida 23 de Maio, mas passageiros não foram feridos. Já à noite, o Autódromo ficou sob forte chuva durante os principais shows”.

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Ônibus com passagem a $ 30 teve que parar no meio da avenida 23 de maio

Menos é mais

Em contrapartida, um festival como o Primavera Sound mostrou que há luz no fim do túnel. Seguindo a máxima “menos é mais”, o evento ditou que menos gente era mais conforto; menos ativação de marca era mais música, e por aí vai. Com metade das pessoas presentes nos eventos maiores, o Primavera reduziu o espaço e lembrou aos fãs que – pasmem! – festival não precisa ser sinônimo de perrengue.

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Show de Carly Rae Jepsen no Primavera Sound em 2023 Foto: Taba Benedicto/Estadão

Mais que um line-up interessante com shows expressivos, os frequentadores puderam tomar água, tiveram conforto, espaço para se movimentar e não enfrentaram filas. Nesse sentido, o Primavera não fez mais que sua obrigação – mas isso é tão raro que a experiência pareceu luxuosa para os fãs.

O Estadão notou: “Houve também uma redenção do Autódromo de Interlagos, casa dos três principais festivais de música em São Paulo. Antes do Primavera, houve reclamações do público sobre transporte e logística nas edições de 2023 do Lollapalooza e, principalmente, do The Town. Mas, no Primavera, pela primeira vez no Autódromo, o esquema foi muito mais suave, desde a entrada até a volta para casa. Tudo bem que o público de cada dia foi de 50 mil pessoas, metade da média diária de seus concorrentes. Mas ficou a impressão de que o local pode, sim, oferecer uma estrutura boa para estes eventos”.

A tragédia não pode ser uma opção

Ana Clara Benevides recebe homenagem de fãs de Taylor Swift na Times Square, em Nova York. Foto: @updateswiftbr via X

A morte de Ana Clara Benevides no show de Taylor Swift, no Rio de Janeiro, teria de servir como a principal lição para todo o setor cultural brasileiro.

Ela não estava em um festival, mas pagou caro por um show-espetáculo, cuja experiência deveria ser minimamente segura e agradável. Mas não: a organização arriscou a tragédia em um dia de calor extremo, com medidas pouco resolutivas.

Nada disso pode se repetir. Como já era óbvio pelas previsões científicas e climáticas há anos, as produtoras precisam adotar medidas urgentes em um calor cada vez mais hostil. Mas mais do que isso, a tragédia tem de impactar na experiência básica de um festival – que, para início de conversa, nunca deveria ter sido tão ruim.

É neste ponto que os organizadores devem colocar a mão na consciência, antes do bolso. Pensar que o show é uma proposta de lazer, emoção, que não pode ser encarada levianamente. Se não pelo conforto dos frequentadores, há agora uma preocupação judicial e um olhar mais atento de órgãos fiscalizadores.

Se os organizadores não mudam, os fãs aprendem

Fãs enfrentam último dia de filas para compra de ingressos do show de Taylor Swift, no Allianz Parque, em 21 de junho de 2023, em São Paulo Foto: Werther Santana/Estadão

Os ingressos vão ficar mais baratos? Dificilmente. Se servir de indicativo, o primeiro lote do Lollapalooza 2024 já está em R$1.200 a inteira, por dia de festival.

Mas a pandemia já passou e os festivais são rotina novamente. Por isso, se os valores são exorbitantes, é urgente que consigam oferecer o mínimo de conforto. Com cuidados na entrada, uma experiência agradável durante, e o mínimo de ocorrências negativas depois. E um olhar na previsão do tempo – afinal, tudo aponta para os extremos (chuva, calor…), sem perspectiva de melhorar.

(E muito antes de ser lei, já devia ser máxima: água gratuita é direito básico.)

Se 2023 não ensinou organizadores, talvez tenha educado os frequentadores. Sabemos que não há mais como se contentar somente com os nomes no line-up – é necessário, afinal, uma experiência à altura do valor pago. Nada menos.

