Lollapalooza 2023: Edição das contradições colocou artistas engajados na berlinda


Como um rapper bem intencionado pode cantar entre tantos infortúnios e dormir tranquilo?

Por Julio Maria

A edição do Lollapalooza de 2023 revelou fragilidades e expôs feridas que o pop brasileiro engajado não queria ouvir. Agora que se sabe do trabalho escravo em suas cercanias, da piada que se tornou fora do País depois que Drake cabulou um show para encher a lata em uma boate dos Estados Unidos e da forma como sucateia cachês de artistas brasileiros, é preciso perguntar não a seus realizadores, mas aos próprios artistas: E então? Como resolver essa contradição colocada entre o que se canta e onde se canta?

Show da cantora Rosalía Foto: TABA BENEDICTO / ESTADAO

A questão é séria porque coloca o artista na berlinda. O Lolla tem como uma de suas frentes o pop de origem militante, racial e de gênero. O rap e o funk, dois estilos aderentes desse discurso, representam algo como 40% de sua programação. Lil Nas X, Pedro Sampaio, Baco Exu do Blues, Black Alien, Ludmilla, Filipe Ret, L7NNON, Rashid e o próprio Drake foram algumas de suas apostas de 2023 por fazerem parte da turma da validação social do “projeto Lollapalooza”. São nomes fortes que precisam estar presentes para agradar, claro, aos fãs, mas também (não sejamos ingênuos) ao mercado. Festivais podem até ser, mas não podem parecer que são monocromáticos.

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Pois o ano que teve mais uma vez o próprio criador do Lollapalooza, Perry Farrell, do Jane’s Addiction, como uma das atrações, começou mal, seguiu com muitos cancelamentos, recuperou-se em instantes de grandes shows, e acabou péssimo. Antes mesmo que seus portões fossem abertos, uma fiscalização feita pelo Ministério do Trabalho e Emprego de São Paulo resgatou cinco trabalhadores prestando serviços para o festival. Segundo o ministério, os homens prestavam serviços de logística de bebidas e estavam em regime de informalidade, dormindo no chão ou sobre madeiras, sem energia elétrica, colchão e sem receber equipamentos de proteção individual (EPIs). Cada um receberia R$ 130 por dia de trabalho, mas, constatou-se, estavam sendo vítimas de jornadas que chegavam a 12 horas por dia.

Rashid: como resolver a contradição?  Foto: EFE/Isaac Fontana

O festival começou e terminou sem que nenhum artista ameaçasse dizer algo contra trabalhos escravos no microfone, deixando o desagradável aroma da indignação seletiva. O tema trabalho escravo feito por mãos de obra periféricas é em si algo que rende broncas históricas de rappers da linhagem de Baco Exu do Blues e do reverencial Black Alien. Mas ali, ninguém sequer ameaçou deixar a programação por este motivo. Pelo mesmo pensamento, não seria a hora de saber porque há diferenças tão discrepantes relacionadas aos cachês pagos pelo festival? O caso tem uma distante jurisprudência: o único episódio em que grupos resolveram peitar o gigante Rock in Rio se deu em 2001, quando um grupo formado por O Rappa, Cidade Negra, Raimundos, Charlie Brown Jr, Skank e Jota Quest resolveram boicotar o festival. As condições oferecidas, os cachês e a estrutura eram, segundo eles, uma vergonha perto do que os estrangeiros receberiam.

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Os palcos de 2023 deram algum respiro. Lis Nas X fez um dos melhores shows, inaugurando a narrativa de um poderio gay imperial e esplendoroso. Ludmilla, mal aproveitada em um horário secundário, veio com uma evolução vocal exemplar e fez um belo show. Billie Eilish foi honesta e generosa com seus fãs, provando ser uma grande artista. Rosalía e o DJ tapa buraco Skrillex, escalado às pressas para o lugar de Drake, fizeram o que puderam para terminar com os ânimos nas alturas. Nem tudo deu certo, mas o importante, à alguma altura do evento, é que a edição mais difícil do festival terminasse logo.

Ludmilla: engolindo sapos em silêncio Foto: LEANDRO CHEMALLE / ESTADÃO CONTEÚDO

O risco Lollapalooza precisa começar a ser calculado. Aos fãs que compram seus ingressos sem nenhuma garantia de que verão seus ídolos – os mais lesados dessa edição foram os fãs do Blink 182 e de Drake, mas não vieram também Omar Apollo, Willow Smith e Dominic Fike –, não valeria a pena criar uma opção de “artista preferido” no momento da compra online? Com ela, os organizadores ficariam obrigados a devolver o valor integral ao dono do ingresso caso o artista escolhido não viesse. Aos artistas que criam suas carreiras sobre causas nobres, não valeria a pena que estipulassem em contrato uma cláusula garantindo que estarão pisando em uma terra livre de explorações escravagistas? Só esse cuidado já causaria um barulho exemplar.

A edição do Lollapalooza de 2023 revelou fragilidades e expôs feridas que o pop brasileiro engajado não queria ouvir. Agora que se sabe do trabalho escravo em suas cercanias, da piada que se tornou fora do País depois que Drake cabulou um show para encher a lata em uma boate dos Estados Unidos e da forma como sucateia cachês de artistas brasileiros, é preciso perguntar não a seus realizadores, mas aos próprios artistas: E então? Como resolver essa contradição colocada entre o que se canta e onde se canta?

Show da cantora Rosalía Foto: TABA BENEDICTO / ESTADAO

A questão é séria porque coloca o artista na berlinda. O Lolla tem como uma de suas frentes o pop de origem militante, racial e de gênero. O rap e o funk, dois estilos aderentes desse discurso, representam algo como 40% de sua programação. Lil Nas X, Pedro Sampaio, Baco Exu do Blues, Black Alien, Ludmilla, Filipe Ret, L7NNON, Rashid e o próprio Drake foram algumas de suas apostas de 2023 por fazerem parte da turma da validação social do “projeto Lollapalooza”. São nomes fortes que precisam estar presentes para agradar, claro, aos fãs, mas também (não sejamos ingênuos) ao mercado. Festivais podem até ser, mas não podem parecer que são monocromáticos.

Pois o ano que teve mais uma vez o próprio criador do Lollapalooza, Perry Farrell, do Jane’s Addiction, como uma das atrações, começou mal, seguiu com muitos cancelamentos, recuperou-se em instantes de grandes shows, e acabou péssimo. Antes mesmo que seus portões fossem abertos, uma fiscalização feita pelo Ministério do Trabalho e Emprego de São Paulo resgatou cinco trabalhadores prestando serviços para o festival. Segundo o ministério, os homens prestavam serviços de logística de bebidas e estavam em regime de informalidade, dormindo no chão ou sobre madeiras, sem energia elétrica, colchão e sem receber equipamentos de proteção individual (EPIs). Cada um receberia R$ 130 por dia de trabalho, mas, constatou-se, estavam sendo vítimas de jornadas que chegavam a 12 horas por dia.

Rashid: como resolver a contradição?  Foto: EFE/Isaac Fontana

O festival começou e terminou sem que nenhum artista ameaçasse dizer algo contra trabalhos escravos no microfone, deixando o desagradável aroma da indignação seletiva. O tema trabalho escravo feito por mãos de obra periféricas é em si algo que rende broncas históricas de rappers da linhagem de Baco Exu do Blues e do reverencial Black Alien. Mas ali, ninguém sequer ameaçou deixar a programação por este motivo. Pelo mesmo pensamento, não seria a hora de saber porque há diferenças tão discrepantes relacionadas aos cachês pagos pelo festival? O caso tem uma distante jurisprudência: o único episódio em que grupos resolveram peitar o gigante Rock in Rio se deu em 2001, quando um grupo formado por O Rappa, Cidade Negra, Raimundos, Charlie Brown Jr, Skank e Jota Quest resolveram boicotar o festival. As condições oferecidas, os cachês e a estrutura eram, segundo eles, uma vergonha perto do que os estrangeiros receberiam.

Os palcos de 2023 deram algum respiro. Lis Nas X fez um dos melhores shows, inaugurando a narrativa de um poderio gay imperial e esplendoroso. Ludmilla, mal aproveitada em um horário secundário, veio com uma evolução vocal exemplar e fez um belo show. Billie Eilish foi honesta e generosa com seus fãs, provando ser uma grande artista. Rosalía e o DJ tapa buraco Skrillex, escalado às pressas para o lugar de Drake, fizeram o que puderam para terminar com os ânimos nas alturas. Nem tudo deu certo, mas o importante, à alguma altura do evento, é que a edição mais difícil do festival terminasse logo.

Ludmilla: engolindo sapos em silêncio Foto: LEANDRO CHEMALLE / ESTADÃO CONTEÚDO

O risco Lollapalooza precisa começar a ser calculado. Aos fãs que compram seus ingressos sem nenhuma garantia de que verão seus ídolos – os mais lesados dessa edição foram os fãs do Blink 182 e de Drake, mas não vieram também Omar Apollo, Willow Smith e Dominic Fike –, não valeria a pena criar uma opção de “artista preferido” no momento da compra online? Com ela, os organizadores ficariam obrigados a devolver o valor integral ao dono do ingresso caso o artista escolhido não viesse. Aos artistas que criam suas carreiras sobre causas nobres, não valeria a pena que estipulassem em contrato uma cláusula garantindo que estarão pisando em uma terra livre de explorações escravagistas? Só esse cuidado já causaria um barulho exemplar.