Os festivais de música se tornaram a grande moda no Brasil. Surgem, crescem, e se expandem anualmente – mas com o crescimento, vêm as dores. Entre Lollapalooza, The Town, Primavera Sound, C6 Fest e outros eventos de médio e grande porte, uma série de dilemas se apresentou neste ano. O primeiro deles, e um dos mais urgentes, é financeiro.

Em 2023, alguns festivais chegaram a cobrar mais de mil reais por ingresso (a inteira por dia no Lollapalooza, por exemplo, chegou a custar R$1.500). Argumenta-se que o valor cobrado pelos fornecedores aumentou; que trazer os artistas gringos está mais caro e complexo (até turnês locais de artistas estadunidenses estão difíceis de bancar). Não à toa: enfrentamos um cenário pós-pandêmico e uma instável economia global.

Festivais The Town, Lollapalooza e shows de Taylor Swift reuniram milhares de pessoas em São Paulo e Rio, em 2023 Foto: Taba Benedicto/Estadão

Os profissionais mudaram, os custos de serviço aumentaram e até os artistas estão mais criteriosos sobre o quanto querem viajar após a pandemia. Então, claro, a realização de um festival encareceu – como aconteceu com praticamente tudo desde 2020. Mas isso não significa que qualquer preço absurdo possa ser cobrado do público às custas dele mesmo. Afinal, um festival não é só o ingresso – antes fosse. Há a água, a cervejinha (ninguém é de ferro...), e as comidas, sempre superfaturadas.

Isso sem contar o constante perrengue. Em algum momento, tornou-se aceitável pagar mil reais em um festival para ter dificuldades da entrada à saída, com riscos inclusive à segurança física.

Ao entrar em 2023, os shows ainda eram um acontecimento quase sem preço. A vida pós-pandemia também pegou no nosso emocional e não nos curamos totalmente dessa lógica. Quanto vale um show inesquecível, se três anos atrás você estava preso dentro de casa sem perspectiva de sair?

Nessa, os festivais se safaram com muita coisa. Isto é, até os desastres acontecerem.

O ano de 2023 nos deixou com algumas lições para os festivais – e dúvidas para 2024. Veja:

A megalomania não vale o preço

Grupo Chainsmokers se apresenta no Palco Skyline durante o festival The Town 2023 Foto: Taba Benedicto/Estadão

Neste ano, a primeira edição do The Town fez barulho – mais no mau que no bom sentido. O festival megalomaníaco, estreante em São Paulo, levou 100 mil pessoas por dia ao Autódromo de Interlagos. Vendas esgotadas, afirmou a organização. Deu para ver.

Pela recompensa de shows apoteóticos de Bruno Mars a Foo Fighters, os frequentadores tiveram que enfrentar um “funil” entre os palcos, chuvas torrenciais e um shopping de ativações de marcas (que, geralmente, agradam muito mais aos influencers convidados que os frequentadores comuns).

Cada frequentador pagou aproximadamente meio salário mínimo no ingresso (no último lote, a inteira para cada dia custava R$815). Isso tudo para o que, teoricamente, seria um evento divertido e leve; na prática, foi uma prova de resistência.

O Estadão registrou: “No caminho, fãs já encontraram problemas, com dificuldades no deslocamento nos trens, lotados e atrasos na entrada. Um ônibus a serviço do festival pegou fogo na avenida 23 de Maio, mas passageiros não foram feridos. Já à noite, o Autódromo ficou sob forte chuva durante os principais shows”.

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Ônibus com passagem a $ 30 teve que parar no meio da avenida 23 de maio

Menos é mais

Em contrapartida, um festival como o Primavera Sound mostrou que há luz no fim do túnel. Seguindo a máxima “menos é mais”, o evento ditou que menos gente era mais conforto; menos ativação de marca era mais música, e por aí vai. Com metade das pessoas presentes nos eventos maiores, o Primavera reduziu o espaço e lembrou aos fãs que – pasmem! – festival não precisa ser sinônimo de perrengue.

Show de Carly Rae Jepsen no Primavera Sound em 2023 Foto: Taba Benedicto/Estadão

Mais que um line-up interessante com shows expressivos, os frequentadores puderam tomar água, tiveram conforto, espaço para se movimentar e não enfrentaram filas. Nesse sentido, o Primavera não fez mais que sua obrigação – mas isso é tão raro que a experiência pareceu luxuosa para os fãs.