A edição do Lollapalooza de 2023 revelou fragilidades e expôs feridas que o pop brasileiro engajado não queria ouvir. Agora que se sabe do trabalho escravo em suas cercanias, da piada que se tornou fora do País depois que Drake cabulou um show para encher a lata em uma boate dos Estados Unidos e da forma como sucateia cachês de artistas brasileiros, é preciso perguntar não a seus realizadores, mas aos próprios artistas: E então? Como resolver essa contradição colocada entre o que se canta e onde se canta?

Show da cantora Rosalía Foto: TABA BENEDICTO / ESTADAO

A questão é séria porque coloca o artista na berlinda. O Lolla tem como uma de suas frentes o pop de origem militante, racial e de gênero. O rap e o funk, dois estilos aderentes desse discurso, representam algo como 40% de sua programação. Lil Nas X, Pedro Sampaio, Baco Exu do Blues, Black Alien, Ludmilla, Filipe Ret, L7NNON, Rashid e o próprio Drake foram algumas de suas apostas de 2023 por fazerem parte da turma da validação social do “projeto Lollapalooza”. São nomes fortes que precisam estar presentes para agradar, claro, aos fãs, mas também (não sejamos ingênuos) ao mercado. Festivais podem até ser, mas não podem parecer que são monocromáticos.

Pois o ano que teve mais uma vez o próprio criador do Lollapalooza, Perry Farrell, do Jane’s Addiction, como uma das atrações, começou mal, seguiu com muitos cancelamentos, recuperou-se em instantes de grandes shows, e acabou péssimo. Antes mesmo que seus portões fossem abertos, uma fiscalização feita pelo Ministério do Trabalho e Emprego de São Paulo resgatou cinco trabalhadores prestando serviços para o festival. Segundo o ministério, os homens prestavam serviços de logística de bebidas e estavam em regime de informalidade, dormindo no chão ou sobre madeiras, sem energia elétrica, colchão e sem receber equipamentos de proteção individual (EPIs). Cada um receberia R$ 130 por dia de trabalho, mas, constatou-se, estavam sendo vítimas de jornadas que chegavam a 12 horas por dia.

Rashid: como resolver a contradição?  Foto: EFE/Isaac Fontana

O festival começou e terminou sem que nenhum artista ameaçasse dizer algo contra trabalhos escravos no microfone, deixando o desagradável aroma da indignação seletiva. O tema trabalho escravo feito por mãos de obra periféricas é em si algo que rende broncas históricas de rappers da linhagem de Baco Exu do Blues e do reverencial Black Alien. Mas ali, ninguém sequer ameaçou deixar a programação por este motivo. Pelo mesmo pensamento, não seria a hora de saber porque há diferenças tão discrepantes relacionadas aos cachês pagos pelo festival? O caso tem uma distante jurisprudência: o único episódio em que grupos resolveram peitar o gigante Rock in Rio se deu em 2001, quando um grupo formado por O Rappa, Cidade Negra, Raimundos, Charlie Brown Jr, Skank e Jota Quest resolveram boicotar o festival. As condições oferecidas, os cachês e a estrutura eram, segundo eles, uma vergonha perto do que os estrangeiros receberiam.

Os palcos de 2023 deram algum respiro. Lis Nas X fez um dos melhores shows, inaugurando a narrativa de um poderio gay imperial e esplendoroso. Ludmilla, mal aproveitada em um horário secundário, veio com uma evolução vocal exemplar e fez um belo show. Billie Eilish foi honesta e generosa com seus fãs, provando ser uma grande artista. Rosalía e o DJ tapa buraco Skrillex, escalado às pressas para o lugar de Drake, fizeram o que puderam para terminar com os ânimos nas alturas. Nem tudo deu certo, mas o importante, à alguma altura do evento, é que a edição mais difícil do festival terminasse logo.

Ludmilla: engolindo sapos em silêncio Foto: LEANDRO CHEMALLE / ESTADÃO CONTEÚDO

O risco Lollapalooza precisa começar a ser calculado. Aos fãs que compram seus ingressos sem nenhuma garantia de que verão seus ídolos – os mais lesados dessa edição foram os fãs do Blink 182 e de Drake, mas não vieram também Omar Apollo, Willow Smith e Dominic Fike –, não valeria a pena criar uma opção de “artista preferido” no momento da compra online? Com ela, os organizadores ficariam obrigados a devolver o valor integral ao dono do ingresso caso o artista escolhido não viesse. Aos artistas que criam suas carreiras sobre causas nobres, não valeria a pena que estipulassem em contrato uma cláusula garantindo que estarão pisando em uma terra livre de explorações escravagistas? Só esse cuidado já causaria um barulho exemplar.

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