O Estadão notou: “Houve também uma redenção do Autódromo de Interlagos, casa dos três principais festivais de música em São Paulo. Antes do Primavera, houve reclamações do público sobre transporte e logística nas edições de 2023 do Lollapalooza e, principalmente, do The Town. Mas, no Primavera, pela primeira vez no Autódromo, o esquema foi muito mais suave, desde a entrada até a volta para casa. Tudo bem que o público de cada dia foi de 50 mil pessoas, metade da média diária de seus concorrentes. Mas ficou a impressão de que o local pode, sim, oferecer uma estrutura boa para estes eventos”.

A tragédia não pode ser uma opção

Ana Clara Benevides recebe homenagem de fãs de Taylor Swift na Times Square, em Nova York. Foto: @updateswiftbr via X

A morte de Ana Clara Benevides no show de Taylor Swift, no Rio de Janeiro, teria de servir como a principal lição para todo o setor cultural brasileiro.

Ela não estava em um festival, mas pagou caro por um show-espetáculo, cuja experiência deveria ser minimamente segura e agradável. Mas não: a organização arriscou a tragédia em um dia de calor extremo, com medidas pouco resolutivas.

Nada disso pode se repetir. Como já era óbvio pelas previsões científicas e climáticas há anos, as produtoras precisam adotar medidas urgentes em um calor cada vez mais hostil. Mas mais do que isso, a tragédia tem de impactar na experiência básica de um festival – que, para início de conversa, nunca deveria ter sido tão ruim.

É neste ponto que os organizadores devem colocar a mão na consciência, antes do bolso. Pensar que o show é uma proposta de lazer, emoção, que não pode ser encarada levianamente. Se não pelo conforto dos frequentadores, há agora uma preocupação judicial e um olhar mais atento de órgãos fiscalizadores.

Se os organizadores não mudam, os fãs aprendem

Fãs enfrentam último dia de filas para compra de ingressos do show de Taylor Swift, no Allianz Parque, em 21 de junho de 2023, em São Paulo Foto: Werther Santana/Estadão

Os ingressos vão ficar mais baratos? Dificilmente. Se servir de indicativo, o primeiro lote do Lollapalooza 2024 já está em R$1.200 a inteira, por dia de festival.

Mas a pandemia já passou e os festivais são rotina novamente. Por isso, se os valores são exorbitantes, é urgente que consigam oferecer o mínimo de conforto. Com cuidados na entrada, uma experiência agradável durante, e o mínimo de ocorrências negativas depois. E um olhar na previsão do tempo – afinal, tudo aponta para os extremos (chuva, calor…), sem perspectiva de melhorar.

(E muito antes de ser lei, já devia ser máxima: água gratuita é direito básico.)

Se 2023 não ensinou organizadores, talvez tenha educado os frequentadores. Sabemos que não há mais como se contentar somente com os nomes no line-up – é necessário, afinal, uma experiência à altura do valor pago. Nada menos.

Os festivais de música se tornaram a grande moda no Brasil. Surgem, crescem, e se expandem anualmente – mas com o crescimento, vêm as dores. Entre Lollapalooza, The Town, Primavera Sound, C6 Fest e outros eventos de médio e grande porte, uma série de dilemas se apresentou neste ano. O primeiro deles, e um dos mais urgentes, é financeiro.

Em 2023, alguns festivais chegaram a cobrar mais de mil reais por ingresso (a inteira por dia no Lollapalooza, por exemplo, chegou a custar R$1.500). Argumenta-se que o valor cobrado pelos fornecedores aumentou; que trazer os artistas gringos está mais caro e complexo (até turnês locais de artistas estadunidenses estão difíceis de bancar). Não à toa: enfrentamos um cenário pós-pandêmico e uma instável economia global.

Festivais The Town, Lollapalooza e shows de Taylor Swift reuniram milhares de pessoas em São Paulo e Rio, em 2023 Foto: Taba Benedicto/Estadão

Os profissionais mudaram, os custos de serviço aumentaram e até os artistas estão mais criteriosos sobre o quanto querem viajar após a pandemia. Então, claro, a realização de um festival encareceu – como aconteceu com praticamente tudo desde 2020. Mas isso não significa que qualquer preço absurdo possa ser cobrado do público às custas dele mesmo. Afinal, um festival não é só o ingresso – antes fosse. Há a água, a cervejinha (ninguém é de ferro...), e as comidas, sempre superfaturadas.

Isso sem contar o constante perrengue. Em algum momento, tornou-se aceitável pagar mil reais em um festival para ter dificuldades da entrada à saída, com riscos inclusive à segurança física.

Ao entrar em 2023, os shows ainda eram um acontecimento quase sem preço. A vida pós-pandemia também pegou no nosso emocional e não nos curamos totalmente dessa lógica. Quanto vale um show inesquecível, se três anos atrás você estava preso dentro de casa sem perspectiva de sair?

Nessa, os festivais se safaram com muita coisa. Isto é, até os desastres acontecerem.

O ano de 2023 nos deixou com algumas lições para os festivais – e dúvidas para 2024. Veja:

A megalomania não vale o preço

Grupo Chainsmokers se apresenta no Palco Skyline durante o festival The Town 2023 Foto: Taba Benedicto/Estadão

Neste ano, a primeira edição do The Town fez barulho – mais no mau que no bom sentido. O festival megalomaníaco, estreante em São Paulo, levou 100 mil pessoas por dia ao Autódromo de Interlagos. Vendas esgotadas, afirmou a organização. Deu para ver.

Pela recompensa de shows apoteóticos de Bruno Mars a Foo Fighters, os frequentadores tiveram que enfrentar um “funil” entre os palcos, chuvas torrenciais e um shopping de ativações de marcas (que, geralmente, agradam muito mais aos influencers convidados que os frequentadores comuns).

Cada frequentador pagou aproximadamente meio salário mínimo no ingresso (no último lote, a inteira para cada dia custava R$815). Isso tudo para o que, teoricamente, seria um evento divertido e leve; na prática, foi uma prova de resistência.

O Estadão registrou: “No caminho, fãs já encontraram problemas, com dificuldades no deslocamento nos trens, lotados e atrasos na entrada. Um ônibus a serviço do festival pegou fogo na avenida 23 de Maio, mas passageiros não foram feridos. Já à noite, o Autódromo ficou sob forte chuva durante os principais shows”.

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Menos é mais

Em contrapartida, um festival como o Primavera Sound mostrou que há luz no fim do túnel. Seguindo a máxima “menos é mais”, o evento ditou que menos gente era mais conforto; menos ativação de marca era mais música, e por aí vai. Com metade das pessoas presentes nos eventos maiores, o Primavera reduziu o espaço e lembrou aos fãs que – pasmem! – festival não precisa ser sinônimo de perrengue.

Show de Carly Rae Jepsen no Primavera Sound em 2023 Foto: Taba Benedicto/Estadão

Mais que um line-up interessante com shows expressivos, os frequentadores puderam tomar água, tiveram conforto, espaço para se movimentar e não enfrentaram filas. Nesse sentido, o Primavera não fez mais que sua obrigação – mas isso é tão raro que a experiência pareceu luxuosa para os fãs.

O Estadão notou: “Houve também uma redenção do Autódromo de Interlagos, casa dos três principais festivais de música em São Paulo. Antes do Primavera, houve reclamações do público sobre transporte e logística nas edições de 2023 do Lollapalooza e, principalmente, do The Town. Mas, no Primavera, pela primeira vez no Autódromo, o esquema foi muito mais suave, desde a entrada até a volta para casa. Tudo bem que o público de cada dia foi de 50 mil pessoas, metade da média diária de seus concorrentes. Mas ficou a impressão de que o local pode, sim, oferecer uma estrutura boa para estes eventos”.

A tragédia não pode ser uma opção

Ana Clara Benevides recebe homenagem de fãs de Taylor Swift na Times Square, em Nova York. Foto: @updateswiftbr via X

A morte de Ana Clara Benevides no show de Taylor Swift, no Rio de Janeiro, teria de servir como a principal lição para todo o setor cultural brasileiro.

Ela não estava em um festival, mas pagou caro por um show-espetáculo, cuja experiência deveria ser minimamente segura e agradável. Mas não: a organização arriscou a tragédia em um dia de calor extremo, com medidas pouco resolutivas.

Nada disso pode se repetir. Como já era óbvio pelas previsões científicas e climáticas há anos, as produtoras precisam adotar medidas urgentes em um calor cada vez mais hostil. Mas mais do que isso, a tragédia tem de impactar na experiência básica de um festival – que, para início de conversa, nunca deveria ter sido tão ruim.

É neste ponto que os organizadores devem colocar a mão na consciência, antes do bolso. Pensar que o show é uma proposta de lazer, emoção, que não pode ser encarada levianamente. Se não pelo conforto dos frequentadores, há agora uma preocupação judicial e um olhar mais atento de órgãos fiscalizadores.

Se os organizadores não mudam, os fãs aprendem

Fãs enfrentam último dia de filas para compra de ingressos do show de Taylor Swift, no Allianz Parque, em 21 de junho de 2023, em São Paulo Foto: Werther Santana/Estadão

Os ingressos vão ficar mais baratos? Dificilmente. Se servir de indicativo, o primeiro lote do Lollapalooza 2024 já está em R$1.200 a inteira, por dia de festival.

Mas a pandemia já passou e os festivais são rotina novamente. Por isso, se os valores são exorbitantes, é urgente que consigam oferecer o mínimo de conforto. Com cuidados na entrada, uma experiência agradável durante, e o mínimo de ocorrências negativas depois. E um olhar na previsão do tempo – afinal, tudo aponta para os extremos (chuva, calor…), sem perspectiva de melhorar.

(E muito antes de ser lei, já devia ser máxima: água gratuita é direito básico.)

Se 2023 não ensinou organizadores, talvez tenha educado os frequentadores. Sabemos que não há mais como se contentar somente com os nomes no line-up – é necessário, afinal, uma experiência à altura do valor pago. Nada menos.

Os festivais de música se tornaram a grande moda no Brasil. Surgem, crescem, e se expandem anualmente – mas com o crescimento, vêm as dores. Entre Lollapalooza, The Town, Primavera Sound, C6 Fest e outros eventos de médio e grande porte, uma série de dilemas se apresentou neste ano. O primeiro deles, e um dos mais urgentes, é financeiro.

Em 2023, alguns festivais chegaram a cobrar mais de mil reais por ingresso (a inteira por dia no Lollapalooza, por exemplo, chegou a custar R$1.500). Argumenta-se que o valor cobrado pelos fornecedores aumentou; que trazer os artistas gringos está mais caro e complexo (até turnês locais de artistas estadunidenses estão difíceis de bancar). Não à toa: enfrentamos um cenário pós-pandêmico e uma instável economia global.

Festivais The Town, Lollapalooza e shows de Taylor Swift reuniram milhares de pessoas em São Paulo e Rio, em 2023 Foto: Taba Benedicto/Estadão

Os profissionais mudaram, os custos de serviço aumentaram e até os artistas estão mais criteriosos sobre o quanto querem viajar após a pandemia. Então, claro, a realização de um festival encareceu – como aconteceu com praticamente tudo desde 2020. Mas isso não significa que qualquer preço absurdo possa ser cobrado do público às custas dele mesmo. Afinal, um festival não é só o ingresso – antes fosse. Há a água, a cervejinha (ninguém é de ferro...), e as comidas, sempre superfaturadas.

Isso sem contar o constante perrengue. Em algum momento, tornou-se aceitável pagar mil reais em um festival para ter dificuldades da entrada à saída, com riscos inclusive à segurança física.

Ao entrar em 2023, os shows ainda eram um acontecimento quase sem preço. A vida pós-pandemia também pegou no nosso emocional e não nos curamos totalmente dessa lógica. Quanto vale um show inesquecível, se três anos atrás você estava preso dentro de casa sem perspectiva de sair?

Nessa, os festivais se safaram com muita coisa. Isto é, até os desastres acontecerem.

O ano de 2023 nos deixou com algumas lições para os festivais – e dúvidas para 2024. Veja:

A megalomania não vale o preço

Grupo Chainsmokers se apresenta no Palco Skyline durante o festival The Town 2023 Foto: Taba Benedicto/Estadão

Neste ano, a primeira edição do The Town fez barulho – mais no mau que no bom sentido. O festival megalomaníaco, estreante em São Paulo, levou 100 mil pessoas por dia ao Autódromo de Interlagos. Vendas esgotadas, afirmou a organização. Deu para ver.

Pela recompensa de shows apoteóticos de Bruno Mars a Foo Fighters, os frequentadores tiveram que enfrentar um “funil” entre os palcos, chuvas torrenciais e um shopping de ativações de marcas (que, geralmente, agradam muito mais aos influencers convidados que os frequentadores comuns).

Cada frequentador pagou aproximadamente meio salário mínimo no ingresso (no último lote, a inteira para cada dia custava R$815). Isso tudo para o que, teoricamente, seria um evento divertido e leve; na prática, foi uma prova de resistência.

O Estadão registrou: “No caminho, fãs já encontraram problemas, com dificuldades no deslocamento nos trens, lotados e atrasos na entrada. Um ônibus a serviço do festival pegou fogo na avenida 23 de Maio, mas passageiros não foram feridos. Já à noite, o Autódromo ficou sob forte chuva durante os principais shows”.

Seu navegador não suporta esse video.

Ônibus com passagem a $ 30 teve que parar no meio da avenida 23 de maio

Menos é mais

Em contrapartida, um festival como o Primavera Sound mostrou que há luz no fim do túnel. Seguindo a máxima “menos é mais”, o evento ditou que menos gente era mais conforto; menos ativação de marca era mais música, e por aí vai. Com metade das pessoas presentes nos eventos maiores, o Primavera reduziu o espaço e lembrou aos fãs que – pasmem! – festival não precisa ser sinônimo de perrengue.

Show de Carly Rae Jepsen no Primavera Sound em 2023 Foto: Taba Benedicto/Estadão

Mais que um line-up interessante com shows expressivos, os frequentadores puderam tomar água, tiveram conforto, espaço para se movimentar e não enfrentaram filas. Nesse sentido, o Primavera não fez mais que sua obrigação – mas isso é tão raro que a experiência pareceu luxuosa para os fãs.

O Estadão notou: “Houve também uma redenção do Autódromo de Interlagos, casa dos três principais festivais de música em São Paulo. Antes do Primavera, houve reclamações do público sobre transporte e logística nas edições de 2023 do Lollapalooza e, principalmente, do The Town. Mas, no Primavera, pela primeira vez no Autódromo, o esquema foi muito mais suave, desde a entrada até a volta para casa. Tudo bem que o público de cada dia foi de 50 mil pessoas, metade da média diária de seus concorrentes. Mas ficou a impressão de que o local pode, sim, oferecer uma estrutura boa para estes eventos”.

A tragédia não pode ser uma opção

Ana Clara Benevides recebe homenagem de fãs de Taylor Swift na Times Square, em Nova York. Foto: @updateswiftbr via X

A morte de Ana Clara Benevides no show de Taylor Swift, no Rio de Janeiro, teria de servir como a principal lição para todo o setor cultural brasileiro.

Ela não estava em um festival, mas pagou caro por um show-espetáculo, cuja experiência deveria ser minimamente segura e agradável. Mas não: a organização arriscou a tragédia em um dia de calor extremo, com medidas pouco resolutivas.

Nada disso pode se repetir. Como já era óbvio pelas previsões científicas e climáticas há anos, as produtoras precisam adotar medidas urgentes em um calor cada vez mais hostil. Mas mais do que isso, a tragédia tem de impactar na experiência básica de um festival – que, para início de conversa, nunca deveria ter sido tão ruim.

É neste ponto que os organizadores devem colocar a mão na consciência, antes do bolso. Pensar que o show é uma proposta de lazer, emoção, que não pode ser encarada levianamente. Se não pelo conforto dos frequentadores, há agora uma preocupação judicial e um olhar mais atento de órgãos fiscalizadores.

Se os organizadores não mudam, os fãs aprendem

Fãs enfrentam último dia de filas para compra de ingressos do show de Taylor Swift, no Allianz Parque, em 21 de junho de 2023, em São Paulo Foto: Werther Santana/Estadão

Os ingressos vão ficar mais baratos? Dificilmente. Se servir de indicativo, o primeiro lote do Lollapalooza 2024 já está em R$1.200 a inteira, por dia de festival.

Mas a pandemia já passou e os festivais são rotina novamente. Por isso, se os valores são exorbitantes, é urgente que consigam oferecer o mínimo de conforto. Com cuidados na entrada, uma experiência agradável durante, e o mínimo de ocorrências negativas depois. E um olhar na previsão do tempo – afinal, tudo aponta para os extremos (chuva, calor…), sem perspectiva de melhorar.

(E muito antes de ser lei, já devia ser máxima: água gratuita é direito básico.)

Se 2023 não ensinou organizadores, talvez tenha educado os frequentadores. Sabemos que não há mais como se contentar somente com os nomes no line-up – é necessário, afinal, uma experiência à altura do valor pago. Nada menos.

Os festivais de música se tornaram a grande moda no Brasil. Surgem, crescem, e se expandem anualmente – mas com o crescimento, vêm as dores. Entre Lollapalooza, The Town, Primavera Sound, C6 Fest e outros eventos de médio e grande porte, uma série de dilemas se apresentou neste ano. O primeiro deles, e um dos mais urgentes, é financeiro.

Em 2023, alguns festivais chegaram a cobrar mais de mil reais por ingresso (a inteira por dia no Lollapalooza, por exemplo, chegou a custar R$1.500). Argumenta-se que o valor cobrado pelos fornecedores aumentou; que trazer os artistas gringos está mais caro e complexo (até turnês locais de artistas estadunidenses estão difíceis de bancar). Não à toa: enfrentamos um cenário pós-pandêmico e uma instável economia global.

Festivais The Town, Lollapalooza e shows de Taylor Swift reuniram milhares de pessoas em São Paulo e Rio, em 2023 Foto: Taba Benedicto/Estadão

Os profissionais mudaram, os custos de serviço aumentaram e até os artistas estão mais criteriosos sobre o quanto querem viajar após a pandemia. Então, claro, a realização de um festival encareceu – como aconteceu com praticamente tudo desde 2020. Mas isso não significa que qualquer preço absurdo possa ser cobrado do público às custas dele mesmo. Afinal, um festival não é só o ingresso – antes fosse. Há a água, a cervejinha (ninguém é de ferro...), e as comidas, sempre superfaturadas.

Isso sem contar o constante perrengue. Em algum momento, tornou-se aceitável pagar mil reais em um festival para ter dificuldades da entrada à saída, com riscos inclusive à segurança física.

Ao entrar em 2023, os shows ainda eram um acontecimento quase sem preço. A vida pós-pandemia também pegou no nosso emocional e não nos curamos totalmente dessa lógica. Quanto vale um show inesquecível, se três anos atrás você estava preso dentro de casa sem perspectiva de sair?

Nessa, os festivais se safaram com muita coisa. Isto é, até os desastres acontecerem.

O ano de 2023 nos deixou com algumas lições para os festivais – e dúvidas para 2024. Veja:

A megalomania não vale o preço

Grupo Chainsmokers se apresenta no Palco Skyline durante o festival The Town 2023 Foto: Taba Benedicto/Estadão

Neste ano, a primeira edição do The Town fez barulho – mais no mau que no bom sentido. O festival megalomaníaco, estreante em São Paulo, levou 100 mil pessoas por dia ao Autódromo de Interlagos. Vendas esgotadas, afirmou a organização. Deu para ver.

Pela recompensa de shows apoteóticos de Bruno Mars a Foo Fighters, os frequentadores tiveram que enfrentar um “funil” entre os palcos, chuvas torrenciais e um shopping de ativações de marcas (que, geralmente, agradam muito mais aos influencers convidados que os frequentadores comuns).

Cada frequentador pagou aproximadamente meio salário mínimo no ingresso (no último lote, a inteira para cada dia custava R$815). Isso tudo para o que, teoricamente, seria um evento divertido e leve; na prática, foi uma prova de resistência.

O Estadão registrou: “No caminho, fãs já encontraram problemas, com dificuldades no deslocamento nos trens, lotados e atrasos na entrada. Um ônibus a serviço do festival pegou fogo na avenida 23 de Maio, mas passageiros não foram feridos. Já à noite, o Autódromo ficou sob forte chuva durante os principais shows”.

Seu navegador não suporta esse video.

Ônibus com passagem a $ 30 teve que parar no meio da avenida 23 de maio

Menos é mais

Em contrapartida, um festival como o Primavera Sound mostrou que há luz no fim do túnel. Seguindo a máxima “menos é mais”, o evento ditou que menos gente era mais conforto; menos ativação de marca era mais música, e por aí vai. Com metade das pessoas presentes nos eventos maiores, o Primavera reduziu o espaço e lembrou aos fãs que – pasmem! – festival não precisa ser sinônimo de perrengue.

Show de Carly Rae Jepsen no Primavera Sound em 2023 Foto: Taba Benedicto/Estadão

Mais que um line-up interessante com shows expressivos, os frequentadores puderam tomar água, tiveram conforto, espaço para se movimentar e não enfrentaram filas. Nesse sentido, o Primavera não fez mais que sua obrigação – mas isso é tão raro que a experiência pareceu luxuosa para os fãs.

O Estadão notou: “Houve também uma redenção do Autódromo de Interlagos, casa dos três principais festivais de música em São Paulo. Antes do Primavera, houve reclamações do público sobre transporte e logística nas edições de 2023 do Lollapalooza e, principalmente, do The Town. Mas, no Primavera, pela primeira vez no Autódromo, o esquema foi muito mais suave, desde a entrada até a volta para casa. Tudo bem que o público de cada dia foi de 50 mil pessoas, metade da média diária de seus concorrentes. Mas ficou a impressão de que o local pode, sim, oferecer uma estrutura boa para estes eventos”.

A tragédia não pode ser uma opção

Ana Clara Benevides recebe homenagem de fãs de Taylor Swift na Times Square, em Nova York. Foto: @updateswiftbr via X

A morte de Ana Clara Benevides no show de Taylor Swift, no Rio de Janeiro, teria de servir como a principal lição para todo o setor cultural brasileiro.

Ela não estava em um festival, mas pagou caro por um show-espetáculo, cuja experiência deveria ser minimamente segura e agradável. Mas não: a organização arriscou a tragédia em um dia de calor extremo, com medidas pouco resolutivas.

Nada disso pode se repetir. Como já era óbvio pelas previsões científicas e climáticas há anos, as produtoras precisam adotar medidas urgentes em um calor cada vez mais hostil. Mas mais do que isso, a tragédia tem de impactar na experiência básica de um festival – que, para início de conversa, nunca deveria ter sido tão ruim.

É neste ponto que os organizadores devem colocar a mão na consciência, antes do bolso. Pensar que o show é uma proposta de lazer, emoção, que não pode ser encarada levianamente. Se não pelo conforto dos frequentadores, há agora uma preocupação judicial e um olhar mais atento de órgãos fiscalizadores.

Se os organizadores não mudam, os fãs aprendem

Fãs enfrentam último dia de filas para compra de ingressos do show de Taylor Swift, no Allianz Parque, em 21 de junho de 2023, em São Paulo Foto: Werther Santana/Estadão

Os ingressos vão ficar mais baratos? Dificilmente. Se servir de indicativo, o primeiro lote do Lollapalooza 2024 já está em R$1.200 a inteira, por dia de festival.

Mas a pandemia já passou e os festivais são rotina novamente. Por isso, se os valores são exorbitantes, é urgente que consigam oferecer o mínimo de conforto. Com cuidados na entrada, uma experiência agradável durante, e o mínimo de ocorrências negativas depois. E um olhar na previsão do tempo – afinal, tudo aponta para os extremos (chuva, calor…), sem perspectiva de melhorar.

(E muito antes de ser lei, já devia ser máxima: água gratuita é direito básico.)

Se 2023 não ensinou organizadores, talvez tenha educado os frequentadores. Sabemos que não há mais como se contentar somente com os nomes no line-up – é necessário, afinal, uma experiência à altura do valor pago. Nada menos.

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